Vimos na aula passada que não é possível a reedição de medidas provisórias na mesma sessão legislativa em que ela tenha sido rejeitada (não na mesma sessão legislativa que ela tenha sido apreciada). Ou seja, se a pergunta for “é possível a reedição de medida provisória?” A resposta deve ser “sim”. Desde que seja na próxima ou em outra sessão legislativa ¹. Vimos também que, se o Presidente da República edita uma medida provisória que é rejeitada antes do recesso parlamentar, que começa em 23/12, ele não poderá reeditá-la antes de terminar a atual sessão. Para simplificar, o que temos que saber é que o que não pode é o Presidente editar novamente uma medida provisória que trate da mesma matéria na mesma sessão legislativa. E isso já aconteceu. Havia, no final de 2007, a necessidade do Presidente da República de renovar a autorização da cobrança da CPMF, que tinha sua existência prevista na Constituição até 31/12/2007. Para continuar a cobrança, seria necessária uma nova emenda constitucional. Então, essa proposta de emenda constitucional não tinha como ser apreciada e o ano estava acabando. Por que não tinha como? Porque a pauta estava trancada por uma medida provisória sobre porte e registro de armas de fogo, que, obviamente, também foi obra do Presidente. Então, o Presidente da República revogou essa medida provisória. Como? Editando outra, exatamente para isso. O texto era próximo de “fica revogada a medida provisória número 379/2007”. Quando isso foi feito, a pauta pôde caminhar, e pôde ser apreciada a CPMF. O governo perdeu. O Presidente da República na verdade queria sim o conteúdo daquela medida provisória que foi revogada, mas ela havia se tornado um obstáculo para a causa mais urgente, que era a CPMF. Então, depois de destrancada a pauta, ele a reeditou, mas na mesma sessão legislativa. Ao reeditar, o PSDB e o DEM ajuizaram uma ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo, que foi deferida, pois o Presidente da República havia editado a mesma MP na mesma sessão legislativa. Isso foi em 12/12/2007. A medida provisória poderia ter sido rejeitada, mas foi o Presidente quem a revogou. O Min. Carlos Britto entendeu que a revogação se equipara à rejeição, no que chamou de “auto-rejeição da medida provisória”, no sentido de que ela não pode ser reeditada na mesma sessão legislativa. Até porque se o Presidente da República revoga e a reedita, isso configura a tentativa do Presidente da República de controlar a pauta do Congresso Nacional. Não é o Presidente da República que pode fazer isso, mas o próprio Congresso. O que está por trás? Separação dos poderes! Seria uma manifesta intervenção do Executivo no trabalho do Legislativo.
No
final desse julgamento, quando
estudarmos o controle de
constitucionalidade, o ato impugnado será defendido pelo Advogado Geral
da União.
Dia 23/12/2007 a medida provisória foi editada novamente. Note que
agora não
usamos o termo “reeditada” para deixar claro que agora estamos falando
já de
outra sessão legislativa.
Veja
o informativo
sobre essa
decisão. Nessa página, consulte o acórdão.
(Informativo 492 ², ADI nº 3964 ³.)
Impossibilidade de o Presidente da República retirar medida provisória já editada
Imagine que o Presidente editou hoje uma medida provisória, que é a espécie normativa que tem caráter de lei com efeitos antecipados. Então uma medida provisória editada hoje já está gerando efeitos. Digamos que ela fica em vigor por 30 dias. Relações jurídicas se estabelecem durante esse tempo. Daí o Presidente, ao seu próprio alvedrio, retira-a, quando decide que todos os efeitos já foram atingidos. Agora veja: quanto ao projeto de lei que o Presidente tem iniciativa: ele pode retirar? Sim. No projeto de lei, ele pode praticar esse ato chamado "retirar". Mas a medida provisória, que já produz efeitos, não pode ser simplesmente retirada. A sociedade já sente os efeitos sem que o Congresso Nacional, o representante da sociedade para elaborar as leis, a tenha apreciado. Será que o Presidente da República, depois de um tempo em que ela foi editada, pode dizer “desisti”? Afinal ela já produziu efeitos. Aí sim, isso seria realmente fraudar a atividade do Congresso Nacional. Imagine que ele retira uma medida provisória e edite outra. E assim sucessivamente. Se assim fosse, até por mais celeridade, poderíamos fechar o Congresso Nacional de uma vez por todas e o Presidente da República será o único legislador! Então não é admissível que o Presidente possa retirar medidas provisórias que tenha proposto.
Mas
não pode ele revogar a medida
provisória, caso ela
esteja trancando a pauta? Note: o Presidente pode revogar, mas não
retirar.
Independentemente
da matéria. Somente devemos ter em mente a ressalva sobre a
medida provisória que trate de impostos, que não terá
efeitos
antecipados, conforme reza o § 2º do art. 62. Então, no final das
contas, qual é a diferença então entre
revogar
e retirar? É que a medida provisória só pode ser revogada por outra,
que
será, necessariamente, apreciada pelo Congresso Nacional. A idéia é não
privar
o Legislativo da apreciação da medida provisória; se o Presidente edita
e retira, o Congresso Nacional fica sem chances de apreciar o
dispositivo.
