Teoria Geral do Processo

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009


Introdução à Teoria Geral do Processo

O que é a Teoria Geral do Processo?

É, em geral, como as coisas vão acontecer.  Para começar, podemos entender a Teoria Geral do Processo como as regras que estão predeterminadas. É como as regras de um jogo. Entretanto, não se tratam exatamente de regras. O processo só seguirá regras excepcionalmente. Em geral o jogo já está acontecendo, e as regras já existem. Vejamos o árbitro de futebol: ele já dispõe das regras, mas o que virá dali será produto de interpretação dele: ele determinará, por exemplo, se uma batida foi ou não falta. O magistrado, no caso do Direito, toma o caso concreto, analisa a situação fática para poder aplicar o ordenamento jurídico àquele caso. Há sim uma valoração subjetiva, mas ele tem que partir daquele ponto prefixado. 

Se há lacunas na lei, como critério de integração das normas, o juiz poderá se valer de analogia, costumes, e princípios gerais do direito, como diz o já visto art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil:

Art. 4o  Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Mas para o processo serve, afinal? Para resolver um problema! Arrumar a solução do problema em relação ao ordenamento jurídico. O fim último é a justiça, a ser realizada através da busca dessa solução.

O processo é um instrumento do Estado para a resolução dos litígios.

Ele surge também para sanar problemas no cumprimento das obrigações. O que fazer se os outros meios se exaurirem? Buscar o Estado para que este substitua a vontade de uma das partes, forçando-a a cumprir sua obrigação. 

O professor afirma que Teoria Geral do Processo é a disciplina mais importante do curso de Direito. Os Códigos, em geral, trazem o Direito material. Eles trazem vários direitos e obrigações para nós. O Código Civil, por exemplo, traz a obrigação a respeito dos contratos. Obrigação e direito, recíprocos, como vimos em Introdução ao Estudo do Direito.

Mas, no mundo fático, isso gera problemas. Eventualmente as partes não cumprem suas obrigações, e o litígio surge. O que fazer? Buscar o Estado, através do processo. Não adianta nada ter o direito material se não houver nada para garantir o exercício desse direito. Como conseguir sua eficácia? Com o processo. Então, o direito é apenas declarado, pois ele já existe. O processo é o que salvaguarda o direito.

Outra coisa: temos duas instâncias. A primeira e a segunda, respectivamente, no caso do DF as Varas e o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Os Tribunais Superiores são instâncias superiores, mas não são consideradas “terceira instância”. Não é exatamente vertical a passagem para o Superior Tribunal de Justiça depois para o Supremo Tribunal Federal. Isso porque só há a possibilidade de recurso para o Superior Tribunal de Justiça em questões mais restritas. Não se analisam mais fatos, apenas decisões. Idem para o Supremo Tribunal Federal. Por isso são chamadas “instancias superiores” e também é por isso que temos a concepção de que só temos a primeira e segunda instâncias. Fatos só são analisados nelas. Nas superiores, somente o Direito. No âmbito do STJ analisam-se as questões infraconstitucionais; no STF, questões constitucionais. Se for o caso, apresenta-se um RE (recurso extraordinário) ao Supremo. Se o caso subir apenas para o STJ, faz-se um recurso especial (não extraordinário). É possível, portanto, ir diretamente da segunda instância para o Supremo.

Uma coisa é discutir e analisar os fatos. Outra é conseguir prová-los.  A alegação é feita na primeira instância. Por exemplo: Lincoln é procurado, preso, acusado, processado e condenado por um homicídio que não cometeu. Ele alego, desde o princípio, que é inocente, que não estava naquele local naquele horário, etc. Ainda assim a promotoria consegue convencer o Tribunal do Júri de que Lincoln culpado e este é o veredicto. Sua defesa poderá recorrer à segunda instância. Feito isso, a decisão é mantida, e Lincoln continua preso. Ainda é possível recorrer para as instâncias superiores, mas nenhuma questão fática será analisada nem nenhuma nova prova ou alegação será incluída nesta etapa; apenas as questões relacionadas às decisões e ao Direito serão apreciadas. Lembre-se que Lincoln declarou-se inocente desde a primeira instância. Logo, a princípio ele não terá mais a chance de apresentar novos elementos documentais nesta fase do processo. 

