Direito Internacional Público

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Reconhecimento de direitos e os direitos humanos

Tópicos:

  1. Introdução
  2. Crítica feita à classificação dos direitos fundamentais por gerações
  3. Tratados sobre direitos humanos
  4. Desafios no trabalho de proteção dos direitos humanos
  5. Globalização e direitos humanos
  6. Segurança internacional
  7. Mecanismos de implementação

Introdução

Quando surgiu a preocupação de defender os direitos humanos como tal, independente de qualquer outra condição? Essa é a pergunta que motiva este estudo.

O que era a defesa dos direitos humanos até antes da segunda guerra mundial? Era o direito humanitário? Ainda não como na forma contemporânea. Era, na verdade, o direito aplicado aos conflitos armados. Remonta à época das Convenções de Genebra, cujos textos fazem a distinção entre combatentes, náufragos, feridos, prisioneiros de guerra e, entre outros, os médicos, que trabalham ajudando pessoas num conflito armado. Também têm a ver com intervenções militares no território de outros Estados para com a proteção da vida, segurança e até o patrimônio do Estado ocupado.

A Sociedade das Nações, criada em 1919 depois da primeira guerra mundial, também se preocupou em criar parâmetros, como também fez a Organização Internacional do Trabalho; então os direitos humanos eram a preocupação com o ser humano em situações específicas, como as de conflitos armados e as relações de trabalho. Ou então quanto à própria presença no território de outro Estado, em que os indivíduos eram vítimas de ações arbitrárias do governo local. Não havia uma preocupação do ser humano enquanto ser humano independente de qualquer condição especial. Existe uma expressão em francês que diz que até no infortúnio se pode colher algo de positivo: à quelque chose malheur est bon. A segunda guerra mundial foi a prova de que o ser humano nunca valeu tão pouco sob o regime nazista. Não só judeus, mas também ciganos, homossexuais, portadores de deficiência física e outros. Os nazistas praticavam também a “eutanásia” dos deficientes mentais.

Filme: Amém. Fala sobre a postura da Igreja Católica em relação aos campos de concentração no cenário da segunda guerra.

A guerra é a pior das atrocidades, não há dúvida; mas nisso entra em cena Norberto Bobbio dizendo que vê algo de positivo no aumento do poder destrutivo das armas, na ameaça ao meio-ambiente, nas ofensas aos direitos humanos. O quê? Justamente porque nunca se discutiu tanto esse tema. De fato, as atrocidades da segunda guerra mundial deram origem à Declaração Universal dos Direitos Humanos. O que foi isso? Foi uma declaração da Assembléia Geral das Nações Unidas feita 1948, que trouxe enunciados e propostas para a proteção do ser humano como ser humano. A declaração não é um tratado, e não vincula juridicamente os Estados, é simplesmente uma declaração. É um conjunto de proposições que tem um inegável valor moral. A Declaração introduz a missão contemporânea de direitos humanos, inspira as Constituições dos Estados e também a celebração de novos tratados de proteção aos direitos humanos.

O que é essa noção contemporânea que a Declaração Universal dos Direitos Humanos introduziu? Em primeiro lugar, os direitos humanos são oponíveis a todos. Mas quem pode ameaçar os seres humanos? O Estado. O Estado é a principal ameaça, o principal violador dos direitos do homem e é ele que aparece nessa noção contemporânea do tema; foi as ações dos próprios Estados que motivaram a Declaração.

Os direitos são, portanto, oponíveis ao Estado, que é seu principal violador, mesmo quando ele age em conformidade com seu ordenamento jurídico. Mesmo quando obedece a um grau de legalidade ele pode ser violador dos direitos humanos. Isso porque, a qualquer momento, um Estado pode promulgar uma lei interna ou mesmo uma norma constitucional que atente contra tais preceitos protetivos do ser humano. Tanto que os nazistas agiam em conformidade com o ordenamento jurídico alemão.

