Direito Constitucional

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Distribuição de competências - conclusão


Cuidado. Na força feita para postar esta nota antes de quarta-feira, posso ter vacilado em algum(ns) pontos. Lembrem-se da aula, usem suas próprias anotações e boa sorte.

Nesta última aula vamos usar muito a Constituição.

Tópicos:

  1. Distribuição de competências tributárias
  2. Competência administrativa
  3. Título III: Da Organização do Estado
  4. Competências dos estados
  5. Competências concorrentes


Começamos na aula passada notando as características básicas do Estado Federal. Entre elas, apesar de todas serem, está uma específica que é fundamental, que, se ausente, não se tem um Estado Federal. É a autonomia dos entes federativos. Em que consiste? Na tríplice capacidade de ele se organizar. Eles se auto-organizarão, auto-administrarão por meio de governantes e, também, com a elaboração de uma legislação própria, que vigora naquele espaço territorial, se autolegislarão. Isso é a autonomia dos entes.

É também a característica básica de uma federação a existência de uma Constituição Federal e o respeito a ela. O estado-membro também pode ter uma; se ele faz, ele o faz por direito próprio, não por concessão de outro ente federativo. Não é a União que dá para o estado o poder de se organizar, legislar e administrar. Isso significa que não há hierarquia entre os entes; União não é hierarquicamente superior aos estados, e vice-versa.

Num Estado Federal, a intromissão de um ente na competência de outro configura desrespeito à Constituição Federal, gera uma inconstitucionalidade. Veja a competência do Supremo Tribunal Federal, no art. 102, inciso III, alínea d.

        Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

        [...]

        III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

        [...]

       d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

Inciso III é a competência recursal extraordinária. A alínea d diz respeito a uma decisão de tribunal submetido ao Supremo que tenha julgado válida lei local contestada em face de lei federal, ou seja, está configurada uma confusão de competências. Como as competências são atribuídas pela Constituição, invasão de competências é inconstitucionalidade.

Então vimos, quando estudamos o recurso extraordinário, que deve haver uma controvérsia de natureza constitucional. Quais são as quatro espécies de controvérsia constitucional que ensejam o RE? As das alíneas do inciso III do art. 102, obviamente: Contrariedade direta à Constituição; declaração de inconstitucionalidade feita na decisão recorrida, já que cabe ao Supremo dar a palavra final sobre qualquer inconstitucionalidade; declaração de validade de lei ou ato do Executivo local que seja contestável em relação à Constituição Federal, e a última alínea, que diz respeito à repartição de competências. É exatamente isso que será cobrado. Muita coisa aqui é útil, portanto, decorem! Lá na frente veremos a importância de decorar certas coisas. O conteúdo do inciso III do art. 102, por exemplo, é até intuitivo, já que já aprendemos que o RE só é cabível quando houver controvérsia constitucional, e as possíveis controvérsias são exatamente essas que acabamos de enumerar. O Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição. Então, as questões que ele julgará terão relação com o quê? Com a Constituição.  A última das alíneas é a que diz respeito diretamente ao assunto do Estado Federal.
 

Distribuição de competências tributárias

Então, como estávamos falando, a característica básica da federação é a autonomia. Quando somos autônomos para resolver nossas coisas, fazermos o que quisermos, realmente somos autônomos ou, para o exercício dessa autonomia é necessário um requisito fundamental, básico? Falta o dinheiro, né. Então, é preciso que se prestem contas. Se somos beneficiários de mesada, se a pessoa que nós dá o dinheiro não concorda com a aplicação, então certamente na próxima vez ela não dará. Então, os entes federativos precisam dinheiro para fazer tais coisas, ou a repartição de competências vai ser só uma bela teoria. Então é por direito próprio dos entes federativos o acesso a um orçamento. Eles têm que ter reservas financeiras, para que possam exercer de maneira autônoma. É por isso que a própria Constituição reparte as competências para tributar. Tributo não é a fonte de financiamento da atuação do Estado? Por isso que é obrigatório. Financiamos a atividade do Estado para, em princípio, reverter para nós mesmos. É para vivermos em sociedade, com o fim do bem comum.