Digamos, agora que anos se passaram e Lincoln continua preso, e jurando  inocência todos os dias. Felizmente, seu irmão Michael descobre uma tecnologia, consegue provar cientificamente sua precisão, e chega à conclusão, através dela, que Lincoln não poderia ter estado ali àquela hora do dia, o que dá a ele um álibi sólido e antes desconhecido pela justiça. O que acontecerá? Deve Lincoln permanecer preso pois a sentença penal condenatória já transitou em julgado? Ou deve ele ter mais uma chance. A resposta é: "processo". Sim, ele deverá dar entrada em um novo processo pedindo a revisão daquela sentença com base em novas provas obtidas. Note que este é um processo novo e autônomo.¹

Temos isso na organização judiciária. Há a Justiça Comum e a Justiça Federal. Fora a Justiça do Trabalho e a Eleitoral. Cada uma delas tem a primeira e segunda instâncias. Da segunda diretamente para o Supremo Tribunal Federal, ou para os Tribunais Superiores: Tribunal Superior Eleitoral ou Tribunal Superior do Trabalho. Para a que tudo isso? É uma divisão de competências.

Quem compõe o Estado Federal? União, estados, municípios e o Distrito Federal. Entre uma lei federal e uma estadual, qual deve prevalecer? A resposta é: depende da matéria. Temos esses três entes (União, estados e municípios), todos contemplados na Constituição com competências próprias. Cada um poderá legislar a respeito de seus assuntos. Então, se o assunto é da competência do município, a lei que deverá prevalecer será a municipal. Essa é a regra. Lei federal que cuida de assunto estadual é deverá ser declarada inconstitucional.

Isso tudo significa que temos um ordenamento jurídico. Alguém pensou em tudo isso, nessa sistemática! Há uma lógica. Tenha sido bem ou mal, alguém pensou, e essa é a lógica do ordenamento jurídico que nos servirá de base.

Não adianta ter o direito se não tiver como fazê-lo valer. Como forçar a parte que nos está impedindo que realizemos nossa vontade, então? A resposta é, mais uma vez, "processo".

Vejam as decisões do Superior Tribunal de Justiça a respeito de questões processuais. Veremos que seus conteúdos se aprofundarão até que a matéria chegue à na Teoria Geral do Processo. É o fundamental de todas as disciplinas que vêm depois (Processo 1, Processo 2, 3, 4 e 5) pois saberemos de onde partir. Do contrário, teremos dificuldade em todas as outras disciplinas de processo por não saber a base, o fundamental daquilo tudo. A aprendizagem de tais matérias subseqüentes, dessa forma, será mecânica, não significativa.

No final das contas, vamos estudar a origem das provas do processo.

Vamos agora falar sobre os bens jurídicos. Eles são, de regra, finitos, alguns mais raros que outros. Até aí tudo bem. Suponhamos agora que tenho uma disputa com a Isabella, que comprou um apartamento do Joãozinho. Ela pagou o combinado, eles foram ao cartório de notas, lavraram a escritura de compra e venda para poder, então, celebrar o negócio feito com o apartamento. Depois, muito feliz pela aquisição, Isabella foi estourar um Champagne. Passado um mês, o Joãozinho encontra alguém e vende o mesmo apartamento para essa pessoa. Ela vai com ele, feliz da vida, ao cartório, realiza todos aqueles procedimentos e sai mais feliz ainda. Pergunta-se: de quem é o imóvel, neste momento?

