Como
começamos a ver na aula passada, leis delegadas são elaboradas pelo
Presidente da República,
mas como é o Congresso Nacional que tem o poder de legislar, para que o
Presidente elabore uma lei, é necessária uma
autorização, chamada delegação.
A delegação tem a forma de resolução bicameral,
ou
resolução do Congresso Nacional. Como essa resolução que autoriza o
Executivo a criar lei é do Congresso Nacional, ela é bicameral.Cuidado
para não confundir o conceito de delegação com o de lei delegada:
aquela é a autorização para se elaborar esta.
Historicamente,
a lei delegada surgiu
juntamente com a lei
complementar. Foi uma emenda constitucional para instaurar o
parlamentarismo no
Brasil na época da Constituição de 46. A lei delegada tem toda a
estrutura de
Estado parlamentarista, em que o legislativo e o executivo são
extremamente
imbricados. Mas a lei delegada, em função das necessidades do Estado
social,
também se manteve mesmo no presidencialismo, pois não é de se
desconsiderar que
o Presidente da República não tenha que lidar com assuntos que demandem
dele
uma agilidade maior. Para lhe dar essa agilidade, existem
instrumentos
legislativos na mão do Presidente. Um deles é a lei delegada. Além
dela, existe também outro
instrumento
legislativo que o Presidente da República faz uso freqüente, que é a
medida
provisória. Num grau crescente de agilidade, a medida provisória é
usada para
“situações-ápice” de necessidade. Os próprios pressupostos são
urgência e
relevância. Se não for urgente e relevante, então o Presidente da
República
poderia muito bem se valer de uma lei delegada, ou então do pedido de
urgência
no processo legislativo ordinário (processo legislativo sumário).
Mas
é claro que o Presidente vai usar
a medida provisória,
pois ela é mais simples e rápida para gerar efeitos. Por isso a lei
delegada quase
não é utilizada; a última foi editada há quase 20 anos, assim ficam
claras as
vantagens da medida provisória do ponto de vista do próprio Presidente
da
República, que, podendo, lança mão dela. Mas mesmo que a lei delegada
não seja
muito utilizada, vamos ler os artigos referentes a ela e veremos,
depois, a medida provisória. Mas o art. 62, que dispõe sobrea medida
provisória, originariamente possuía
apenas um parágrafo. Ou seja, medidas provisórias eram tratadas pelo
parágrafo
único do art. 62. Em 2001, com o advento da Emenda Constitucional nº
32, o art.
62 foi modificado, estabelecendo a partir de então que esse artigo,
além de seu
caput, tem 12 parágrafos, para
trazer
um tratamento mais detalhado da medida provisória.
Vamos
analisar cronologicamente esses
instrumentos legislativos:
A lei delegada já existia na Constituição anterior e se manteve na atual. Na Constituição Federal de 1988, a lei delegada está no art. 68.
Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo
Presidente da
República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional. § 1º - Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre: I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; III - planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos. § 2º - A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício. § 3º - Se a resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada qualquer emenda. |
Até
o caput já
sabemos o conteúdo.
O
§ 1º do art. 68 cuida daquilo que
não pode ser objeto de lei
delegada, ou seja, o que o Congresso Nacional não pode delegar, ou
limitação de
delegação pelo Congresso Nacional.
§
2º e § 3º: cuidam do procedimento
de delegação. O instrumento
"lei delegada número X" é elaborado pelo próprio Presidente. O que
sabemos já sobre a lei delegada? Que ela tem que ser elaborada mediante
delegação,
que se faz por meio de uma resolução do Congresso Nacional. Então, a
tramitação
no Poder Legislativo do instrumento lei delegada é, na realidade, a
tramitação
de uma resolução, resolução essa que autorizará a delegação. Isso
porque a lei delegada em si será feita no Poder Executivo, pelo
Presidente
da
República, ministérios e sua Casa Civil. Então cuidado: a lei delegada
em si não é a resolução. A resolução é um instituto do Congresso
Nacional que autoriza a criação da lei delegada. Resolução é, portanto,
obra do Legislativo para delegar ao Executivo a criação de uma lei.
Essa lei, que é obra do Executivo, logicamente se chama lei delegada.
A
Constituição fala que há duas
maneiras de o Congresso
Nacional delegar esse poder ao Presidente da República, que a doutrina
convencionou chamar de delegação típica
e delegação atípica. A primeira é a
simples: o Presidente pede e o Congresso Nacional elabora uma resolução
dizendo
algo como: “o Presidente da República está autorizado a elaborar a lei
sobre
tal assunto.” Então o Legislativo estabelece o conteúdo e os termos do
exercício da delegação legislativa. O Presidente elabora, promulga e publica, e a
partir disso nós
estamos obrigados a fazer ou deixar de fazer algo. Essa é a delegação
típica.