São, portanto, princípios éticos que são delineados no plano internacional. Se opõem aos Estados e inspiram suas Constituições; aliás, orientam os ordenamentos jurídicos nacionais. A partir desse momento, o princípio de Direito Internacional da dignidade da pessoa humana deve orientar os Estados tanto quanto o princípio da igualdade soberana dos Estados. É um princípio norteador dos ordenamentos jurídicos nacionais. São muitos os Estados que depois vieram a incorporar o teor da Declaração Universal dos Direitos Humanos às suas Constituições, decretando que todos os direitos de proteção ao ser humano, constitucionais ou legais, devem ser interpretados em conformidade com a Declaração da ONU.

As normas de proteção serão delimitadas no plano internacional, para orientar os Estados. A idéia é que os direitos humanos são tema de proteção internacional, e não devem ficar reservados à proteção dos Estados. Os direitos humanos são universais e indivisíveis. Universais porque se aplicam ao ser humano como ser humano, e o único requisito é a condição de homem, onde quer que esteja, seja qual for sua situação, local de origem, orientação política e religião. E indivisíveis no sentido de que os direitos devem ser buscados em seu conjunto, embora sejam de diferentes naturezas, pois se inter-relacionam.

Leia a Declaração Universal dos Direitos do Homem:

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS
Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III)
da  Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948

Preâmbulo

        Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,  
        Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do homem comum,  
        Considerando essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo Estado de Direito, para que o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra tirania e a opressão,  
        Considerando essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações,  
        Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla,  
        Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a desenvolver, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos humanos e liberdades fundamentais e a observância desses direitos e liberdades,  
        Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mis alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso,  

A Assembléia  Geral proclama

        A presente Declaração Universal dos Diretos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.  

Artigo I

        Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão  e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.  

Artigo II

        Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua,  religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.

Artigo III

        Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Artigo IV

        Ninguém será mantido em escravidão ou servidão, a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas.  

Artigo V

        Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.

Artigo VI

        Toda pessoa tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecida como pessoa perante a lei.  

Artigo  VII

        Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.  

Artigo VIII

        Toda pessoa tem direito a receber dos tributos nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem  os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.  

Artigo IX

        Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado.  

Artigo X

        Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.  

Artigo XI

        1. Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.  
        2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Tampouco será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.

Artigo XII

        Ninguém será sujeito a interferências na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.

Artigo XIII

        1. Toda pessoa tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado.  
        2. Toda pessoa tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a este regressar.

Artigo XIV

        1.Toda pessoa, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países.  
        2. Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos propósitos e princípios das Nações Unidas.

Artigo XV

        1. Toda pessoa tem direito a uma nacionalidade.  
        2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade.

Artigo XVI

        1. Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer retrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução.  
        2. O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes.

Artigo XVII

        1. Toda pessoa tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros.  
        2.Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.

Artigo XVIII

        Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular.

Artigo XIX

        Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

Artigo XX

        1. Toda pessoa tem direito à  liberdade de reunião e associação pacíficas.  
        2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.

Artigo XXI

        1. Toda pessoa tem o direito de tomar parte no governo de sue país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos.  
        2. Toda pessoa tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país.  
        3. A vontade do povo será a base  da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo  equivalente que assegure a liberdade de voto.

Artigo XXII

        Toda pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade.

Artigo XXIII

        1.Toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.  
        2. Toda pessoa, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.  
        3. Toda pessoa que trabalhe tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.  
        4. Toda pessoa tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses.

Artigo XXIV

        Toda pessoa tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas remuneradas.

Artigo XXV

        1. Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle.  
        2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.

Artigo XXVI

        1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito.  
        2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.  
        3. Os pais têm prioridade de direito n escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.

Artigo XXVII

        1. Toda pessoa tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do processo científico e de seus benefícios.  
        2. Toda pessoa tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica, literária ou artística da qual seja autor.

Artigo XVIII

        Toda pessoa tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e  liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados.

Artigo XXIV

        1. Toda pessoa tem deveres para com a comunidade, em que o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível.  
        2. No exercício de seus direitos e liberdades, toda pessoa estará sujeita apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer às justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática.  
        3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos propósitos e princípios das Nações Unidas.

Artigo XXX

        Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição  de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos.

