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Já falamos sobre recurso. Agora vamos ver o fundamento.
Temos dois tipos de erro. In iudicando: se tenho qualquer erro de procedimento que comprometa o devido processo legal, compromete-se a decisão fatalmente. A sentença, portanto, está errada, e não obedeceu ao que deveria, em termos de aspectos formais, então ela não deveria existir. Diferente é aquela sentença que está formalmente perfeita mas o juiz se equivocou na interpretação dos fatos ou do disposição legal. A sentença é certa, porém injusta. Exemplo: outro dia o professor teve que elaborar uma apelação em que o juiz interpretou os fatos de forma equivocada; o juiz entendeu que um veículo abalroou outro na traseira, e não na lateral traseira, o que muda completamente a responsabilidade; a interpretação mudou tudo. O Direito não pode ser aplicado corretamente neste caso. O que houve? Erro de fato.
Diferente é quando o juiz interpreta corretamente os fatos, mas na hora de aplicar o ordenamento jurídico ao caso concreto ele interpreta mal a própria disposição legal. A sentença, portanto, está errada.
Esses
são os fundamentos recursais.
Admissibilidade: essa palavra já dá a idéia do que precisamos: admitir ou não admitir o recurso. Se compriu os pressupostos, então formalmente está perfeito, e pode ser admitido. Quando admite-se o recurso, o Tribunal diz: “conheço do recurso.” Ou então “não conheço do recurso.” Nisso, o recurso pode ou não ser admitido. Se foi admitido, então ele foi conhecido, se não, ele não foi conhecido.
Se não foi admitido, é como se ele não tivesse existido. Neste caso, o mérito não será analisado. Se, por outro lado, ele foi conhecido, dizemos que ele foi admitido então passa-se ao mérito dele.
O juízo de admissibilidade é analisado em duplo grau: o juízo a quo e o ad quem fazem essa análise. O primeiro é o prolator da decisão, e o ad quem é o que julgará o recurso. Exemplo disso: apelação. Tive minha sentença de primeira instância. Eu interponho minha apelação no juízo a quo. Ele toma o recurso, analisa os pressupostos, admite-o, e manda a apelação para o Tribunal. Lá, o colegiado re-analisa se os pressupostos; se forem admitidos, o mérito será examinado. Então a admissibilidade é analisada tanto pelo juízo a quo quanto pelo ad quem.
O
mérito será visto, em regra,
somente pelo ad quem. Em regra
porque há exceções,
como o agravo de instrumento. Ele é apreciado pelo Tribunal, mas,
quando
interposto, deve-se informar o juiz a quo
que aquela decisão está tendo pedido de reforma. Ele deve tomar ciência
dos
motivos, e, nesse caso, ele mesmo poderá retratar sua decisão. Isso
excepcionalmente.
À medida que interponho um recurso, ele gera alguns efeitos jurídicos recursais importantes: o primeiro é o devolutivo. O que é? Tem a idéia de devolução, devolver. Simples: quando ajuízo uma ação, quero a tutela jurisdicional. O juiz me entrega a sentença, mas não fiquei satisfeito; em outras palavras, fiquei sucumbente. O que o recurso fará? Devolverá a lide para a jurisdição novamente. Esse é o efeito devolutivo. É o principal efeito recursal: devolver a matéria para uma nova manifestação da jurisdição.
Outro possível efeito recursal é o suspensivo. O nome também é intuitivo: suspende algo. O quê? A eficácia da decisão recorrida. Exemplo: saiu uma decisão condenando alguém a pagar R$ 10 mil para outra pessoa. Se houve recurso, que foi recebido com efeito suspensivo, significa que a eficácia daquela decisão está suspensa, então não pode ser executada.
Terceiro efeito importante: o regressivo. Tem a ver com a análise do mérito ser, em regra, feita apenas pelo juízo ad quem. Neste caso, significa que a lide cairá para o mesmo juízo, buscando a retratação daquele juiz. Em regra, não haverá efeito regressivo. O legislador aponta os casos. É o recurso fazer a matéria recursal regressar para o mesmo julgador.
Quarto efeito: extensivo. É simples também, veja a ilustração: se houve uma ação penal em que todos nós somos réus e fomos condenados em concurso material em função do mesmo crime. Eventualmente, apenas um de nós recorre da decisão, apontando que houve um cerceamento de defesa numa fase anterior do processo. Significa que o resto do processo está todo viciado, portanto também a sentença, que deverá ser anulada. A sentença, no caso, não pode ser anulada apenas para uma pessoa. O efeito do recurso se estenderá para todos os co-réus.
Observação:
um efeito não anula
outro. Daí vem a expressão “duplo
efeito recursal”: devolutivo e suspensivo, portanto. É comum.
Há uma série de recursos na processualística.
Quanto à natureza: temos recursos ordinários, especiais e extraordinários. Especial é interposto junto ao Superior Tribunal de Justiça, enquanto o extraordinário é interposto perante o Supremo Tribunal Federal. São para matérias respectivamente infraconstitucionais e constitucionais.