Então os tributos serão divididos na União, estados e municípios. A Constituição estabelece as competências, determinado quem estabelecerá impostos sobre o quê. Então, a técnica usada pelo constituinte foi a de enumeração das competências tributárias. No que toca às competências tributárias a técnica foi essa.

O constituinte deu para a União a possibilidade de criação de impostos que não estão enumerados. Isso, como veremos, se inverte na competência legislativa e na administrativa. Nessas duas, a competência enumerada é da União e dos municípios e a remanescente é dos estados. Mas, na competência tributária, não. A competência enumerada é de todos, sendo que é a União que pode criar um tributo que não está previsto. Art. 153:

Seção III
DOS IMPOSTOS DA UNIÃO

        Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

        I - importação de produtos estrangeiros;
        II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados;
        III - renda e proventos de qualquer natureza;
        IV - produtos industrializados;
        V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;
        VI - propriedade territorial rural;
        VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.

        § 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.

        § 2º - O imposto previsto no inciso III:

        I - será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei;

        § 3º - O imposto previsto no inciso IV:

        I - será seletivo, em função da essencialidade do produto;
        II - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores;
        III - não incidirá sobre produtos industrializados destinados ao exterior.
        IV - terá reduzido seu impacto sobre a aquisição de bens de capital pelo contribuinte do imposto, na forma da lei.

        § 4º O imposto previsto no inciso VI do caput:

        I - será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas;
        II - não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore o proprietário que não possua outro imóvel;
        III - será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem, na forma da lei, desde que não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal.

        § 5º - O ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial, sujeita-se exclusivamente à incidência do imposto de que trata o inciso V do "caput" deste artigo, devido na operação de origem; a alíquota mínima será de um por cento, assegurada a transferência do montante da arrecadação nos seguintes termos:

        I - trinta por cento para o Estado, o Distrito Federal ou o Território, conforme a origem;
        II - setenta por cento para o Município de origem.

Está em que título? No VI, da tributação e do orçamento. Vejam o Capítulo I, que fala do Sistema Tributário Nacional. Ele tem normas gerais e, depois, limitações ao poder de tributar, ou seja, a própria Constituição impõe limites ao Estado. Essas limitações constituem direitos subjetivos nossos: garantias do contribuinte. O constituinte estabeleceu que cobrar tributos é legítimo e necessário. Contudo, esse poder de cobrar impostos tem limites. Em seguida diz quais são. Se a Constituição limita o Estado, ela gera direitos para nós. É direito fundamental, solidificado pela jurisprudência.

Na Seção III, começa o constituinte a enumerar os impostos. E, no art. 153, ele enumera quais os impostos da União; no art. 155 os impostos dos estados e do DF e, no 156, os dos municípios. Ali veremos que à União compete o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). Suponha, por exemplo, que a alíquota do IPI está zero para veículos. É um incentivo que o poder, o Estado está dando para fomentar a economia, para gerar riquezas, portanto. Quem autoriza isso? Se o imposto é da União, só pode ser a União que o reduzirá. Está no art. 153, inciso IV, transcrito acima.

Quando falamos em importação de produtos estrangeiros, conforme o inciso I, temos até um valor de “freeshop” para pagar sem incidirem impostos. 500 dólares. A União que legislou sobre isso. Imposto de exportação, de renda, etc. Só esses listados. São os que a Constituição autorizou a União a criar. O único que a União ainda não criou foi o Imposto sobre Grandes Fortunas.

Como dito, a União é a única que pode instituir novos impostos além dos já enumerados. Está no art. 154:

         Art. 154. A União poderá instituir:

        I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição;

        II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.