Artigos 1 a 21: são os chamados direitos humanos de primeira geração. Bobbio aceita essa classificação, mas a idéia é de um tcheco radicado na Eslováquia chamado Karel Vašák.

Essa classificação de gerações se inspira na bandeira francesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Os direitos de primeira geração se classificam em direitos de liberdade, inspirados no ideário da Revolução Francesa. É a idéia de que todo ser humano tem direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade. Também não sofrer tortura, tratamento degradante, prisão arbitrária, violação de privacidade e correspondência, entre outros direitos individuais. É um conjunto de direitos que se opõem ao Estado, dele reclamando uma conduta negativa, que se abstenha de violar os direitos dos indivíduos. Esses direitos também são chamados de liberdades negativas.

Direitos sociais e econômicos são os que estão nos artigos 22 a 27 da Declaração. Inspiraram-se nas conquistas sociais do ser humano depois da revolução industrial da metade do século XIX. Direito ao trabalho, educação, cultura, lazer, igualdade salarial, previdência social; são direitos que requerem do Estado conduta ativa, visando ao bem estar comum. Por isso são chamados direitos sociais. Significa que o Estado tem que promover políticas públicas em nome do bem estar social. Esses são os direitos de segunda geração.

Direitos de terceira geração são parte de uma idéia mais nova, e refletem-se na fraternidade, representada pela cor vermelha da bandeira francesa. São direitos da coletividade ou difusos: paz, desenvolvimento, meio-ambiente e propriedade sobre o patrimônio comum, dirão alguns autores. Paulo Bonavides disse: “Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo, ou de um determinado Estado.” ¹ Não estão na Carta, que pára nos direitos sociais. Os direitos difusos foram incorporados ao longo do tempo. Há inclusive quem fale em direitos de quarta geração e até quinta, mas a doutrina majoritária pára nos direitos de terceira geração.

A crítica: quem é o destinatário dessas obrigações? De quem se deve cobrar a realização desses direitos? Não é simplesmente ao Estado. O Estado não é o único responsável pelo meio-ambiente saudável. Por isso há confusão. Ainda assim é o Estado que deve promover suas políticas para a manutenção da paz e do meio-ambiente.
 

Crítica feita à classificação dos direitos fundamentais por gerações

Essa classificação atentaria contra a indivisibilidade dos direitos humanos. É que ela sugere que os direitos humanos têm um conteúdo programático, que devem ser conquistados e incorporados progressivamente. Assim, por exemplo, uma ofensa aos direitos sociais poderia ser tolerada desde que os direitos civis e políticos estivessem protegidos e no devido exercício.

Os direitos de liberdade, como de liberdade de expressão, de organização, são direitos que conduzem, que articulam, que qualificam o indivíduo à obtenção de direito sociais e difusos. Não é possível pensar numa sociedade com direitos sociais sem, antes, haver direitos civis e políticos. Por isso que os direitos têm que ser buscados de uma forma conjunta.

A Organização Mundial de Saúde diz que a principal causa de morte no mundo é a pobreza. Como pensar em direitos humanos sem combater, antes, a pobreza? Os direitos humanos não devem ser incorporados gradualmente. Nisso, a crítica ganha certa força. Inclusive porque ainda há lutas em busca da eficácia desses direitos. A crítica é uma oportunidade para se explicar a indivisibilidade desses direitos.

Quem defende a classificação diz que ela é mera questão de didática e de correspondência histórica, e não pretende atentar contra a aquisição de tais direitos.
 

Tratados sobre direitos humanos

Alguns pactos internacionais que se inspiraram na Declaração de 1948 foram: Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, que reproduz o conjunto da Declaração Universal; o Pacto de São Jose da Costa Rica, de 1969; a Convenção Contra a Todas as Formas de Discriminação da Mulher de 1979, da Assembléia Geral das Nações Unidas; a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de 1984; Convenção dos Direitos da Criança, de 1990 e a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, de 1981.

