Direito Civil

terça-feira, 12 de agosto de 2008


Interpretação da LICC - continuação


Tópicos:
  1. Continuação sobre o art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil
  2. Classificações doutrinárias dos costumes
  3. Lei
  4. Princípios
  5. Análise doutrinária do art. 4º
  6. Eqüidade
  7. Art. 5º
  8. Interpretação da norma


Continuação sobre o art. 4º da LICC

O artigo cita o costume como fonte de Direito. O costume tem um elemento objetivo e um subjetivo. O elemento objetivo é a repetição do hábito. O elemento subjetivo é a necessidade dessa repetição. Vamos aplicar isso agora.

Formar filas é um costume. Não está regulamentado em lei, mas faz parte de uma rotina que temos. Em qualquer lugar que vamos temos a repetição deste hábito. E porque o repetimos? Por uma questão de organização. Se eu furar a fila, ou seja, não cumprir essa norma social de organizar filas, não sofrerei uma sanção jurídica, mas sofrerei uma sanção moral. Então, vimos que isso é uma questão de necessidade. Não se repete o hábito de formar filas à toa, fazemos não apenas por necessidade, mas por causa de uma coerção moral.

Os costumes são classificados de acordo com o Código Civil, art. 1297, § 1º:

§ 1o Os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisórios, tais como sebes vivas, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas, presumem-se, até prova em contrário, pertencer a ambos os proprietários confinantes, sendo estes obrigados, de conformidade com os costumes da localidade, a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua construção e conservação.

O costume é trazido pelo legislador: ele traz a requisição do uso do costume. O próprio legislador pede a aplicação do costume. Trata-se de costumes relacionados a vizinhança e divisória. Dá responsabilidade aos dois vizinhos sobre a cerca divisória. O valor dela será calculado de acordo com os costumes da localidade.

Classificações doutrinárias dos costumes

  1. Secundum legem: significa “de acordo com a lei”. É o costume mais bem aceito, facilmente reconhecido como tais em suas respectivas localidades, de eficácia obrigatória.
  2. Praeter legem: “que não é regulado pela lei.” Denominação dada pela doutrina àquele costume ao qual se recorre quando o legislador nada fala a respeito do fato em questão, ou seja, quando a lei for omissa.
  3. Contra legem: “Contra a lei.” ex: não usar o cinto de segurança. Há alguns juízes que têm o hábito de decidir contra legem. De acordo com esta fonte¹, há dois casos comuns em que se aplica o costume contra legem: quando a lei em desuso é substituída pela regra costumeira ou quando o costume simplesmente suprime a lei. Outro exemplo é o não-uso do cinto de segurança.

Os livros tentam mostrar que os únicos costumes aplicados ao Direito são o secundum e o praeter, mas na prática não é assim. A jurisprudência também fala do uso de costume contra legem. Maria Helena Diniz, em seu livro sobre a LICC, conta que o juiz, ao decidir, se não o fez em conformidade com o artigo, mas conforme o costume da região, costume esse contra a lei, então é provável que haja recurso.

Lei

Já falamos em analogia, costumes e agora falaremos da lei. Que não fiquemos presos à seqüência do art. 4º. Sobre a ela, não temos muito o que falar. Suas duas características fundamentais são: o caráter, ou seja, ela é feita para todos (também chamado de caráter abstrato) e, como vimos, a grande diferença entre o Direito natural e o Direito positivo é que, neste, há a proposição hipotética. O Direito positivo trás consigo a coerção e a sanção.

Princípios

Relembrando a origem dos princípios: eles vêm do Direito natural; quando falamos em princípios, a idéia que nos vem à cabeça é a de valoração, de preceito. Por vezes, encontramos princípios genéricos ou gerais e princípios especiais ou setoriais.

Como já visto antes: o princípio que veda o enriquecimento ilícito é visto em todos os ramos do Direito. O princípio da boa-fé é pertencente ao Direito Civil. O legislador presume que, ao fazermos um contrato, estamos agindo de boa-fé.

