Direito Penal

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Erro no Direito Penal

Frase do dia: “O erro de proibição é um excludente de culpabilidade.”

Tópicos:

  1. Erro de proibição
  2. Espécies: evitável e inevitável
  3. Distinção entre desconhecimento da lei e desconhecimento da proibição
  4. Erro sobre a pessoa
  5. Aberatio ictus
  6. Descriminantes putativas
  7. Teoria dos elementos negativos do tipo

Erro de proibição

Há erro de proibição quando o agente toma por legal ou legítima uma ação proibida. O sujeito supõe atuar legalmente mas atua contrariamente ao Direito. Enquanto no erro de tipo o sujeito erra sobre a representação do fato, no erro de proibição o sujeito erra quanto à proibição, e sabe exatamente o que está fazendo. Se um sujeito tem cocaína guardada em uma despensa, mas pensa que se trata de maizena, é erro de tipo. Se possui cocaína, sabe que realmente é cocaína, porém acha que é permitido porque está em pouca quantidade, então é erro de proibição. Aconteceu de um homem comprar, em viagem ao litoral, alguns pentes de cabelo feitos de fósseis de peixes. Foi detido no aeroporto ao tentar embarcar com os pentes, sob a acusação de crime ambiental. É um caso concreto em que dificilmente o sujeito saberia da proibição, então houve erro de proibição. Note que ele sabia que se tratava de um pente de cabelo feito de ossos de peixes. Outro caso foi um homem que descobriu uma nascente de água, então passou a engarrafar e vendê-la. Foi processado também por crime ambiental, pois em verdade precisa-se de autorização para esse tipo de atividade. Tirar Xerox é um outro caso notório: muitos alegarão que não sabiam da ilicitude quando forem abordados por uma autoridade lhes acusando de violação de direitos autorais, já que é uma prática corriqueira aqui.

 

Espécies: evitável e inevitável

Alguns autores, na Alemanha por exemplo, como é o caso de Schünemann, defendem a equiparação quanto aos efeitos do erro de tipo e o erro de proibição. Quando evitável, que se leve à apenação do crime culposo. Professor defende que a diferenciação entre as duas é falsa.


Distinção entre desconhecimento da lei e desconhecimento da proibição

Essa distinção é feita por alguns autores. O conhecimento da lei, logo seu não-desconhecimento, é adquirido por se ter informações sobre a lei. Podemos ter informações pelo rádio, TV, estudos, boca-de-fumo, etc. Esse é o conhecimento formal da lei.  Esse conhecimento, logo também o desconhecimento, apesar de o professor não concordar muito, continuam como inescusáveis, irrelevantes, ou seja, ninguém pode deixar de cumprir a lei alegando que não a conhece.

O desconhecimento da proibição é em geral obtido por meio de processo de socialização, que começa na família e na escola. Desde criança sabemos que roubar e matar é “feio”, “dá cadeia”,  “é coisa do diabo”, etc.

Normalmente, quem conhece a lei também conhece a proibição. O desconhecimento da lei é irrelevante, enquanto o desconhecimento da proibição é escusável. Se faltar o conhecimento da proibição, levará ao erro de proibição. Devido a erros de interpretação, é possível conhecer a lei e desconhecer a proibição.

O corolário desse raciocínio é: geralmente, quem desconhece a proibição desconhece também a lei.

Alguns autores, entretanto, recentemente vêm questionando essa distinção. Ela faz sentido quando tomamos como referência a criminalidade tradicional. Se tomarmos criminalidade atual e artificial, essa distinção permanece completamente válida.

Isso tem sido perguntado em concurso.

 

Erro sobre a pessoa

Ocorre erro sobre a pessoa quando o agente pretende praticar crime contra A e pratica contra B. Atinge-se pessoa diversa da pretendida. A lesão se dirige a uma pessoa diversa daquela que se supõe estar lesionando. Exemplo: matar um sósia.

Como o Código trata essa situação? Há duas teorias para esse erro

Teoria da concretização: para ela, o que importa é o que de fato aconteceu. Se o sujeito queria matar A, atirou contra A e acertou B, então, de fato, houve homicídio doloso contra B. O erro sobre a pessoa é irrelevante de acordo com essa teoria.

 

Aberatio ictus

É uma modalidade de erro sobre a pessoa. É um erro na execução do crime. Erro de ataque. Então, por exemplo, quero matar meu pai, atiro contra ele, ele desvia e eu acerto um estranho. É o mesmo caso da mulher que queria envenenar o marido e acabou matando os filhos, já discutido. Tanto no erro sobre a pessoa quanto na aberatio ictus, o Código adotou a teoria da equivalência. Se houver um único resultado, responde-se por aquele. Se houver mais de um resultado, aplica-se a regra do concurso formal. O agente responde por um único crime. Se forem diferentes, o mais grave, se iguais, um único, sempre com pena aumentada.

