Teoria Geral do Processo

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Teoria geral da prova


Tópicos:

  1. Introdução e destinatários da prova
  2. Objeto da prova
  3. Função e classificações da prova
  4. Quanto ao objeto
  5. Quanto à forma
  6. Quanto à natureza
  7. Verdade
  8. Ônus da prova
  9. Espécies de fato


Introdução e destinatários da prova

Para que serve a prova? Para provar as coisas, oras. Muito bem. Mas o que significa provar? Formar a convicção. Com a prova, buscamos formar uma convicção. Não adianta meramente alegar, informar, dar noticia de um fato, é necessário constituir provas dele. A partir desse momento, estamos trazendo convicção para o destinatário da prova. E quem é o destinatário principal ou primário da prova? O juiz. Porque é ele quem decidirá. É ele quem, em princípio, precisa ter convicção a respeito dos fatos. As partes também têm que ter convicção, então dizemos que elas são destinatárias secundárias da prova. Por que é necessário que elas também sejam destinatárias das provas, ou melhor, porque a prova também tem que ser direcionada a elas? Para preservar o direito ao contraditório. Então, um sujeito processual alega algo, e a parte contrária fala a respeito desse mesmo fato. O primeiro busca provar o que alegou, e a parte contrária buscará provar o contrário. O princípio do contraditório leva então a que tenhamos esse tratamento bilateral.

 

Objeto da prova

E o objeto? Qual o sentido, o que queremos com a prova? Provar fatos. Quaisquer fatos? Quais fatos que interessam provar? Os fatos pertinentes à lide, ou à pretensão. A lide existe justamente em função da pretensão. Por diversas vezes repetimos o conceito de lide, que é fundamental: um conflito intersubjetivo de interesses qualificado por uma pretensão resistida. Então, se a lide é o problema a se resolver, ela deve estar ligada a fatos. O juiz tem que conhecê-los para aplicar o ordenamento jurídico ao caso concreto. Esse é o objeto: os fatos da pretensão, os fatos da lide. O que é mesmo pretensão? Interesse. A repetição é para internalizarmos logo esses conceitos tão básicos de uma vez por todas. Quando falamos em pretensão, falamos em subordinação do interesse alheio ao nosso. É só lembrar o que é lide para daí tirar essa idéia. O que um quer? Que o interesse do outro se subordine ao dele. A partir do momento que essa pretensão é resistida, surgiu a lide.

 

Função e classificações da prova

A prova tem por função formar a convicção do julgador.

Há vários tipos de classificação possíveis para as provas. Primeiramente, vejamos quanto ao sujeito. A prova pode ser classificada como pessoal: exemplos são prova testemunhal e o depoimento pessoal; no processo penal o réu tem que ser ouvido, então o juiz determina uma audiência para que ele preste seu depoimento pessoal. No cível também: condutor que bate no veículo de outrem também tem direito de dar seu depoimento. O depoimento pessoal é dado por uma das partes, autora ou ré. Se a pessoa depondo não é autor ou réu, é testemunha. Então cuidado com a confusão: todos depõem, mas o depoimento pessoal é o dado necessariamente por uma das partes. Testemunha é um terceiro em relação à lide. Terceiro desinteressado; pois se for interessado, ele entra na hipótese do inciso IV do Código Civil e não poderá ser testemunha (será imprestável).

A prova é pessoal, portanto, porque é uma pessoa que a faz.

Prova real: quando o objeto da prova não é uma pessoa; o que está lá para produzir é uma coisa, como a arma do crime. Os estilhaços de vidro, marcas de frenagem, sangue de vítimas de acidente, tudo isso são provas reais exatamente porque não pessoais. Essa é, portanto, uma classificação quanto ao sujeito. Pela classificação subjetiva, ou é uma pessoa, ou é uma coisa que faz a prova.

 

Quanto ao objeto

O objeto da prova pode ser direto ou indireto. O parâmetro é o que se pretende provar. Então vejam: quando é direta, estamos provando a dinâmica do acidente, por exemplo. Mostram-se as marcas, pedaços de carro, testemunhas que presenciaram, tudo ligado diretamente ao fato da lide. Agora vamos ver um exemplo da indireta: o condutor que está sendo acusado de atropelamento. Ele prova que, naquele dia, ele estava no Rio de Janeiro e não aqui. Ele provou algo do fato? Nada. Ele provou que estava em outro lugar naquele dia, portanto, é uma prova indireta ou circunstancial. É uma circunstância que afasta o fato. Então, ao considerarmos a prova quanto ao objeto, temos em mente o fato da lide, que se pretende provar.

