Direito Civil

sábado, 6 de junho de 2009

Prescrição, decadência e responsabilidade civil

Também pela celeridade às vésperas da prova, esta nota não passou pela última revisão.

Esquema da prescrição e decadência:

Semelhanças: 

Prescrição

  1. Age sobre a pretensão;
  2. Admite renúncia desde que consumada;
  3. Admite interrupção, suspensão e não-contagem;
  4. Interesse das partes;
  5. Prazos não poder ser alterados. 

Decadência

  1. Age sobre o próprio direito;
  2. Não admite renúncia;
  3. Interesse público;
  4. Decadência convencional admite alteração de prazos.

 

Como falamos na terça, esta aula é mais um aprofundamento, uma incursão sobre essas duas matérias que o professor, em razão de uma preocupação, considera extremamente relevante para nós. Do ponto de vista pratico, se pensamos em advogar, ou do teórico, para conhecer os institutos, o fato é que tanto um quanto outro serão primordiais para que entendamos bem uma relação jurídica. Quantos e quantos casos não conseguimos resolver de uma maneira “mágica” em razão desse assunto?

Veja este: um casal rico gostava de viajar pelo país. Em 1978, depois de uma viagem pela Bahia, ficaram encantados por uma praia, e resolveram adquirir não uma casa em frente a ela, mas um quarteirão inteiro. Quem geria os negócios da família era o marido. Um caseiro foi nomeado pelo casal para cuidar dos lotes, mas sem vínculo empregatício, nada formal. O casal mandava para ele dinheiro irregularmente, às vezes ficavam quatro meses sem remeter, depois mandavam todos os salários acumulados sem correção, e muitas outras atitudes de quem está acomodado. Em troca, o caseiro apenas ficava na detenção daquele enorme terreno.

Os anos se passaram e o casal, literalmente, esqueceu da propriedade que haviam adquirido naquela ocasião. Na década de 90, o marido faleceu. A viúva, que jamais mexera com negócios, ficou endividada, até que, quando a necessidade bateu, ela se lembrou do quarteirão-beira-de-praia que havia adquirido mais de quinze anos antes, e teve que vendê-lo. Se isso não ocorresse, os credores tomariam coisas que realmente faziam valor para aquela senhora. Mas, para vender, seria necessário dispensar o caseiro, que ficara lá por tantos anos. Ao receber a notícia, ele ficou enfurecido e desesperado: não teria mais, a partir desse momento, nada mais para fazer, não teria formas de sobrevivência. Então, ele ajuizou uma ação de conhecimento para que se reconhecesse o efetivo vínculo que ele possuía, durante todos esses anos, com o casal, agora apenas a viúva.

Agora vamos pensar no que significou essa ação ajuizada. Qual era o risco que estava correndo a viúva se nada fosse feito por parte do caseiro? A propriedade poderia ser alvo de uma ação de usucapião, causa que seria facilmente ganha, e a mulher perderia a chance de vendê-la, ficando, assim, pobre pelo resto da vida porque os credores lhe tomariam outros bens. Significa então que essa ação ajuizada contra ela foi a melhor coisa que lhe ocorreu na vida. Por quê? Porque, ao o caseiro pleitear o conhecimento da relação de trabalho, ele admite que houve uma relação na qual ele ficava como detentor do imóvel, portanto impedido de pedir usucapião. Afinal, a usucapião só pode ser pleiteada por aqueles que se apoderam do bem por determinado período de tempo, em outras palavras, se imitem na posse, o que não era o caso. O caseiro não estava com a posse do imóvel, mas com a detenção dele. Ajuizando essa ação ele dá adeus à possibilidade de reivindicar a propriedade do quarteirão.

Usucapião é a única forma de prescrição aquisitiva. O exercício da posse, para se valer da usucapião, não é possível quando se tem uma relação de mando. Aquele empregado que está à disposição da dona administra, protege a propriedade em nome dela. Ao ajuizar, ele mesmo admitia que ele era um funcionário.

Tudo por conta de uma prescrição! Então são circunstâncias que vale a pena que a gente entenda. E aqueles mais iluminados, que têm um feeling diferente das pessoas normais, são os que buscam a análise por esses detalhes mais definitivos. Mas olhe: um advogado que atua perante o Superior Tribunal de Justiça ou o próprio Supremo não tem a mesma mentalidade do que faz esse tipo de trabalho em primeira instância. Este está com o pensamento no nível abaixo. Então, para que tenhamos a excelência daquele que atua junto às instâncias superiores, devemos levar em conta, seriamente, todos os elementos. Pergunte-se se um advogado que esquece de detalhes como esses, ou de outros prazos processuais, serão um dia bons.

