Começamos a compra e venda e fomos até as restrições legais
à liberdade de comprar e vender. Vimos a venda a cônjuge, que é permitida desde
que de seja de bens excluídos da comunhão. Temos que saber os termos! Depois
falamos de venda a menores. É crime vender a menores bebida, cigarro, produtos
pornográficos, fogos e bilhetes de loteria. As provas de concurso geralmente
colocam o que não é óbvio. Não perguntarão se é crime vender bebida e cigarro a
crianças, o que é óbvio, mas perguntarão sobre o bilhete de loteria.
Vamos continuar.
Venda a descendente
Ascendentes não podem
vender a descendentes sem que os demais descendentes e o cônjuge consintam
expressamente. A venda será passível de anulação. Art. 496: “É anulável a venda de ascendente a
descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante
expressamente houverem consentido.” Ana é casada com Rui. Eles têm três
filhos: Xerxes, Yone e Zumiro. Se Ana quiser vender alguma coisa para Xerxes,
como um apartamento, ela precisará da autorização de Yone, Zumiro e Rui. Depois
do Código Civil de 2002, Rui também é herdeiro. Isso influenciará todos, daí a
necessidade da autorização. E se não der, a compra terá validade? Sim, desde
que ninguém se manifeste. Veremos que há um prazo para se anular a venda.
Parágrafo único: “Em
ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime de bens for
o da separação obrigatória.”
A regra vale, portanto, para comunhão absoluta, parcial ou
aquestos. Se o regime de comunhão for a separação obrigatória, como o regime
que deve ser usado quando um dos cônjuges tem mais de 60 anos, a anuência é dispensável.
Questões importantes:
Yone tem 10 anos de idade. Ela tem condições de dar
autorização nessa compra? Ter-se-á, nessas situações, que ir a juízo. O juiz
irá designar um curador especial, não necessariamente o Ministério Público.
Pode ser um parente ou amigo. Ele analisará a situação, vendo se não trará
prejuízo para Yone. O curador irá suprir a autorização.
E se Zumiro estiver no Tibete, e ninguém consegue
encontrá-lo? O que fazer? Para não invalidar, novamente deverá ser feito pedido
judicial e o próprio juiz irá suprir essa autorização, avaliando a
possibilidade de prejuízo imediato ou mediato.
E outra situação: quando eram mais novos, Xerxes roubou a
namorada de Zumiro. Este tem ódio daquele. Quando Ana foi pedir autorização
para Zumiro para vender o apartamento a Xerxes, aquele não deu. E ainda
sinalizou que irá anular a venda. O que fazer? Comunicar ao juiz que houve
negativa injusta. O juiz suprirá se concorda com a injustiça da negativa. O
apartamento é de Ana e ela poderá dispor livremente, desde que não traga
prejuízo a ninguém.
E se Zumiro for casado com Wandirene, depois de voltar do
Tibete? Se casado com comunhão absoluta, precisará Ana da autorização de Wandirene
para vender o apartamento? A maioria da doutrina defende que, se o legislador
entendesse necessário, ele mencionaria essa hipótese expressamente. A doutrina
minoritária afirma que não há como a lei falar sobre tudo, e que, como o
casamento é em comunhão universal, qualquer prejuízo sofrido por Zumiro também
será sofrido por Wandirene.
Prazos
Art. 179 do CC: “Quando
a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para
pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão
do ato.”
É o nosso caso. Na compra e venda, não há prazo. Então,
usamos o art. 179. Significa que Zumiro terá dois anos para voltar do Tibete e
requerer a anulação. Yone, por sua vez, terá até seus 12 anos de idade para
reclamar. A doutrina alega que esse prazo é demasiadamente curto.
Súmula 494 do STF: “A ação
para anular venda de ascendente a descendente, sem consentimento dos demais,
prescreve em vinte anos, contados da data do ato, revogada a súmula 152”
Houve revogação tácita dessa súmula pois é anterior ao
Código Civil de 2002, que mudou todos os prazos. Caberá discussão em qualquer
sentido, agora. Há quem diga inclusive que essa ação só poderia ser intentada
depois da morte da Ana, pois do contrário seria um caso de pacta corvina! A jurisprudência ainda é bem dividida.