No plano regional, há a Convenção Européia dos Direitos do Homem, criada pelo Conselho da Europa em 1950 (uma organização internacional de 1949 que abrange 47 Estados, inclusive os 27 da União Européia); A Convenção Americana, para o continente americano, cuja Carta continha muito mais direitos civis e políticos, e depois deram a ela um conteúdo social, econômico e cultural. A Carta Africana tem uma ênfase em direitos sociais, econômicos e culturais. Diz que não pode haver liberdade se não houver conquistas materiais sociais porque entende-se que é um continente muito atingido pela pobreza. A Carta diz que não existem direitos civis e políticos se não houver direitos sociais antes.
 

Desafios no trabalho de proteção dos direitos humanos

O que se entende por direitos humanos é algo de natureza universal ou cultural? É esse o debate entre universalistas e relativistas. Os universalistas dizem que existem um mínimo ético, e que a dignidade da pessoa humana é universal. A prática da mutilação de mulheres em alguns países orientais é algo a se combater incondicionalmente, e a desculpa da cultura não deve ser usada para abrigar graves ofensas aos direitos humanos. Os relativistas culturais rebatem: “que mínimo ético irredutível é esse? Quem está qualificado para determinar? Será que isso não é uma forma, um resultado de uma visão eurocêntrica dos direitos humanos?” Indagam eles se isso não é uma nova forma de etnocentrismo ou de neocolonialismo. É como se uma parte do mundo estivesse qualificada para dizer a outra parte do mundo o que são direitos humanos. Cada sociedade tem uma visão sobre o que seriam tais direitos, e essa visão deveria se respeitada. O meio termo entre eles seria, então, o chamado multiculturalismo emancipatório ou multiculturalismo de confluência, que é a idéia de que cada cultura tem sua própria idéia de direitos humanos, sua própria concepção sobre a dignidade da pessoa humana, e nenhuma dessas idéias seria completa, sendo necessário, então, que se promova um permanente diálogo intercultural. Nisso, poder-se-ia chegar a uma concepção ampla de direitos humanos.  
 

Globalização e direitos humanos

Globalização solidária: idéia tosca ² de que o mercado não deve ser deixado livre. Ele não opera para proteção dos direitos humanos, mas em busca de eficiência, e é preciso que o Estado atue no sentido de impor limites ao mercado e traçar políticas públicas de proteção a minorias excluídas do desenvolvimento econômico. No primeiro momento, a preocupação era com o conjunto das pessoas, em realçar a igualdade entre elas. Era preciso, depois da segunda guerra mundial, pensar nos seres humanos como iguais. Com o tempo, percebeu-se que certas minorias eram mais vulneráveis socialmente, e tinham mais dificuldade em ver seus direitos protegidos. Exemplos: mulheres. O conceito de mulher como minoria é um conceito político, pois elas são maioria em número absoluto. Fora elas há os estrangeiros, religiosos de algumas religiões, homossexuais, pertencentes a outros grupos étnicos, etc. ³
 

Segurança internacional 4

Há uma mentalidade, por parte de alguns, de que guerras se justificariam pela necessidade de defesa da segurança internacional, na luta contra a violência e contra o terrorismo. George Bush pensava assim, e carregava a bandeira da legítima defesa preventiva. Também os regimes de exceção e as decisões tomadas por grandes potências à margem das Nações Unidas. Isso tudo parece estar sendo superado hoje em dia.

A idéia contemporânea de segurança internacional significa que o Estado de Direito deve ser reforçado em suas estruturas e instituições para que não mais seja necessária a força para a resolução de conflitos. A comunidade internacional então atua no sentido de convencer os Estados a fortalecerem si próprios até que seja garantida a paz no Estado de Direito.
 

Mecanismos de implementação

Começaram, é claro, depois de 1945, com a criação da Organização das Nações Unidas.

O primeiro desses mecanismos foi o Tribunal Militar de Nuremberg, constituído depois da segunda guerra mundial pelos Estados vencedores para julgar os vencidos. Foi a primeira vez em que se disse à humanidade que os direitos do ser humano não estavam confinados à proteção do Estado, mas protegidos no plano internacional, e que os infratores responderiam penal e individualmente por seus crimes. Crítica a Nuremberg: foi um tribunal post facto, sem respeito ao princípio da anterioridade da lei penal, de exceção, repleto de seletividade política, e aplicou a pena de morte. Mas ele representou um primeiro passo na idéia de que os direitos humanos são protegidos internacionalmente. Objetivamente falando essa foi a contribuição do tribunal. Foi anterior à Declaração Universal dos Direitos Humanos, que é de dezembro de 1948.

