Direito Civil

sexta-feira, 26 de março de 2010

Extinção do contrato


9 – Da extinção do contrato
9.1 – Da extinção do contrato pela execução (com cumprimento)
9.2 – Da extinção do contrato pela inexecução (sem cumprimento)
9.2.1 – Modos de extinção sem cumprimento
Resolução
Resilição
Morte

9.2.2 – Exercício do direito de arrependimento
9.2.3 – Implemento da cláusula resolutiva “pacto comissório”

Os contratos, como qualquer outro negócio jurídico, têm um ciclo de vida. Nascem, de acordo com as vontades, produzem seus efeitos, as partes cumprem suas obrigações e depois se extinguem. Essa é a forma esperada para a extinção de um contrato. É também aquela chamamos de forma normal, natural, esperada. É aquela em que as partes cumprem suas obrigações. O contrato surte o efeito desejado no momento em que foi feito. Depois, extingue-se e esse tipo de contrato não trará problema para ninguém.

Imagine que pretendo comprar o notebook do Lucas, e ele está disposto a vendê-lo. Acertamos o valor de R$ 3.000,00. A obrigação foi cumprida, e tudo está acertado. Isso é o esperado, é o que se deseja nos contratos. Essa é a extinção do contrato pela execução, ou com cumprimento. É o que foi cumprido: entrego o dinheiro, ele me entrega o computador.

Dois temas temos que ter atenção: primeiro, o termo quitação. Significa “recibo”. Quem dá o recibo? O credor. Importante é que o recibo é uma obrigação do credor, e não é uma faculdade. Quem recebe tem a obrigação de dá-lo, uma comprovação de que recebeu. Sem recibo, o devedor simplesmente não precisa pagar, e não estará em débito nem em mora.

Solvens é outro termo que precisamos saber: é aquele que paga. É o devedor no momento em que adimple sua obrigação. Não é puramente sinônimo de devedor, mas sim devedor no momento do pagamento. Se a quitação for recebida de forma irregular, o solvens poderá não pagar. Sem recibo, o sujeito poderá não pagar, e não terá contra si os efeitos da mora.

O que mais nos interessa é a extinção do contrato no sentido litigioso, contencioso. O objetivo é que o contrato chegue ao seu cumprimento com a execução. Mas, por via de regra, o que mais trabalhamos é a extinção do contrato pela inexecução. Alguém não cumpriu o que tinha prometido; algo aconteceu. Essa extinção pela inexecução, sem cumprimento, é a em que o contrato se extingue sem que as partes tenham atingido seus objetivos. Essa extinção pode ser dar em dois momentos distintos: primeiro deles: por causas anteriores ou contemporâneas à formação do contrato, quer dizer, algo inesperado aconteceu antes do contrato ser formado ou durante sua formação que não permitiu que o contrato fosse cumprido. Segundo: por causas supervenientes, por algo que aconteceu depois que o contrato se formou. Vamos ver as primeiras.

 

Causas anteriores ou contemporâneas

Teremos que lembrar no art. 104. “A validade do negócio jurídico requer: agente capaz, objeto lícito, possível e determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei.” O artigo traz os defeitos decorrentes da falta se seus requisitos subjetivos. É um artigo para decorarmos. Qual é o requisito subjetivo que está elencado o art. 104? Agente capaz. Se quem contratou não era capaz, então não temos contrato válido. Lembrem-se também do princípio da autonomia da vontade. Sem vontade, não há validade; há vício. São dois vícios subjetivos, que tratamos aqui. São, portanto, a capacidade e a vontade. Em outras palavras, incapacidade ou vício na vontade acabam com o contrato. Posso ter sido coagido, forçado, induzido a contratar...

Também pode haver defeitos decorrentes da falta dos requisitos objetivos: o objeto tem que ser lícito, possível e determinado ou determinável. Se houver problema no objeto, dizemos que há problema na formação do contrato.

E, por fim, os defeitos decorrentes da falta de requisitos formais. A forma tem que ser a prescrita ou pelo menos a não defesa em lei. Se o contrato tiver que ser feito por escrito e não foi, temos um defeito de forma, o que é uma causa contemporânea à formação do contrato.