Com
duas medidas provisórias correndo
do Congresso, em que uma delas tem o conteúdo único de revogar medida
provisória anterior, qual
deve ser apreciada primeiro? A última a chegar, pois ela paralisa a
primeira. No final, as duas deverão ser apreciadas. Pode-se rejeitar a
primeira e
converter a segunda, acontecer o contrário, ou rejeitar as duas.
Contudo, em se tratando de duas medidas provisórias de diferentes
teores, aprecia-se a primeira a chegar pois ela está mais perto de
esgotar o prazo para sobrestar a pauta do Congresso Nacional.
Medida provisória e lei anterior que trate do mesmo assunto
Olhem o nome do instrumento
legislativo: “medida provisória”. Se já existe uma lei que
trata do
assunto X, e o Presidente da
República acha que a matéria precisa de algo mais, o que ele faz? Ele
edita uma medida provisória sobre aquele assunto. O que acontece com
a lei?
A eficácia dela
fica suspensa, não
revogada. Isso porque trata-se de uma medida provisória. Então,
enquanto
a
medida provisória estiver em vigor sobre o mesmo assunto de lei
preexistente, a lei terá
sua
eficácia suspensa. Se a medida provisória for convertida em lei, aí
sim, a lei que já existia será
revogada.
E se a medida provisória for rejeitada? Daí seguirá que a lei nunca
terá sido revogada, então
ela sai da suspensão e volta
a produzir efeitos. O termo bom para se usar é suspensão da
eficácia, quando
ocorre uma medida provisória que conflita com uma lei já existente
sobre aquele mesmo assunto. Então, não se fala em revogação de lei por
medida provisória; apenas é próprio falar em revogação quando for de
medida provisória por outra medida provisória.
Proteção das relações jurídicas formadas durante a vigência da medida provisória
E se o Congresso Nacional não editar o decreto legislativo?
Raciocínio
é: um determinado assunto
está sendo proposto. O Congresso Nacional tem 120 dias para apreciar,
concordando ou não com o tratamento que foi dado pelo Presidente.
Significa então que o presidente então teve sua oportunidade, e agora é
o Congresso Nacional que está se manifestando. Ou então simplesmente
rejeitou-se a
medida provisória; nisso a Constituição diz ao
Legislativo: “você
não quis concordar com o Presidente
da República,
então você terá que
dar uma solução jurídica para as relações jurídicas elaboradas, por
meio de
decreto legislativo." Para saber o que acontecerá, § 11.
§ 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas. |
Medidas provisórias nos estados e municípios
A constituição diz, expressamente, no art. 62, caput, que...
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. |
Será que, se o Presidente da República, que é o sujeito do caput do art. 62, pode editar medidas provisórias, os chefes de Executivos dos demais entes federativos também podem editar medidas provisórias? A única previsão constitucional que pode nos dar uma pista para a resposta está no art. 25, § 2º. Qual é a localização? Título III, que diz respeito aos estados federados.
CAPÍTULO
III
DOS ESTADOS FEDERADOS Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição. [...] § 2º - Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação. [...] |
A mensagem do artigo é que o poder constituinte originário estabelece o mínimo para a organização dos estados federados e, a partir de então, eles seguem com sua autonomia.
Medidas provisórias "definitivas"?
Parece logicamente contraditório o termo. Existem sim, entre aspas. São tão definitivas como uma lei é definitiva até que dure ou seja revogada. Está previsto na Emenda Constitucional nº 32, no art. 2º. Sabemos que uma emenda constitucional é uma espécie normativa, assim como a lei ordinária, a lei complementar, o decreto legislativo, etc. Então existe o diploma legislativo da emenda constitucional. Ela pode fazer dois tipos de alteração na Constituição: alterar redação dos artigos, ou também, nesse primeiro tipo, incluir novos artigos no próprio texto Constitucional, como "art. 15-A" ou art. 251 (já que a Constituição tem 250 artigos). A emenda constitucional nº 32 tem três artigos: o art. 1º altera vários artigos da Constituição, inclusive o 62. Mas a emenda constitucional pode ser autônoma no sentido de que ela pode trazer uma regulamentação própria, como a do art. 2º da própria Emenda 32:
Art. 2º As medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional. |
Viram
o efeito? Significa que entre 12/08/2001 e
11/09/2001, se houvesse medidas
provisórias em vigor, elas ficariam indefinidamente em vigor. No caso,
umas 60.
Estão
pendentes de apreciação, e se comportam como leis, que obrigam os
indivíduos a fazer ou a deixar de fazer determinadas coisas. Se quiser
acabar com elas, o
Presidente
da República edita outra medida provisória revogando-as expressamente,
ou
o Congresso Nacional aprecia e rejeita-as.
Fim da matéria da prova.