Depois vieram, na década de 90, os tribunais ad hoc, criados para julgar os incidentes na Iugoslávia e em Ruanda. Foram constituídos pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas para julgar pessoas de determinada parte do mundo, nacionais de um Estado, e não por Estados vencedores de uma guerra. Essa foi uma evolução em relação ao tribunal anterior. Também critica-se os tribunais ad hoc por terem sido repletos de politização. O que se pergunta é: “por que ainda não se criou um tribunal para julgar os crimes de Fidel Castro, o massacre da Praça da Paz Celestial, patrocinadores de terroristas Palestinos, etc.?” Rápido é para se criar um órgão para julgar os crimes de Ruanda, Estado pobre e quase que absolutamente sem expressividade mundial; é como se o houvessem escolhido para dar exemplo ao mundo.

Por fim o Tratado de Roma, de 1998, que instituiu o Tribunal Penal Internacional na cidade de Haia. Respeitou o princípio da anterioridade, não era post facto, não tinha a pretensão de julgar nacionais de determinados Estados, e só seria posto a operar com o consentimento do Estado patrial do criminoso ou do Estado territorial do crime. Isso foi visto como forma de implementação da proteção dos direitos humanos.

Em primeiro lugar, temos os tribunais penais internacionais. Em segundo lugar os comitês de controle, e as cortes regionais de direitos humanos. Vejamos:

Há órgãos de monitoramento de violações aos direitos humanos. Os comitês de controle fazem investigações para averiguá-las. Podem receber reclamações, monitorar e fazer investigações, pedir relatórios, enfim, monitorar o cumprimento dos direitos consagrados pelo Pacto. Não proferem sentenças e sua atividade não tem o caráter de sanção, nem tem força de uma decisão jurisdicional.

Cortes regionais de direitos humanos: não existe um tribunal internacional de direitos humanos. Por isso mesmo as Nações Unidas incentivam a criação de cortes regionais de proteção aos direitos humanos. A idéia é que, por haver maior proximidade geográfica entre os Estados de uma mesma região, não só ficará mais fácil a atividade em si como também por que é maior a chance de haver consonância cultural entre eles, portanto dificilmente haverá divergência quanto o que deve ser entendido por direitos humanos. A Corte Européia, por exemplo, fica em Estrasburgo. Tinha uma estrutura pública, com uma Comissão e uma Corte. A Comissão fazia uma análise, um juízo de admissibilidade. Ela foi extinta e hoje em dia o acesso é direito à Corte para indivíduos, grupos de pessoas, organizações e Estados. São 17 juízes. Há um mecanismo também de fiscalização do cumprimento das decisões da Corte que é feito pelo Comitê de Ministros.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos foi criada pelo Pacto de São José da Costa Rica, com sede na própria São José. Tem funcionamento parecido com o que era a Corte Européia antes do Protocolo 11, de 1998. Os indivíduos e grupos de pessoas não têm acesso, só a comissão e os Estados-partes. O que fazer quando o indivíduo tem um direito seu violado? Ele recorre primeiramente à Comissão, que faz o juízo de admissibilidade e verifica as condições de prosseguir. Ela, eventualmente, faz investigações in loco e apresenta à Corte um relatório. Os Estados podem se dirigir diretamente à corte.


1 – Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6340 – Acessível em 18/10/09 às 04:34.