 

Quanto à forma

Pode ser:

Nossa doutrina coloca a prova testemunhal, mas o professor prefere a denominação “oral”. Por quê? Porque testemunhal é uma espécie de prova oral. Temos duas espécies de prova oral, uma, a testemunhal e outra, o depoimento pessoal. Note que a prova testemunhal é dada por um terceiro desinteressado na lide, enquanto o depoimento pessoal é dado pela parte. Ambas são orais.

Documental: um contrato, um cheque, uma nota promissória, tudo que faz prova. Contrato é prova do que? De que um negócio jurídico foi celebrado. Mas como assim? Dos fatos que levaram à convergência de interesses. Uma compra e venda, por exemplo. Se o sujeito A quer comprar e o B quer vender, vejam a convergência de interesses de manifestando. No contrato, está discriminado o objeto e a concordância. Ele é, portanto, prova os fatos do negócio jurídico. Então, é uma prova documental. Cheque: nada mais é que uma prova de uma dívida (ordem de pagamento à vista.) Apesar de que até o STJ reconhece que ele é quase uma nota promissória, já que ele pode ser pós-datado. É o que chamamos de "cheque pré". Mas a promissória está quase em desuso porque o cheque assumiu sua função.

Material: pericial, pois é a pericia que analisará o conjunto das provas materiais (ou reais). Num acidente, vê-se que velocidade estava o condutor para se chegar à conclusão de quem foi o culpado; assim temos a prova pericial.

 

Quanto à natureza

É uma discussão conceitual, que cai muito em partes subjetivas de várias avaliações. Natureza da prova: temos três correntes. a primeira sustenta que a natureza da prova é de direito material. A segunda diz que é de direito processual e a terceira defende que é mista. Mas por que de direito material? Porque está diretamente ligada ao ato, fato ou negócio jurídico. Então é da própria essência do ato, por isso a natureza deve ser de direito material.

Outra corrente alegará que, se a prova não for trazida ao processo, ela não servirá de nada, então isso seria o mesmo que não provar. Por isso a natureza da prova deve ser de direito processual.

A visão mista da é que foi buscada nos últimos tempos, com a idéia de se contemporizar as duas concepções. Mas a prova só tem razão de existência na medida em que as partes estão sujeitas ao não cumprimento de uma obrigação pela outra. Daí vem a necessidade da prova. Portanto a natureza processual ficou mais preponderante.

Comprei um chocolate hoje. Fiz um compra e venda. Mas cadê a prova? Não tenho! Não peguei recibo nem nota fiscal, e pior ainda, paguei em dinheiro, logo não se pode rastrear a transação.

 

Verdade

O que vem a ser verdade? Temos que ir ao contexto filosófico para buscar “a verdade sobre a verdade”. Não nos interessa aqui, porque se levarmos isso em consideração, literalmente não conseguiremos resolver a lide. Logo não podemos pensar na concepção filosófica; temos, portanto, que ter duas concepções de verdade, sendo que, para o Processo Penal, o sistema não aceita se a verdade não for aquela que tenha a perfeita correspondência com a realidade.

Comprei o chocolate. E se alguém imediatamente diz que eu furtei o chocolate, e não o comprei. Assim, surge uma dúvida. Se não ficar perfeitamente provado que eu realmente furtei, poderei ser condenado? Não. Por quê? Por causa do processo in dubio pro reo. Ou seja, ou consigo a verdade conforme a realidade, com exata correspondência a ela, ou não poderei ser condenado. Isso se chama verdade material, que é a verdade buscada obrigatoriamente no Processo Penal. Agora, para o âmbito civil (que é tudo o que não é penal, como trabalhista, cível, eleitoral, enfim, tudo que não for criminal), não precisamos da exata correspondência à realidade. Muitas vezes, alguns indícios já são suficientes para formar a convicção do juiz para que ele declare, constitua ou condene. O processo, então, produzirá essa verdade, mesmo que, de repente, na realidade o sujeito não tivesse, por exemplo, aquela obrigação. Suponhamos, então, que eu descumpri um contrato, e, por ele, eu teria que pagar uma quantia X. O que terei que fazer? Provar que eu já efetuei o pagamento. Como fazer isso? Apresentando nota fiscal ou recibo. Sem recibo, acabei tendo que pagar de novo. Mesmo que na realidade eu tenha pagado. Essa é a verdade formal, a verdade produzida pelo processo. O processo produziu a verdade de que eu contraí a obrigação e não paguei.