E
a delegação atípica? Está no § 3º:
o Congresso Nacional, ao editar a resolução que autoriza o Presidente
da República a elaborar a lei delegada, coloca em um dos artigos dessa
resolução: "fica autorizado o
Presidente da República a elaborar uma lei sobre o assunto tal." Mas a
resolução, neste caso, estabelece que o Presidente
submeta o
projeto à aprovação do Congresso Nacional, que poderá aprovar ou
rejeitar, mas não emendar. Essa é a delegação atípica, que pede que o
Presidente da
República remeta o Projeto de Lei delegada para aprovação.
Prestem
atenção no § 1º, que é o
conteúdo do que não pode
ser objeto de delegação.
Por que fazem
sentido essas restrições? Restrições quanto a matéria de competência
exclusiva do Congresso
Nacional, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados... Para que essa
restrição? Finalisticamente, todas as restrições constitucionais a
respeito dos
poderes visam a manutenção da separação. A questão sempre será,
portanto, “de
que forma?”. Por isso que, para responder a esse tipo de pergunta,
devemos consultar
os artigos do texto constitucional. Devemos ver se haveria lógica em
haver a
delegação em tais assuntos. Comecem, então, pelo art. 51, com as
competências
da Câmara dos Deputados:
Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados: I - autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado; II - proceder à tomada de contas do Presidente da República, quando não apresentadas ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa; III - elaborar seu regimento interno; IV – dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias; V - eleger membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII. |
Perceberam
a obviedade já presente no
inciso I?
Continuem
lendo os incisos e também
os do art. 52, com as
competências do Senado. Finalmente, vá ao art. 49, com as competências
privativas do Congresso Nacional, e veremos que não há lógica ou
possibilidade
de haver essa delegação.
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional; II - autorizar o Presidente da República a declarar guerra, a celebrar a paz, a permitir que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente, ressalvados os casos previstos em lei complementar; [...] |
No
caso do art. 49, basta ver o
exemplo do inciso II: se
fosse delegável ao Presidente que elaborasse lei sobre tal matéria, ele
poderia
declarar guerra arbitrariamente. E qualquer forma de arbitrariedade é
uma afronta à idéia de limitação do poder.
Por
outro lado, quem celebra tratado
internacional? O art.
52 fala que compete ao Senado autorizar a vigência de um tratado no
âmbito
interno e compete ao Congresso Nacional autorizar a ratificação
de um tratado, bem como autorizar
o Presidente a declarar a guerra e celebrar a paz. Mas como delegar ao Presidente
da República algo
que ele próprio faz? Essas normas são, portanto, um controle
prévio
que o Congresso Nacional faz. Se o Congresso Nacional abre mão desse
controle prévio,
tudo se concentrará na mão do Presidente da República. “Celebrar”:
assinar o
tratado internacional. Quando o Presidente assina o tratado, dizendo
que
concorda com os termos, nós não estamos obrigados a fazer ou deixar de
fazer
nada, ainda. Essa assinatura, internacionalmente falando, tem o
seguinte
conteúdo: “o Brasil está intencionado
em fazer parte deste tratado.”
Apenas essa
função. Depois da autorização dos representes do povo, há, então, a
ratificação.
Vamos
seguir com a análise das
restrições à delegação, lendo
o art. 68. Já vimos que
matérias de competência exclusiva da Câmara, do Senado ou do Congresso
Nacional não podem ser objeto de delegação.
Além disso fala que não pode ser
objeto de delegação matéria reservada à lei complementar. Por quê?
Separação
dos poderes? Claro, mas o principal motivo é que a lei complementar
precisa de um quorum de
aprovação
maior, e também que a Constituição taxa as matérias que serão reguladas
lei
complementar...
portanto, qual a lógica dessa limitação? Chega perto da obviedade,
também.
§
1º, inciso
I: organização
do Poder
Judiciário. Aqui, qual é a resposta? Claro que o Presidente
da República
não elaborará leis delegadas sobre o Poder Judiciário. É o próprio
judiciário
que tem a reserva de iniciativa para propor projetos de lei sobre sua
própria
estrutura.
Inciso
II do § 1º :
§ 1º - Não serão objeto de delegação os atos de
competência exclusiva
do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos
Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar,
nem a legislação sobre: [...] II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; |
Logo,
direitos fundamentais, que só
podem ser tratados por
emenda constitucional, ainda assim nunca de forma a abolir, apenas a
expandir,
bem como direitos políticos, cidadania e nacionalidade.
