Direito Civil

terça-feira, 14 de abril de 2009

Provas do negócio jurídico: a confissão



Frase do dia: só quem confessa são as pessoas associada aos direitos e deveres envolvidos na causa.

Estamos falando das provas tão somente no sentido de prepararmo-nos para um assunto de cunho eminentemente processual. Vamos aprofundar isso no momento oportuno ao estudar processo. Isso porque o estudo das provas só será necessário quando houver um problema. Então as partes até fizeram um contrato, uma pactuação, e, no final das contas, houve alguma querela que não foi solucionada de maneira amigável, razão pela qual elas deverão submeter ao Poder Judiciário que ficará responsável para dar uma sentença (prestação jurisdicional).
 

Modalidades de provas dos negócios jurídicos

São 5, mas, nesta enumeração, por não serem taxativas, mas meramente enumerativas, há outras. Quais são?

  1. Confissão;
  2. Prova documental;
  3. Prova testemunhal;
  4. Prova presuntiva;
  5. Prova pericial.

Existe sim uma hierarquia entre essas provas; umas são mais fortes do que outras. A primeira delas, portanto, encabeçando essa hierarquia, é a confissão. Também chamada de “rainha de todas as provas”, justamente por que, em nosso Direito, especialmente no Direito Civil, estamos indo em busca da verdade ficta, que é a verdade que se prova nos autos. Então, uma determinada circunstância, quando confessa, o juiz não terá nem a obrigatoriedade nem o interesse de ir em busca de mais fatos pra comprovar aquela alegação. O entendimento que o juiz terá é: “se a própria parte confessou, falando de um fato contrário ao seu interesse, quem sou eu para dizer que ela está errada?” Daí temos uma diferença muito gritante em relação ao Direito Penal, em que se vai em busca da verdade absoluta, ou verdade real. Como no exemplo do delegado de polícia que apura um crime e surge, de repente, um sujeito confessando a autoria. Quando isso acontece, o delegado não pode cessar as investigações apenas com essa confissão.

No Direito Civil, e também em outros Direitos, vamos em busca da verdade ficta.

A confissão é a modalidade mais forte de prova. É aquela que, uma vez presente, fará com que o juiz e as partes não mais precisem se preocupar em provar determinada coisa. Muitos pensam que a confissão só pode ser feita pelo réu, o que não é verdade. Vezes há em que temos um autor/requerente/demandante que ajuíza uma ação e está, ele próprio, faltando com a verdade, e se entrega em algum momento do processo. Como um sujeito que pede em juízo o pagamento de uma dívida de R$ 10.000,00, em que ficou acertado que o devedor pagaria em 10 parcelas de R$ 1.000,00, devedor esse que contesta o valor pedido, dizendo que na verdade já quitou duas prestações, faltando, portanto, apenas R$ 8.000,00. Se a parte autora admitir que essa alegação da parte ré é verdadeira, isso será uma confissão, pois é um fato contrário ao interesse do demandante.

Ao constar nos autos o reconhecimento dos R$ 2.000,00 já pagos, o juiz já limitará o valor da causa para, no máximo, 8 mil reais. É a partir desses 8 mil que o juiz começará a trabalhar.

Então, em se tratando de confissão, falamos numa prova robusta. É a pior coisa para o advogado defender alguém que confessa, enquanto é a melhor coisa para ele estar contra alguém que confessa.

E se uma parte confessa uma série de fatos e a outra se mantém calada, como numa relação conjugal, que é um negócio jurídico formal? Digamos que sou casado e desejo me separar de minha esposa. Alego para o juiz que não haverá necessidade de uma ação de separação de corpos, e digo também que estamos separados de fato há mais de 5 meses. Minha ex comparece à audiência e não se pronuncia a respeito. Então, considera-se que ela está confessando.

Logo, a confissão pode ser tanto espontânea quanto ficta, ou seja, considerada, implícita. Na seqüência, fizemos uma definição de confissão. Ao recorrer à doutrina, vamos ver várias definições nesse sentido. Quando temos uma confissão definida pela própria lei, é claro que será esta a confissão mais segura. É a que está no art. 348 do Código de Processo Civil.

Seção III
Da Confissão

        Art. 348.  Há confissão, quando a parte admite a verdade de um fato, contrário ao seu interesse e favorável ao adversário. A confissão é judicial ou extrajudicial.

        Art. 349.  A confissão judicial pode ser espontânea ou provocada. Da confissão espontânea, tanto que requerida pela parte, se lavrará o respectivo termo nos autos; a confissão provocada constará do depoimento pessoal prestado pela parte

Vejam que, agora que falamos de uma matéria processual, vez por outra faremos menção ao Código de Processo Civil, não ao Código Civil. Portanto cuidado para não consultar o diploma errado!

A confissão é a modalidade de prova prevista nos artigos 212, inciso I, 213 e 214 do Código Civil, mais o art. 348 e seguintes do Código de Processo Civil.

