Balanço de pagamentos
Vamos falar o que é, em que consiste, qual a utilidade, e também que isso tem relevância sobre os acontecimentos da atualidade. O objetivo é trabalhar, na aula que vem, com o câmbio. Não existe hoje país algum que seja auto-suficiente. Os países, em maior ou menor grau, dependem dos outros, às vezes por questão de matéria-prima, ou para adquirir conhecimento tecnológico; há uma série de fatores que faz com que as relações internacionais sejam necessárias entre os países. Assim essas relações se dão na troca de mercadorias, de serviços ou ainda em movimentos de capitais financeiros que trafegam entre eles. Se pegarmos o mapa do mundo e tentarmos interpretá-lo em termos das relações econômicas dos países, veremos que há países que, embora sem auto-suficiência, eles têm alto grau de abertura externa. Um exemplo claro que depende muito do comércio exterior é o Japão. Se não fosse pelo comércio exterior, o país asiático não seria a potencia econômica que é. Primeiro porque é pequeno em dimensão territorial, e com muita limitação de recursos naturais. Os japoneses dependem muito do comércio. Depois de ser devastado em 1945, já na década de 60 o país era uma economia respeitada no mundo. O Japão, basicamente, é um país que depende muito da importação de matérias primas, detém um conhecimento tecnológico alto, processa matérias primas em produtos acabados, usando tecnologia de ponta, e vive basicamente de exportação e importação. É a fonte de prosperidade deles.
Há nações que têm menor abertura. No momento em que começam a abrir o comércio, começam no mesmo momento a apresentar sinais de crescimento. China, por exemplo. Ela se isolou do mundo. Foi a partir da queda do muro de Berlim, com as mudanças políticas no cenário mundial, como com o fim da guerra fria que ela começou a mudar sua organização econômica. Hoje é um grande importador e exportador.
EUA: sempre foi uma economia com grande grau de abertura, e grande parte do seu crescimento foi por causa das relações econômicas internacionais. Isso é para vermos que países como o Brasil, por exemplo, que, de uma forma ou de outra, ao longo da história, tendo outras condicionantes, ainda têm grau de abertura relativamente limitada. Exporta bastante, mas, ainda assim, perde para as grandes potências quando comparamos o Brasil com elas.
Vamos, inicialmente, conceituar o balanço de pagamentos para então entendê-lo.
A questão das relações econômicas internacionais adquire uma importância grande nos últimos anos. Tudo está globalizado hoje em dia. Com a tecnologia, os efeitos são percebidos muito mais rapidamente entre diversos cenários econômicos. As bolsas de valores são praticamente interconectadas, e se interdependem. O desenvolvimento do mundo virtual trouxe condições para que se realizassem transações em uma velocidade jamais vista. Isso faz com que a economia fica cada vez mais atrelada ao desenvolvimento tecnológico. Por exemplo: a atual crise imobiliária americana e os efeitos imediatos no resto do mundo.
O balanço de pagamento é um instrumento extremamente necessário para o mundo de hoje para o país acompanhar o estado de suas contas. Por exemplo o Brasil: ele tem participação no comércio internacional, mesmo não tendo um grau de abertura tão grande, mas importa, exporta e recebe investimentos. Não é nada mais, nada menos do que o registro sistemático de todas as transações de caráter de comércio ou financeiras realizadas entre residentes e não-residentes no período de um ano.
É feito numa base contínua. O BACEN tem registro de todas as transações, e, baseado numa metodologia de contas, libera trimestralmente os resultados. No final do ano, faz um consolidado desses resultados parciais e dá o balanço final. Esse dado se torna referencia para os formuladores de política econômica, e também para saber qual o valor acumulado no país de moedas ou divisas estrangeiras; o montante, o estoque de recursos financeiros que o país tem para qualquer eventualidade.
O balanço de pagamentos é organizado. A idéia é que temos várias transações de diferentes tipos: há transações a títulos de juros por empréstimos que o país assumiu ano passado, de vistos de turistas, do tipo doação que o país faz a título de solidariedade a outro país, etc. Quando falamos que se trata de um registro sistemático, dizemos que ele segue uma certa organização das transações. O especialista ou mesmo o não-especialista já tem uma idéia relativamente clara da situação atual das transações econômicas do país.
Envolvem movimentos que não têm existência real concreta também.
O balanço de pagamento se organiza basicamente em três tipos de conta:
A) conta de transações correntes: são chamadas assim para diferenciar de transações de capital para dar a idéia do fluxo de mercadorias e serviços entre os países. Ela é feita em três subcontas:
A1- balança comercial: dá conta apenas dos bens que têm existência física e real. Trata apenas de exportações e do valor das importações. É restrita a esses dois tipos de transações. À balança comercial adiciona-se à...
