Já falamos sobre o impulso oficial. A jurisdição não acontece enquanto alguém não a provoca. Uma vez dado, o impulso oficial dá prosseguimento automático ao processo. A própria jurisdição, através do Estado-juiz, impulsiona o processo.
Já que estamos falando em dinâmica do processo, temos rapidamente duas classificações: quando é o próprio órgão oficial que o faz, (autodinâmica), ou quando as partes o fazem, (heterodinâmica). Dinâmica é o movimento do processo. Auto remete à idéia de “automática”. O próprio Estado faz. Mas casos há em que são as partes que “tocam” o processo, então essa dinâmica recebe a nomenclatura de “heterodinâmica”.
O processo tem fases, sendo três básicas:
Postulatória: postular é requerer, pleitear. As partes fazem seus pedidos e requerimentos, tanto a autora quanto a ré. Depois disso, basta alegarem? Não. Serão necessárias provas. Daí a segunda fase, a...
Probatória. É quando as partes entregam provas. Então, são ouvidas as partes, em seguida são entregues as provas. O que falta, então? A decisão, obviamente. Então a terceira fase é a...
Decisória. Se já se alegou e provou, então a terceira fase é decisória. Essas fases ocorrerão, em regra, por impulso oficial. Aqui começamos a ver a noção de dinâmica do processo. Essas fases correrão por autodinâmica, em regra, ou, excepcionalmente, por heterodinâmica.
Mas o que faz que o processo continue andando? Devemos ter prazos para que isso aconteça. A função do prazo é justamente fazer o processo andar. Se a parte que tem que praticar um determinado ato num prazo legal, se praticá-lo ou não o processo irá caminhar do mesmo jeito. Terminado o prazo, se a parte não praticou o ato, o processo segue ainda assim. Essa é a função do prazo: não depender para sempre da vontade de uma das partes. Se ela fez ou não fez, ótimo de qualquer jeito.
Fatos, atos
e
negócios jurídicos
Agora, olhem a semelhança com o Direito Civil: por que estamos vendo isso aqui de novo? Atos, fatos e negócios jurídicos, que estudamos bem recentemente em Direito Civil, foram vistos do ponto de vista material. Aqui, estamos lidando com os fatos processuais. A diferença não é apenas de nome ou local, mas de regras próprias, que são diferentes do direito material. Imediatamente, já vemos que os fatos do direito material acontecem no mundo natural, enquanto os processuais só ocorrem em juízo. Aqueles não dependem, a princípio, de forma específica. Aqui, devemos ter em mente que as coisas funcionam exatamente do modo contrário: os fatos processuais dependerão de regra específica na maioria dos casos.
Vejam: compra e venda. Preciso de um contrato formal e escrito, com uma forma predeterminada? A resposta correta é “depende” em relação ao tipo de bem que é o objeto do negócio. Sendo imóvel, então sim, precisamos de forma específica. Que diferença isso faz? É que se não seguir aquela forma, o negócio não é válido.
Contudo, ao comprar bens móveis, não precisamos de um contrato formal escrito. Podemos fazê-lo de boca. Então a forma legal desse negócio jurídico não depende de prescrição legal. Esse é o direito material, em que, em regra, não é necessária uma forma específica. Entretanto, aqui no direito processual a regra é depender sim de forma. Mas, como toda regra, há exceções.
Primeiro ponto a entender: apesar de essa ser a regra, a doutrina trouxe um princípio processual, depois incorporado pelo legislador, que diz que a regra é que depende de forma, todavia, se for praticado de uma outra forma mas ainda assim atingir a finalidade, o ato deverá ser aproveitado. Esse é o princípio da instrumentalidade das formas. Diz que a forma foi criada para ser um instrumento para atingir determinado objetivo. Então, a regra é que haja forma legal, mas, se praticado de outra forma e atingir a finalidade, então OK. Mas até mesmo esse princípio obedece a uma coisa primordial, quando o legislador diz: “este ato deve ser praticado desta forma sob pena de nulidade.” Aí sim: se a forma não for obedecida, então não interessa se atingiu a finalidade; ele será nulo. Esse princípio está intrinsecamente ligado ao princípio da economia processual.
