Direito Processual Civil

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Competência – continuação

Tópicos:

  1. A competência absoluta
  2. A competência relativa
  3. Modificação de competência
  4. Prevenção
  5. Perpetuação da jurisdição

Ainda não terminaremos a competência nesta aula. Na próxima quarta-feira veremos a localização de bens imóveis, da localização dos fatos, e outras situações. E assim sendo, precisamos ver o que é competência absoluta e competência relativa. Depois veremos a possibilidade da modificação ou não da competência. Por quê? Quando protocolamos qualquer ação que seja, precisamos saber se aquele juízo tem ou não competência, se ele pode, portanto, desde o inicio, se declarar incompetente. Dependerá da causa, de sua natureza, a matéria, ou então da localização dos bens, bem como relativamente à condição das pessoas. Precisamos, sem dúvida nenhuma, identificar o foro competente para que o requerimento não seja encaminhado para o juízo errado.
 

A competência absoluta

Como vamos trabalhar? Primeiramente, vamos verificar a competência absoluta. Pode ser argüida de ofício. Por que é absoluta? Podemos observar que a competência absoluta é determinada em vista do interesse público, não pode ser modificada por convenção dos sujeitos envolvidos, e é improrrogável. A primeira coisa que observamos, portanto, é o interesse público. Quando há, ele se sobrepõe ao interesse privado. Então não se pode modificar a competência pois o próprio legislador coloca que, quando a natureza da causa, um juiz de uma área diferente não pode julgar. É como dar uma causa penal a um juiz cível. O legislador estabelece o critério para a fixação da competência. Não se pode modificar a existência de interesse público. De fato, o interesse público, dentro da competência absoluta, não deixa mudar a competência por convenção das partes. Elas não podem, por exemplo, fazer eleição de foro, nem podem pedir quaisquer modificações sobre onde se deve protocolar aquela ação. Então devemos olhar desde o início se podemos ajuizar em determinada vara. Errando o lugar, o juiz será incompetente, se declarará como tal, e encaminhará para o competente.

Às vezes pode acontecer que alguns atos foram realizados. Mesmo que o juiz seja incompetente, há possibilidade de se preservar os atos processuais. O que não se pode preservar são as decisões, que são nulas caso proferidas por juiz incompetente. Fundamentaremos em breve no Código de Processo Civil.

Por outro lado, se é absoluta, a competência é improrrogável. Quando a incompetência é relativa, e as partes não atentam para esse fato, o juiz continua à frente do processo. A incompetência absoluta, quando ocorre, é declarada de ofício. Uma situação bastante importante é que a competência absoluta tem que ser demonstrada na contestação. Veremos isso no processo de conhecimento, nas modalidades de defesa do réu. Dentro dessa competência absoluta, na contestação ela é apresentada, dentro das preliminares. Art. 301. O advogado apresenta as preliminares, em que se levantam os aspectos processuais. Neles, também se argúi a incompetência absoluta. Muitos falam que as preliminares são apresentadas na contestação antes do mérito, mas na mesma peça inicial. Veja o art. 301:

Seção II
Da Contestação

        [...]

        Art. 301.  Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar: 

        I - inexistência ou nulidade da citação; 

        II - incompetência absoluta;  

        [...]

O que o advogado faz nas preliminares? Ele inclui a defesa processual, mas não adentra na questão material ainda. Discute-se tudo o que quer conforme o art. 301. Só então vem a discussão do mérito. Mas, dentro da discussão preliminar, onde se levantam os questionamentos processuais, como a competência, conforme o inciso II do artigo. Aqui se alega “...a incompetência de Vossa Excelência...” O mérito é o próprio pedido, a pretensão do autor que foi feita na petição inicial. Então, a defesa deverá conter as duas partes. É que, se por acaso o juiz indeferir as questões processuais argüidas pela defesa, não restará nenhuma questão de direito material para ser analisada, o que significa que os fatos alegados pelo autor se presumirão verdadeiros. É, portanto, uma indiligência deixar de trazer, na defesa, as alegações preliminares e as sobre o mérito. Veremos isso nas primeiras aulas de processo de conhecimento. 

