Direito Civil

terça-feira, 21 de outubro de 2008


Pessoa jurídica – continuação

 

Art. 51

O art. 51, como falado na aula de ontem, fala das causas de extinção da pessoa jurídica. Votação da maioria absoluta, da maioria simples, término do tempo de existência, etc.

Este artigo traz o procedimento de extinção.

Art. 51. Nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu funcionamento, ela subsistirá para os fins de liquidação, até que esta se conclua.

§ 1o Far-se-á, no registro onde a pessoa jurídica estiver inscrita, a averbação de sua dissolução.

§ 2o As disposições para a liquidação das sociedades aplicam-se, no que couber, às demais pessoas jurídicas de direito privado.

§ 3o Encerrada a liquidação, promover-se-á o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica.

Repare que pode ser qualquer uma das situações de extinção.

Os parágrafos falam sobre vários itens que temos que saber. Quando a pessoa jurídica vem a ser extinta, o primeiro procedimento a ser realizado é a liquidação. Quando falamos em liquidação falamos em pagamento de todos os débitos, se ela ainda tiver dinheiro. Nesta fase, temos que lembrar se essa pessoa jurídica tem ou não uma responsabilidade subsidiária existente em seu ato constitutivo. Os membros dela responderão de maneira subsidiária? Pode ser que o patrimônio dela não seja suficiente para sanar todas as dívidas deixadas. Além do patrimônio da pessoa jurídica o patrimônio dos membros também tem que ser acionado, caso disposto no ato constitutivo que os membros têm responsabilidade subsidiária.

Passada a fase da liquidação, temos que fazer a averbação do ato constitutivo ¹. Lembrem-se que a averbação é uma anotação, uma comunicação de que aquela pessoa jurídica já está em fase de extinção, no próprio registro em que foi feita a inscrição. Depois disso, passa-se à etapa de cancelamento, a ser feito no cartório.

Posteriormente, devemos dar publicidade aos atos. A averbação e cancelamento são, na pratica, seguidos, quase que automaticamente sucessivos. Mas para o Direito são processos distintos.
 

Art. 52

Não falamos que falamos que a pessoa jurídica também tem direito à personalidade? O art. 52 diz exatamente sobre a personalidade da pessoa jurídica:

Art. 52. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.

A doutrina entende que só existem dois direitos da personalidade que podemos aplicar à pessoa jurídica.

  1. Direito à imagem;
  2. Direito à honra.

Aqui no caso de pessoa jurídica, a honra que será protegida será a honra objetiva, e não subjetiva. A honra objetiva, como estudamos, é a reputação, o que a sociedade acha do sujeito. Por vezes uma reportagem malfeita pode acabar com uma empresa. O direito à personalidade da pessoa jurídica é um pensamento novo, vindo da década de 80, com os casos de escândalos envolvendo creches. A imagem que se tinha da creche acusada foi destruída, e a figura das creches em geral, como instituição, mais ainda. É desde o novo Código de 2002 que os artigos são trazidos.
 

Associações e art. 53

Como falado, nessa parte geral, o código civil só se preocupará em trabalhar as associações e fundações. Vejamos, então, o...

Art. 53:

CAPÍTULO II
DAS ASSOCIAÇÕES

Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos.

Parágrafo único. Não há, entre os associados, direitos e obrigações recíprocos.

A constituição da associação se dá a partir da reunião de pessoas. A associação, em regra, não tem nem visa lucro. Porque em regra? Pelo Código Civil realmente ela não visa. Mas há associações ligadas ao ensino que fogem à regra e conseguem ter lucro; são constituídas justamente com esse fim. Há faculdades que são associações. FGV por exemplo.

Voltando à regra: ao pensarmos numa associação, digamos uma associação de moradores ou de representação profissional, ela não se reúne com a finalidade lucrativa. Entretanto elas podem ter um lucro no decorrer de sua existência. Caso tenha, esse lucro deve ser pego e reaplicado na própria associação, por exemplo quando a associação vende um bem e obtém um dinheiro. Diferente do que ocorre na sociedade: o lucro é dividido entre os sócios.

Ao reparar o parágrafo único do art. 53, vemos que os associados não têm direitos e deveres recíprocos. Porque o Código fala isso? É justamente por causa do fim da associação, que não é o lucro.
 