Aqui está a competência remanescente da União. Mas ela tem que ser bem criativa para não criar um outro imposto sem mesmo fato gerador para não incorrer em bis in idem, que é a hipótese do inciso I.

Art. 155, com os impostos dos estados e DF:

Seção IV
DOS IMPOSTOS DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL

        Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: 

        I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; 
        II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; 
        III - propriedade de veículos automotores. 

        § 1.º O imposto previsto no inciso I: 

        I - relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal
        II - relativamente a bens móveis, títulos e créditos, compete ao Estado onde se processar o inventário ou arrolamento, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito Federal;
        III - terá competência para sua instituição regulada por lei complementar:

        a) se o doador tiver domicilio ou residência no exterior;
        b) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior;

        IV - terá suas alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal;

        § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: 

        I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;
        II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:

        a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;
        b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores;

        III - poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços;
        IV - resolução do Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecerá as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação;
        V - é facultado ao Senado Federal:

        a) estabelecer alíquotas mínimas nas operações internas, mediante resolução de iniciativa de um terço e aprovada pela maioria absoluta de seus membros;
        b) fixar alíquotas máximas nas mesmas operações para resolver conflito específico que envolva interesse de Estados, mediante resolução de iniciativa da maioria absoluta e aprovada por dois terços de seus membros;

        VI - salvo deliberação em contrário dos Estados e do Distrito Federal, nos termos do disposto no inciso XII, "g", as alíquotas internas, nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, não poderão ser inferiores às previstas para as operações interestaduais;
        VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:

        a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto;
        b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;

        VIII - na hipótese da alínea "a" do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
        IX - incidirá também:

        a)sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço;
        b) sobre o valor total da operação, quando mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios;

        X - não incidirá:

        a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores; 
        b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica;
        c) sobre o ouro, nas hipóteses definidas no art. 153, § 5º;
        d) nas prestações de serviço de comunicação nas modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita; 

        XI - não compreenderá, em sua base de cálculo, o montante do imposto sobre produtos industrializados, quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos;
        XII - cabe à lei complementar:

        a) definir seus contribuintes;
        b) dispor sobre substituição tributária;
        c) disciplinar o regime de compensação do imposto;
        d) fixar, para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, o local das operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços;
        e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, "a";
        f) prever casos de manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias;
        g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
        h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X, b; 
        i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço. 

        § 3º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e o art. 153, I e II, nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País.

        § 4º Na hipótese do inciso XII, h, observar-se-á o seguinte: 

        I - nas operações com os lubrificantes e combustíveis derivados de petróleo, o imposto caberá ao Estado onde ocorrer o consumo; 
        II - nas operações interestaduais, entre contribuintes, com gás natural e seus derivados, e lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I deste parágrafo, o imposto será repartido entre os Estados de origem e de destino, mantendo-se a mesma proporcionalidade que ocorre nas operações com as demais mercadorias; 
        III - nas operações interestaduais com gás natural e seus derivados, e lubrificantes e combustíveis não incluídos no inciso I deste parágrafo, destinadas a não contribuinte, o imposto caberá ao Estado de origem; 
        IV - as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, g, observando-se o seguinte: 

        a) serão uniformes em todo o território nacional, podendo ser diferenciadas por produto; 
        b) poderão ser específicas, por unidade de medida adotada, ou ad valorem, incidindo sobre o valor da operação ou sobre o preço que o produto ou seu similar alcançaria em uma venda em condições de livre concorrência; 
        c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, b.

        § 5º As regras necessárias à aplicação do disposto no § 4º, inclusive as relativas à apuração e à destinação do imposto, serão estabelecidas mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, g.

        § 6º O imposto previsto no inciso III: 

        I - terá alíquotas mínimas fixadas pelo Senado Federal; 
        II - poderá ter alíquotas diferenciadas em função do tipo e utilização.