Vamos ver agora dois artigos importantes. Art. 111:

        Art. 111.  A competência em razão da matéria e da hierarquia é inderrogável por convenção das partes; mas estas podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde serão propostas as ações oriundas de direitos e obrigações.

        [...]

A competência referida aí é absoluta ou relativa? As duas! Primeiramente por causa da competência em razão da matéria. A competência absoluta, relativamente à matéria ou à natureza da causa, não pode ser modificada. Neste caso ela é absoluta. A competência funcional também não pode ser modificada; ela também é inderrogável. E a segunda parte do artigo? O valor da causa, e também a questão do território podem ser questão de competência relativa.  

Parágrafos:

        § 1o  O acordo, porém, só produz efeito, quando constar de contrato escrito e aludir expressamente a determinado negócio jurídico.

        § 2o  O foro contratual obriga os herdeiros e sucessores das partes.

Muitas vezes, quando há possibilidade de se fazer um pacto, através de um contrato de direito material, esse contrato pode eleger um foro. Podemos pactuar que a cidade de Goiânia será usada para dirimir um eventual conflito. Devemos também ver o art. 113:

        Art. 113.  A incompetência absoluta deve ser declarada de ofício e pode ser alegada, em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de exceção.

        [...]

A incompetência absoluta pode ser declarada ex officio conforme a primeira parte do caput. Também pode ser alegada em qualquer tempo e grau de jurisdição se absoluta. Independentemente de exceção: deve ser demonstrada na própria contestação das preliminares. É o disposto no art. 301, inciso II.

Se houver somente uma única vara, ela poderá julgar qualquer ação, e o juízo será competente. É o Poder Judiciário daquele estado que confere a competência.

Art. 113, § 1º:

        § 1o  Não sendo, porém, deduzida no prazo da contestação, ou na primeira oportunidade em que Ihe couber falar nos autos, a parte responderá integralmente pelas custas.

Então, normalmente, quem deve alegar é o juiz, ex officio. A parte deve alegar no primeiro momento caso o juiz não o faça. Não alegando, ele arcará com as custas. 

§ 2º:

        § 2o  Declarada a incompetência absoluta, somente os atos decisórios serão nulos, remetendo-se os autos ao juiz competente.

Foi o que falamos há pouco. Veja a importância: os atos praticados serão válidos, conforme o parágrafo, desde que não sejam decisórios. Ao se remeter os autos, mantêm-se os atos não prejudiciais. Decisões são nulas. É o princípio da economia processual.

Lei 1060/50: a parte tem o direito de não pagar as custas.
 

A competência relativa

Vamos agora para a competência relativa. Enquanto na absoluta atendia-se ao interesse público, aqui se atende ao interesse privado. No art. 111 estão previstas ambas as competências. A competência relativa, então, conceitua-se por aquela que pode ser declarada por vontade das partes, que se caracteriza em razão do território e do valor da causa. Veja: território e valor da causa. Nalgumas situações, diante da competência relativa, há possibilidade de as partes, levando em consideração o objeto de litígio, alegarem a incompetência, e o juiz, ao receber a petição inicial do autor, verifica que não é mesmo competente. Ele não pode declarar de ofício a competência relativa. As partes terão prazo de 15 dias para arguí-la. Se não for feito dentro desse tempo, a competência será prorrogada.

Exemplo: mulher tem seu domicílio em Goiânia. Seu hoje ex-marido mora no Distrito Federal. No decorrer do casamento, surgiu a incompatibilidade de gênios, descrita no rol do art. 1573 do Código Civil, e eles resolveram se separar. O marido ajuizou ação de separação aqui em Brasília. A mulher recebeu a citação com a contrafé. Lá em Goiânia ela contratou um advogado, e poderia perfeitamente apresentar sua defesa lá. Mas ela veio para cá apresentar sua defesa na Vara de Família brasiliense onde fora protocolada a ação. O juiz, que recebe a defesa da mulher, verificada a legitimidade, a capacidade postulatória, condições da ação, pressupostos processuais faz o que? Nada, pois não havia nada de errado. Ele marcará uma audiência, primeiramente de conciliação, e julgará o processo. O foro competente, a princípio, seria o de Goiânia, mas houve prorrogação da competência por decurso de prazo sem argüição da incompetência.