2 – Tosco: não no sentido mais coloquial que a juventude tem usado ultimamente, mas de acordo com o Dicionário Michaelis: (ô) adj (lat tuscu) 1 Que não é lapidado, polido, nem lavrado; tal como a natureza o produziu: Pedra tosca. 2 Malfeito; grosseiro. 3 Rude, rústico. 4 Inculto, sem instrução, estúpido, ignorante, bronco. Em tosco: em bruto. Pl: toscos (ô). Fem: tosca (ô). Lembrem-se, quando vocês leram a página de ajuda, que eu repetidas vezes pedi para que lessem, do que significa a cor marrom quando usada no meio do texto acima da linha horizontal que divide o texto da nota das notas de rodapé. Uma regra que defini para este site é que nunca o entendimento de uma nota dependerá de uma palavra ou trecho em marrom, então, na frase apontada, basta ignorá-la que ela continuará tendo sentido. Assim, a redação do site permanece imparcial.

3 – São os chamados grupos minoritários, que, na verdade, são muito fortes. Como já visto no texto, eles não necessariamente são minoritários em número, mas em expressividade, historicamente. Mulheres já constituem maioria, mas ainda há quem diga que elas ainda são um grupo minoritário por causa de sua expressividade. Esse argumento já não mais vale no Brasil; basta ver quantas mulheres estão ocupando cargos públicos e executivos nos últimos anos. Não só isso, mas também os cursos de ciências exatas e na carreira científica. Outro grupo é os dos homossexuais. Já foram vítimas até de rituais de sacrifício religioso no Egito, ainda hoje são malvistos no oriente e a prática homossexual constitui crime grave em 53 países, 7 deles cominando pena de morte, destes, todos no mundo árabe. Hoje em dia, entretanto, já têm direito ao casamento em seis países, cinco do primeiro mundo (Canadá, Espanha, Suécia, Noruega e Bélgica, sendo o sexto a África do Sul). No Brasil, estão prestes a conseguir um superdireito: a “lei da mordaça gay” (PL/Senado 122/06), projeto que pretende modificar a Lei 7716/89, dirigida aos negros, extrapolando seu objeto, que se limita a garantir o direito de acessibilidade a qualquer estabelecimento, e incluindo os homossexuais como beneficiários do direito exclusivo de se sentirem ofendidos por práticas “odiosas”, como o ato de um cidadão virar o rosto para outro lado ao ver um casal gay manifestando afetividade. A inconstitucionalidade é evidente. Outro grupo minoritário em número são os judeus, que somam apenas cerca de 20 milhões no mundo hoje; Na época do pós-guerra, tiveram sucesso na criação de seu próprio Estado. A comunidade judaica é das mais fortes em amadurecimento histórico e consciência de classe; poucos são os judeus pobres no século XXI. Ao longo do século passado, Israel sofreu inúmeras tentativas de invasão, todas frustradas; ainda assim a população judaica dobrou em cerca de duas décadas. Por último, mas não esgotando os exemplos, são os negros. Vítimas de atrocidades e discriminação ao longo dos séculos XVIII e XIX no Brasil, hoje são especialmente protegidos. A própria Constituição (prevendo a imprescritibilidade do crime de racismo) e a Lei 7716 são exemplos, fora o privilégio que têm para ingressar nas Universidades Federais. Algumas criam até “centros de convivência”, ambientes em tese destinados ao atendimento dos negros, garantindo não se tratarem de guetos. No caso da UnB, o lugar funciona mais como um balcão de informações da “ação afirmativa”; dentro, encontramos flyers políticos que nada têm a ver com a causa negra, mas sim, por exemplo, com o antagonismo a um ministro do STF, cartilhas anti-Estados Unidos, e uma biblioteca com cerca de cinqüenta títulos, todos novíssimos, como se nunca tivessem sido tocados, na área de Antropologia, Sociologia, História e Filosofia, mais uma pilha de revistas Carta Capital. Quanto à legislação, alegam que tais normas existem para trazer a igualdade material entre negros e outros, mas uma boa discussão é: “quando chegará essa igualdade material? O que está faltando? Não já teria ela chegado?” 

4 – Não ficou muito clara mesmo essa parte de segurança internacional. Completei com trechos que eu acho que a professora concordaria, de conversas que eventualmente tivemos nos finais de aula. E menos ainda tenho certeza sobre a conclusão dessa seção. Quando peguei meu rascunho, tive que juntar pedaços provavelmente porque eu havia copiado mal, me desculpem por isso.