Então, quando alguém falece, essa herança é transmitida causa mortis. ITCD: Imposto sobre Transmissão Causa mortis e Doação de quaisquer bens ou direitos. O imposto vai para o estado ou DF. Operações sobre circulação de mercadorias: ICMS. Sobre veículos: IPVA.

Acabaram os dos estados. Vamos aos dos municípios:

Art. 156:

Seção V
DOS IMPOSTOS DOS MUNICÍPIOS

        Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

        I - propriedade predial e territorial urbana;
        II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
        III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. 

        § 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá:

        I – ser progressivo em razão do valor do imóvel; e 
        II – ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel.  

        § 2º - O imposto previsto no inciso II:

        I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;
        II - compete ao Município da situação do bem.

        § 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar: 

        I - fixar as suas alíquotas máximas e mínimas; 
        II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior.
        III – regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.

O primeiro deles é, obviamente, o IPTU. Se vamos vender um apartamento, temos um ato oneroso. Há a incidência de um imposto, o ITBI: Imposto de Transmissão de Bens Imóveis. Então, sobre o valor da venda, pagaremos um valor para o município. Além desse imposto, temos o Imposto Sobre Serviços de qualquer natureza. É o ISS. Exemplo: empresa cuja atividade é a prestação de serviços de limpeza. Então a empresa que presta serviços de coleta de lixo, por exemplo, paga ISS.

Como pudemos notar, cada ente federativo tem um conjunto de receitas próprias dado pela Constituição. Além desse conjunto, a própria Constituição tem o capítulo que dispõe sobre a repartição das receitas tributárias, que é o Capítulo VI do Título VI. Então, de tudo que se arrecada, especificamente da União, deve haver uma partilha. Os estados e municípios irão receber parte dessa arrecadação. Então, além do que e eles arrecadam de imposto próprio, eles também recebem um percentual das receitas da União. A Constituição estabelece, então é direito do município e do estado receber esses valores, e dever da União fazer o repasse. Uma vez com o dinheiro, eles poderão exercer suas competências com autonomia, sem prestar contas a respeito de em que aplicarão, ou com que políticas públicas irão gastar. É claro que não podem fazer qualquer coisa, pois tem uma repartição de competências. A Constituição diz: “tais assuntos serão de execução pela União.” Ou então de atividade dos estados, ou dos municípios. Qual é o critério que a Constituição adotou para fazer essa distribuição de competências? Vejamos: Por que a professora deu à Gabriela a competência de ler em voz alta o artigo 153 da Constituição, por exemplo? No caso da professora, seria por discricionariedade; este foi o critério estabelecido por ela. No caso da Constituição, é o critério é a predominância do interesse. Ou seja, para o que for de interesse predominantemente nacional a Constituição atribui a competência para agir para a União. O que for de competência predominantemente regional, para os estados. E o que for de interesse predominantemente local foi para os municípios. Mas veja o critério: da predominância, não da exclusividade. E, a partir desse critério da predominância, o constituinte traçou os conteúdos das competências de cada ente federativo. Quais são essas competências? Além da competência para instituir impostos para arrecadar, existem duas outras que são atribuídas na Constituição. Uma é a administrativa e outra é a legislativa. Vejamos cada uma.
 

Competência administrativa

O que é isso? É o que é dado ao executivo? Sim. Mas o que está contido nessa competência? Executar medidas, colocar em prática as políticas. Colocar em prática as leis. Executar as leis, as tarefas, agir. Essas competências administrativas também são chamadas de competências de execução ou competências materiais. Mas já aprendemos que o Estado só pode agir mediante lei, se não há lei dispondo sobre a atuação do Estado, ele simplesmente não pode agir. Se ele vai executar, ele executará uma lei. Cada passo dado pela Administração Pública deve ser dado com base na lei. Então, as competências administrativas pressuporão uma legislação. Veremos que na Constituição a distribuição de competências para administrar e para legislar serão correspondentes. Por exemplo: tendo em vista o critério da predominância do interesse, a quem competirá emitir moeda? União. Intuitivo, até. Isso está escrito num artigo que estabelece que compete à União emitir moeda (21, inciso VII). Mas para isso deve haver uma legislação. Quem legislará sobre isso? A União, óbvio. É a predominância do interesse. Por absurdo, não faria sentido deixar para um dos estados-membros legislar sobre a emissão de moeda, quando compete à União emiti-la.

