Direito Constitucional

sexta-feira, 29 de maio de 2009

O controle concentrado de constitucionalidade no Brasil

18/06/09 às 20:16 - Corrigida passagem em que dizia que a resolução do Senado Federal produzia efeitos ex-tunc; na verdade, a resolução tem efeitos ex-nunc.

Tópicos:
  1. Ação direta de inconstitucionalidade por omissão
  2. Mandado de injunção
  3. A argüição de descumprimento de preceito fundamental
  4. Ação declaratória de constitucionalidade
  5. A repercussão geral do recurso extraordinário

Terminamos a aula passada falando da Constituição de 1988, que trouxe os novos legitimados para ajuizar a ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. Vimos que a Constituição de 1946 foi emendada pela Emenda Constitucional nº 16, de 1965, que trouxe o modelo próprio do controle de constitucionalidade que era a representação de inconstitucionalidade. Ela ficou sendo denominada genérica. Por quê? Genérica em relação à representação interventiva. Ela busca a declaração de inconstitucionalidade de um ato especificamente estadual que viola os princípios constitucionais sensíveis.

A representação de inconstitucionalidade era usada só para representação interventiva. Quando veio a outra representação, que poderia ser usada para todo e qualquer ato, sem ser necessariamente estadual, e ainda pura e simplesmente em relação a qualquer dispositivo da Constituição, não só os sensíveis, ela passou a se chamar de genérica.

Essa representação de inconstitucionalidade só poderia ser ajuizada pelo Procurador Geral da República. E aí, em 1988, a Constituição manteve o controle difuso e seus instrumentos e também manteve o instrumento do controle concentrado: a direta interventiva e a também a genérica. Só que a genérica mudou de nome: em vez de representação de inconstitucionalidade, passou a chamar ação direta de inconstitucionalidade.

Agora, em 88, não só os instrumentos do controle concentrado foram ampliados como também se ampliou o rol de legitimados, que são os que podem ajuizar a ADI. Agora, temos no art. 103 nove incisos relacionando entidades e órgãos que podem propor uma ação direta de inconstitucionalidade. Entre eles estão os partidos políticos com representação, confederação sindical ou entidade de classe, além do Presidente da República, Procurador-Geral da República, governador, Mesa da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, Mesa das assembléias legislativas e o Conselho Federal da OAB. Houve uma ampliação também dos instrumentos do controle concentrado. Até o fim da vigência da Constituição de 1967, tínhamos o controle feito pela representação interventiva; então, a partir de 88, em razão das características deste texto constitucional, o texto originário trouxe a previsão da ação direta de inconstitucionalidade, mas criou também a...

Ação direta de inconstitucionalidade por omissão

Então, a ADIO está no texto constitucional desde a redação originária. Ela trouxe essa ação direita porque o texto constitucional tinha, como tem, muitas normas que trazem uma dilação, um adiamento na tomada de decisão. Que adiamento é esse? A Constituição prevê várias normas que prevêem a edição de uma lei posterior, ordinária ou complementar, para lhe dar eficácia. Quando a norma constitucional não for amparada, haverá o cabimento da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Esse instrumento veio da Constituição portuguesa. São normas de eficácia limitada, a uma lei, a uma legislação posterior para desenvolver a eficácia da norma constitucional.

Mas como é essa ação direta de inconstitucionalidade por omissão? Se o Congresso Nacional é o órgão competente para elaborar as leis, e a Constituição diz que “lei disporá sobre tal assunto”, e o Congresso se mantém parado, a conduta é de omissão, e, portanto, inconstitucional. Se a Constituição manda e o Legislativo não faz, isso é uma contrariedade à Constituição. Reconhecendo a conduta omissiva do Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal declara a inconstitucionalidade por omissão do Congresso Nacional. Qual o efeito disso? Se se está chegando ao Supremo e se pede que seja declarada a omissão inconstitucional do Congresso Nacional, ele declara que o Congresso Nacional “está omisso”. E aí? Esta é a decisão do Supremo. Em seguida ele manda uma mensagem para o Congresso Nacional. E então, o que acontece? Acabou. Por isso ela é tão criticada! Mas a verdade é que não é possível ter outro efeito, porque o Supremo não pode obrigar o Congresso Nacional a legislar. Então, por que a nossa Constituição é cheia de normas com eficácia limitada? Na época da elaboração da Constituição, eram vários os interesses antagônicos que pressionavam os constituintes. Qual a decisão mais fácil para aquele momento? Adiar. Atende-se o interesse de um grupo pondo a norma na Constituição. Mas diz-se que só será feito em lei posterior, e eles (os legisladores de a partir de então) que se virem. O Congresso Nacional vai avaliar as circunstâncias políticas para determinar a efetiva elaboração da lei reguladora daquela norma constitucional. O que se pode na prática é, com base nessa conduta omissiva, ajuizar uma ação de indenização contra o Estado.

Mas, quanto à omissão, é verdade que há outro instrumento, genuinamente brasileiro, posto para solucionar a falta de eficácia: o...


Mandado de injunção

Enquanto a ação direta de inconstitucionalidade faz parte do controle concentrado, o mandado de injunção está dentro do grupo de instrumentos de controle difuso. O mandado de injunção é um remédio constitucional à disposição do indivíduo para suprir a omissão do Congresso Nacional em face da Constituição. Exemplo: direito de greve dos servidores públicos “na forma da lei”. Tal lei nunca foi feita para o setor público; havia apenas para a área privada. Nesse caso específico, o Supremo avançou em sua posição em relação ao mandado de injunção, que é o remédio constitucional que se lança mão quando a omissão legislativa torna inviável o exercício dos direitos constitucionalmente previstos. Está no art. 5º, inciso LXXI:

        Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

        [...]

        LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;

Assim, o Supremo Tribunal Federal avançou em sua jurisprudência. Os primeiros mandados de injunção impetrados tiveram a mesma eficácia da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, portanto rapidamente surgiram críticas ao instrumento. Quando era assim, o Supremo estabelecia um prazo de seis meses para que o Congresso Nacional elaborasse a norma. Caso contrário, o autor do mandado de injunção passará a exercer o direito independentemente da norma. Só o autor, então, sem efeito erga omnes; era apenas para o caso concreto. Pode até ser coletivo, mas para aquela coletividade determinada, então não deixa de ser caso concreto. Então, quando fosse possível, o Supremo Tribunal Federal entendia que, se o Congresso Nacional não elaborasse, a parte poderia passar a gozar o direito. Exemplo: entidades de assistência social sem fins lucrativos têm direito a imunidade de tributos, nos termos da lei. Que lei? Essa lei nunca surgiu. Essas entidades ajuizaram o mandado de injunção, e o Supremo Tribunal Federal deferiu, estabelecendo o prazo para que o Congresso Nacional elaborasse a lei. Sem a lei, elas passaram a gozar da imunidade.

Compare o inciso LXXI com o inciso LXIX do art. 5º.

        LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;

A argüição de descumprimento de preceito fundamental

Os instrumentos do controle concentrado de constitucionalidade foram previstos na Constituição originária: ação direta de inconstitucionalidade e ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Também veio a argüição de descumprimento de preceito fundamental, pelo constituinte de 88, no § 1º do art. 102:

        Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

        [...]

        § 1.º
A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.

O que é argüição? Pedido, questionamento, como em dissertação de mestrado e tese de doutorado. Então, questiona-se o descumprimento de uma norma fundamental da Constituição. É um controle de constitucionalidade com base mais restrita. Enquanto podemos buscar a inconstitucionalidade de qualquer lei federal ou estadual, na argüição de descumprimento de preceito fundamental só as normas consideradas fundamentais: direitos fundamentais, princípios fundamentais, e não toda e qualquer norma. “Na forma da lei”. 5/10/88. Essa lei só veio a surgir em 1999. É a lei 9882, de autoria do agora Ministro Gilmar Mendes. A eficácia do artigo só teve plenitude em 1999. Só então se passou a admitir argüição de descumprimento de preceito fundamental no Supremo.

Além desses instrumentos, também faz parte a...

Ação declaratória de constitucionalidade

Esta, Entretanto, só veio prevista no texto constitucional em 1993, pela Emenda Constitucional nº 3. O que se pede na ADI? A declaração de inconstitucionalidade, argumentando que a lei está viciada. Mas quando se vai ao Supremo com uma ação declaratória de constitucionalidade, isso não é estranho? Se ela foi promulgada, significa ela passou por todos os atos do processo legislativo constitucionalmente previstos, e goza, portanto, da presunção de constitucionalidade. Só que, enquanto na promulgação a lei goza da presunção de constitucionalidade, essa presunção é relativa, tanto que uma vez promulgada, ela pode ser questionada, e pode ser objeto de controle de todos os juízes e tribunais no controle difuso, no dia-a-dia. Por isso presunção relativa. Com a ação declaratória de constitucionalidade, a previsão, que era relativa, passa a ser absoluta. Se algum juiz, por ter divergido no controle difuso a respeito da constitucionalidade da lei, e ao mesmo tempo o Supremo declara a constitucionalidade, todos os processos em curso terão que passar a aplicar esse entendimento. Mas e se, com o tempo, se verifica que a sociedade mudou, e não mais há a necessidade daquela lei, e que, agora, ela é inconstitucional? O que fazer? Ela não estava blindada? O que se pode fazer é o Congresso Nacional elaborar outra lei, com o mesmo assunto, para provocar a revogação tácita da anterior. Essa nova lei nascerá com presunção relativa de constitucionalidade.

Mas há ainda outra possibilidade: se o Congresso Nacional não revoga e a lei continua em vigor, alguém pode ajuizar uma ADI. As ações do controle de constitucionalidade têm efeitos vinculantes, contra todos, exceto contra o próprio Supremo Tribunal Federal. Art. 102, § 2º:

        § 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal

Regra: sempre que se declara a inconstitucionalidade, essa declaração retroage. Quem declara? O Judiciário, portanto, retroage com relação à inconstitucionalidade. Reconhecida a inconstitucionalidade de uma lei, ela é inconstitucional desde seu nascimento. No controle difuso, a eficácia é apenas para as partes. Feito isso, o Supremo manda uma mensagem para o Senado Federal, que elaborará uma resolução para produzir efeitos ex-nunc para todos.

A repercussão geral do recurso extraordinário

O RE chega ao Supremo Tribunal Federal no controle difuso a partir do esgotamento das instâncias ordinárias. Art. 102, inciso III:

        III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

        a) contrariar dispositivo desta Constituição;

        b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

        c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.

        d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

Agora, deve-se demonstrar também que o problema terá efeito mais amplo do que apenas para as partes. Por quê? Porque o Supremo quer restringir o acesso a ele.

Esse § 3º foi inserido pelo constituinte reformador de 2004, na Emenda Constitucional nº 45. A referida lei só surgiu em 2006: Lei 11418, que regulamenta o uso do recurso extraordinário, alterando dispositivos do Código de Processo Civil e determinando que o regimento interno do STF estabeleça as normas necessárias à execução da lei.