Art. 54

Ontem a professora falou do artigo que traz os elementos do ato constitutivo. Esse artigo só vale para sociedades e fundações, e temos um artigo especifico sobre os elementos do ato constitutivo da associação.

Se faltar um dos elementos citados pelo artigo, o estatuto será nulo.

Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá:

I - a denominação, os fins e a sede da associação;

II - os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados;

III - os direitos e deveres dos associados;

IV - as fontes de recursos para sua manutenção;

V – o modo de constituição e de funcionamento dos órgãos deliberativos;

VI - as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução.

VII – a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas.
  1. Inciso I: as informações mais básicas. O nome, onde fica a sede, e qual será o fim da pessoa jurídica. Quanto à sede, lembrem-se que ela se relaciona ao domicílio e que a pessoa jurídica pode ter domicílio de eleição. 
  2. Inciso II: refere-se ao art. 57 do Código Civil, que veio com uma literatura nova desde 2002.
    O Código se preocupa com a exclusão do associado. Em 2005 houve uma pequena reforma no Código em relação a isso. A preocupação do legislador não é mais com a admissão, mas com a expulsão do associado. Tanto é assim que o art. 57 vem com um novo formato.
  3. Inciso III: fala dos direitos e deveres do associado, que devem estar estipulados no estatuto. Liga-se ao art. 58. O código determinará, no art. 58, que só será alterado direito e dever se for alterado o estatuto. Um associado não pode interferir no direito nem dever do outro, nem propor alteração. Se algo for alterado, o estatuto tem que ser alterado primeiro. Até mesmo para se ampliar direitos.
  4. Inciso IV: ontem falamos que o fundo social teria que ser citado, ou seja, de onde sairia o dinheiro para a manutenção da pessoa jurídica. O mesmo vale aqui para a associação. Apesar de a associação ser formada por pessoas naturais, haverá a presença de pequenas quotas para a manutenção da associação.
  5. Inciso V: modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos. Liga-se aos artigos 59 e 60. Veremos a competência da assembléia geral. Basicamente é o que os órgãos deliberativos determinarão na diretoria.
  6. Inciso VI: condições de alteração das disposições estatutárias. Ontem vimos que, se é permitido que se mude a forma de administração da pessoa jurídica, isso tem que estar definido no próprio estatuto.
  7. Inciso VII: a forma de gestão administrativa e a forma de aprovação das respectivas contas. Liga-se também ao art. 59.

 

Resumo dos elementos do ato constitutivo da associação

  1. Denominação;
  2. Fins;
  3. Sede;
  4. Requisitos de admissão, demissão e exclusão dos associados;
  5. Direitos e deveres dos associados;
  6. Fonte dos recursos;
  7. Modo de constituição dos órgãos deliberativos;
  8. Condições para se modificar o estatuto;
  9. Forma de gestão e aprovação de contas.
     

Art. 55

Art. 55. Os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens especiais.

Os associados devem ter direitos iguais, mas o estatuto pode criar categorias especiais. Regra: se o estatuto for omisso, o tratamento dado será o mesmo em relação a direitos e deveres dos associados. Por isso falamos em isonomia dos associados. Mas a parte final do artigo nos diz que, se quisermos, podemos criar categorias especiais. Logo, esta é a exceção à regra. É permitido estipular que um associado que contribuíra com uma quota maior no início da associação tenha mais direitos que os outros? Sim, desde que seja trazido de forma expressa no estatuto. Não há proteção quanto à criação de categorias especiais.
 

Art. 56

É um artigo mais detalhado. Na prática, vemos o contrário do que está nele disposto. Ele é cópia do artigo correspondente do antigo Código.

Art. 56. A qualidade de associado é intransmissível, se o estatuto não dispuser o contrário.

Parágrafo único. Se o associado for titular de quota ou fração ideal do patrimônio da associação, a transferência daquela não importará, de per si, na atribuição da qualidade de associado ao adquirente ou ao herdeiro, salvo disposição diversa do estatuto.

Vamos interpretar, primeiramente, o caput. Ele está preocupado com a possibilidade de transferência da qualidade de associado. Regra: para o Código Civil, se nada for posto no estatuto, caso alguém seja associado e venha a morrer, a qualidade de associado será passada aos herdeiros? Não. Também não se pode vender o título caso o estatuto não fale sobre isso. Logo, se ele for omisso, a qualidade de associado é intransmissível. Essa não é a regra na prática. Vejamos, por exemplo, um clube. Se não fosse transmissível, poucas pessoas circulariam por ele. Logo, tomaremos como regra a possibilidade de transmissão da qualidade de associado. Essa transmissão pode ser do tipo inter vivos ou mortis causa.