O professor ainda nos dá outra dica: se nós compreendemos relação jurídica, 60% do problema está resolvido. Há tanta gente que simplesmente se esquece da composição da relação jurídica, seus elementos... aí acionam a pessoa errada, pedem algo que não pode ser pedido, não reconhecem direito o vínculo de atributividade...

Então, hoje temos uma passagem rápida sobre prescrição e decadência. Já está em nossas cabeças. Depois vamos ver rapidamente responsabilidade civil. Comecemos.

Prescrição e decadência são institutos que visam manter a segurança jurídica. Como? Estabelecendo marcos temporais. Ao impor um prazo, o que está por trás? Que, se não for buscado, não se tem mais o interesse em reformar uma sentença, e o sujeito se deu por satisfeito. É a coisa julgada. O que é mesmo coisa julgada? É uma qualidade que a sentença adquire. Essa coisa julgada pode se dar no primeiro grau, segundo, ou nos graus superiores. Ao perder frente ao Supremo, faz-se coisa julgada. A parte credora, por exemplo, passa à próxima fase, a execução. Lembrem-se das aulas de TGP. Vamos dar nomes a esses institutos que trabalham com a extinção de direitos em razão do tempo.
 

Art. 205:

Seção IV
Dos Prazos da Prescrição

        Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.

É a regra geral de prazos. A maior prescrição que temos no direito civil é de 10 anos. Antigamente tínhamos uma prescrição de 20 anos, no Código Civil de 1916. Com o advento no Novo Código, diversos prazos prescricionais foram diminuídos. É só comparar para ver. Todos os prazos prescricionais ou foram diminuídos ou foram mantidos. O que isso nos mostra? Que o direito está cada vez mais preocupado em cumprir a Lei de Introdução ao Código Civil, mais especificamente o art. 5º: a jurisdição deve atender à função social da lei. Anos atrás, tinha-se uma mentalidade patrimonialista, individualista. O Código de 2002, já com a mentalidade de justiça social, vem com uma proposta de prazos ainda menores, pois agora vigora o entendimento de que, caso alguém demore para correr atrás do que é seu, é porque a pessoa não tem muito ou nenhum interesse, então a idéia de justiça social é dela retirar para dar a outro.

Só para não haver possibilidade de vacilo: não apareça com o Código de 1916 para fazer a prova!

Então, o maior prazo prescricional que o direito nos dá para agir é de 10 anos. Na dúvida, chutem esse prazo. Se a lei não confere prazo diferenciado, esse é o maior que temos. Todos os demais prazos estarão no art. 206:

        Art. 206. Prescreve:

        § 1o Em um ano:

        I - a pretensão dos hospedeiros ou fornecedores de víveres destinados a consumo no próprio estabelecimento, para o pagamento da hospedagem ou dos alimentos;

O inciso II do § 1º é questão de prova:

        II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo:

        a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;

        b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;

Pretensão do segurado contra o segurador. Em suma, se tivermos problema com seguro, não deixem passar de um ano. Muita gente tem o direito material mas não mais o direito de pleiteá-lo.

Inciso IV: também importante. O perito tem um ano para cobrar seus honorários.

§ 2º:

        § 2o Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem.

Também questão de prova “sem dó nem piedade”. Prescrevem em 2 anos as pretensões alimentares.

§ 3º, inciso I: aluguéis de prédios urbanos ou rústicos: também é questão de prova.

        § 3o Em três anos:

        I - a pretensão relativa a aluguéis de prédios urbanos ou rústicos;

§ 3º, inciso IV:

       IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;

Também importante. Lembram da lesão? Enriquecimento sem causa. Se nós não quisermos anular o negocio pela lesão, significa o que? Pode-se ajuizar reparação dos danos? Sim, quero questionar o enriquecimento ilícito. Assim, caio neste caso.

§ 5º inciso I.

        § 5o Em cinco anos:

        I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;

Público ou particular. Então se assumimos uma dívida, com um instrumento particular no qual consta a confissão de dívida, tem-se 5 anos para cobrar essa dívida.