Compra por pessoa
encarregada de zelar por interesse do vendedor
Os que têm por dever
ou profissão (tutores, curadores, testamenteiros, administradores) não podem comprar
bens confiados à sua guarda. Estão proibidos de adquirir bens do daquele
por quem zela, sob pena de nulidade absoluta. Nada mais lógico. Se eu administro os bens de alguém que tem 10 anos
de idade, eu mesmo estipulo o preço, e não posso comprá-los. O juiz, caso o
sujeito esteja passando fome, mandará colocar no mercado antes de autorizar a
venda para mim mesmo. É complicadíssimo comprar bens do tutelado. O Ministério
Público terá que intervir.
Advogado pode comprar bens do constituinte! Súmula 165 do
Supremo: “a venda realizada diretamente
pelo mandante ao mandatário não é atingida pela nulidade do art. 1133, II, do
código civil.”
Outra coisa importante está no art. 497 do Código: “Sob pena de nulidade, não podem ser
comprados, ainda que em hasta pública:
I – pelos tutores, curadores,
testamenteiros e administradores, os bens confiados à sua guarda ou
administração;
II – pelos servidores
públicos, em geral, os bens ou direitos da pessoa jurídica a que servirem, ou
que estejam sob sua administração direta ou indireta;
III – pelos juízes,
secretários de tribunais, arbitradores, peritos e outros serventuários ou
auxiliares da justiça, os bens ou direitos sobre que se litigar em tribunal,
juízo ou conselho, no lugar onde servirem, ou a que se estender a sua
autoridade;
IV – pelos leiloeiros
e seus prepostos, os bens de cuja venda estejam encarregados.
Parágrafo único. As
proibições deste artigo estendem-se à cessão de crédito.”
Perito, que é quem determina o valor de mercado, obviamente
não poderá comprar bens que ele mesmo avaliou.
Venda por condomínio
indivisível
O que é isso? Seu apartamento é um condomínio indivisível?
Não. Indivisíveis são áreas que, se fossem divididas, ficariam menores do que a
área mínima permitida por lei. Art. 504: “Não
pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro
consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento
da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a
estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de
decadência.
Parágrafo único. Sendo
muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior valor e, na
falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem iguais, haverão a
parte vendida os comproprietários, que a quiserem, depositando previamente o
preço.”
Vamos imaginar, agora, uma mansão com quatro proprietários,
A, B, C e D, em condomínio. A, precisando de dinheiro, resolve vender sua
parte. Ele não poderá oferecer para pessoas estranhas à propriedade; ele deverá
oferecer, primeiramente, para B, C e D. A pode querer vender para E, seu primo,
mas não poderá fazê-lo se um ou mais dos outros donos quiserem; estes têm
preferência.
Pode ser que A e D tenham um problema pessoal, o que poderia
levar A a querer tirar vantagem de D, oferecendo, para este, sua parte por um
preço igual a três vezes o razoável. Também não poderá fazer isso. É o que diz
a expressão “tanto por tanto”, usada no artigo, que significa: o mesmo preço.
Não poderá haver nenhuma forma de discriminação aqui, como estipular preço
abusivo dependendendo do interessado, como preferência por um dos outros
condôminos.
Outra situação é que A pode ser o único sujeito que está
residindo na mansão, apesar de ela possuir outros três proprietários, mas que
moram em outra cidade. A, precisando de dinheiro, resolve vender sua quota para
alguém, então anuncia nos classificados. F, interessado, se apresenta e compra
a quota de A por exatamente ¼ do valor da casa, o valor certo. Como era A quem
estava morando na casa, F ocupa seu lugar. B, C e D, os outros donos, nada
sabem do que aconteceu.
Quando ficarem sabendo, eles notarão o descumprimento da lei
praticado por A, afinal eles deveriam ter preferência. Se um dos três tivesse
interesse em adquirir a parte de A. Qual a solução? Ajuizar ação anulatória de
negócio jurídico. Assim, a quota voltaria à propriedade de A, para que fique à
disposição de B, C ou D para adquirirem. Qual o prazo? 180 dias da data da
conclusão do ato. Mas há divergência: Maria Helena Diniz, por exemplo, defende
que esse prazo deve começar a contar da data em que se teve ciência da venda
irregular, pois muitas vezes os coproprietários não ficam sabendo mesmo. A
jurisprudência já admitiu flexibilização desse prazo. Os condôminos terão
direito real sobre o bem.