Se o estatuto fala que a qualidade de associado é transferível, mas sem especificar como, logicamente entrará tanto a modalidade inter vivos como a mortis causa ². As associações, na prática, evitam confusões.

Parágrafo único do art. 56: preocupa-se com a transferência não da qualidade de associado, mas da transferência de quotas.

Regra para o Código: tomemos o exemplo de um clube. Ao se adquirir de alguém a jóia do clube, já posso me dizer sócio? Olhe que a transferência de quotas não obrigatoriamente transfere a qualidade de associado.

Exceção: quando compramos uma jóia, na prática estamos nos tornando associados, pois, como vimos, não tomamos a regra do artigo, mas a exceção. A qualidade de associado é vendida, deixada como herança, dada, etc.. Sendo assim, é porque o estatuto está permitindo. Para que a transferência de quotas implique na transmissão da qualidade de associado, isso precisa estar expresso no estatuto.

 

Art. 57

Este artigo sofreu uma modificação já em 2005.

Art. 57. A exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que assegure direito de defesa e de recurso, nos termos previstos no estatuto. (Redação dada pela Lei nº 11.127, de 2005)

 

Havia um parágrafo único, que não há mais. Todas as associações tiveram que alterar seus estatutos. Foi uma correria. A associação deveria trazer a justa-causa para excluir o associado. Com isso, a doutrina criou o seguinte pensamento: os estatutos têm que carregar o princípio da tipicidade, ou seja, trazer a justa-causa de exclusão. Não era assim antes de 2005. Qualquer motivo grave era suficiente para excluir o associado. A doutrina entra para dizer que essa justa-causa tem que ser tipificada.

O associado tem direito de defesa. Não é o direito de defesa no âmbito judicial, mas no administrativo. Ele tem direito a recurso no próprio âmbito da associação. Aquela exclusão pode ser analisada, e o estatuto tem que citar qual é o órgão interno responsável para acolher a defesa do associado. O prazo, os recursos e julgadores têm de estar definidos.

 

Art. 58 e o princípio da intangibilidade entre associados

Art. 58. Nenhum associado poderá ser impedido de exercer direito ou função que lhe tenha sido legitimamente conferido, a não ser nos casos e pela forma previstos na lei ou no estatuto.

 
Se o estatuto define quais são os direitos e deveres do associado, não será outro associado quem dirá quais são tais direitos e deveres. É o princípio da intangibilidade entre associados. Ao criar uma nova regra, mesmo que para trazer benefícios, o estatuto deverá ser alterado e essa alteração terá de ser averbada.

 

Art. 59

Atenção novamente para os que usam códigos antigos. Este artigo também foi alterado em 2005.

Art. 59. Compete privativamente à assembléia geral: (Redação dada pela Lei nº 11.127, de 2005)

I – destituir os administradores; (Redação dada pela Lei nº 11.127, de 2005)

II – alterar o estatuto. (Redação dada pela Lei nº 11.127, de 2005)

Parágrafo único. Para as deliberações a que se referem os incisos I e II deste artigo é exigido deliberação da assembléia especialmente convocada para esse fim, cujo quorum será o estabelecido no estatuto, bem como os critérios de eleição dos administradores. (Redação dada pela Lei nº 11.127, de 2005)


Antigamente havia muito mais competências para a assembléia geral. Hoje são apenas duas. Destituir o administrador e aprovar alterações estatutárias.

Lembrem-se que chamamos a atenção para a aprovação de contas. Antigamente essas contas eram aprovadas pela assembléia geral. A partir da mudança de 2005, essas contas não mais serão aprovadas pela assembléia geral, somente por assembléia extraordinária.

Parágrafo único: olhe o detalhe. Ontem foi falado do artigo do quórum de aprovação. A regra é “maioria dos presentes”. Caso não se defina expressamente no estatuto, o quórum de aprovação será a maioria dos presentes. Neste artigo, que fala do quórum de convocação, o funcionamento é diferente. Repare que quem definirá o quórum de convocação será o estatuto. E se não definir? Afinal, não é elemento obrigatório do ato constitutivo. Se for o caso, vamos para o...
 