Esses três motivos causarão nulidade ou anulabilidade contratual. Em outras palavras, nulidade relativa ou nulidade absoluta. Dependerá da gravidade do defeito, da situação, da sanabilidade, perenidade do defeito. Lembrem-se que o contrato nulo nunca produz efeito, e a sentença que o declara nulo tem efeitos ex-tunc. O anulável, se assim vier reconhecido em sentença judicial, esta terá efeitos ex-nunc, produzindo efeitos somente a partir de sua decretação da anulação.

Cada caso terá que ser analisado separadamente. Prevalece a máxima: “cada caso, um caso.” Alguns contratos podem ser realizados até com absolutamente incapazes: doação, por exemplo. Quem a aceita é seu representante legal.

 

Causas supervenientes à formação do contrato

São as mais comuns. O contrato se formou perfeitamente, sem problemas, o agente é capaz, a forma está perfeita, não há vício na vontade, o objeto é lícito. No entanto, depois, ocorreu alguma espécie de rescisão contratual. Isso é muito importante para quem mexe com contratos: a rescisão. Temos que saber muito bem sobre a resolução contratual. A resolução traz uma ideia de insatisfação. O contrato teve algum problema depois de sua formação, e uma das partes ficou insatisfeita. Insatisfação lembra um “querer mais”.

A resolução pode ser dar por inexecução voluntária, o que trará uma ideia de culpa. Não confunda com o Direito Penal, que diferencia o dolo da culpa. A resolução contratual também pode se dar por inexecução involuntária, sem culpa.

Voltemos ao contrato de compra e venda do notebook do Lucas: se ele desistiu de vender, houve culpa da parte dele. Quem queria comprar não ficou feliz: veja a ideia de insatisfação aparecendo aqui. Insatisfação semelhante aconteceria se o comprador aparecesse no dia sem o dinheiro. Em qualquer desses casos há culpa.

Quando falamos em culpa, falamos em responsabilidade civil. O contrato que se resolve com culpa ensejará perdas e danos. Por outro lado, também a resolução pode ser involuntária. O que é isso? Caso fortuito ou força maior. Neste caso não há culpa.

Voltemos, então, à questão da responsabilidade civil apenas para lembrarmos. Qual é a regra da responsabilidade civil? Ação culposa, que, com o nexo causal, produz de um dano. São esses três elementos: deve estar presente uma ação ilícita que está ligada ao dano, através do nexo causal. Para o Código Civil, tem que haver uma culpa: é a teoria subjetiva da responsabilidade civil. No CDC, a teoria da responsabilidade civil é a objetiva, e não precisa de culpa.

Sem culpa, como em caso de roubo ou furto da coisa, não cabe falar em perdas e danos, mas sim em ressarcimento, em devolução de valores pagos. Essa é a resolução, a ideia de insatisfação.

 

Resilição

Vamos ouvir todos os dias enquanto estivermos falando em contratos. Em breve inciaremos o estudo dos contratos em espécie, e, em todo contrato que veremos, como o de de compra e venda, estudaremos os elementos: conceito, requisitos, obrigação das partes e extinção do contrato. A extinção do contrato pode se dar por resilição unilateral, por exemplo. Vamos ver o que é isso. A resilição, para diferenciar da resolução, não traz a ideia de insatisfação. Se ocorre resilição, ninguém fica insatisfeito. Vamos entender com um típico exemplo de resilição bilateral.

Como já falamos, não há insatisfação. Se é bilateral, ela é praticada pelas duas partes, por meio do distrato. Antes elas contrataram, agora estão distratando. Ocorre resilição bilateral quando as duas partes concordam em desfazer o negócio. Não traz a ideia de insatisfação, e ninguém está insatisfeito. Essa é a resilição bilateral. Exemplo: pouco depois de fechar negócio com Lucas, me dirijo a ele e digo: “Lucas, estive pensando, e acho que é melhor não fazermos esse negócio.” No que ele responde “Pois é, eu acho que vou é precisar mesmo do meu note!”