Inciso
III:
III - planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos. |
Quem
elabora o projeto de lei
orçamentária? Os
representantes do povo, pois o imposto é do povo, simples também. É
dinheiro
que está embutido em cada compra ou tributo que se paga. Tudo isso vai
para um
fundo, que daí serão distribuídos, conforme a ideologia que está em
vigor. Hoje
em dia a ideologia do governo é mais social, então parte desse volume é
repassada
para programas assistenciais. Analogamente, se o governo fosse
mais liberal,
talvez
se repassassem montantes a empresas privadas para fomentar a geração de
empregos. Isso será distribuído conforme o governo, que elaborará um
plano,
chamado plurianual:
que vige por
mais
de um ano. Em geral, quatro anos. No momento inicial, não se especifica
para
onde serão repassados os recursos. Esse plano plurianual tem que ser
especificado todo ano, por meio da Lei de Diretrizes Orçamentárias.
São,
portanto, quatro Leis de Diretrizes Orçamentárias editadas sob a égide
do plano plurianual. Este contém idéias em abstreato, que balizarão as
LDOs. Todo ano o dinheiro deve
ser
efetivamente destinado. Com base na Lei de Diretrizes Orçamentárias se
faz a LOA,
a Lei Orçamentária Anual. É nela que, finalmente, se especificam os
destinos.
Logo,
o orçamento é feito pelo
governo, mas deve ser
apreciado pela Câmara dos Deputados. Se assim não fosse, o projeto, que
seria
público, viraria unipessoal e arbitrário. Quanto a nada disso é
possível
delegação.
Estão tratadas no art. 62 da Constituição. Todos os parágrafos além do 1º entraram no artigo depois da Emenda 32, de 2001.
Art. 62. Em
caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar
medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato
ao Congresso Nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32,
de 2001) § 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I – relativa a: a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; II – que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III – reservada a lei complementar; IV – já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República. § 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada. § 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes. § 4º O prazo a que se refere o § 3º contar-se-á da publicação da medida provisória, suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congresso Nacional. § 5º A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais. § 6º Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando. § 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional. § 8º As medidas provisórias terão sua votação iniciada na Câmara dos Deputados. § 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional. § 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo. § 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas. § 12. Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto. |
Como
dito, o art.
62 originário continha apenas um parágrafo único. Antigamente, a
disposição da
medida provisória na Constituição era assim (veja o adendo especial com
as
normas originarias da Constituição): "Em
caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar
medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato
ao Congresso Nacional, que, estando em recesso, será convocado
extraordinariamente para se reunir no prazo de cinco dias. Parágrafo
único. As medidas provisórias perderão eficácia, desde a edição, se não
forem convertidas em lei no prazo de trinta dias, a partir de sua
publicação, devendo o Congresso Nacional disciplinar as relações
jurídicas delas decorrentes."
Não
havia nenhuma restrição, pois.
Justamente por essa falta de
restrição, a medida provisória poderia versar sobre tudo. Seria mais um
motivo
para o Presidente da República deixar a lei delegada de lado. Mas é
claro que o
presidente, a partir dessa interpretação que estamos falando, editava
medidas
provisórias e os partidos ou interessados ajuizavam ADINs contra elas.
Assim, o
Supremo Tribunal Federal passou a desenvolver uma jurisprudência sobre
o que
poderia e o que não poderia ser objeto de medida provisória, em função
do
texto lacônico
da Constituição originária. Na jurisprudência do Supremo sobre as
Medidas
Provisórias identificamos correspondência entre as limitações da lei
delegada e
as da medida provisória, estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal.
Ele
estabeleceu expressamente que não poderia haver medida provisória sobre
matéria
que deveria obedecer ao princípio da reserva legal (não há crime sem
lei
anterior que o defina nem pena sem prévia cominação legal). É um
princípio
contido no princípio da legalidade.
Assim
impede-se que medida provisória
possa criar um crime. Crime
só pode ser criado por lei ordinária. ²
Então o Supremo passou a desenvolver essa jurisprudência. Mesmo assim, o Presidente da República abusa do uso das MPs. A idéia, com a Emenda Constitucional nº 32, foi restringir o abuso na edição de Medidas Provisórias. Quando a Emenda 32 veio, o Congresso Nacional colocou na Constituição todo o entendimento que o Supremo Tribunal Federal havia desenvolvido sobre conteúdo que não poderia ser objeto de medida provisória.
