Ferdinand Lassalle e a Essência da Constituição
Tópicos:
Deve-se
compreender
o contexto histórico em que ele escreveu isso. Foi a segunda
metade do séc. XIX.
Lassalle morreu aos 39 anos, provavelmente num duelo porque estava
tendo um
caso com a mulher de outro homem...
Sugestão
de
leitura: O que
é uma Constituição Política,
do próprio Lassalle.
Vimos na
aula
passada que a Revolução Francesa, que
começa em 1789, foi o grande momento
de afirmação da classe burguesa, na virada de
mundo feudal, antigo regime, para
aquilo que conheceremos como Estado moderno, a sociedade moderna,
direitos
universais e direitos do homem.
Também
vimos um
pouco sobre os fatos da revolução: a queda da
Bastilha, o terror, radicais,
jacobinos, leia este post do blog.
¹
Só
se conclui esse
ciclo tenso e violento com a chegada de Napoleão Bonaparte
ao poder. Ele dá uma
nova centralizada política e jurídica ao poder,
é carismático, encerra a onda
de execuções, e, de alguma maneira, acena para a
nobreza que ele não iria
simplesmente destruir tudo. Depois se auto-proclama imperador e expande
os domínios
da França através de uma grande campanha militar:
as guerras napoleônicas que agitaram
a Europa Ocidental. A Europa Ocidental respondia, na época,
por todas as colônias
africanas, americanas e asiáticas. Quando
Napoleão é derrotado, ocorre o Congresso de
Viena. É uma espécie de ancestral de
organizações como a ONU. Foi
nesse congresso que ficou definido onde seria a Prússia, a
Áustria, a Polônia, etc.
Quando Napoleão é derrotado em Waterloo, os
países se reúnem em Viena e fazem o
rateio dos espólios. É mais ou menos nessa forma
que ficou o desenho do mapa da
Europa do séc. XXI.
A
Prússia é a que mais
gostou dessa partilha. Entretanto, não era um
país. O que chamamos de Alemanha
hoje era, naquela época, uma confederação
de principados, a chamada Confederação
Germânica. Era o até então Sacro
Império Romano-Germânico. A história da
Alemanha unificada só começa mesmo no
séc.
XX. Havia desde o Congresso de Viena a idéia de unificar os
territórios alemães,
mas isso não se confirmou por causa da divergência
entre Prússia e Áustria.
A
Prússia ganha
força por causa do rompimento de barreiras
alfandegárias entre os países e isso
realmente fortalece a região. Quando chega a
época de 1840-1845, a Confederação
Germânica já era uma potência
econômica. Já possuía
indústrias, trabalho,
acumulação de capital, exportava, arrecadava...
porém ainda era governada por
leis feudais. O poder ainda se afirmava na figura do monarca soberano,
cujo exército
jurava defendê-lo, a aristocracia dava
sustentação a esse regime e a burguesia,
que trabalhava, estava no limite da paciência. Até
que, em 1848, uma revolução
popular explode na Prússia. Quem participa dela ativamente
é o próprio
Ferdinand Lassalle. Ele era era professor, advogado e socialista; era
um
pequeno burguês. As insatisfações eram
que não seria possível um comércio
desenvolvido se ainda se deviam pagar tributos aos lordes luxuosos. A
motivação
foi mais ou menos aquela que subverteu a França cerca de
meio século antes.
Depois
é a vez da Áustria,
Suíça, e todos os países do ocidente
europeu. São as revoluções burguesas
do
séc. XIX. A exceção foi a Inglaterra,
que teve sua revolução dois séculos
antes.
Por que
estudamos
tanto sobre a Alemanha, autores alemães, textos e
Constituição alemã? É
porque houve
um revezamento cultural, com o renascimento italiano primeiro no
séc. XVI, e
depois do renascimento teve essa fase de
contestação por meio da arte, o Iluminismo,
a revolução filosófica, fatos esses
essencialmente franceses, sucedidos por
Napoleão, guerras, declínio de
Napoleão e, depois de tudo isso, com o
fortalecimento da região da Prússia, o centro
cultural passa para a Alemanha.
1848
é o ano da revolução
na Prússia, seguida por imitações do
movimento burguês que pipocaram nos demais
países europeus. Buscava-se garantir que, do processo
revolucionário, nascesse
uma nova constituição, que garanta liberdades,
direitos, que estabeleça a segurança
do país. O sonho constitucional acompanha a humanidade
ocidental num momento em
que ela decide se emancipar. É um sonho de
emancipação. A indagação
que servia
de motor revolucionário era “por que
nós, seres humanos, livres, dotados de
inteligência,
precisamos ficar submetidos a um poder opressor, seja de uma nobreza ou
de um
monarca?" Esse era o questionamento para convencer a
consciência do povo, a consciência
social a se mobilizar contra a opressão e a
injustiça. a Constituição passa a
ser o veículo de pregação desses
valores. Aconteceu primeiro na França, depois
na Prússia. Foi editada a Constituição
de Frankfurt, de 1848, que adotava,
entre outras coisas, o sufrágio universal. Leia este
post ² do blog do professor sobre a
Prússia e a Constituição. É
um texto de
Wikipedia, então cuidado, cheque as referências
³ no final do artigo. O texto serve para entender a
comparação entre o caso
francês e o caso prussiano.