Há também a classificação dos princípios em:

Análise doutrinária do art. 4º

Pelo art. 4º, temos, como fontes de Direito, lei, analogia, costumes e princípios. Mas, temos várias correntes doutrinárias tratando especificamente deste artigo. Vejamos cinco delas:

  1. Caio Mário: usa a interpretação declaratória (ou declarativa) que não aumenta nem diminui o conteúdo do artigo.
  2. Orlando Gomes: outro clássico do Direito Civil, restringe o conteúdo do art. 4º. Para ele, só é fonte de Direito a lei e os costumes. Justifica ele que as leis e os costumes têm duas características em comum: o caráter de abstração e generalidade. Também, tanto a lei quanto o costume envolvem a coerção, seja ela jurídica ou moral/social. Portanto, a interpretação de Orlando Gomes é restritiva.
  3. Maria Helena Diniz: faz um exaustiva classificação das fontes de Direito: primeiro, divide-as em fontes estatais, que são leis e jurisprudência. Quanto à estatalidade da lei não há discussão. Mas a jurisprudência não está citada no art. 4º. O judiciário, quando se posiciona de forma uniforme, forma sua jurisprudência. Pode-se recorrer a ela numa petição, mas não é tecnicamente fonte de Direito. Então a interpretação de Maria Helena Diniz é extensiva. Ela ainda fala em fontes não-estatais: doutrina, costumes e o que denominou “vontade humana”. A doutrina é fonte de interpretação, não fonte de Direito, mas a autora defende que nem sempre encontramos certas definições no código, e, portanto, tem-se que recorrer à doutrina. Costumes: sem problemas. Vontade humana: para discutir essa fonte de Direito que só ela e Leoni concordam em existir, Maria Helena Diniz recorre à idéia de contratos, que ela diz se tratar de “lei entre as partes”. No Direito Civil, prega-se a autonomia das vontades, desde que seja lícito o contrato firmado. Pode ser usado na petição inicial, para mostrar, por exemplo, que o vizinho fez um contrato parecido. Esse argumento só é válido na perspectiva do Direito Contratual. Não é uma idéia muito bem aceita, praticamente só ela e Leoni trazem a vontade humana como fonte de Direito.
  4. Washington de Barros: faz a distinção entre fontes imediatas e fontes mediatas. As primeiras seriam as leis e os costumes. As mediatas seriam a doutrina e a jurisprudência. Ele não cita nem analogia nem princípios. Como ele cria uma idéia de fontes “mediatas” e “imediatas”, então entende-se que ele cria uma ordem seqüencial obrigatória. Não é o melhor posicionamento porque não podemos criar ordem obrigatória em fontes de Direito.
  5. Leoni: divide as fontes de Direito em primárias e secundárias. As primárias, para Leoni, são a lei, os costumes, jurisprudência e vontade humana. Ele concorda com Maria Helena Diniz neste particular. As secundárias são: doutrina e princípios. Leoni é autor moderno, e a grande crítica que se faz a ele é que ele cria, assim como Barros, uma ordem. Analogia não é citada como fonte de Direito por ele. E, para agravar, já que ele fez  uma ordem, tratou de colocar os princípios em último lugar. Por ter criado a ordem, não considerar a analogia e atribuir menor importância aos princípios ele é bastante criticado pelos autores mais tradicionais.

Como isso será cobrado em prova, se for: a professora pedirá: “interprete o art. 4º e cite uma corrente doutrinária.” Não precisa trazer todas elas, mas cite uma ou duas, que aumentem, mantenham ou diminuam o art. 4º e fundamente sua defesa.

Eqüidade

A professora não citou nenhuma corrente doutrinária com a eqüidade! E agora? Acalme-se. A eqüidade é a aplicação do justo. Eqüidade está citada no art. 4º? Não. Não é para criticar o autor da corrente, mas se atenha ao texto da lei. Há muitos livros que falam de fonte de Direito e, depois, falam de eqüidade. Eqüidade não é citada no art. 4º, mas é um instituto do Direito. A origem dessa eqüidade está no Direito natural: a busca pela justiça.

A doutrina também não fica fora de jogo em matéria de eqüidade. Os doutrinadores trazem a... 

Eqüidade legal: quando o legislador traz os exemplos materiais da aplicação da eqüidade. Vamos relembrar: na primeira aula, a professora disse que há um artigo na lei de alimentos: a sentença que concede o pagamento de pensão alimentícia não transita em julgado. Ela pode ser revista a qualquer momento. Pode ser reduzida ou aumentada. Esse artigo da lei de alimentos traz um exemplo de eqüidade implícita. O legislador não escreveu a palavra eqüidade, mas pela leitura do artigo vemos que pede-se a aplicação do justo. Lei 5478/68, art. 15:

Art. 15. A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado e pode a qualquer tempo ser revista, em face da modificação da situação financeira dos interessados.