E a resilição unilateral? Alguns contratos permitem a resilição unilateral, ou seja, esperam por ela. Exemplo: contrato de trabalho. O empregado que resolve ir embora não precisa indenizar o empregador. Nosso contrato de trabalho prevê a resilição de um lado só: unilateral. Por outro lado o empregador poderá dizer que não mais precisa dos serviços do empregado. Cabe indenização? Não, pois a resilição é um fenômeno jurídico típico do contrato de trabalho.

Em regra, os contratos por tempo indeterminado permitem a resilição unilateral. Casamento, por exemplo. Não se pode forçar alguém a ficar eternamente ligado a um contrato. Outro exemplo: contrato de locação por tempo determinado. Pode ser contratado por tempo determinado mas renovável por tempo indeterminado.

O que é mesmo denúncia? Há a denúncia vazia e a cheia: aquela, sem motivação; esta, com. Em contrato de locação caberia indenização pelo inquilino não mais querer ficar? Não faria sentido.

Alguns contratos permitem a resilição unilateral. Imagine este cenário: passarei um ano morando fora. Desfiz-me das minhas coisas, e contatei Talita, dona de uma enorme casa, pedindo que cuidasse de minha novíssima geladeira durante esse tempo. É um contrato de quê? Depósito. Não poderia ser de empréstimo? Até poderia, mas neste a Talita usaria o objeto, enquanto que no depósito pressupõe-se somente a entrega e a guarda, sem uso. Seis meses depois, meu dinheiro acabou e voltei da Índia. Quero a geladeira de volta. Talita pode objetar e exigir que a geladeira fique lá por mais seis meses, até que se complete o período de um ano? Não faria lógica. O contrato de depósito, portanto, permite a resilição por parte do depositante, não pelo depositário, que não pode resilir unilateralmente. Imagine que estou em Bangalore e, de repente, Talita me manda um e-mail mandando vir buscar a geladeira imediatamente! Portanto, a resilição não traz a ideia de instatisfação.

 

A morte como causa superveniente de extinção do contrato

Todo contrato se extingue com a morte? Não todos. Os intuitu personae se extinguem com a morte, via de regra. Se Xuxa, que viria cantar, morre, poderá comparecer Sasha? Não mesmo. A morte poderá ensejar a devolução de valores já pagos, mas indenização não. Imagine o que seria pedir indenização ao filho do morto...

 

Exercício do direito de arrependimento

Podemos nos arrepender dos contratos feitos? Não, por força do pacta sunt servanda. Logo, via de regra, também não se pode arrepender de se ter contratado. A não ser que haja uma cláusula de arrependimento.

Exemplo: de novo a compra e venda do notebook do Lucas. Podemos estabelecer uma cláusula de arrependimento. Código Civil, art. 420: “Se no contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos os casos não haverá direito a indenização suplementar.” A cláusula de arrependimento sempre deverá trazer, consigo, arras. As arras têm função indenizatória. Para que servirão essas arras? Geralmente elas têm duas funções: podem ser confirmatórias ou indenizatórias. No caso de cláusula de arrependimento, elas serão indenizatórias, apenas. A confirmatória é dada por alguém que não tem interesse de que o sujeito desista do negócio. As indenizatórias, por sua vez, são dadas no caso de: “se eu desistir, tu ficarás com as arras a título de indenização.” Então, se adiantei dinheiro ao Lucas para que concretizasse o negócio depois, ele poderá retê-lo caso eu venha a desistir de efetivar a compra.

Quem as deu perdê-las-á. Quem as recebeu devolvê-las-á em dobro. É o texto do art. 420. Note que as arras indenizatórias são a indenização em si, e substituem as perdas e danos. Quem contrata já sabia que poderia se arrepender. No caso de arras indenizatórias, não se fala em perdas e danos.

Por último, para fecharmos, vamos rever a cláusula resolutória. Art. 475: “A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.” Isso quer dizer que, se tivermos um contrato sinalagmatico ou bilateral, que traz automaticamente uma cláusula resolutiva tácita, uma das partes poderá deixar de cumprir sua obrigação caso a outra também não cumpra. Se a cláusula for expressa, operará de pleno direito; se tácita, dependerá de interpelação. É o art. 474: “A cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação judicial.