Essa
Constituição não
é aceita pela monarquia, que submete ao parlamento outra
Constituição, que é
aprovada em 1850. Embora já seja um avanço, ela
mantém privilégios e não
prevê
o sufrágio universal. Tem voto censitário e cria
o Senado da Republica.
Lassalle quase morreu de desgosto. Era contemporâneo de Marx.
O
feudalismo vai
ficando pra trás na memória, o acúmulo
de capital já está se fortalecendo, a
revolução
industrial está no auge. Mais difícil
não foi promover mudanças na economia,
mas sim na política e no Direito, que mexem com o
exercício do poder: de
comandar o exército, de fazer leis, o direito de mandar. O
industrial capitalista
está lá, mandando em seus empregados, mas
não na nação. Nesse momento ainda
é a
monarquia e aristocracia que tem poder, mas vão sendo
gradativamente substituídos
pelos burgueses.
Isso tudo e mais um pouco entrega para o séc. XX uma herança de políticas não resolvidas: por isso há revoluções e guerras mundiais. Primeira guerra, ascensão de Hitler, nova tentativa de reconciliação, segunda guerra, que se aproveitou da tecnologia militar para aumentar exponencialmente o numero de mortes. Depois guerra fria, ameaça nuclear e de guerra de mísseis balísticos, então pensam até na caveira de Hamlet, “to be or not to be”: “o que há de ser depois disso tudo?” Einstein até disse: “não sei se teremos uma terceira guerra mundial, mas a quarta será uma guerra de paus e pedras.” Tudo isso por causa do século XIX mal-resolvido.
Lassalle
inventa o “constitucionalismo
sem constituição”. Ele defende que a
Constituição real é outra coisa,
diferente
daquela escrita naquele papel: a constituição
real de toda e qualquer sociedade
(a Essência da Constituição)
é diferente. O que é a essência de uma
Constituição?
O que torna algo verdadeiramente uma
Constituição? Como ela deve ser pra ser
chamada de Constituição? Toda teoria
constitucional tem que responder a essas
perguntas. Lassalle começa seu pensamento por aí.
A Constituição é a soma, a
conjunção
dos valores e fatores reais que vigoram naquele país.
Lassalle tem uma visão sociológica,
jurídica e anti-dogmática. Lança
perguntas e só as responde no final da obra. O
que é verdadeiramente uma
Constituição? O que deve ter uma
Constituição para
ser chamada como tal? Um jurisconsulto diria que é um pacto
social e invocaria
a teoria contratualista; se for uma república, é
um documento político de uma nação,
que serve também para organizar o poder e distribuir
direitos. Isso não é
suficiente para Lassalle. O que é
essencialmente constitucional? Essa é a pergunta
para toda e qualquer
sociedade.
Primeiramente,
é
necessário que a Constituição seja
fundamental. Mas o que é fundamental?
Fundamental
é o
necessário? Na construção de uma casa,
o que se faz primeiro? A fundação, o
fundamento. então sim, fundamento é
necessário. Ela também deve ser a base para
a gênese das outras leis. A validade destas tem que vir da
validade da Constituição.
Vamos imaginar, por absurdo, que ocorreu um incêndio na
Prússia (situação
hipotética proposta por Lassalle). A biblioteca que continha o registro de tudo pegou
fogo. E agora? Se de repente
todas as leis de um país deixassem de
existir por um acidente desses? Mais ou menos como na
revolução, mas não
exatamente. Pegou fogo e pronto. Poderia o parlamento, o legislador,
reescrever
a legislação do jeito que ele bem quisesse?
Monarquia,
aristocracia, a grande burguesia, mercado financeiro. Pra ele, a
Prússia era
isso. Era a soma desses fatores reais de poder. Em caso de desespero, o
povo.
Ferdinand Lassalle também abre uma discussão muito interessante sobre o poder constituinte, mas não fecha. Ele não menciona as condições para o exercício desse poder constituinte.
Não parem de ler o
blog. Lá contém os artigos postados pelo
professor com os fundamentos
históricos das constituições. As notas
de Direito Constitucional devem ficar
mais ricas quando o professor começar as aulas mais
esquemático-expositivas.
Aparentemente, o conteúdo do blog, somados aos
três textos que ficamos
encarregados de ler (A Essência da
Constituição, a Força Normativa da
Constituição e o texto de L.R. Barroso), somado
ao livro A Era dos Direitos, já
dão o embasamento necessário por hora,
já que não estamos vendo o Direito
Constitucional positivo ainda. Conferência de 1863
de Ferdinand Lassalle na Prússia. Leia.
É
um texto histórico importante, uma referência ao
que estudamos em nossa área. A
visão sociológica da
Constituição voltou a ter um espaço
interessante no estudo
do Direito Constitucional e também na questão do
poder constituinte. De onde
vem a força que inaugura a ordem constitucional, a ordem
jurídica de um
determinado país? então, Lassalle tem uma
visão bastante crítica das
constituições
dos países, às quais chama de “meras
folhas de papel”. O que é essencialmente
uma Constituição? Leia o blog e a apostila com o
texto A Essência da
Constituição.
1-
http://constitucional1.blogspot.com/2008/08/revoluo-e-constituio.html
2- http://constitucional1.blogspot.com/2008/08/prssia-e-constituio.html
3- http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%B5es_de_1848