Art. 60

Art. 60. A convocação dos órgãos deliberativos far-se-á na forma do estatuto, garantido a 1/5 (um quinto) dos associados o direito de promovê-la. (Redação dada pela Lei nº 11.127, de 2005)


Podemos interpretar este artigo de duas maneiras. Se o estatuto for omisso e nada falar sobre o quorum para a convocação, um quinto dos associados já podem se reunir para fazer a deliberação. Outra interpretação que se dá a este artigo é: às vezes a associação estipulou um quórum muito elevado. Esta corrente diz que este artigo é uma defesa da minoria. Há autores que dizem que, se o quórum for muito difícil de se atingir, a minoria será prejudicada, portanto que se faça com apenas 1/5 dos membros. Esta outra interpretação, portanto, é o direito da minoria. Apesar de estar definido no estatuto, basta que 1/5 estejam presentes.
 

Art. 61

A associação terminou, seja lá por que motivo. Ou foi o tempo, ou a associação se tornou ilícita, ou houve votação unânime, votação por maioria absoluta, etc. O que fazer com o patrimônio e as quotas que sobraram da associação?

Art. 61. Dissolvida a associação, o remanescente do seu patrimônio líquido, depois de deduzidas, se for o caso, as quotas ou frações ideais referidas no parágrafo único do art. 56, será destinado à entidade de fins não econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição municipal, estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes.

§ 1o Por cláusula do estatuto ou, no seu silêncio, por deliberação dos associados, podem estes, antes da destinação do remanescente referida neste artigo, receber em restituição, atualizado o respectivo valor, as contribuições que tiverem prestado ao patrimônio da associação.

§ 2o Não existindo no Município, no Estado, no Distrito Federal ou no Território, em que a associação tiver sede, instituição nas condições indicadas neste artigo, o que remanescer do seu patrimônio se devolverá à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União.

Agora vamos fazer um esquema e interpretar.

  1. Se houver a possibilidade, ao pagar as dívidas e ainda sobrar dinheiro, as quotas devem ser devolvidas de maneira atualizada. Às vezes nada sobra.
  2. Outro comportamento: suponha que eu sou um associado. Paguei o débito, peguei minha quota, e ainda sobrou dinheiro. O que fazer? Olhar o estatuto e ver se ele já indica outra entidade de fim não econômico. Olhe o detalhe. Quando a associação termina, ela pode transferir seu patrimônio para outra entidade de fim não econômico. Quais são mesmo? Ou uma associação ou uma fundação.³
  3. Terceiro detalhe: minha associação é de fim cultural. Posso transferir o patrimônio remanescente para uma fundação religiosa? Sim. O Código Civil não exige que a finalidade seja a mesma. Os fins podem ser iguais ou semelhantes.
  4. Quarto comportamento: estatuto omisso. Nada foi indicado. Poderá ser convocada uma assembléia extraordinária, não geral, para que os associados votem para onde vai esse patrimônio remanescente. É uma segunda chance. Se o estatuto não define, o Código abre uma possibilidade para que os associados votem para onde irá o patrimônio.
  5. Quinto comportamento: o estatuto não definiu, nem os associados se preocuparam em reunir para onde vai. O juiz determina para onde vai aquele patrimônio remanescente. Repare que no final do caput está dito que o patrimônio pode ir para uma instituição municipal, estadual ou federal. Se a associação tem domicílio em um município, procurar-se-á outra associação de fins iguais no mesmo município.
  6. Sexta e última possibilidade: no local da associação, não há nem outra associação nem outra fundação que possa recolher aquele patrimônio. Nesse caso, quem recolherá o patrimônio será a Fazenda Pública. Semelhante ao que ocorre no processo de ausência. O detalhe aqui é que as Fazendas Públicas que irão recolher serão a Fazenda Pública do estado, não do município (que era a que recolhia no processo de ausência), do Distrito Federal, se for aqui em Brasília e, se houver territórios, a Fazenda Pública da União.

Próxima aula: fundações.
  1. Essa averbação tem que ser comunicada a algum órgão.
  2. Pode ter havido uma pequena confusão aqui: há a possibilidade de, nesse caso de omissão do estatuto, a modalidade automaticamente empregada ser a inter vivos.
  3. Ainda nesta linha estava escrito em meu rascunho: "Necessariamente será para outra associação." Não entendi por que, foi as fundações também não têm fins econômicos, e não deixam de se encaixar na descrição do § 2º do artigo.