3 - O contrato social deverá conter as normas reguladoras da vida
social da sociedade
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O art. 997 do Código Civil traz as cláusulas essenciais que deverão constar no ato constitutivo da sociedade empresária, sem os quais ele não será registrado na Junta Comercial:
SUBTÍTULO II
Da Sociedade Personificada CAPÍTULO I Da Sociedade Simples Seção I Do Contrato Social Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará: I - nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas; II - denominação, objeto, sede e prazo da sociedade; III - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária; IV - a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la; V - as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços; VI - as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições; VII - a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas; VIII - se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais. Parágrafo único. É ineficaz em relação a terceiros qualquer pacto separado, contrário ao disposto no instrumento do contrato. |
Relembrem-se que são cláusulas sem as quais o contrato não é arquivado. São as essenciais. Há também as cláusulas acidentais, que são as demais cláusulas que os sócios podem incluir à vontade, respeitando as proibições legais (determinar que um sócio não terá participação nos lucros, ou que não terá participação nos prejuízos, que somente um contribuirá com capital para a sociedade, etc.) Tudo que não está aí no art. 997 fica a critério dos sócios colocar ou não no contrato.
Quais as essenciais? Qualificação dos sócios, nome civil, profissão, estado civil, nacionalidade, endereço, documento de identidade, número do CPF; se for pessoa jurídica, CNPJ, sede e nacionalidade dos sócios. Estes são os requisitos presentes apenas no inciso I. No inciso II, vemos “objeto social”, que é o ramo de atividade econômica que a sociedade irá explorar. Nome empresarial: deve constar no contrato social. Também o local da sede, que é onde se encontra o representante legal da pessoa jurídica, o local de decisões, onde se exerce seu poder decisório. Ela pode ter sede, matriz, filial, agência, sucursal, mas terá que indicar todas as especificidades no contrato social.
Prazo de duração: a pessoa jurídica pode ter prazo de duração indeterminado ou determinado. Essa condição também terá que constar no contrato social.
Capital social e cotas de cada sócio: são as cláusulas do inciso III. O capital social é o valor que os sócios injetam para formar o patrimônio da pessoa jurídica. Pode ser em dinheiro, créditos ou bens, móveis ou imóveis. Toda contribuição tem que ser especificada.
Nomeação do administrador: quer dizer que o contrato social tem que especificar quem será o responsável pela administração da pessoa jurídica. Na sociedade em nome coletivo e na sociedade em comandita simples só pode ser administrador um dos sócios. Na sociedade em nome coletivo todos têm responsabilidade solidária e ilimitada, enquanto na sociedade em comandita simples há sócios comanditários e sócios comanditados, estes com responsabilidade ilimitada e poder para participar da gerência da sociedade, enquanto aqueles só têm responsabilidade na medida do capital investido, sem direito a gerir a sociedade. Na sociedade limitada pode o administrador pode ser tanto sócio quanto pessoa não-sócia. Dependerá de cláusula contratual dispondo sobre isso. Ou seja, a autorização pode estar no contrato, mas a indicação de quem será pode estar no próprio contrato ou em documento separado.
Finalmente uma cláusula de reserva de mercado: o que é isso? É a necessidade de visto de advogado, conforme o Estatuto da Advocacia, a Lei 8906/94, art. 1º, § 2º:
Art. 1º São atividades privativas de advocacia: [...] § 2º Os atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes, quando visados por advogados. |
Por
que isso? Antes de ser
incluído isso na lei, isso poderia ser feito por um contador, por
exemplo. Ele
dava o visto ao contrato social para que então pudesse ser arquivado.
Depois do
Estatuto da Advocacia somente com o visto do advogado que o ato
constitutivo
pôde ser arquivado na Junta Comercial. A idéia era diminuir os erros
que freqüentemente
eram cometidos na edição dos atos constitutivos das sociedades
empresariais, o
que fazia que o Judiciário tivesse que ser buscado desnecessariamente e
muitas
vezes.
O que são? São cláusulas não essenciais, não obrigatórias. Dependem da vontade dos sócios incluí-las ou não no ato constitutivo. O critério para o setor privado é a permissão para fazer tudo que não está proibido. Há requisitos mínimos; fora deles, qualquer coisa pode ser colocada sem problema. Por conta dessa generalidade, dessa possibilidade ampla, citamos dois exemplos: um é a cláusula arbitral, que é uma cláusula que regula como será escolhido um árbitro para decidir, resolver, no sentido de julgar, as pendências entre os sócios, litígios e discordâncias internas entre eles. Também a cláusula que regula o reembolso de sócios dissidentes de operação contratual. Normalmente um sócio que não concorda com alguma alteração contratual, desde que tenha até 25% do capital social (se for qualificado como sócio minoritário, que é a classificação), a lei lhe assegura o direito de retirada. Quem sai da sociedade tem o direito de receber sua participação no patrimônio da sociedade. Nisso, não devemos confundir: receber a participação no patrimônio, não no capital. Isso porque o sócio entra com uma participação no capital, mas, depois de um tempo em que o capital é posto a funcionar, o patrimônio pode estar maior ou menor, dependendo de a sociedade ter tido lucro ou prejuízo nesse período.