Tome novamente o mesmo caso: marido mora aqui, mulher em Goiânia, mas, em vez de ela apresentar sua contestação aqui, ela apresenta uma exceção de incompetência para declinar o próprio processo, que foi distribuído à décima Vara de Família, para que seja apreciado em Goiânia. Ela tem 15 dias para apresentar a exceção. O art. 297 do CPC fala das modalidades de defesa que podem, no prazo de 15 dias, ser apresentadas: contestação, reconvenção, e exceção de incompetência.

CAPÍTULO II
DA RESPOSTA DO RÉU

Seção I
Das Disposições Gerais

        Art. 297.  O réu poderá oferecer, no prazo de 15 (quinze) dias, em petição escrita, dirigida ao juiz da causa, contestação, exceção e reconvenção.

Não apresentando, presume-se que o foro foi aceito.
 

Modificação de competência

Há a possibilidade de se modificar a competência por quatro vias diferentes. Por que se pode modificar a competência? São situações expressas em lei. Podemos modificar, então, para que determinada ação seja julgada por outro juízo. Art. 102:

Seção IV
Das Modificações da Competência

        Art. 102.  A competência, em razão do valor e do território, poderá modificar-se pela conexão ou continência, observado o disposto nos artigos seguintes.

Primeira coisa: conforme o art. 102, podemos prorrogar a competência relativa por conexão ou por continência. A absoluta não. Por quê? Porque não se fala em questão de matéria nem hierarquia. O juiz pode processar ações conforme a competência mude por conexão ou continência. Mas por que conexão e continência? Porque o próprio legislador assim determinou nessa Seção IV do capítulo da competência interna.

O que é conexão e continência? Temos dois artigos. A conexão é a principal forma de prorrogação de competência. O objetivo do legislador é evitar decisões contraditórias. Por quê? Cai uma ação numa vara, enquanto outra vara fica de julgar determinada causa conexa, por isso corre o risco de julgar em outro sentido. O objetivo é evitar o contraditório. O art. 103 diz o que são causas conexas.

        Art. 103.  Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando Ihes for comum o objeto ou a causa de pedir.

O advogado tem que demonstrar a existência de uma ação conexa. Imagine que um locador ajuíze ação de cobrança contra o inquilino. Ao mesmo tempo ele ajuíza ação de despejo em outra vara. A causa de pedir é a mesma, então deverá ser o mesmo juiz que julgará.

Isso melhora não apenas para as partes, mas para o próprio Estado-juiz.

Também se pode alegar a conexão como modalidade de contestação do art. 301.

Por outro lado, temos outra forma de prorrogação semelhante. Vejam o art. 104:

        Art. 104.  Dá-se a continência entre duas ou mais ações sempre que há identidade quanto às partes e à causa de pedir, mas o objeto de uma, por ser mais amplo, abrange o das outras.

Aqui temos uma causa abrangendo a outra. O que se pede numa causa inspirada por um acidente de automóveis? A reparação do dano, o lucro cessante, o quê? Ou então alguém vai ao banco, pega um milhão emprestado, e o devedor não paga o valor. O banco ajuíza ação de cobrança reivindicando R$ 10.000,00 relativamente a juros, correções, atualizações, enfim. Pouco tempo depois, nota-se o título principal, que é o valor de um milhão. Neste caso, o juiz que vai cobrar o valor maior, que é o capital da quantia de R$ 1 milhão, também apreciará a ação da cobrança dos juros, correções e atualizações. Acessório segue o principal.

