2.1 – Conceitos: negócio jurídico
e contrato
2.1.2 – Contrato vs. negócio
jurídico
2.2. – Requisitos de validade dos
contratos
2.2.1 – Capacidade das partes
2.2.2 – Vontade das partes
2.2.3 – Conteúdo do objeto do
contrato
2.2.4 – Forma dos contratos
Conceito de contrato
A primeira coisa que devemos
saber é o que é negócio jurídico. O que é um negócio jurídico? É a junção da manifestação
de vontade do homem com a intenção de gerar efeitos jurídicos. Tenho a vontade
de fazer algo e essa vontade gerará um efeito jurídico qualquer. Vontade de
dormir não é um negócio jurídico. Mas e se eu quero registrar meu filho? Tive a
vontade e essa vontade gerou alguma consequência jurídica. Isso é um negócio
jurídico. E o contrato? O contrato é um negócio jurídico.
Vamos lembrar da Matemática, mais
especificamente a teoria dos conjuntos. A única coisa que a professora lembra
de Matemática é que o contrato é um subconjunto
do negócio jurídico. O contrato é uma espécie do gênero negócio jurídico. Se o
contrato é um negócio jurídico, então, ao conceituar o contrato, podemos
começar com “negócio jurídico que...” mas, o que o diferencia do negócio jurídico?
O contrato dependerá da junção de pelo menos duas vontades.
Muito bem. Se dissemos que o
contrato é um negócio jurídico, aquelas regras para negócio jurídico valem para
contratos? Valem! Mas mais ainda: como o contrato é espécie, haverá mais regras.
Note a frase que falamos antes: “junção de duas vontades”. Não é o mesmo que duas pessoas! Isso inclusive é questão de prova: Adriana quer comprar um terreno.
Esse terreno é da Ana, do Rui e da Rita. Eles precisam ter a vontade de vender.
Não são duas pessoas envolvidas; são quatro; mas são duas vontades. Atenção
para isso!
Um conceito que a professora
gosta muito é o do próprio Clóvis Bevilácqua: “o contrato é o acordo de vontades para o fim de adquirir, resguardar,
modificar ou extinguir direitos.” É um conceito bem simples.
Cada vez que a norma jurídica
precisar de duas vontades, ela será um contrato.
Pois bem. Comprei uma casa, então
fiz um negócio jurídico. Mas é também um contrato, pois há duas vontades: a de
vender, do vendedor, e a minha, de comprar. E ao registrá-la? Negócio jurídico,
pois não preciso de mais ninguém. Somente da minha vontade para legitimar essa
compra.
Voltando: existem normas gerais
para os negócios jurídicos, que começam no art. 104 do Código Civil, e normas
gerais para os contratos, a partir do art. 421. Começando no art. 104, que é um
artigo com o qual devemos sonhar até decorá-lo: “A validade do negócio jurídico requer:
I – agente capaz;
II – objeto lícito,
possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou
não defesa em lei.”
Agente capaz. Objeto lícito. Não
pode haver coisa ilícita na jogada. A forma tem que ser prescrita ou não defesa
em lei. São esses os requisitos de validade do contrato? Temos partes,
capacidade, objeto e forma! Veja a identidade.
É nulo, e não anulável, o
contrato que não tenha tais requisitos. O contrato nulo nunca produzirá efeitos
jurídicos.
Importante, ao falar dessa
questão da capacidade das partes e elementos, que nosso contrato pode ter
elementos específicos para cada tipo de contrato. Como, por exemplo, no
contrato de depósito: a entrega da coisa. É o que veremos nos contratos em
espécie: no caso do contrato de depósito, não há contrato perfeito antes da
entrega da coisa; a mera declaração de vontades não é suficiente para o que
iremos chamar de aperfeiçoamento do
contrato.
Em nosso Código Civil temos 23
contratos em espécie. Claro que não veremos todos os que existem, mas
tentaremos ver os do Código. Há contratos na legislação extravagante. Mas, por
exemplo, quando virmos a locação, muito mais que a locação de bens móveis veremos
a locação de bens imóveis. Aí teremos que usar não só o Código Civil, mas
também a Lei no Inquilinato. Na compra e venda, o maior volume de normas está
no Código de Defesa do Consumidor e não no Código Civil.
Requisitos de validade dos contratos
Requisitos significam: condição
necessária para se chegar a certo fim. Precisamos disso para ter um contrato. O
requisito é a condição necessária para se chegar à validade dos contratos.
O primeiro que veremos é a
capacidade das partes. Está no art. 104, que fala, no inciso I, em agente
capaz. Agente capaz é o agente em geral capaz para todos os negócios jurídicos.
Vamos recordar o art. 1º do Código: “Toda
pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.” Essa é a regra mais geral.
Art. 2º: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a
lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.”
E os Arts. 3º e 4º: “São absolutamente incapazes de exercer
pessoalmente os atos da vida civil:
I – os menores de
dezesseis anos;
II – os que, por
enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para
a prática desses atos;
III – os que, mesmo por
causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.”