Por
último: a cláusula que regula
os efeitos da morte de sócio. Em regra, alteração de contrato social
precisa,
nas sociedades em nome coletivo e na sociedade em comandita simples, de
unanimidade, aqui entendida por 75% do capital. Ou seja, a morte de um
sócio,
se não estiver expressa no contrato, pode implicar na extinção da
pessoa
jurídica. Isso porque os sócios remanescentes não estão obrigados a
aceitar a
inclusão do herdeiro do falecido ou de qualquer outra pessoa, e também
porque a
sociedade não pode perdurar com apenas um sócio. Então o ideal é que o
contrato
social já traga disciplinado o que acontecerá: previsão de inclusão do
herdeiro
ou extinção da pessoa jurídica. É uma cláusula não-essencial.
Escrita. Tem que ser em forma de documento. Esse documento pode ser público ou particular. Público é o documento feito no Cartório de Notas, o cartório oficial, estatal. O particular é o documento que é feito sem o conhecimento do cartório. Uma forma não vincula a outra. Um contrato social pode ser feito por escritura pública e alterado por alteração contratual particular e vice-versa. O único detalhe é na ocasião em que o capital é integralizado com bem imóvel. Se a constituição da sociedade que recebe como parte do capital um bem imóvel é feito por contrato particular, para transferir o imóvel do nome do sócio para o da pessoa jurídica, tem que ser feita uma escritura pública e a transferência tem que ser feita pelo registro imobiliário. Agora, se o contrato social for feito por escritura pública e nele já constar todos os elementos que são essenciais para a transferência do imóvel, fica dispensada a escritura pública, ou seja, o próprio contrato social arquivado na Junta Comercial pode ser levado a registro no Cartório de Imóveis. Mas vejam bem: como a transferência de imóvel no Brasil exige escritura pública, o contrato deve ser feito por escritura pública, e é preciso que o contrato social contenha os elementos relativos ao imóvel que são necessários para a transferência do imóvel. Basta que o contrato social tenha todos esses elementos relativos ao imóvel que são necessários à escritura de transferência do imóvel. Assim sendo, não será necessária a escritura pública.
No esquema também vemos o que o contrato social pode ser oral apenas para garantir direitos de terceiros não-sócios. O que vem a ser isso? Na aula passada, falamos, quando estudamos sociedade irregular ou de fato, que há uma particularidade: ela não existe para o Direito a não ser para ser responsabilizada em relação a terceiros. Ela não traz nenhum direito para os sócios de uma sociedade de fato. O terceiro pode provar que existe uma sociedade irregular para receber indenização. Mas o sócio de sociedade de fato só terá algum tipo de comprovar a existência de sua atividade em relação ao terceiro se houver um contrato escrito registrado na Junta Comercial. Dessa forma, quando se trata da forma do contrato social, é admita a prova oral apenas para responsabilizar a sociedade de fato quanto a terceiros. É dizer: não vamos confundir porque não existe eventual forma de registro de sociedade com prova oral. Somente o terceiro poderá fazê-lo, para provar a existência de uma sociedade constituída irregularmente. Assim o MST é responsabilizado. Pode-se provar por prova oral. Se a sociedade existe de fato, ela pode provocar prejuízo. Não tem documento nenhum, então o terceiro ficaria desamparado se não houvesse a forma oral de produção de prova.
Tanto
uma firma que é constituída
por escritura pública pode ter o contrato social alterado em documento
particular, como uma pessoa jurídica sociedade empresária que foi
construída
por contrato particular não está impedida em sofrer alteração por
escritura
pública. Nada está vinculado; a forma primeiramente utilizada não
necessariamente deverá ser repetida nas eventuais alterações. A única
particularidade é em relação à integralização de capital mediante a
entrega de
bem imóvel. Neste caso, pode-se dispensar ou não a lavratura de uma
escritura
pública só para a transferência do nome do sócio para a pessoa
jurídica. O
próprio contrato pode ser transcrito no cartório de imóveis que faz a
escritura.
Já vimos as condições essenciais para a constituição, e agora vamos ver as condições para a alteração do ato constitutivo.
