Os contratos, como qualquer outro
negócio jurídico, têm um ciclo de vida. Nascem, de acordo com as vontades,
produzem seus efeitos, as partes cumprem suas obrigações e depois se extinguem.
Essa é a forma esperada para a extinção de um contrato. É também aquela chamamos de
forma normal, natural, esperada. É aquela em que as partes cumprem suas
obrigações. O contrato surte o efeito desejado no momento em que foi feito.
Depois, extingue-se e esse tipo de contrato não trará problema para ninguém.
Imagine que pretendo comprar o
notebook do Lucas, e ele está disposto a vendê-lo. Acertamos o valor de R$ 3.000,00.
A obrigação foi cumprida, e tudo está acertado. Isso é o esperado, é o que se
deseja nos contratos. Essa é a extinção do contrato pela execução, ou com cumprimento.
É o que foi cumprido: entrego o dinheiro, ele me entrega o computador.
Dois temas temos que ter atenção:
primeiro, o termo quitação. Significa
“recibo”. Quem dá o recibo? O credor. Importante é que o recibo é uma obrigação
do credor, e não é uma faculdade. Quem recebe tem a obrigação de dá-lo, uma
comprovação de que recebeu. Sem recibo, o devedor simplesmente não precisa
pagar, e não estará em débito nem em mora.
Solvens é outro termo que precisamos saber: é aquele que paga. É o
devedor no momento em que adimple sua
obrigação. Não é puramente sinônimo de devedor, mas sim devedor no momento
do pagamento. Se a quitação for recebida de forma irregular, o solvens poderá não pagar. Sem recibo, o sujeito
poderá não pagar, e não terá contra si os efeitos da mora.
O que mais nos interessa é a
extinção do contrato no sentido litigioso, contencioso. O objetivo é que o
contrato chegue ao seu cumprimento com a execução. Mas, por via de regra, o que
mais trabalhamos é a extinção do contrato pela inexecução. Alguém não cumpriu o
que tinha prometido; algo aconteceu. Essa extinção pela inexecução, sem
cumprimento, é a em que o contrato se extingue sem que as partes tenham
atingido seus objetivos. Essa extinção pode ser dar em dois momentos distintos: primeiro deles: por causas anteriores ou
contemporâneas à formação do contrato, quer dizer, algo inesperado aconteceu
antes do contrato ser formado ou durante sua formação que não permitiu que o
contrato fosse cumprido. Segundo: por causas supervenientes, por algo que
aconteceu depois que o contrato se formou. Vamos ver as primeiras.
Causas anteriores ou contemporâneas
Teremos que lembrar no art. 104.
“A validade do negócio jurídico requer: agente
capaz, objeto lícito, possível e determinado ou determinável e forma prescrita
ou não defesa em lei.” O artigo traz os defeitos decorrentes da falta se
seus requisitos subjetivos. É um artigo para decorarmos. Qual é o requisito subjetivo
que está elencado o art. 104? Agente capaz. Se quem contratou não era capaz,
então não temos contrato válido. Lembrem-se também do princípio da autonomia da
vontade. Sem vontade, não há validade; há vício. São dois vícios subjetivos,
que tratamos aqui. São, portanto, a capacidade e a vontade. Em outras palavras,
incapacidade ou vício na vontade acabam com o contrato. Posso ter sido coagido,
forçado, induzido a contratar...
Também pode haver defeitos
decorrentes da falta dos requisitos objetivos: o objeto tem que ser lícito,
possível e determinado ou determinável. Se houver problema no objeto, dizemos
que há problema na formação do contrato.
E, por fim, os defeitos
decorrentes da falta de requisitos formais. A forma tem que ser a prescrita ou
pelo menos a não defesa em lei. Se o contrato tiver que ser feito por escrito e
não foi, temos um defeito de forma, o que é uma causa contemporânea à formação
do contrato.
Esses três motivos causarão
nulidade ou anulabilidade contratual. Em outras palavras, nulidade relativa ou
nulidade absoluta. Dependerá da gravidade do defeito, da situação, da
sanabilidade, perenidade do defeito. Lembrem-se que o contrato nulo nunca
produz efeito, e a sentença que o declara nulo tem efeitos ex-tunc. O anulável, se assim vier reconhecido em sentença
judicial, esta terá efeitos ex-nunc, produzindo efeitos somente a partir de sua decretação da anulação.