“São
incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:
I – os maiores de
dezesseis e menores de dezoito anos;
II – os ébrios habituais,
os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o
discernimento reduzido;
III – os excepcionais,
sem desenvolvimento mental completo;
IV – os pródigos.
Parágrafo único. A
capacidade dos índios será regulada por legislação especial.”
Os artigos 3º e 4º tratam respectivamente dos absolutamente
e relativamente incapazes.
Recordando isso, é importante
saber o que essa é a capacidade. É importante saber, entretanto, que para os
contratos precisamos de uma capacidade específica. Não é só essa capacidade
geral, no início do Código Civil.
Agora vejam: quais são mesmo as
condições da ação? Possibilidade jurídica do pedido, legitimidade das partes e
interesse de agir.
Aqui nos contratos também
precisaremos da legitimidade da parte ou partes. Para cada contrato haverá uma
legitimidade. A prática de cada ato do contrato terá sua própria legitimidade.
No contrato de locação, por exemplo, só terá legitimidade para receber o aluguel
o proprietário do imóvel. Isso posto, imagine que você está alugando o
apartamento de alguém e o filho do proprietário vem te cobrar. No terceiro mês
surge o dono, reclamando prestações vencidas dos últimos três meses. Aí sim
você chega à conclusão que o filho dono é um charlatão. Tinha ele legitimidade
para receber a quitação do aluguel? Não. Significa que paguei mal. O filho não
é agente capaz para receber, a não ser que tenha procuração do pai.
Outro exemplo: tutores. Não podem
comprar bens dos tutelados. Se sou tutor do Pedro, não posso comprar bens dele.
Se pudesse, eu mesmo estaria dando o preço de uma coisa que eu fosse comprar.
Então, para evitar isso, a lei não permite que tutores comprem bens dos tutelados.
Eles não têm capacidade de fazer esse negócio.
Temos outros exemplos: pai não
pode vender para filho sem autorização dos outros filhos e do cônjuge.
O que é importante sabermos
daqui? Que essa capacidade ou incapacidade para contratar não é perene,
absoluta. Ela é específica, para começar. O tutor não pode praticar compra e
venda com bens do tutelado, mas pode fazer outras coisas. Se amanhã o sujeito
não é mais tutor, ele poderá comprar bens do ex-tutelado. Precisamos, portanto,
ter em mente que essa legitimidade contratual é circunstancial.
Legitimidade e capacidade
contratual são sinônimos. Vamos usar o termo capacidade.
Vontade das partes
Na aula passada vimos que, sem
vontade, não há contrato válido. Então precisamos ter a liberdade, a livre
vontade de contratar. E, aqui, quando demos o exemplo, vimos que precisamos de
pelo menos duas vontades. Não estabelecemos aqui o número de pessoas, mas o
número de interesses para contratar. Para entender, volte à questão da compra e
venda do terreno que pertence a três pessoas: há quatro pessoas envolvidas, o
comprador e os três proprietários, mas apenas dois interesses na jogada:
comprar e vender.
É importante notar que essas vontades
são requeridas de pessoas capazes de celebrar. Nem sempre quem assina é parte
contratual. Interessante isso. Sempre quem assina o contrato é parte
contratual? Isso já caiu em concurso.
Representante legal, por exemplo: Assina, mas não é parte. Outro exemplo:
contrato de locação. Exemplo: Adriana tem uma casa, e resolveu fazer um
contrato de locação com Rui. Até aqui tudo bem. Porém, após certo tempo Adriana
resolveu vender o imóvel. Vendeu a casa para a Ana. O contrato de locação
determinava que, mesmo com a venda, a locação subsistiria. Dessa forma, o contrato
de locação continua existindo. Quem assinou o contrato de locação foi a Ana?
Não. Foi Adriana. Hoje, Adriana não é mais parte do contrato de locação, mas foi ela quem assinou.
Observações:
Mas há contratos que requerem
declarações expressas de vontade. Manifestação
expressa é aquela que deixa clara a intenção da parte. Em prova de concurso caiu: “um contrato de doação, para
ter validade, tem que ser realizado expressamente, a não ser que o bem seja de
pequeno valor e a entrega seja feita em seguida.” Verdade? Não. A lei fala escrito, mas não expresso! Veja a diferença.
Quem cala não necessariamente
consente. Só excepcionalmente. É o teor do art. 111 do Código, que já estudamos
no terceiro semestre: “O silêncio importa
anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for
necessária a declaração de vontade expressa.” Outro exemplo: locação feita
por tempo determinado. Se as partes permanecerem em silêncio, o contrato se
renovará automaticamente por tempo indeterminado. É uma previsão específica da
lei.
Conteúdo do objeto do contrato
Vamos entender primeiramente o
que é objeto do contrato. Quais são as obrigações que temos? De fazer, de dar,
de não fazer. Basicamente essas. Num contrato de compra e venda de um carro, o
objeto é o carro! É portanto uma obrigação de dar. Se contrato alguém para
desentupir a pia da minha casa, o objeto do contrato é a prestação daquele
serviço.