Eqüidade judicial: não serão exemplos, mas os aplicadores: quem pode aplicar, quem pode usar da eqüidade? Isso está no CPC, art. 127 e lei 9307/96, art. 11.

Art. 127. O juiz só decidirá por eqüidade nos casos previstos em lei.

 

Art. 11. Poderá, ainda, o compromisso arbitral conter:

        I - local, ou locais, onde se desenvolverá a arbitragem;

        II - a autorização para que o árbitro ou os árbitros julguem por eqüidade, se assim for convencionado pelas partes;

        III - o prazo para apresentação da sentença arbitral;

        IV - a indicação da lei nacional ou das regras corporativas aplicáveis à arbitragem, quando assim convencionarem as partes;

        V - a declaração da responsabilidade pelo pagamento dos honorários e das despesas com a arbitragem; e

        VI - a fixação dos honorários do árbitro, ou dos árbitros.

        Parágrafo único. Fixando as partes os honorários do árbitro, ou dos árbitros, no compromisso arbitral, este constituirá título executivo extrajudicial; não havendo tal estipulação, o árbitro requererá ao órgão do Poder Judiciário que seria competente para julgar, originariamente, a causa que os fixe por sentença.


A eqüidade, para ser usada, tem que estar na legislação, implícita ou expressamente. Um dos aplicadores é o juiz.

Quer ficar rico? Especialize-se Direito de Sucessões e inventário. Nesse ramo, faz-se pouco e ganha-se muito, testemunhou a professora. Se os herdeiros estiverem brigando, uma simples petição pode render R$ 6.000. Ou então, já que estamos falando em lei 9307/96, art. 11, você também pode se especializar em...

Arbitragem: justiça particular. Em vez de ir ao judiciário, procura-se um árbitro para decidir a pendência. Pessoas comuns não procuram a arbitragem, mas as grandes empresas sim. Muitas vezes elas querem celeridade no processo e não querem seus segredos escritos nos autos de um processo público. Para ser árbitro ou advogado da arbitragem, basta ser técnico no assunto, e não precisa de curso superior. Basta estudar muito e saber vários idiomas.

Diz a doutrina que o árbitro é um aplicador da eqüidade.

Terminamos o art. 4º!

Art. 5º:

Art. 5o  Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

A parte destacada é o trecho importante que a professora nos mandou grifar. O que o juiz está buscando, na verdade? Um critério de justiça, de uma coletividade, e não de um dado grupo. Na interpretação de uma lei, busquem a idéia de justiça no âmbito coletivo. Para que estudar essa tal de “interpretação da norma”? Qual a finalidade? É que há, infelizmente, lacunas na lei. temos leis obscuras e leis que trazem posicionamentos parecidos. Às vezes a fonte de Direito não socorre, então recorre-se à interpretação.

Interpretação da norma

Quando tocamos no assunto de interpretação da norma, temos dois antigos autores: Savigny, que ouviremos falar muito em Direito real, posse, propriedade, etc. Diz ele: na interpretação da norma, tem que se ter a visão subjetiva. Isto é: tenho que ver os motivos que levaram o legislador a escrever aquela norma. Para Savigny, o que importa é o motivo histórico. Por vezes, podemos entender a lei pelo motivo histórico. Mas nem sempre, como gostaria Savigny. Larenz tem um posicionamento bem diferente: a visão objetiva. Larenz não quer saber de motivo histórico. Ele diz que se uma lei for obscura, devemos interpretá-la conforme a aplicação na atualidade. Deve-se observar como a sociedade lida com aquela norma hoje. Nenhum dos dois posicionamentos é dominante, entretanto, ou seja, não há corrente minoritária nem corrente majoritária neste sentido.

Vamos ver a interpretação das normas de acordo com a classificação da doutrina:

Quanto às fontes: interpretação jurisprudencial: não tem muito o que falar. Quem dará o posicionamento se determinada lei deve ser interpretada de uma forma ou de outra é a jurisprudência.

Quanto aos meios:

Quanto aos resultados:



1: Eis a fonte: http://repensandodireito.blogspot.com/2007/10/aula-de-ied-fontes-do-direito-cont.html