Cada caso terá que ser analisado
separadamente. Prevalece a máxima: “cada caso, um caso.” Alguns contratos podem
ser realizados até com absolutamente incapazes: doação, por exemplo. Quem a
aceita é seu representante legal.
Causas supervenientes à formação do contrato
São as mais comuns. O contrato se
formou perfeitamente, sem problemas, o agente é capaz, a forma está perfeita,
não há vício na vontade, o objeto é lícito. No entanto, depois, ocorreu alguma
espécie de rescisão contratual. Isso é muito importante para quem mexe com
contratos: a rescisão. Temos que saber muito bem sobre a resolução contratual. A resolução traz uma ideia de insatisfação. O contrato teve algum
problema depois de sua formação, e uma das partes ficou insatisfeita.
Insatisfação lembra um “querer mais”.
A resolução pode ser dar por
inexecução voluntária, o que trará uma ideia de culpa. Não confunda com o Direito Penal, que diferencia o dolo da
culpa. A resolução contratual também pode se dar por inexecução involuntária,
sem culpa.
Voltemos ao contrato de compra e
venda do notebook do Lucas: se ele desistiu de vender, houve culpa da parte
dele. Quem queria comprar não ficou feliz: veja a ideia de insatisfação
aparecendo aqui. Insatisfação semelhante aconteceria se o comprador aparecesse
no dia sem o dinheiro. Em qualquer desses casos há culpa.
Quando falamos em culpa, falamos
em responsabilidade civil. O contrato que se resolve com culpa ensejará perdas
e danos. Por outro lado, também a resolução pode ser involuntária. O que é
isso? Caso fortuito ou força maior. Neste caso não há culpa.
Voltemos, então, à questão da responsabilidade
civil apenas para lembrarmos. Qual é a regra da responsabilidade civil? Ação culposa, que, com o nexo causal, produz de um dano. São esses três elementos: deve estar presente
uma ação ilícita que está ligada ao dano, através do nexo causal. Para o Código
Civil, tem que haver uma culpa: é a teoria subjetiva da responsabilidade civil.
No CDC, a teoria da responsabilidade civil é a objetiva, e não precisa de
culpa.
Sem culpa, como em caso de roubo
ou furto da coisa, não cabe falar em perdas e danos, mas sim em ressarcimento, em devolução de valores
pagos. Essa é a resolução, a ideia de insatisfação.
Resilição
Vamos ouvir todos os dias
enquanto estivermos falando em contratos. Em breve inciaremos o estudo dos
contratos em espécie, e, em todo contrato que veremos, como o de de compra e
venda, estudaremos os elementos: conceito, requisitos, obrigação das partes e
extinção do contrato. A extinção do contrato pode se dar por resilição
unilateral, por exemplo. Vamos ver o que é isso. A resilição, para diferenciar
da resolução, não traz a ideia de insatisfação. Se ocorre resilição, ninguém
fica insatisfeito. Vamos entender com um típico exemplo de resilição bilateral.
Como já falamos, não há
insatisfação. Se é bilateral, ela é praticada pelas duas partes, por meio do distrato. Antes elas contrataram, agora
estão distratando. Ocorre resilição bilateral
quando as duas partes concordam em desfazer o negócio. Não traz a ideia de
insatisfação, e ninguém está insatisfeito. Essa é a resilição bilateral.
Exemplo: pouco depois de fechar negócio com Lucas, me dirijo a ele e digo:
“Lucas, estive pensando, e acho que é melhor não fazermos esse negócio.” No que
ele responde “Pois é, eu acho que vou é precisar mesmo do meu note!”
E a resilição unilateral? Alguns
contratos permitem a resilição unilateral, ou seja, esperam por ela. Exemplo:
contrato de trabalho. O empregado que resolve ir embora não precisa indenizar o
empregador. Nosso contrato de trabalho prevê a resilição de um lado só:
unilateral. Por outro lado o empregador poderá dizer que não mais precisa dos
serviços do empregado. Cabe indenização? Não, pois a resilição é um fenômeno
jurídico típico do contrato de trabalho.