A2- balança de serviços: pagamentos e recebimentos por serviços. Por exemplo: viagens internacionais, e tudo aquilo que estrangeiros gastam com empresas brasileiras, com aviões de bandeira nacional. Seria uma entrada de pagamento por conta do serviço do transporte de passageiros. E, por outro lado, temos que também os brasileiros podem usar aviões de companhias estrangeiras. Essa ida de dólares é o dinheiro brasileiro pago na aquisição do transporte. Tomemos o exemplo da Gol, que faz esse tipo de serviço, se um português usá-la, haverá entrada de dinheiro. As viagens internacionais são coisas que não tem existência física, mas são serviços que movimentam dinheiro.
Também há o pagamento de frete internacional. O Brasil pode pagar o transporte a um navio de bandeira japonesa para exportar soja. Depende da transação, porque às vezes é o importador que paga, em outras é o exportador, dependendo do contrato celebrado.
Outro serviço são os seguros. Toda mercadoria transportada por ar ou mar é sempre segurada, para evitar perda em caso de queda de avião ou naufrágio. Não termina aqui. Há uma série de outros serviços que são pagos a outros países por conta do uso de coisas. Outro é o caso do uso de imagem. Fazer toalhas com a imagem do Pluto, por exemplo, requer que se pague o direito à proprietária do personagem. Nada impede que o empresário brasileiro invista na abertura de uma filial do McDonalds, desde que ele reverta à dona da marca os royalties.
Editar um livro best-seller internacional também requer que paguemos ao autor dos direitos autorais. Isso tudo, em geral, é chamado de royalties. É o direito de uso de marca, de imagem, de direito autoral etc.
Mas assim como existem essas coisas, existem também uma série de serviços que estão associados ao uso de fator produtivo. Vamos supor que no Brasil um hospital compre, do exterior, um equipamento de última geração. É uma tecnologia nova, mas o Brasil não a conhece. Não tem quem saiba manusear e operar o aparelho aqui. No contrato da compra, pode ser que haja um grupo de pessoas da empresa vendedora que virão ao Brasil a título de assistência técnica para treinar pessoas, instalar o aparelho e fazer a manutenção. É uma mão-de-obra especializada que corre por conta do país que a comprou. O hospital que comprou pagará, a título de assistência técnica, dinheiro pelos serviços. O técnico receberá um salário, a título de renda. Ele também pode ser um profissional que vem trabalhar temporariamente. É não-residente, como um engenheiro de alta especialização, que falta no mercado brasileiro, e, por conta do salário, ele exercerá uma função aqui dentro. Além do salário, existem outras espécies de renda:
Empresas multinacionais. Gera riqueza e renda aqui, mas, por lei, tem que fazer remessa de lucros para a matriz, que fica no estrangeiro. Então, além do salário, há o lucro remetido ao exterior. O Brasil manda mais para a fora do que recebe.
Por fim, os juros da divida externa.
Os três últimos são tipos de rendas. Fator trabalho = salário, fator capital = lucros de empresas, fator uso do capital = juros da dívida.
Isso completa o que chamamos de balanço de pagamentos.
No final, faz-se a comparação entre o que os brasileiros gastaram no exterior com o que os estrangeiros gastaram aqui. Isso é incluído no balanço.
Digamos Austrália e Brasil. São dois países que farão uma transação comercial entre si. Suponhamos que no Brasil haja uma fabrica de sapatos, que montou um estande numa feira internacional. Um empresário australiano visitou a feira, viu o estande, gostou da qualidade dos sapatos, fez perguntas sobre custos e outros detalhes e ficou atraído. Suponham também que eles tenham fechado uma transação de 20.000 dólares de exportação de sapatos dessa empresa brasileira para a australiana. A partir daí, há toda uma burocracia e procedimentos, o governo brasileiro autentica a remessa, e, ao chegar à aduana australiana, as autoridades locais verificam a procedência legítima da carga, e, nosso amigo importador verifica que está tudo correto e chega a hora do pagamento. E na hora de pagar, o que fazer? O australiano, ao pagar, pegará os dólares australianos e comprará dólares americanos no banco central da Austrália. Ele emitirá um cheque contra seu banco em dólar australiano à taxa de câmbio do momento, no valor correspondente aos 20.000 dólares americanos, que é o valor da transação. Ele está pagando pelos sapatos. Esse cheque vai para o banco central da Austrália. Ele, tomando a taxa de câmbio que foi feita, pega dólares americanos e manda para o Brasil. Esses dólares entram pelo BACEN brasileiro, que receberá esses 20.000. Digamos que o exportador brasileiro tenha uma conta num banco daqui. O BACEN fica com os dólares e faz um deposito em reais equivalentes aos 20.000 dólares na conta local do exportador brasileiro. Resultado: nem o importador australiano nem o exportador brasileiro viram a cor dos dólares. Só os bancos centrais os manusearam.