Ao recorrermos à doutrina, veremos uma carga de conteúdo que veremos aqui de forma mais sintética. Temos “fato” que é o gênero. O grande conjunto, em que dentro temos outro, e outro. Fato é uma série de coisas, mas nem todos interessam ao Direito. Os que interessam ao Direito são os fatos jurídicos. O fato jurídico latu sensu é aquele que cria, extingue ou modifica direitos. Temos isso dentro do processo? Fatos que podem extingui-lo, criar situações processuais, modificar o processo, enfim, modificam o direito processual? Perfeitamente.
E o fato jurídico strictu sensu? Como já sabemos, são aqueles fatos naturais que têm repercussão no mundo do Direito. Temos fatos jurídicos strictu sensu dentro de um processo? Sim, como por exemplo morrer uma das partes. O processo será suspenso ou eventualmente haverá substituição das partes. O mesmo para a morte de um dos advogados.
Ato jurídico: fato jurídico derivado da ação humana. Antes víamos os acontecimentos naturais, mas os atos jurídicos derivam da ação humana, por isso ato. O ser humano pratica. Ato está dentro da idéia de fato. Há o ato jurídico strictu sensu, sem intenção. Como alguém bater em seu carro, fato esse que gera uma conseqüência de direito. E há os outros atos jurídicos, que são os com intenção. Contratos, por exemplo. São os negócios jurídicos.
Há fato jurídico processual, ato jurídico processual e também negócio jurídico processual! Mesmo dentro do processo, que segue regras determinadas por lei, é possível fazer negócios jurídicos. As partes podem, depois de provocado o Judiciário, chegar a um acordo e resolver, ali mesmo, em juízo, estabelecer um novo valor para uma dívida. O juiz não questionará, ele apenas homologará. Esse foi um negócio jurídico processual. Alguém poderia pensar que não fosse possível haver negócios jurídicos dentro do processo pois, dado que este corre por impulso oficial, inclusive com prazos legalmente determinados, as partes não poderiam controlar as conseqüências, pois, a princípio, essas conseqüências pretendidas acabariam por distorcer o rito processual. Entretanto não é assim que devemos pensar. O processo tem sim sua forma estabelecida e os prazos, mas isso não significa que o negócio jurídico esteja proibido no âmbito do processo, em qualquer das fases, quando a lide já está formada e já sendo apreciada pelo Judiciário.
Então temos tudo isso: fato, ato e negócio jurídico processual. Temos que saber muito bem a diferença entre as diferentes espécies de fatos jurídicos em relação ao direito material e ao direito processual, especialmente com relação às nulidades.
O que vem a ser um prazo? Um período determinado para que se cumpra determinado ato, ou praticar determinado ato. O prazo, então, é um lapso, um período de tempo entre dois marcos. Temos o marco inicial e o marco final. É o marco inicial que iniciará a contagem do prazo, e o final terminará a contagem. Esses marcos são chamados de termos. Daí pequena parte da doutrina civilista estabelecer uma diferença entre termo e prazo enquanto elemento acidental do negócio jurídico: os termos seriam os marcos final e inicial, enquanto o prazo seria o intervalo de tempo entre eles. Já vimos condições e termos recentemente em Direito Civil. Condição é um evento futuro e incerto, enquanto o termo é um evento futuro e certo. Então prazo é o período de tempo entre dois termos. Temos o termo inicial e o termo final. Chamamos os termos incial e final respectivamente de “a quo” e “ad quem”. Essa nomenclatura foi posta porque é muito usada pela doutrina e pela jurisprudência. Praticar um ato depois do termo ad quem enseja preclusão, que é a perda do direito de praticar um determinado ato processual. O ato deve ser praticado dentro do prazo, ou seja, depois do termo a quo e antes do ad quem.