O contrato social pode ser alterado desde que observados os requisitos de validade, os pressupostos de existência e as cláusulas essenciais. Na aula passada, vimos os dois primeiros. Quais são mesmo os pressupostos de existência de uma sociedade? Affectio societatis e pluralidade de sócios. Só há duas exceções à pluralidade: a subsidiária integral e sociedade unipessoal temporária, derivada de uma sociedade pluripessoal que terminou ficando com apenas um sócio. Quanto aos requisitos de validade, como vimos há os genéricos, que são exatamente a lista do art. 104 do Código Civil, da validade do negócio jurídico, e os específicos, que são os do art. 981: obrigação mútua de união de esforços e participação de todos no lucro e no prejuízo, na medida do capital investido, sendo defesa a cláusula que isenta um sócio de participação no prejuízo ou que proíbe outro de ter participação nos lucros.
As decisões devem ser tomadas por maioria de votos, não em número absoluto de pessoas, mas em porcentagem de capital investido. Quem tem mais capital tem mais poder de voto. Isso para decisões normais do dia-a-dia da sociedade. Para que se alterem as cláusulas essenciais há regras específicas. A regra geral é a maioria do capital. Se houver empate, haverá o desempate pelo número de sócios. Assim, imagine que uma sociedade empresária tenha três sócios, sendo que um deles investiu R$ 100 mil, enquanto os outros dois investiram R$ 50 mil cada. Se houver divergência entre o primeiro e os dois últimos, o desempate operará em favor dos dois últimos, porque, apesar de somarem exatamente o mesmo capital do primeiro, eles estão em maioria de indivíduos. Isso para alterações normais. Para alterar o contrato social, a regra é a regra legal, do art. 999 do Código:
Art. 999. As modificações do contrato social, que tenham por objeto
matéria indicada no art. 997, dependem do consentimento de todos os
sócios; as demais podem ser decididas por maioria absoluta de votos, se
o contrato não determinar a necessidade de deliberação unânime. Parágrafo único. Qualquer modificação do contrato social será averbada, cumprindo-se as formalidades previstas no artigo antecedente. |
Nas sociedades em nome coletivo e nas sociedades em comandita simples, é necessária unanimidade para a alteração de cláusula essencial. Na LTDA, ¾ do capital, 75%, conforme os arts. 1071 e 1076:
Seção V
Das Deliberações dos Sócios Art. 1071. Dependem da deliberação dos sócios, além de outras matérias indicadas na lei ou no contrato: I - a aprovação das contas da administração; II - a designação dos administradores, quando feita em ato separado; III - a destituição dos administradores; IV - o modo de sua remuneração, quando não estabelecido no contrato; V - a modificação do contrato social; VI - a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou a cessação do estado de liquidação; VII - a nomeação e destituição dos liquidantes e o julgamento das suas contas; VIII - o pedido de concordata. |
Art. 1076. Ressalvado o disposto no art. 1061 e no § 1º do art. 1063,
as deliberações dos sócios serão tomadas: I - pelos votos correspondentes, no mínimo, a três quartos do capital social, nos casos previstos nos incisos V e VI do art. 1071; II - pelos votos correspondentes a mais de metade do capital social, nos casos previstos nos incisos II, III, IV e VIII do art. 1071; III - pela maioria de votos dos presentes, nos demais casos previstos na lei ou no contrato, se este não exigir maioria mais elevada. |
Vejam bem: a unanimidade para as sociedades em nome coletivo e para as sociedades em comandita simples é para alteração de cláusula do contrato, de cláusulas essenciais. Já na LTDA a porcentagem de 75% é para alterar qualquer cláusula, inclusive as essenciais. A lei assegura aos ditos sócios minoritários da LTDA o direito de retirada, caso não concordem com alterações do contrato propostas pela maioria, recebendo os discordantes o valor patrimonial de suas cotas. Cuidado: capital social é o capital com que os sócios contribuem para iniciar a pessoa jurídica. Quando um sócio se retira, a participação dele é no patrimônio, não no capital. Se a sociedade teve lucro, o patrimônio pode estar maior do que no início. Mas ela pode ter tido prejuízo. Nisso, o patrimônio no final das contas estará menor do que quando iniciada a sociedade.
Essas
são as regras de alteração.
Recapitulando: vimos ontem as regras de validade, regras de existência,
e hoje
as cláusulas essenciais, sem as quais o contrato não é arquivado,
regras de
decisão para alteração das cláusulas: unanimidade em relação às
cláusulas
essenciais na sociedade em nome coletivo e na sociedade em comandita
simples,
maioria do capital nas questões do dia-a-dia; 75% do capital na LTDA
para alteração
de qualquer tipo de cláusula, ressalvado o direito dos acionistas
minoritários
(os que respondem por até 25% do capital da sociedade) de se retirar da
sociedade levando suas cotas.