        Concurso formal

        Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.

        Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código.


O aumento de pena varia com o número de vítimas.

Se fosse adotada a teoria da concretização, o que aconteceria, neste caso? O caso da mulher que envenenou a marmita para matar o marido, marmita essa que foi provada pelos filhos, que morreram, seria um caso de um único homicídio doloso tentado contra o marido e dois homicídios culposos consumados contra os filhos. Então adotar-se-ia a regra do concurso material. Não é o que ocorre.

 

Descriminantes putativas

erro sobre causas de justificação sempre que o erro recai sobre uma das quatro causas de justificação, quais sejam: legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do Direito. Alguns autores chamam de erros de tipo permissivo: o sujeito pensa que está agindo em legítima defesa e não está. Putativo: imaginário, suposto. Exemplo: um inimigo jurou matá-lo. Certo dia, em um lugar ermo, você o encontra, e o vê tirar um volume do bolso. Imaginando que se tratava de uma pistola, você saca a sua primeiro e o mata. Depois, ao verificar, viu que aquele objeto na verdade era apenas um telefone celular. Atirar no suposto agressor neste caso é legítima defesa putativa: você acreditava que estava agindo em legítima defesa, mas não era o caso, então houve um erro de proibição.

Outro caso notório dos tempos recentes: guerra do Iraque. Batalhão A percebe um grupo inimigo avançando em sua direção. A abre fogo e o extermina. Ao verificar, vêem que tratavam-se de aliados, mas os atiradores pensaram estar atacando um grupo inimigo. Então, eles poderiam alegar legítima defesa putativa.

Caso Jean Charles: o brasileiro, que corria da polícia inglesa, foi confundido com um terrorista e foi brutalmente executado. Os policiais poderiam alegar legítima defesa de outrem de caráter putativo.

O erro sobre causa de justificação ocorre quando o agente supõe que está amparado por uma causa de justificação e não está. Esse erro, como os demais, pode ser inevitável ou evitável.

Três correntes doutrinárias sobre erro sobre causas de justificação:

  1. O erro sobre causa de justificação é um erro de tipo. Essa é a corrente majoritária.
  2. Outros dizem que é uma modalidade de erro de proibição.
  3. Outros dizem que é um erro sui generis.

Ocorre o resultado diverso do pretendido quando o agente pratica um crime diverso do que ele queria praticar. Imagine que um meliante deseja quebrar a vitrine de uma loja. Ele atira uma pedra, mas nesse momento está passando alguém, que tem sua cabeça ferida pela pedra. O sujeito responde pelo resultado diverso do pretendido por crime culposo. Se houver os dois resultados, então há concurso formal, escolhendo o crime mais grave com pena aumentada. Veja novamente o art. 70.

Teoria dos elementos negativos do tipo

Nós estudamos que o conceito analítico de crime é: fato típico, ilícito e culpável, com certa autonomia entre essas classificações. Quem pratica um fato típico não necessariamente pratica um fato ilícito. A tipicidade é apenas um indicio da provável antijuridicidade. Quem pratica um fato antijurídico pratica necessariamente um fato culpável? Não. Pode haver loucura ou erro de proibição. Portanto, em geral trabalha-se com o conceito tripartido do crime. Mas a teoria dos elementos negativos do tipo trabalha com o conceito bipartido: crime como fato típico e culpável apenas. Essa pergunta foi feita num concurso para Procurador da República. Então, o que diz a teoria? Todo fato típico é necessariamente ilícito, mas não necessariamente o fato ilícito é típico. Por quê? Porque de acordo com essa teoria, em todo tipo penal está implícita uma cláusula que seria mais ou menos o seguinte: matar alguém é crime. Mas o tipo poderia ser crime também? A redação da lei penal, segundo essa teoria, seria: “matar alguém, exceto em estado de necessidade, legítima defesa, etc.” O mesmo para o crime de roubo: “roubar é crime, salvo em estado de necessidade”. Ou seja, todo fato típico é necessariamente ilícito.

Haveria, por essa teoria, um tipo total que é a parte positiva, e uma segunda, que é a parte negativa. Qual seria a primeira parte? A realização dos elementos do tipo. Matar, subtrair, constranger, caluniar, etc. Todos os elementos. A segunda parte, a negativa, seria a ausência de causas de justificação. Se o sujeito mata alguém, ele realiza a primeira parte do tipo, mas se o faz em legítima defesa, então ele não realiza a segunda parte e a ausência de causas de justificação afastaria o tipo. Logo, todo fato típico seria ilícito. Violar contrato: é ilícito civil, mas não é típico para o Direito Penal. Os elementos negativos do tipo são os elementos que negam o tipo: as causas de justificação.


1- Isso ainda é muito controverso.