Se somos advogados, fizemos um contrato de prestação de serviço e não fomos pagos, temos um prazo de 5 anos para cobrar do cliente inadimplente.

Dados os prazos, vamos às características:

Os prazos prescricionais não admitem alteração. Fora esses casos previstos, não haverá admissão de alteração. Na decadência isso já não é verdade. A decadência, desde que convencional, leia-se “por disposição das partes”, admitirá alteração. Então isso não vale apenas para a prova, mas para o nosso futuro profissional. Se formos advogados envolvidos na elaboração de minutas contratuais, para dar um parecer sobre determinadas contratações, dependerá obviamente de que lado estejamos. Se estamos de um lado, quereremos que o prazo seja muito pequeno, ou, do outro, que o prazo seja alargado. O prazo para anular negócios é de 4 anos, e, sendo decadencial, não há nada que se possa fazer para suspender, interromper ou impedir o início da contagem desse prazo. Cuidado com outros casos em que os prazos são especiais, como nos do art. 1560. Em outros casos em que a lei não dispuser, poderá o prazo ser de dois anos. Mas, como estudamos neste semestre os negócios jurídicos, trabalhem com a regra de 4 anos. Mas, na prova da Ordem ou em concursos, pensem nas outras possibilidades.

Mais sobre as características: a prescrição atua sobre a possibilidade de agir, e a decadência sobre o direito propriamente dito.

Prescrição admitirá renúncia, desde que consumada. O Código é bem preciso ao fazer essa disposição para nós. Art. 191:

        Art. 191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.

Quem renuncia à pretensão é quem tem o interesse em receber. O credor do direito, conseqüentemente. Para entender, veja: a prescrição envolve duas ou mais pessoas. Se quem tiver esse direito for o credor, quem terá o interesse em que esse direito prescreva? O devedor, obviamente. Logo, quem tem o interesse na prescrição é o devedor em face da pretensão do credor de vir a cobrá-lo. Então logicamente vemos que o artigo foi elaborado para o credor. A renúncia para o prazo prescricional vale para ambas as partes. Pode ser expressa ou tácita.

Observação: decadência não admite renúncia.

A prescrição admite interrupção, suspensão e não-contagem (impedimento). O cronometro não é acionado. Não corre prescrição entre pais e filhos, ascendentes e descendentes. O filho tem um direito em relação ao pai. Enquanto durar o pátrio poder, não corre prazo entre eles; chega a ser acionado o cronometro. Entre cônjuges na constância do casamento também. Negócio entre cônjuges não começa a contar para anular o negócio celebrado. Também não corre entre pessoas relativamente capazes.

Observação: preclusão é um termo mais usado para questões processuais.

Na suspensão, o cronometro é acionado e depois é congelado. Se passam dois anos enquanto parada a contagem, o tempo volta a correr de onde parou. O que ficou computado antes do *stop* vale. Na interrupção não: o cronometro é acionado, depois parado e, quando retomado, começará novamente o tempo, e se desconsidera o tempo já corrido antes da interrupção. A contagem se iniciará do zero. É primordial sabermos disso: interrupção somente pode ocorrer uma vez.

Decadência admite simplesmente a não-contagem, contra pessoas absolutamente incapazes. Art. 198, inciso I e art. 208.

        Art. 198. Também não corre a prescrição:

        I - contra os incapazes de que trata o art. 3o;
       
CAPÍTULO II
Da Decadência
        [...]

        Art. 208.
Aplica-se à decadência o disposto nos arts. 195 e 198, inciso I.

A decadência está prevista nos artigos 207 a 211 do Código.

Quanto ao interesse das pessoas envolvidas, a prescrição interessa somente às partes. Vejam por que: a prescrição não é um instituto que age sobre a possibilidade de agir?  Então, se ele diz respeito à possibilidade de agir, falamos em uma pessoa específica interessada num negócio feito privativamente. Então, a prescrição interessa às partes envolvidas, porque age sobre a possibilidade de agir. Esta também é a explicação em relação à renúncia. Quem renuncia o faz porque quer e pode.

Já a decadência acaba com o direito em si, então mais gente pode estar interessada, e o interesse é público, operando erga omnes. 

Semelhanças:

Ficaram implícitas. Ambos trabalham com a ação do tempo com o objetivo de proporcionar segurança jurídica fixando marcos temporais.