Em regra, os contratos por
tempo indeterminado permitem a resilição unilateral. Casamento, por exemplo. Não
se pode forçar alguém a ficar eternamente ligado a um contrato. Outro exemplo:
contrato de locação por tempo determinado. Pode ser contratado por tempo
determinado mas renovável por tempo indeterminado.
O que é mesmo denúncia? Há a denúncia
vazia e a cheia: aquela, sem motivação; esta, com. Em contrato de locação
caberia indenização pelo inquilino não mais querer ficar? Não faria sentido.
Alguns contratos permitem a
resilição unilateral. Imagine este cenário: passarei um ano morando fora.
Desfiz-me das minhas coisas, e contatei Talita, dona de uma enorme casa,
pedindo que cuidasse de minha novíssima geladeira durante esse tempo. É um
contrato de quê? Depósito. Não poderia ser de empréstimo? Até poderia, mas
neste a Talita usaria o objeto, enquanto que no depósito pressupõe-se somente a
entrega e a guarda, sem uso. Seis meses depois, meu dinheiro acabou e voltei da
Índia. Quero a geladeira de volta. Talita pode objetar e exigir que a geladeira
fique lá por mais seis meses, até que se complete o período de um ano? Não
faria lógica. O contrato de depósito, portanto, permite a resilição por parte do depositante, não pelo
depositário, que não pode resilir unilateralmente. Imagine que estou em
Bangalore e, de repente, Talita me manda um e-mail mandando vir buscar a
geladeira imediatamente! Portanto, a resilição não traz a ideia de
instatisfação.
A morte como causa superveniente de extinção do contrato
Todo contrato se extingue com a
morte? Não todos. Os intuitu personae
se extinguem com a morte, via de regra.
Se Xuxa, que viria cantar, morre, poderá comparecer Sasha? Não mesmo. A morte
poderá ensejar a devolução de valores já pagos, mas indenização não. Imagine o
que seria pedir indenização ao filho do morto...
Exercício do direito de arrependimento
Podemos nos arrepender dos
contratos feitos? Não, por força do pacta
sunt servanda. Logo, via de regra, também não se pode arrepender de se ter
contratado. A não ser que haja uma cláusula de arrependimento.
Exemplo: de novo a compra e venda
do notebook do Lucas. Podemos estabelecer uma cláusula de arrependimento. Código
Civil, art. 420: “Se no contrato for estipulado
o direito de arrependimento para qualquer das partes, as arras ou sinal terão
função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em
benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente.
Em ambos os casos não haverá direito a indenização suplementar.” A cláusula
de arrependimento sempre deverá trazer, consigo, arras. As arras têm função
indenizatória. Para que servirão essas arras? Geralmente elas têm duas funções:
podem ser confirmatórias ou indenizatórias. No caso de cláusula de
arrependimento, elas serão indenizatórias, apenas. A confirmatória é dada por
alguém que não tem interesse de que o sujeito desista do negócio. As
indenizatórias, por sua vez, são dadas no caso de: “se eu desistir, tu ficarás
com as arras a título de indenização.” Então, se adiantei dinheiro ao Lucas
para que concretizasse o negócio depois, ele poderá retê-lo caso eu venha a
desistir de efetivar a compra.
Quem as deu perdê-las-á. Quem as
recebeu devolvê-las-á em dobro. É o texto do art. 420. Note que as arras
indenizatórias são a indenização em si, e substituem as perdas e danos. Quem
contrata já sabia que poderia se arrepender. No caso de arras indenizatórias,
não se fala em perdas e danos.
Por último, para fecharmos, vamos
rever a cláusula resolutória. Art. 475: “A
parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não
preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização
por perdas e danos.” Isso quer dizer que, se tivermos um contrato
sinalagmatico ou bilateral, que traz automaticamente uma cláusula resolutiva tácita,
uma das partes poderá deixar de cumprir sua obrigação caso a outra também não
cumpra. Se a cláusula for expressa, operará de pleno direito; se tácita,
dependerá de interpelação. É o art. 474: “A
cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de
interpelação judicial.”