Quanto à iniciativa: da própria parte, que é sucumbente, então ela quererá recorrer. Posso ter também outra situação em que, mesmo ninguém recorrendo voluntariamente, o juiz, de ofício, remeterá para o Tribunal. Exemplo: quando a Fazenda Pública for condenada em uma decisão. Mesmo que ela não recorra, o juiz tem obrigação de remeter esse processo ao duplo grau. Não foi voluntário, mas necessário, porque a lei obriga. Por quê? Quando falamos em Fazenda Pública, o interesse é público. Então, decisões contra a fazenda terão sempre o duplo grau de jurisdição. Daí podemos dizer que quem pode exercer a iniciativa de interpor um recurso pode ser a parte ou o juiz, e a iniciativa é dita voluntária ou necessária.
Podemos ter os dois no mesmo processo? No esquema A-J-R, imagine que R = Fazenda Pública, e ela foi condenada. Podemos ter o recurso voluntário e o necessário? Sim, podemos ter um recurso voluntário parcial e também a remessa oficial.
Quanto à autonomia: temos um recurso principal e um adesivo, que é literalmente pregado naquele. Exemplo: eu queria que determinada prova pericial fosse produzida, mas o juiz indeferiu meu pedido. Posso recorrer dessa decisão? Devo. Qual é o mérito? Quis produzir minha prova, mas o juiz cerceou minha defesa. Pode ser que o processo siga e eu vença. Neste caso, não fará diferença alguma a prova que eu queria produzir. Mas eu posso ter sido sucumbente; pode ser que a prova mude a história. Então, interponho um recurso chamado agravo retido. E o processo segue. Se perder, eu, primeiramente, mostrarei o agravo, dizendo: “havia um agravo retido!” Então a primeira coisa que o Tribunal conhecerá e julgará é o agravo. Qual é o recurso principal? A apelação. Por quê? Vejam: tive minha ação, seguida de uma audiência. Nessa audiência, tive meu agravo retido. O processo não acabou ali; ele seguirá até chegar à sentença. Ela foi desfavorável; fui sucumbente. Significa que posso recorrer dessa decisão. Qual é o recurso? Apelação. Nisso, o agravo retido vai pregado à apelação. Por isso ela é o principal. Poderei até ter uma mudança na história levando a crer, posteriormente, que nada mudaria ainda com aquela prova, motivo do agravo retido. Qual recurso cuida do mérito da causa? A apelação, que é a principal.
Quanto à retratação: em regra, os recursos não permitem a retratação do próprio julgador. Mas em alguns casos sim. O recurso que permite a retratação é chamado de retratativo. O recurso que não permite é o não-retratativo. Simples assim.
Quanto ao
fundamento: ele
poderá ser comum ou especial. Estamos falando de fundamento. Qual é a
questão
principal que me leva a recorrer? Sucumbência. Então, por via de regra,
deve estar
presente a sucumbência, e basta ela para que surja o interesse
processual. Mas,
em outros recursos, o legislador exige algo a mais. Um exemplo é o
pré-questionamento.
Os dois recursos só são admitidos (no exame de admissibilidade) se,
primeiramente,
houver sucumbência e se houver
pré-questionamento
da matéria. O que vem a ser isso? O nome também é intuitivo: questionar
previamente. Então já tenho que ter discutido a matéria. Como o RE: só
admite o
questionamento da matéria constitucional se eu já tiver questionado
essa
matéria constitucional no juízo a quo.
O mesmo para o RESP: também requer pré-questionamento, mas em matéria
infraconstitucional. Exemplo: o TJDFT interpretou mal o dispositivo X
do Código
Civil. Entendi que tal dispositivo não tem aquela extensão toda
apontada pelo
colegiado, por exemplo. Discuti isso no Tribunal? Sim. Essa questão foi
enfrentada pelo Tribunal? Foi. Então, poderei fazer um RESP. Se o
Tribunal não
tiver enfrentado essa matéria, o RESP não será admitido. O que acontece
então? O
RESP está para ser interposto junto ao STJ. O juízo de admissibilidade é analisado no
juízo a quo e no ad
quem. Isso significa que o RESP tem que ser interposto primeiramente no
Tribunal
de Justiça! O Presidente do Tribunal analisará a admissibilidade recursal. Aí sim
ele
enviará para o STJ e, se este admitir o recurso, só então analisará o
mérito. Pode
ser, portanto, que o juízo de admissibilidade tenha sido negativo. E agora? Só
me
resta me conformar? Não. Recurso de agravo, direto para o Superior
Tribunal de
Justiça, para analisar essa admissibilidade.
E o RE? Mesmo raciocínio. Apenas troque o Tribunal competente para o STF, e a matéria deve ser constitucional.
Por último, e se houver pré-questionamento aqui na Primeira Vara Cível do DF? O raciocínio permanece: ela mesmo analisará a apelação. Depois de decidir sobre a admissibilidade, só então remeterá ao TJ.
Acabamos a matéria!