Outro exemplo: quem legislará sobre nacionalidade? União. Não tem sentido um estado-membro dizer que têm nacionalidade brasileira determinadas pessoas. Ou estabelecer diferentes requisitos para se tornar brasileiro. Não tem motivo, especialmente lógico, para essa lei ser específica. É para termos uma noção do critério da predominância do interesse.

A Constituição, como já vimos, adotou uma diferença entre critério e técnica de repartição de competências. O que vem antes? O critério ou a técnica? O critério. A partir de um critério, adota-se uma técnica. No caso, o critério é o da predominância do interesse enquanto a técnica é a de enumeração de competências. Em relação às competências administrativas, enumeram-se as competências administrativas da União e dos municípios e o remanescente fica para os estados.

O mesmo para a competência legislativa: as remanescentes serão dos estados. Até por analogia, pois as duas competências têm, pelo menos na visão geral, que bater.
 

Título III: Da Organização do Estado

Art. 18:

        Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

        § 1º - Brasília é a Capital Federal.

        § 2º - Os Territórios Federais integram a União, e sua criação, transformação em Estado ou reintegração ao Estado de origem serão reguladas em lei complementar.

        § 3º - Os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar.

        § 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei.

Nem precisava estar escrito no art. 18 que todos são autônomos. Afinal, já está dito, no art. 1º, que o Brasil é a uma federação. Por que está escrito? Para dar uma continuidade na leitura, mas em que medida? Na que a Constituição falar em todo o seu bojo. Não é uma autonomia baseada no Direito norte-americano; o art. 18 deixa claro que se trata do modelo brasileiro até por citar os municípios, cuja existência difere do federalismo clássico. Então o artigo fala sobre os entes federativos, o art. 19 fala sobre as vedações aos entes federativos e o art. 20, iniciando o Capítulo II, enumera os bens da União, o que é de sua propriedade; o art. 21 traz as competências administrativas da União.

        Art. 21. Compete à União:

        I - manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais;
        II - declarar a guerra e celebrar a paz;
        III - assegurar a defesa nacional;
        IV - permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente;
        V - decretar o estado de sítio, o estado de defesa e a intervenção federal;
        VI - autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de material bélico;
        VII - emitir moeda;
        VIII - administrar as reservas cambiais do País e fiscalizar as operações de natureza financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguros e de previdência privada;
        IX - elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social;
        X - manter o serviço postal e o correio aéreo nacional;
        XI - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais; 
        XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão:
        a) os serviços de radiodifusão sonora, e de sons e imagens; 
        b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos;
        c) a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura aeroportuária;
        d) os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território;
        e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros;
        f) os portos marítimos, fluviais e lacustres;
        XIII - organizar e manter o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios;
        XIV - organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio; 
        XV - organizar e manter os serviços oficiais de estatística, geografia, geologia e cartografia de âmbito nacional;
        XVI - exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão;
        XVII - conceder anistia;
        XVIII - planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e as inundações;
        XIX - instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso;
        XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos;
        XXI - estabelecer princípios e diretrizes para o sistema nacional de viação;
        XXII - executar os serviços de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; 
        XXIII - explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições:
        a) toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional;
        b) sob regime de permissão, são autorizadas a comercialização e a utilização de radioisótopos para a pesquisa e usos médicos, agrícolas e industriais; 
        c) sob regime de permissão, são autorizadas a produção, comercialização e utilização de radioisótopos de meia-vida igual ou inferior a duas horas; 
        d) a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa; 
        XXIV - organizar, manter e executar a inspeção do trabalho;
        XXV - estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa.