Ou também o contrato que impede
que o sujeito não trabalhe para concorrente dentro de um ano: obrigação de não
fazer.
O objeto tem que ser possível,
determinado ou ao menos determinável.
Vimos também no art. 104 que o
objeto tem que ser lícito. Não pode contrariar lei, moral e bons costumes. Pense
nisso: era uma vez uma montadora de veículos que resolveu expor o novíssimo
carro no aeroporto. Para apresentá-lo e atrair olhares para o lugar, uma linda
jovem de roupas vermelhas foi contratada para posar ao lado do carro,
“apresentando-o”. Entretanto, o contrato previa que a mulher deveria ficar de
boca calada durante as oito horas que ficasse expondo o carro. Depois de muitas
horas, uma amiga apareceu por acaso, e elas apenas se cumprimentaram
rapidamente. O chefe logo notou e apareceu, repreendendo-a.
Pois bem: é lícito o contrato em
que a parte fica obrigada a demonstrar um carro durante oito horas, mas atenta
contra a moral e os bons costumes exigir que ela ficasse absolutamente calada.
Esse contrato, portanto, não é lícito.
No objeto também veremos a
questão da possibilidade. A possibilidade pode ser física ou jurídica. Contratar
uma muda para cantar é um objeto impossível, daí não se pode ter contrato
válido. Por fim, a impossibilidade jurídica: contrato de compra e venda de
drogas.
Art. 426: “Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.” É mais
uma impossibilidade jurídica. Exemplo específico: para contratos, contrato de
herança de pessoa viva chamamos de pacta
corvina (referente aos corvos, aves associadas à morte, vindoura ou
consumada). Imagine que tenho uma avó moribunda que tem uma casa, e vou
herdá-la. Já antevendo esse quadro, sabendo que estou precisando de dinheiro, entro
em contato com Carmelita, minha amiga, dizendo-a: quer comprar a casa que estou
para herdar? Não será possível. Nem mesmo poder-se-á alegar pacta sunt servanda pela
própria impossibilidade jurídica desse contrato.
E coisa litigiosa, pode ser
objeto de contrato? Pode! Há um risco sobre qualquer transação envolvendo bens
cuja propriedade está sendo disputada em juízo. Mas não há impedimento legal.
Aquele quem o juiz declarar como legítimo proprietário de uma casa sob disputa
poderá reivindicar o bem com quem quer que esteja, antes ou depois de haver
transação. Exemplo: Hermínio disputa com sua irmã Hermione, em juízo, a casa
que seu falecido pai deixou. Hermínio se apressa a vendê-la para Hermógenes,
seu primo, e finaliza a transação. Hermógenes está agora na posse da Casa.
Pouco depois, após analisar mais cautelosamente o testamento de Hermófilo, pai
de Hermínio e Hermione, o magistrado nota que a casa deveria ficar com a filha,
e a declara como proprietária. Ela poderá reivindicar a casa que encontra-se em
poder de Hermógenes.
Podemos vender coisas futuras
também. Isso se encaixa na descrição de objeto determinável. Exemplo: frutos
por colher daqui a quatro meses.
E se a impossibilidade do objeto
for posterior ao momento da feitura do contrato? Aí sim analisa-se se houve
culpa ou não de uma das partes, para saber se caberá ou não indenização. Foi caso
fortuito, ou força maior? Se for imprevisível, não deverá haver indenização.
Se contrato com a Ivete Sangalo
para cantar aqui em nossa formatura, mas bem no dia ela ficar doente, ficaremos
tão chateados que pensaremos imediatamente em pedir perdas e danos. Mas não
podemos, já que, em regra, ficar doente é um caso fortuito. Mas poderemos
provar que alguém sabia que iria ficar doente; cada um descobre como provar.
Fato é: sem prova, sem sucesso.
Ter razão e não provar de nada adianta.
E a questão de o objeto ser
determinado ou determinável? Posso comprar “alguma coisa” de alguém? Não,
preciso especificar. Um mínimo de determinação é necessário. O objeto tem que
ser suscetível de avaliação em dinheiro. Se o juiz está olhando para um
contrato, é porque houve algum problema. Com o problema, temos que ter uma
valoração. Como vamos a juízo sem ter valor da causa? Não há como.
Forma dos contratos
É a forma é como vamos
exteriorizar a vontade de contratar. A forma não pode ser defesa em lei. Por via de
regra, a forma é livre. Art. 107: “A
validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando
a lei expressamente a exigir.” A validade não depende de determinação
especial. A forma tem que ser expressa ou tácita.
Há contratos formais, que são
aqueles para os quais a lei determina uma forma para eles, e também os
informais, cuja lei nenhuma forma determina. A compra e venda em si não é um
contrato formal, mas o registro de imóvel é um ato formal.