Ambos podem ser alegados em qualquer instância. Nos resumos encaminhados a nós, há a defasagem em relação à prescrição. Cuidado com o resumo no espaço aluno em que está dito que a prescrição não pode ser declarada de ofício. Desde o final de 2008 ela pode sim ser conhecida de ofício, depois de uma reforma no Código de Processo Civil. ¹

 

Responsabilidade civil

Esquema:

 
Não podemos, no Direito Civil, falar em reparação do dano sem que aja dano. É que trabalhamos com uma perspectiva diferente do Direito Penal, em que se pune a tentativa. Então, ao falar em reparação do dano, é importante que tenha-se dano indenizável para que ele possa ser demonstrado.

Qual é a idéia do dano? É a trazida pelo art. 186 do Código Civil:

TÍTULO III
Dos Atos Ilícitos

        Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

A pessoa que causa prejuízo ao outro terá que se responsabilizar por aquilo. Na teoria geral da responsabilidade civil vamos reparar esse dano de que forma? Posso me tornar escravo, me oferecer para que me cause dano, permitir que me xinguem, etc? Não. A responsabilidade civil é pecuniária, patrimonial. A idéia de dano está bem compreendida, então. Por isso o dano tem que ser indenizável.

 

Espécies de responsabilidade civil

Temos dois tipos:

Uma que pode advir do contrato, ou seja, fecho um negócio com alguém, ela descumpre, causando prejuízo a mim, ela será responsabilizada. Como fazer um negócio de aluguel com o dono de um imóvel, não recebo a chave em tempo, e sou obrigado a ficar em hotel enquanto isso. É advindo de um descumprimento de um contrato, então é responsabilidade civil contratual.

Também podemos ter uma responsabilidade que não está vinculada ao contrato, que é geral, que não está adstrita a uma relação contratual. Então, se estou andando na rua e alguém, por negligência, me causa um prejuízo, ou então o sujeito esquece do freio de mão, fazendo com que o carro desça ladeira abaixo e entre em minha casa, derrubando meu muro, essa situação advém de um contrato? Não. Mas o agente que causa o dano terá que reparar? Sim. Então, esta é responsabilidade extracontratual.

A teoria objetiva do dano não exige má-fé nem vontade, ou seja, a pessoa pode simplesmente agir voluntariamente ou involuntariamente, causando qualquer que seja o dano. E, por conta disso, terá que pagar. Não leva em conta o animus do agente, mas só o dano avaliado objetivamente. Questão de prova: a intenção do agente é levada em conta?

 

Elementos da responsabilidade civil

  1. Agente culpado;
  2. Nexo causal;
  3. Dano.

O agente culpado dispensa explicações. Apenas denota quem é o sujeito. É o que liga o agente ao dano, que é o que chamamos de culpa. Ela pode ser vinda da própria vontade do agente, ou pode ser advinda da negligência, imperícia ou imprudência. A negligência é inércia do agente em praticar determinado ato. Imprudência é ação, comissiva, apesar de exigir um comportamento, ainda assim o sujeito fazer. Significa “fazer apesar de”. Imperícia: envolve um conhecimento técnico sobre as circunstâncias.

Caudas de excludente de ilicitude: quando a própria vítima causa o dano, incide uma excludente de ilicitude.

Culpa concorrente, quando os dois envolvidos têm culpa: os dois agem de forma a se causar um prejuízo mútuo. Temos o caso fortuito ou força maior. Causar dano para salvar alguém de perigo iminente também constitui excludente de ilicitude.

Muito já ouvimos e ouviremos falar em reparação doe danos. Hoje está em voga falar em responsabilidade por danos morais. Todos querem processar alguém por danos morais. Há inclusive a crescente indústria do dano moral, que é pegar idéia trazida dos Estados Unidos e ganhar rios de dinheiro. Exemplos de heranças de lá: assédio sexual e assédio moral. Ambos ensejam indenização por danos morais. 


  1. Neste momento o professor lançou uma questão que envolve um caso concreto de pensão alimentícia cuja credora é uma menina de 13 anos. Ele perguntava a respeito da pretensão do direito de exigir os alimentos, e frisou a importância de a menina ser menor, que é o fato de a prescrição não correr contra absolutamente incapazes (art. 198). Infelizmente não consegui anotar o problema inteiro, com todos os detalhes.