Como saberemos que ele contém competências administrativas e não legislativas? Porque não está escrito “legislar sobre”; vejam também os verbos: manter, declarar, assegurar, decretar, autorizar, emitir, administrar, elaborar e executar planos, manter, explorar, tudo verbos de natureza administrativa, executiva. São 25 incisos de competências administrativas da União, competências de execução, competências materiais.

Ainda neste capítulo, temos o art. 22, com as competências legislativas. Olhem a redação do caput.

        Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

        I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;
        II - desapropriação;
        III - requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo de guerra;
        IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;
        V - serviço postal;
        VI - sistema monetário e de medidas, títulos e garantias dos metais;
        VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;
        VIII - comércio exterior e interestadual;
        IX - diretrizes da política nacional de transportes;
        X - regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aeroespacial;
        XI - trânsito e transporte;
        XII - jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia;
        XIII - nacionalidade, cidadania e naturalização;
        XIV - populações indígenas;
        XV - emigração e imigração, entrada, extradição e expulsão de estrangeiros;
        XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões;
        XVII - organização judiciária, do Ministério Público e da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios, bem como organização administrativa destes;
        XVIII - sistema estatístico, sistema cartográfico e de geologia nacionais;
        XIX - sistemas de poupança, captação e garantia da poupança popular;
        XX - sistemas de consórcios e sorteios;
        XXI - normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares;
        XXII - competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federais;
        XXIII - seguridade social;
        XXIV - diretrizes e bases da educação nacional;
        XXV - registros públicos;
        XXVI - atividades nucleares de qualquer natureza;
        XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III; 
        XXVIII - defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima, defesa civil e mobilização nacional;
        XXIX - propaganda comercial.

        Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.

Do inciso I ao inciso XXIX estão todas as competências legislativas da União, enumeradas. Agora, além dessas, há mais alguma? Sim! No Título IV, que estudamos tanto já. Art. 48:

Seção II
DAS ATRIBUIÇÕES DO CONGRESSO NACIONAL

        Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:

        [...]

        XIV - moeda, seus limites de emissão, e montante da dívida mobiliária federal.

Qual a diferença? Este depende de sanção, então o instrumento normativo é lei, ordinária ou complementar. Veja a enumeração no art. 48. Olhem a correspondência, voltando ao 21. No art. 21 está dito que compete à União emitir moeda. No art. 48, inciso XIV está previsto que cabe ao Congresso Nacional dispor sobre “moeda, seus limites de emissão, e montante da dívida mobiliária federal.” Vejam as correspondências entre os incisos. É por motivos óbvios: o Estado só pode agir mediante lei, mas, se compete a ele agir, tem que ser por lei prevista! Se essas são as competências administrativas e legislativas da União, que estão enumeradas, vamos ver as competências administrativas e legislativas dos municípios, que também estão enumeradas. Art. 30:

        Art. 30. Compete aos Municípios:

        I - legislar sobre assuntos de interesse local;
        II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
        III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;
        IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;
        V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;
        VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental;
        VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;
        VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;
        IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Essas são as competências administrativas dos municípios. A cada competência dessas corresponderá uma competência legislativa sobre o mesmíssimo assunto, no que toca o interesse local.
 

Competências dos estados

São as competências remanescentes. Apesar disso, o constituinte resolveu escrever duas:

Art. 25:

CAPÍTULO III
DOS ESTADOS FEDERADOS

        Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.

        § 1º - São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.

        § 2º - Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação.

        [...]

Quais são as vedadas? Estados e União, claro. O § 1º fala da competência remanescente. O § 2º fala sobre gás: competência dada expressamente pela Constituição, mediante lei. Quem legislará? O estado.