Como
é possível ver, muito do conteúdo do art. 62 se assemelha às limitações
da lei delegada. O Supremo Tribunal Federal foi além, pois a
lei
delegada é menos excepcional do que a medida provisória. O Direito
Penal, por exemplo, agora explicitado nas restrições adicionadas ao
art. 62 (§ 1º, inciso I, alínea b), remete
a direitos individuais, logo, evidentemente, não podem ser matéria de
medida provisória. ³
Observação:
dado que o pressuposto da medida provisória é a relevância e a
urgência, se acontece uma calamidade ou
declaração de guerra, o Presidente da República está autorizado a
editar MPs.
O
inciso IV do art. 62 diz que não
pode haver medida
provisória sobre matéria já aprovada em projeto de lei pendente de
sanção ou
veto pelo Presidente da República. Por quê? ⁴
O Presidente editar uma
medida provisória sobre um assunto já disciplinado em projeto de lei
aprovado
pelo Congresso Nacional seria como menosprezar o trabalho do
Legislativo. O
Presidente deve vetar e, só então, poderá editar a medida
provisória. A
Constituição só veda a edição de medida provisória se o veto ainda
estiver
pendente. Se o veto for derrubado, vira lei. E se, neste caso, houver
uma
medida provisória vigendo sobre o mesmo assunto? A medida provisória é
revogada.
Sobre
o seqüestro de bens: tem a ver
com o ex-Presidente
Collor e seus planos econômicos. Para evitar isso, o constituinte
derivado acabou
com a possibilidade de edição de medida provisória que pudesse
surpreender tão
desagradavelmente a população que poupava dinheiro, com o disposto no
inciso II
do § 1º do art. 62.
Antecedente
da medida provisória
Antes
da Constituição de 1988, não
havia medida provisória.
Entretanto reconhecia-se ao Presidente da Repúblicaa necessidade de
editar
normas urgentes sobre determinadas matérias. O instrumento que ele
tinha era o
decreto-lei. O decreto-lei existe no Brasil desde a Constituição de
1934, como
instrumento legislativo na mão do Executivo, e foi adotado amplamente
no regime
militar. A Constituição de 1967 adotou abertamente o instituto.
Vimos
que a medida provisória tinha
vigência por 30 dias. O decreto-lei
na Constituição de 67 tinha vigência por 60. Essa não era a única
diferença. Enquanto a medida provisória precisa ser convertida em lei
pelo
Parlamento dentro dos 30 dias ou perderá eficácia, o decreto-lei, caso
não rejeitado pelo Congresso,
automaticamente se convertia em lei. O decreto-lei, então, era
convertido ou
por aprovação ou por decurso de prazo. A medida provisória, ao
contrário, só
pode ser convertida em lei se o Legislativo se manifestar ativa e
positivamente.
Na
mudança de regime, a idéia foi que
não se deve ter
decreto-lei no Brasil, pois o nome já assumira uma conotação ruim e
associava-se
ao regime de força. Mas o Presidente da República, reconhecidamente,
precisava
editar normas urgentemente. “Vamos, então, mudar o nome” – pensaram os
constituintes de 1986 – 1988. A diferença está na conversão. Hoje, a
medida
provisória perde a eficácia desde a edição caso ela não seja convertida
em lei.
Isso significa que todas as
relações jurídicas que se
formaram nesses 30 dias serão retroativamente desfeitas.
Já
conseguimos, portanto, identificar
algumas diferenças
entre a medida provisória e o decreto-lei:
Mas
há outra diferença, a princípio
importante, mas que,
pelo contexto da época, também já perdeu a importância: o decreto-lei
tinha
restrições materiais à sua edição. Enquanto ele foi um instrumento
utilizado na
ditadura, a Constituição da época estabelecia restrições para seu uso;
enquanto a
medida provisória, na Constituição de 88, não tinha, em seu texto
originário, nenhuma restrição! As restrições foram
incluídas
a partir da formação da jurisprudência do Supremo. As restrições do
decreto-lei
eram que ele só poderia versar sobre duas matérias: segurança nacional
e finanças
públicas. É claro que o que é e o que não é matéria de segurança
nacional no
regime militar era bem amplo.
Leitura
opcional: A Ditadura
Envergonhada, de Elio Gaspari e
veja o legado da ditadura. Foi durante exatamente no período de 1964 –
1985 que
houve a maior produção legislativa do Brasil, com diplomas que perduram
até
hoje, recepcionados pela atual ordem constitucional sem
incompatibilidades
substanciais. Nem mesmo os AI’s nem a famosa Lei de Imprensa (Lei
5260/67)
foram de total ruindade; tais normas não versavam apenas sobre a
repressão.
Então, o art. 62 do texto inicial da Constituição de 88 era lacônico. Ele foi modificado pela Emenda Constitucional nº 32. Ela trouxe regras e restrições sobre a tramitação de medidas provisórias no Congresso Nacional.
Aula de reposição remarcada para 09/05/09.