É óbvio que isso altera as reservas internacionais. O banco central australiano teve sua disponibilidade de dólares americanos reduzida em 20.000, enquanto aqui a reserva de dólares foi aumentada nesse mesmo valor. Dólares australianos foram retirados de circulação da Austrália, diminuindo a oferta de moeda por lá. Aumentou, por outro lado, a oferta de Reais no Brasil. Então, como vimos, as transações internacionais também alteram os mercados internos. Jamais uma transação é feita à revelia do BACEN ou ocorrerá aquele problema como aconteceu no banco Opportunity.
Eu mesmo tenho um amigo que se diverte jogando Poker online, e até consegue custear o próprio almoço com o dinheiro que ganha. Ele ganha fichas na sala de jogo, que são creditadas na conta dele no mesmo site; esse crédito é reversível em créditos “reais”, a serem depositados num banco qualquer. Entretanto, os bancos brasileiros não aceitam transferências de sites de apostas pois aqui é ilegal o jogo, por isso ele abriu uma conta num banco do Canadá. Quando deseja, ele vai ao banco24horas e retira, usando seu cartão, uma quantia, pagando uma taxa.
Pergunta-se: os bancos centrais do Brasil e do Canadá ficaram sabendo dessa transação? Sim. Toda transferência internacional que parte de bancos estrangeiros em direção ao Brasil são filtradas e registradas primeiro pelo banco central daquele país, que remete o valor ao Banco Central do Brasil, que por sua vez envia ao terminal de saque. ¹
Quando pensamos nessas coisas, o fenômeno fica mais claro. Tudo está sendo transado em dólar, mas o dinheiro é revertido em moedas nacionais.
Se estiver entrando uma bagatela de dólares aqui, o BACEN terá que regular o fenômeno. Uma quantidade de Reais muito grande será emitida. A alternativa que o governo tem é emitir título da divida publica: os compradores trocam moedas pelos títulos; as moedas voltam para o cofre do Banco Central. É um contrapeso para o excesso de moeda. Por isso a divida pública cresce.
Qual é a outra parte que ainda se refere às transações correntes?
A3- transferências unilaterais: em geral não tem muitos efeitos quantitativos. São transações sem contrapartida, de caráter financeiro. Doação para a Indonésia depois da tsunami. O Brasil pode, por exemplo, doar parte da Petrobrás, seja lá por qual motivo for.
Quando tudo isso for somado, teremos uma coisa chamada saldo em transações correntes. É = A1+A2+A3 = STC. Pode ser positivo ou negativo.
A outra parte, B, é a chamada de conta de movimento de capitais. Dá a idéia de capitais que vão e vêm. São transações puramente de dinheiro, com a finalidade produtiva ou não.
Exemplos: investimento estrangeiro, como da Toyota em algum estado brasileiro.
Também há as aplicações financeiras. Por exemplo o magnata George Soros, que, dois dias antes de ser descoberta a região do pré-sal, comprou US$ 800.000,00 em ações da Petrobrás.
E outros investimentos. Há os de curto prazo, de longo prazo, amortizações (pagamento das prestações de um empréstimo). Se uma parcela é de R$ 1.600 , sendo 1.480 próprias e 120 de juros, a parte de 1.480 será a amortização.
Há também os empréstimos e financiamentos.
Ao somar tudo isso, teremos algo chamado saldo do movimento de capitais, que pode ser positivo ou negativo. = SMK.
Finalmente, há uma coisinha chamada erros e omissões. Não temos certeza que tudo foi realizado de forma correta. Quantas vezes vimos sujeitos pegos com dólar na cueca, ou então bispos da Renascer entrando com 56.000 dólares na Flórida sem declarar... Ninguém evita contrabando, nem ação de doleiros, nem hackers.
E aí teremos o que chamamos de conta de resultado. É o resultado do balanço de pagamento. Também chamado de saldo do balanço de pagamento.
Conta de resultado = saldo do balanço de pagamento:
SBP = STC + SMK + EO. |
Como o SBP é a vitrine da confiabilidade do país, ele influencia o risco-Brasil.
Veremos exemplos numéricos na próxima aula.