§ 3º: aqui também o Estado pode, da mesma forma que a União pode, criar regiões de desenvolvimento, como SUDAM, Zona Franca, etc. O estado também pode agrupar regiões como quiser, mediante lei complementar. Lei complementar estadual? Sim! É que não está expresso na Constituição um princípio que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reconhecido,  usado para limitar a autonomia dos estados: princípio da simetria constitucional. Por esse princípio, entende o Supremo que as normas da Constituição Federal que materializam a separação de poderes têm que ser reproduzidas no âmbito estadual. Processo legislativo: materializa a separação dos poderes: iniciativa, deliberação, discussão, votação, sanção e veto. Isso segundo a jurisprudência muito criticada, mas que prevalece. A crítica é que toda a restrição à autonomia é uma exceção, e o princípio, como sendo da autonomia, deveria estar expresso. Além daquilo, não deveria haver qualquer outra restrição.

Então vimos que existem competências legislativas e administrativas. Sendo da União ou dos municípios, elas são enumeradas. Sendo dos estados, as competências são remanescentes. Essas competências foram distribuídas da seguinte maneira: como exclusivas, que são as enumeradas, e as comuns. O que é remanescente também é exclusivo, pois o que não foi enumerado para a União e para os municípios é vedado a eles. É exclusivo dos estados. O mesmo para a competência privativa: enumeram-se para a União e municípios e são remanescentes para os estados.
 

Competências concorrentes

Além das privativas, a Constituição adotou outra repartição, oriunda de uma mudança do Estado, que assumiu caráter mais social, intervencionista, que começou a reconhecer que determinadas atividades deveriam ser compartilhadas. São precisas atividades de cooperação entre eles. A partir da primeira guerra mundial, identificou-se o conjunto de atividades que tinham que ser distribuídas para todos os entes federativos. Não poderia ser de competência privativa de um deles. Seriam mais bem desempenhadas se distribuídas para todos, sem exclusividade de nenhum. E então se adotou uma nova regra de repartição: comuns e concorrentes.

Então, no âmbito da competência administrativa, existe um conjunto de atividades que o constituinte distribuiu para todos. Está no art. 23:

        Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

        I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público;
        II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;
        III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
        IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
        V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;
        VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
        VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;
        VIII - fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar;
        IX - promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;
        X - combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos;
        XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios;
        XII - estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito.

        Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.

São todas competências de execução de políticas, de atividades, que serão reconhecidamente de interesse de todos os entes federativos, e melhor desempenhadas em cooperação entre eles. Por isso é chamada de competência administrativa comum.

Agora, se existe a administrativa, deve haver, por lógico, a competência legislativa. Tem outro nome, dado no art. 24:

        Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

        I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;
        II - orçamento;
        III - juntas comerciais;
        IV - custas dos serviços forenses;
        V - produção e consumo;
        VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
        VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;
        VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
        IX - educação, cultura, ensino e desporto;
        X - criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas;
        XI - procedimentos em matéria processual;
        XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;
        XIII - assistência jurídica e Defensoria pública;
        XIV - proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência;
        XV - proteção à infância e à juventude;
        XVI - organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis.

        § 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

        § 2º
- A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

        § 3º
- Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

        § 4º
- A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

Competência concorrente, na expressão “legislar concorrentemente”. Aqui mora o problema. Por exemplo: compete aos estados, à União e ao DF legislar concorrentemente sobre:

        VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;

Inciso XII: previdência social, proteção e defesa da saúde. Uma lei do estado de SP estabeleceu a vedação do comércio de amianto, porque faz mal à saúde. Então só vigora em SP. Mas só em SP que amianto faz mal? Então um dos legitimados do art. 103 ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade contra essa lei de SP, alegando que o estado legislou sobre matéria de interesse nacional, portanto, de competência da União. Qual foi o fundamento dessa ação direta? § 1º do art. 24:

        § 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

Olhem a redação do parágrafo: “limitar-se-á”. Então, dentro desse artigo 24, sobre saúde, proteção ao patrimônio, e mais todos os incisos a União legislará, mas sem tecer detalhes. Se ela vai a detalhes, ela começa a invadir competência que não é dela, porque questões específicas e detalhadas variarão conforme as peculiaridades locais. E quem terá competência sobre aquele assunto para legislar, por exemplo, sobre matéria ambiental? O ambiente é diferente aqui do que em SP. Se a União detalhar, tais normas não poderão incidir sobre as regiões. Então, dentro da competência concorrente, compete à União legislar sobre normas gerais, que é o que está escrito. Mas e se a União não legislou sobre normas gerais? Simplesmente não existe a lei, mas o estado precisa executar medidas, o que só pode fazer mediante lei. Então, vem o § 2º:

        § 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

Não exclui a competência suplementar dos estados. O que é competência suplementar? Se não existe a lei, o estado legisla suplementarmente. § 3º:

        § 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

O estado legislará sobre tudo na ausência de normas gerais, ainda que só aplicadas no âmbito do estado. É o que se chama de competência suplementar. Mas quando ele suplementa, mediante autorização da própria Constituição, será que a União fica impedida depois? § 4º:

        § 4º - A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

Significa que o estado até pode legislar, mas a União não renuncia sobre esse poder que tem. Quando a lei produzida pela União regular o mesmo objeto da lei estadual, no que for colidente, a legislação do estado não mais se aplicará. A do estado foi exercida enquanto não sobrevinha a da União. Por que a Constituição usou a expressão “suspende a eficácia”, mas não “revoga”? Porque não há hierarquia sobre os entes federativos.

Voltando ao caso do amianto: São Paulo legislou, proibindo o comércio de amianto. Quem ajuizou a ADI disse que isso é norma geral, portanto houve atentado às competências. Vedar o comércio de amianto é norma geral. Alegou-se que o estado invadiu a competência da União. E existe a lei federal que autoriza a venda de amianto. E aí? A norma estadual é inconstitucional. Essa é a primeira observação a se fazer. Então, na ação direta de inconstitucionalidade, questionando a lei estadual, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal foi pacifica até esse julgamento no seguinte sentido: há uma inconstitucionalidade formal, pois o estado está legislando sobre norma geral, que não lhe compete. A lei é inconstitucional. O relator foi o Ministro Marco Aurélio. Ele concedeu a liminar, reconhecendo a inconstitucionalidade da lei. Na liminar concedida, o efeito foi suspender a eficácia da lei estadual. A Lei 9868, que estabelece o procedimento da ação direta de inconstitucionalidade, diz que a liminar concedida monocraticamente tem que ser ratificada pelo Plenário. Isso porque é a uma declaração de inconstitucionalidade prévia, mas há a reserva de plenário, no art. 97. Então o ministro concede, mas ele terá um prazo para levar a questão a Plenário. E o Plenário foi palco de uma decisão muito interessante: o debate sobre o direito à saúde gerou a confusão de que a lei que estabelece que pode haver venda de amianto é federal. Chegou-se então à conclusão de que a lei contraria o art. 196 da Constituição, que dispõe sobre o direito à saúde.

Seção II
DA SAÚDE

        Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Então, eles entenderam a que a lei geral, da União, era inconstitucional por força do art. 196. Se comprovado que o amianto prejudica a saúde, a lei que contraria o princípio é inconstitucional. Quando eles reconheceram que essa lei federal é inconstitucional, qual é o efeito desse reconhecimento? No controle concentrado, houve uma análise incidental da constitucionalidade de uma outra lei! Que a lei da União é inconstitucional, portanto, desde quando ela foi promulgada. Então ela nunca existiu nem gerou efeitos. § 3º do art. 24:

        § 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

Reconhecendo-se que a lei federal é inconstitucional, o estado poderia legislar plenamente. A liminar de Marco Aurélio foi cassada. Mas aí é que está: como foi incidental, não tem efeito erga omnes.

Acabou!