Imagine também a situação da vítima de acidente: por que ela cobraria apenas o lucro cessante? Por que ele não cobra, na mesma ação, as despesas que foram contraídas no reparo do veículo? O juiz que julga a ação principal também julgará as acessórias. Essa é a continência.

Foro de eleição: nada impede que seja feito um contrato substancial, de direito material entre duas pessoas maiores, capazes, que poderão eleger qualquer foro para dirimir seus conflitos relativos àquele contrato. Não pode a empresa, numa relação de consumo, ou o empregador, numa relação trabalhista, estabelecer qualquer foro; deverá ser respectivamente o do consumidor e do trabalhador.

O contrato, em caso de conflito, deverá ser anexado à petição inicial. Caso nada se fale contra o foro de eleição, é lá mesmo que a ação será julgada. Por quê? Porque estamos falando do interesse privado, o que significa que a competência pode ser prorrogada. A prorrogação de incompetência é tácita. Na situação em que a mulher, podendo, nada falou e o foro ficou aqui em Brasília mesmo, houve prorrogação tácita da competência. Acontece a partir do momento em que não houve a alegação de exceção de incompetência. Isso pode acontecer.  
 

Prevenção

Fenômeno processual pelo qual o juiz que primeiro tomar conhecimento da causa tem sobre ela firmada a sua competência. Está tratada nos arts. 106 e 219:

        Art. 106.  Correndo em separado ações conexas perante juízes que têm a mesma competência territorial, considera-se prevento aquele que despachou em primeiro lugar.

Como pode acontecer? Há quatro juízes. Eles têm todos a mesma competência: da Primeira Vara, Segunda, Terceira, Quarta. Na distribuição da minha petição inicial, sorteou-se a Terceira. A partir daí, todas as petições no mesmo processo deverão ser distribuídas para a Terceira Vara. O art. 219 fala relativamente ao juiz que pediu a citação. E, a partir daí, todas as petições intermediarias irão para o juiz que primeiramente tomou conhecimento da causa:

        Art. 219.  A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição.

        [...]

Exemplo: a área de uma propriedade rural engloba a divisa entre os estados de Minas Gerais e Goiás. De repente, surge um litígio a respeito daquela propriedade. O interessado ajuíza no estado de GO, que detém 10% da área da própria, ficando os outros 90% com MG, onde, depois de 4 messes, o outro interessado ajuíza uma ação com a mesma causa de pedir. De quem será a competência para julgar essa ação? De Goiás! Não importa o tamanho da área compreendida no estado, o que importa é que foi em Goiás que a ação foi ajuizada primeiramente.
 

Perpetuação da jurisdição

Firmada a competência de um juiz, ela perdura até o final da demanda. Essa é a perpetuação da jurisdição. Está disposta nos arts. 87 e 263:

        Art. 87.  Determina-se a competência no momento em que a ação é proposta. São irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem o órgão judiciário ou alterarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia.

TÍTULO VI
DA FORMAÇÃO, DA SUSPENSÃO E DA EXTINÇÃO DO PROCESSO

CAPÍTULO I
DA FORMAÇÃO DO PROCESSO

        [...]

        Art. 263.  Considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou simplesmente distribuída, onde houver mais de uma vara. A propositura da ação, todavia, só produz, quanto ao réu, os efeitos mencionados no art. 219 depois que for validamente citado.

Aquele juiz que iniciou o processo irá finalizá-lo. Não importa se ocorrer qualquer fato que seja, aquele juiz terá que finalizar. Mas se o juiz casar, for promovido, se mudar, falecer, o processo continuará naquela Vara, independente da pessoa física do juiz. Então não importa, por a competência foi firmada naquele lugar.

Com isso terminamos mais um tópico da competência. nas próximas aulas trabalharemos outros artigos.

Na quarta-feira veremos direitos reais, localização dos bens, dos fatos, onde morreu o autor da herança, e onde é o foro de competência para a abertura do inventário e partilha.