Isso nos deixa irresignados. Temos, então, que preliminarmente nos conformar com essa concepção de que o Processo Penal trabalha com a verdade real e o Processo Civil com a verdade formal. Podemos até encarar assim: o Processo Penal não aceita a verdade formal porque, por mais que o juiz não disponha das provas, ele não poderá condenar. Como continuamos indignados com isso, o legislador entra em cena trazendo o art. 130 do Código de Processo Civil:

        Art. 130.  Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

O juiz pode buscar a verdade. Não é, agora, uma incumbência apenas das partes. O juiz, para prestar a jurisdição, pode buscar as provas. Como? Uma testemunha falou “que determinada pessoa presenciou o fato.” Então, o juiz a intima para ouvi-la. O juiz, portanto, atua na busca da verdade material. Antes, portanto, tínhamos uma sistemática bem separada: verdade formal no Civil, verdade material no Penal. A jurisdição é a obrigação de buscar a verdade material para aplicar o Direito corretamente.

 

Ônus da prova

Também chamado de “encargo processual”. Há que se fazer uma distinção entre ônus e obrigação. O ônus é algo do indivíduo para com ele mesmo, enquanto obrigação é algo do indivíduo para com outro. O professor tem uma obrigação para conosco. Mas ele tem um ônus dele, do oficio dele, do conjunto de atividades dele, que ele assume com ele mesmo. Então, quando você afirma para o juiz que alguém bateu em seu carro, você deverá mostrar como se constituiu esse fato. Então, esse ônus é do indivíduo. Quem alega tem o ônus de provar. Isso vale tanto para autor e réu: ambos têm o ônus processual de provar o que alegam. Não basta falar, deve-se provar. Nasce, portanto, uma coisa: um critério formal, o ônus do pedido. “Quero que o sujeito seja condenado a pagar algo.” Preciso, entretanto, provar que ele tem a obrigação de pagar. Portanto, cuidado com outro mito: o ônus não é de quem acusa, mas de quem alega. Esse é o critério formal para a determinação do ônus da prova.

Então vamos para outro critério, o material: é a idéia anterior esmiuçada. Quem afirma deve provar. Só o autor faz pedido em juízo? Não, o réu também faz. Está no art. 333 do Código de Processo Civil:

        Art. 333.  O ônus da prova incumbe:

        I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

        II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

        Parágrafo único.  É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:

        I - recair sobre direito indisponível da parte;

        II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.

O artigo traz as...

 

Espécies de fato

Vamos analisar cada um dos tipos de fato citados no artigo.

Constitutivo: o autor tem que provar o fato que constituiu o direito que ele pleiteia. Pode ser um negócio jurídico de compra e venda de um automóvel. O réu, por sua vez, terá interesse em provar um fato impeditivo, modificativo ou extintivo daquele direito. Naquele exemplo nosso do contrato, se faço prova do contrato, faço prova constitutiva do meu direito. Porém o réu surge e diz: “calma aí. Nesse contrato aí você ficou de me entregar o carro no dia 10 do mês passado. Hoje são 11 e você não entregou ainda. Portanto, não sou obrigado a te pagar enquanto você não me entregar o bem.”

Esse, portanto, é um fato impeditivo: o bem não foi entregue conforme combinado.

Modificativo: o sujeito vem cobrando, mas depois assina-se um aditivo contratual acertando que de agora em diante se pagará em 12 vezes. Mesmo depois desse acordo, o sujeito (autor) está cobrando tudo de uma vez. Cabe ao réu, então, alegar fato modificativo daquele direito o qual o autor reivindica. O aditivo contratual é exatamente esse fato.

Extintivo: se o devedor já pagou sua obrigação, o direito que o autor da ação pede em juízo já se extinguiu.

Isso é tudo lógico; o legislador apenas colocou nomes para esses tipos de fato.