Incrivelmente, não é de nenhum dos dois compradores. Bens imóveis não têm transferência tão simples. Isabella deveria ter ido, em seguida, no cartório de registro de notas e aí sim, a partir daí, ela poderia seguramente se considerar dona do apartamento. Infelizmente o que ela e Joãozinho foram fazer no cartório não foi, exatamente, um registro. O cartório de registro de imóveis, que é o que ela deveria ter pedido a Joãozinho para acompanhá-la, é circunscricional, ou seja, só existe um para cada área predeterminada, então aqui não teria como fraudar. Pessoa sensata deveria, primeiro, verificar se o imóvel tem algum impedimento, buscando sua certidão de ônus reais.

Acabou de surgir um conflito intersubjetivo (entre dois ou mais sujeitos de direito). Um dos sujeitos pode ter resistido à pretensão. Uma das partes, nesse caso, deseja que o interesse da outra sucumba em relação ao dela.

É neste momento que surgiu a lide.

Denomina-se lide o conflito intersubjetivo de interesses qualificado por uma pretensão resistida.

Observação: tentem não estudar, o quanto mais possível, decorando. A aprendizagem aqui deve ser significativa. A frase acima é uma candidata a ser decorada. Não faça isso. O conflito acima deve ser qualificado, mas de que forma? Por uma pretensão resistida por uma das partes. Tudo tem lógica, felizmente.

Portanto, mais tecnicamente, o processo serve para solucionar as lides.

O processo surgiu como um instrumento que o sujeito de direito tem para resolver as lides. E como ele fará isso? O cidadão, buscando a ajuda do Estado, através de seu representante (magistrado), para que este analise os fatos dessa lide e as provas para que o direito seja declarado: ele buscará no ordenamento jurídico a solução para o conflito no caso concreto. Note o número de lides que podem surgir de um fato. Cada lide tem um interesse diferente em jogo. Então, haverá uma pretensão diferente. Para cada pretensão, uma lide. Separam-se os problemas. Litígio é uma palavra que dá a mesma idéia.

A lei, por si só, é eficaz, porque gera efeitos. Mas a eficácia fática pode ter sido violada. É para isso que serve o processo.

Autocomposição: o processo compõe as lides. Mas o problema pode ser resolvido entre as partes mais simplesmente, sem provocar o Estado. ²

Arbitragem: em vez do Estado, busca-se um terceiro para resolver a lide.

Dica: tudo na vida é uma questão de método. Então, se temos um bom método, temos meio caminho andado. Um bom método para estudarmos seja o que for é, primeiro, ter uma visão geral da coisa. Depois, chegamos um pouco mais próximo dela, vendo o que a compõe. Em seguida, fazemos o estudo mais aprofundado. Portanto, para estudar para concurso, comece pela lei, na forma seca.

A maioria dos problemas intersubjetivos ocorrem em relação aos bens jurídicos. A escassez é o pressuposto para a vontade de ter. É justamente para o convívio em sociedade que precisamos de regras.

Outra dica: não estudar no método decoreba, mecanicamente. Isso dá “Síndrome de Windows”³. Por isso que 80% do nosso conhecimento será formado pelas respostas dos porquês. Respostas para "o que é isso" dificilmente constituirão 20% do conhecimento. É necessário, portanto, estudar criticamente, e entender a lógica do objeto.


1- Este parágrafo e o anterior foram elaborados por mim mas com base na explicação mais curta que o professor deu. Apenas escrevendo agora que me ocorreu a dúvida se este novo processo tem uma outra lide ou não, já que a pretensão é a mesma: a de se inocentar. Portanto, não confiem 100% na palavra "autônomo".

2- O professor deixou claro que a resolução do conflito ficará apenas entre as partes, mas não deixou claro se isso acontecerá absolutamente sem a intervenção do Estado. Penso que há casos em que o Judiciário deve ser provocado exatamente para que este tome conhecimento do acordo ao qual chegaram as partes.

3- Aqui referido como “ato de travar”. O incrível é que este Windows 95 no qual digitei isto jamais travou em minha mão, e eu o tenho desde 1996 e ele nunca foi formatado.