Estrutura da Constituição
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Como vimos no programa, a disciplina está dividida em duas partes. A primeira: teoria da Constituição, e a segunda: direitos fundamentais. Falamos, brevemente, sobre a classificação das constituições, um pouco sobre poder constituinte, mas falamos abstratamente, para mostrar isso na experiência constitucional que vivemos no Brasil desde a independência em 1822, bem como a manifestação do poder constituinte e a dificuldade que a assembléia enfrentou para se dar de modo legítimo. O poder constituinte era o exército, antigamente. Dava golpes e outorgava a Constituição. Ou então dava golpes e promovia mudanças no regime político de modo abrupto. Tivemos, então, um golpe que gerou a república, juntamente com as oligarquias, e mais alguns atores, como a maçonaria. Em 1930, houve a mesma coisa. A revolução de 30 culminou na Constituição de 34. Depois o Estado Novo, a Constituição de 67, a emenda nº 1 de 69... Como vimos, a história das constituições brasileiras não é muito condizente com as das Constituições tradicionais; aqui muita coisa aconteceu com base na quartelada e na força. E mesmo as promulgadas tiveram certa dificuldade para exercer sua força normativa. A de 34, por exemplo, durou apenas 3 anos. Não tem como falar de força normativa dela. A de 46, apesar de ter tido um período mais largo de vigência, também teve muita dificuldade dada a instabilidade política por causa do regime de 46. Era a questão da legitimidade e votação, a começar. Mas o fator principal que dificultou a imposição da força normativa da Constituição de 46 foram as instabilidade políticas internas.
Em 67, vem uma Constituição semi-outorgada, pois o regime militar não extingue as instituições. Eles mantiveram as eleições para a Câmara e o Senado durante praticamente todo o período do regime militar. Nomeavam interventores, mas deixavam o povo escolher os parlamentares. O governo militar elaborou um projeto de Constituição e convocou o Congresso para rapidamente votá-lo. Paulo Bonavides chama isso de referendo, dada também a rapidez cobrada. Não era exatamente uma Constituição democrática. E também teve força normativa, mas muito curta, porque logo vieram os atos institucionais. O AI 5 suspende todas as garantias fundamentais. Em 69, uma emenda estrutural muda toda a Constituição de 67, e faz com que chamem essa emenda de uma nova Constituição, mais adequada à realidade do Brasil do ano.
O governo totalitário também precisa de uma Constituição? Suspende eleições, amordaça o judiciário, decreta o recesso do legislativo... a figura do "ato institucional" não existia em nenhum texto constitucional.
Quando uma Constituição é boa, ela mesma estabelece condições para que os fatores reais de poder se equilibrem. São os próprios poderes do Estado, forças armadas, mercado, povo, Igreja, etc.
Com o fim do regime militar, Sarney propõe uma emenda à Constituição de 67, convocando a assembléia constituinte. Foi a primeira vez que tivemos realmente a manifestação do poder constituinte. Os fatores reais de poder exerceram seu papel democraticamente.
A Constituição de um país será tanto melhor quanto ela for adequada. Esse termo é usado por Luis Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Inocêncio Coelho, etc. A Constituição que tem eficácia cria condições para que os fatores reais de poder convivam de maneira harmoniosa.
A Constituição brasileira cria dificuldades para a gestão por causa de sua grande extensão. Qualquer mudança na Constituição exige quóruns elevadíssimos.
As emendas, depois de 1989, existiram para adequar o Brasil à realidade mundial, como o novo cenário geopolítico pós-queda do Muro de Berlim.
Então vamos ver os aspectos estruturais da Constituição. Indicaremos hoje, veremos quarta. Antes de estudar os direitos fundamentais, vamos localizá-los.
A Constituição está dividida de modo lógico e esquemático em títulos, que se subdividem em capítulos, que se subdividem em seções, que contêm artigos, parágrafos, incisos, e alíneas. É assim desde as codificações romanas.
Títulos:
Título primeiro - Fundamentos e princípios fundamentais. Não tem subdivisões internas. Tem apenas quatro artigos.
TÍTULO
I Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I
-
a soberania;
II
- a cidadania
III
- a dignidade da pessoa humana;
IV
- os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V
-
o pluralismo político.
Parágrafo
único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição. |
Note os fundamentos no caput. O artigo é a unidade normativa mais básica de qualquer lei. O país se constitui em Estado Democrático de Direito. Nota os cinco fundamentos do Estado.
Comunhão de direitos. Cidade é em sentido político, não de agrupamento urbano. Vem de civitas, do latim, ou Polis, do grego. O homem é animal político (Aristóteles): é cidadão. Para isso, a Constituição tem que assegurar formas de garantir seu direito à cidadania.
Dignidade humana: é a
origem de todos os direitos
fundamentais. O status dignitatis é
o
que as pessoas podem exigir pelo simples fato de serem humanos. Alguns
autores,
entretanto, defendem que a dignidade humana não pode ser
considerada fundamento
de todos os direitos fundamentais, sustentando, por exemplo, que os
incisos
XXI, XXV, XXVIII e XXIX do art. 5º da
Constituição não possuem, como
fundamento
direto, a dignidade humana. É que as pessoas
jurídicas e agrupamentos de
pessoas também têm direitos fundamentais.
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. |
Trata da separação de poderes, como idealizado por Montesquieu.
Art.
3º Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil:
I
-
construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II
- garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. |
Fala dos objetivos da República. Note que esse artigo faz alusão àquela atribuição controversa da Constituição, que seria a de prometer coisas para o futuro.
Art.
4º A República Federativa do Brasil rege-se nas
suas relações internacionais
pelos seguintes princípios:
I
-
independência nacional;
II
- prevalência dos direitos humanos;
III
- autodeterminação dos povos;
IV
- não-intervenção;
V
-
igualdade entre os Estados;
VI
- defesa da paz;
VII
- solução pacífica dos conflitos;
VIII
- repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX
- cooperação entre os povos para o progresso da
humanidade;
X
-
concessão de asilo político. |
São os princípios que regem as relações internacionais do Brasil.
Título segundo: direitos e garantias fundamentais. É até aqui que vai o conteúdo de Direito Constitucional 1.
Nem todos os direitos fundamentais estão nos artigos 5º ao 17.
Vamos estudar o texto constitucional e as teorias que explicam isso. O que fazer no caso de colisão de direitos fundamentais? É a doutrina que tentará propor uma solução. Por exemplo: intimidade e liberdade de informação e expressão. Casos que vemos na mídia de trambiques ocorridos em empresas que são filmadas por câmeras escondidas. Para notar a gravidade dessa situação, lembremos um caso em que um pai de aluno de uma escola de crianças pequenas apresentou denúncia à polícia de que os donos da escola estariam abusando sexualmente do filho. Esse pai logo conseguiu a atenção de outros pais, que também ficaram horrorizados. A imprensa perguntou ao delegado encarregado do caso o que estava acontecendo, que se prontificou a dizer, antes de concluir as investigações, o que estaria ocorrendo. A escola foi logo depredada pela população, as crianças ficaram sem aula, arruinou-se o negócio dos empresários, que ficaram para sempre vistos como pedófilos. Quinze dias depois, quando os relatórios são concluídos, chegou-se à conclusão de que nada daquilo havia ocorrido; tudo havia sido ilusão de um paranóico pai.
Os outros títulos são:
E, finalmente, o Ato Das Disposições Constitucionais Transitórias.
Há também o preâmbulo, no início do Texto, que é uma profissão de fé dos constituintes.