História e Cultura Jurídica Brasileira

quinta-feira, 4 de setembro de 2008


Os pilares do Estado moderno século XII


José Murilo de Carvalho, autor de A Construção da Ordem, é um dos maiores historiadores que há no Brasil hoje. Na verdade, esse livro está incluído em um volume só que compõe uma trilogia, já que a obra é composta de três livros. Ele fala sobre a elite política.

Governa-se a partir de que? O governo das elites dominantes está fundado em que? Murilo faz uma reflexão dentro da sociologia clássica. Para isso ele recorre a dois autores: Gaetano Mosca foi o primeiro. Mosca mostra que as elites dominantes são geralmente grupos sociais que se alicerçam e controlam forças sociais predominantes: dinheiro, conhecimento, terras, força militar, dependendo do momento histórico. Mas essa interpretação ainda é insuficiente. Temos que mostrar como acontece a mudança social. Então ele recorre a Vilfredo Pareto, que diz que essas elites do poder se mantém na medida em que conseguem jogar com dois resíduos principais: a força e o conhecimento.

José Murilo sintetiza essas idéias e busca entender as brechas de cada uma.

O importante é entender a formação do Estado. Murilo enfatiza a influência do Estado na manutenção do poder dessas próprias elites dirigentes. O Estado será fundamental na expansão dos países europeus para fora da Europa. Isso foi por causa da centralização política do Estado em torno do monarca absoluto, especialmente em Portugal na Espanha; foram os monarcas quem financiaram as grandes navegações dos séculos XV e XVI.

Murilo ainda fala de uma tensão importante: a expansão do corpo de funcionários e o domínio político de forças dominantes de representação social. O papel fundamental é do Estado. De um lado, há a expansão do poder dos funcionários, do outro, a pressão de grupos sociais dominantes, representativos da sociedade. Temos que nos lembrar dos elementos que são pilares da formação do Estado, ditos pelos sociólogos Max Weber e Wallerstein ¹

Max Weber: ordem legal. O direito é legitimador do Estado e garantidor e da ordem social estabelecida. Além de legitimar a ordem social vigente, ele precisa legitimar a si próprio. Isso, na Alta Idade Média, foi fundamental para dar poder ao papa.

Foi necessária também a jurisdição compulsória em determinado território. A noção de império era completamente diferente da noção de Estado que temos a partir da modernidade. O império não tinha capital; a capital era justamente onde o rei estava. O rei mesmo que cobrava taxas, já que não havia um corpo de funcionários especializados nisso. A idéia de Estado moderno hoje é algo que não é, ou melhor, não deveria ser personalizado por ninguém.

Monopolização do uso legítimo da força: mais um pilar do Estado moderno de acordo com Weber. A formação do Estado moderno é a centralização gradual e paulatina do monopólio da força, da burocratização e a criação de legitimidade e homogeneização das populações, dos súditos. O marco é a revolução francesa, principalmente com Napoleão no cenário, de 1808 a 1812, que desenvolve um sistema de educação na França que tem inúmeras funções, inclusive a homogeneização da população francesa. A maioria dos países europeus é composta de várias etnias. Hoje mesmo, na França, há, no âmbito das famílias, o uso de dialetos desconhecidos do restante do mundo.

No período de transição para a Idade Moderna, houve paralelamente a ampliação do poder de taxação, com o emprego de funcionários para isso.

Para fechar essa introdução: nos estados em que predomina a burocracia, os estratos mais altos confundem, em parte ou totalmente, com a elite política. É o caso de Portugal e Brasil. O Brasil é um país onde o Estado é quase todo poderoso. Os setores sociais mais contestadores recebem dinheiro do Estado: CUT, UNE, MST... O Estado é o lugar onde a elite política mantém sua hegemonia. A elite política brasileira é majoritariamente composta por juristas.

Onde predomina o parlamento e partidos, a elite política retira seu poder de fontes não estatais. Não é o caso do Brasil.


Esquema: 

Quem governa?

O problema das elites políticas vinculado à dinâmica social
|-> a natureza do governo e o sentido de sua ação
|-> a sociologia clássica

Gaetano Mosca: domina aquele que controla alguma força social (dinheiro, terra, conhecimento, religião) predominante
Vilfredo Pareto -> dependente de manipular dois resíduos principais: força e persuasão
|-> crítica: importância e influência do Estado na manutenção do domínio da própria classe política
                |-> causação recíproca -> elite política e Estado moderno
                               |-> tensão: de um lado a expansão do poder dos funcionários, e de outro as pressões dos grupos sociais dominantes                                    pela representação política

Os pilares do Estado moderno século XII
                |-> Max Weber: ordem legal
                                               Jurisdição compulsória sobre um território
                                               Monopolização do uso legítimo da força

                 |-> I. Wallerstein:

       Burocratização
       Criação de legitimidade e homogeneização dos súditos
       Ampliação do poder de taxação
       Monopólio do recrutamento militar

                               |-> tensão: onde predominou a burocracia, seus estratos mais altos se confundiram, em parte ou totalmente, com a                                           elite política
                                                    |-> onde predominou o parlamento e os partidos, a elite política retirou seu poder de fontes não estatais
                                                                |-> quanto mais profunda a revolução burguesa, tanto menor o peso do Estado na vida social,                                                                                burocrático ou civil - mais representativa a elite política autônoma do Estado.


1- A única referência a um provável nome que deve ser desse sujeito que eu encontrei  é de Immanuel Wallerstein, sociólogo americano ainda vivo, não-contemporâneo de Weber (que morreu 10 anos antes de Wallerstein nascer), e não encontrei nenhuma menção a "bureaucracy", "legitimacy" nem "Weber" neste artigo da Wikipedia (http://en.wikipedia.org/wiki/Immanuel_Wallerstein).