O art. 213 deixa muito claro que só quem pode fazer a confissão é a parte que esteja envolvida no assunto. Portanto nunca ouviremos uma testemunha confessando algum fato. Então, se tenho uma lide com o Thiago, que nomeia a Amanda como sua testemunha, que, no meio do depoimento entrega-o, isso não é considerado confissão. Só quem confessa é a pessoa associada aos direitos e deveres envolvidos. Na prática isso revela muito. Houve um caso na Justiça do Trabalho em que o professor representava o reclamante (empregado) e tinha uma infinidade de horas extras que não haviam sido pagas pela empresa em que ele trabalhava. Para uma empresa, questões judiciais sobre hora extra estão entre as coisas mais incômodas. Um salário que se eleva de R$ 500,00 pra R$ 600,00 faz com que incidam sobre esses R$ 100,00 de diferença todo o efeito cascata: FGTS, 13º, férias e recolhimento previdenciário.

Enfim, estavam eles lá, e o cliente tinha que fazer a prova de que ele fazia hora extra. Ele tinha uma testemunha fraca; a empresa, por sua vez, trouxe várias testemunhas que mentiram em juízo. Elas disseram que nunca fizeram hora extra, e que não era comum haver hora extra naquela empresa. A causa foi perdida. Passaram-se 7 meses e essas pessoas, que deram esse depoimento, foram todas mandadas embora. Em seguida elas foram a juízo pedir o advinha quê? Sim, elas também queriam o pagamento de horas extras! Grande advogado da empresa, que teve a diligência de buscar, nos autos do processo anterior, os depoimentos das testemunhas, que agora figuravam como partes autoras, o que haviam dito. A declaração de que elas não faziam hora extra e de que tudo aquilo que o cliente do professor alegava era mentira foi para os autos deste processo e aí sim, tais declarações são uma forma de confissão. O detalhe é a estranheza do acontecimento: a empresa arrolou, como testemunhas, outros empregados (que depois vieram a constituir parte ativa na demanda), para afirmarem que não havia a prática da hora extra lá. Há indicio, então, de coação. Neste caso, para que os novos demitidos provassem que as alegações anteriores foram feitas mediante coação, seria necessário que se fizesse prova disso e que fossem incluídas nos autos. Suponha, portanto, que de fato houve coação. Essa é a verdade real. Como a parte não obteve êxito em provar esse fato para incluir nos autos, considera-se verdade (ficta) que não houve coação. É a verdade que interessa ao Direito Civil, ao Direito Trabalhista e vários outros.

Atenção para mais uma questão de prova, de concurso e da Ordem: a confissão não é estritamente pessoal, personalíssima. Ela é também admitida quando feita por representante. A confissão é perfeitamente valida se feita por representação, desde que os poderes estejam expressos na procuração.

Art. 213:

        Art. 213. Não tem eficácia a confissão se provém de quem não é capaz de dispor do direito a que se referem os fatos confessados.

        Parágrafo único. Se feita a confissão por um representante, somente é eficaz nos limites em que este pode vincular o representado.

Então, não é algo que apenas o autor ou o réu podem praticar.
 

Características da confissão

A primeira é que a confissão é irrevogável, ou seja, não se pode voltar atrás. Uma vez feita a confissão, não pode o sujeito voltar ao juiz e dizer que mudou de idéia. Coisas como tortura podem provocar anulação, não revogação. Qual a diferença entre as duas? Outra questão de prova. Quem revoga é a própria parte. Se fiz uma confissão, e pudesse retirá-la, isso seria revogar. Quem anula, por outro lado, é o Judiciário. Claro que podemos estar diante de uma confissão que foi colhida mediante coação mas, neste caso, não estaremos diante de uma confissão sujeita a revogação, mas sujeita a anulação. Quem decretará a anulabilidade é o Judiciário. A confissão tem efeitos de nulidade mas é inexistente, porque é um negócio jurídico mas sempre sem vontade. Lembrem-se que a vontade é pressuposto de existência do negócio jurídico. Já a coação relativa, como chantagem, pode levar a confissão à condição de anulabilidade, mas não nulidade.

Segunda característica: a confissão é indivisível. Em regra, ela não pode ser fragmentada. Um autor ou réu não pode se dirigir ao juiz e fazer um “pacote de confissões.” É dizer: “confesso isto, isso e aquilo mas não aquilo e mais aquilo.” Não se pode aproveitar parte da confissão apenas para beneficiar-se da parte boa, como tentando dizer “seu juiz, isso aqui o senhor pode considerar, OK? Mas aquilo ali não!”

Art. 354 do Código de Processo Civil:

        Art. 354.  A confissão é, de regra, indivisível, não podendo a parte, que a quiser invocar como prova, aceitá-la no tópico que a beneficiar e rejeitá-la no que Ihe for desfavorável. Cindir-se-á, todavia, quando o confitente Ihe aduzir fatos novos, suscetíveis de constituir fundamento de defesa de direito material ou de reconvenção.

Terceira característica: a confissão diz respeito a direitos disponíveis. Com relação a direitos indisponíveis, não há que se falar em confissão. Questões sobre vida, honra, nome, imagem, que são direitos personalíssimos, não admitem confissão.

Fiquemos por aqui. Quinta-feira haverá aula de revisão com presença não-obrigatória.