A preclusão se divide em três espécies:
A temporal é a perda do direito de praticar um ato em função do tempo, em função de um prazo. É o que acontece com um ato praticado depois do termo ad quem. Se for o caso, o ato será considerado inexistente.
Essa é a preclusão temporal. Mas há a lógica, que é simples: suponha que um tomador de empréstimo contrai uma dívida de R$ 10.000,00 com um alguém. Sobre esse valor também incidirão correção monetária, multa contratual, juro de mora, tudo. O devedor, na tentativa de acertar o débito, deposita R$ 10.000,00 na conta do credor. Ele atingiu sua finalidade? Não. Então esse ato pode ser impugnado: não se deve apenas R$ 10.000,00, mas R$ 13.000,00 depois da incidência dos encargos. O simples recebimento é tacitamente abrir mão do direito de impugnar. Foi em função do tempo? Não, foi da prática de um outro ato que é incompatível com a cobrança da dívida por inteiro. Receber, aqui, significa concordar. Há uma incompatibilidade lógica.
E a consumativa? Essa preclusão é assim: tem-se mais de uma espécie de defesa. Na ação contra o devedor dos R$ 10.000,00, este poderá contestar, reconvir ou excepcionar a competência, alegar suspeição, etc. Ele tem, portanto, esses três tipos de defesa à sua disposição. Pode-se usar apenas uma, duas ou até as três espécies de defesa ao mesmo tempo. Mas o prazo é o mesmo. Imagine que o procedimento comum seja de 15 dias. Nesse tempo, pode-se exercitar a defesa. Pode o réu fazer sua contestação no décimo dia? Sim, está dentro do prazo (depois do termo a quo e antes do ad quem). Isso significa que ele terá mais 5 dias para fazer a reconvenção? Negativo. Ele não terá mais nenhum dia. Se a parte exercitar sua defesa no meio de um prazo, esse prazo se consome. Essa é a preclusão consumativa: perda do direito de praticar um ato processual por ter praticado o ato e, por conta disso, consumido o prazo.
O que é um réu revel? Não é o réu que não chega a se tornar sujeito processual, pois assim sobre ele não poderia recair conseqüência alguma. Ele passa, de fato a integrar a relação jurídica processual, e figura como réu. O revel, então, é o réu que não exercita sua defesa. Tem o prazo e não o utiliza. A revelia implicará algo mais grave do que a preclusão isoladamente. Ele não perdeu só o direito de praticar o ato; haverá outras conseqüências: todas as alegações feitas pelo autor serão consideradas verdadeiras. Diremos, então, que o processo correrá “à revelia do sujeito.” Ele poderá intervir no processo depois, mas o pegará no estado em que se encontra. Se ele perde o prazo e perde o direito de praticar um ato que deveria ter praticado, não se considera que ele teve sua ampla defesa cerceada.
São classificações fáceis e intuitivas:
Então veja: se tive um prazo para a defesa, este prazo será individual ou comum? É individual porque é para uma das partes: o réu. Se temos um réu apenas, não devemos ter a menor dúvida. E se houver dez réus? O que importa é o pólo passivo da demanda. O prazo continua sendo individual. Prazo para réplica é individual do mesmo jeito: é um prazo para o autor, e pode haver múltiplos autores. Usa-se o mesmo raciocínio: desta vez é o pólo ativo da demanda que está submetido a esse prazo, daí é individual. E prazo para recurso de uma sentença? Quem pode recorrer de uma sentença? As duas partes. Se ambos perderam algo, esse prazo será comum. Isso tem uma implicação formal importante: se o prazo é comum e sou autor e você é réu, não poderei pegar os autos e levá-los para casa, ou como você faria sua defesa? Se o prazo for individual, então os autos poderão sair do lugar que os guarda.
Art. 188. Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte for a Fazenda Pública ou o Ministério Público. |
O legislador privilegiou a Fazenda Pública e o Ministério Público. Portanto, se for para contestar, é em quádruplo, se for para recorrer, é em dobro. Também é um prazo legal, pois também deriva da lei.