Direito Empresarial - Cambiário

sexta-feira, 09 de abril de 2010

Protesto - continuação


 

Vamos terminar o estudo da letra de câmbio hoje, na aula que vem vamos para a nota promissória, que fecha o conteúdo da prova.

Na aula passada, falamos do protesto, que é o ato formal praticado pelo credor perante o cartório competente para se incorporar à obrigação cambiária um fato relevante, como a falta do pagamento ou do aceite.

Hoje vamos falar das consequências da falta de protesto. O que acontece se o credor deixar aquele prazo para fazer o protesto? É o que veremos.

Qual é o prazo a realização do protesto por falta de pagamento? Primeiro dia útil em seguida.

Se Arthur não paga a letra de câmbio à Talita hoje, que é a data do vencimento, quando será realizado o protesto? Na vida prática, seria na segunda-feira próxima. Talita, convencida por Arthur, que a persuade a não ir ao cartório dizendo que irá pagar, não fez o protesto. Vamos às consequências:

A consequência da perda do prazo para a realização do protesto será a inexigibilidade do crédito mencionado na letra contra os codevedores e seus avalistas; já contra o aceitante e seus avalistas, a perda do prazo não os afetará.

Das assertivas acima, extrai-se que o protesto será necessário contra os codevedores de seus avalistas e facultativo contra o aceitante e seus avalistas.

Vamos traduzir. Quem é o devedor principal do título? Arthur, que é o sacado e, ao aceitar, torna-se o aceitante, que é o devedor principal. Quem são os codevedores do título? Diogo, Flávia, Cadu e Leopoldo. Dissemos que Talita tem até segunda-feira para fazer o protesto. A consequência de não fazer é a perda do direito creditício contra os codevedores e seus avalistas. Significa dizer que, se no dia 12/4 ela não for ao cartório, ela não mais poderá cobrar de nenhum daqueles: nem Leopoldo, nem Diogo, nem Flávia nem Cadu; ela perderá o direito creditício contra essa pessoas, que irá remanescer tão somente contra Arthur e Rebeca, sua avalista. Isso na falta de pagamento pelo Arthur, que aceitou, se vinculou e se tornou devedor principal. Se Arthur não aceita, não falamos em perda do direito creditício contra ele.

Essa consequência trará duas figuras: o protesto facultativo e o protesto necessário. Se o protesto não for realizado, o título deixará de ser exigível para Leopoldo, Diogo, Flávia e Cadu, que são os codevedores. Significa então que, para essa pessoas, o protesto é necessário, sob pena de não mais se poder deles exigir o cumprimento da obrigação. Já em relação a Arthur e Rebeca, o protesto é facultativo, pois eles permanecem na condição de devedor principal e avalista, respectivamente, e Talita continuará tendo o direito de cobrar deles dois.

Rebeca é codevedora do título. Por que o protesto contra ela não é necessário, mas facultativo? Porque o Arthur é devedor principal. O avalista se encontra em equivalência em relação ao avalizado. Rebeca está garantindo a obrigação do devedor principal. Se o protesto contra Arthur é facultativo, facultativo será contra Rebeca.

Se o devedor principal não pagar o título, quem pagará? Qualquer um. Se Arthur não quiser pagar, Talita irá diretamente ao cartório. É como se ela passasse a seguinte mensagem ao Arthur: “não quer conversar comigo, converse com o tabelião!”

 

Cláusula “sem despesa” ou “sem protesto”

Leopoldo pode, no entanto, sacar uma letra de câmbio com a cláusula “sem despesa” ou “sem protesto”. Vejamos o que é isso: é um instituto que assegura ao credor contra qualquer devedor, seja ele principal ou codevedor, os direitos de crédito da cártula independentemente de protesto. Assim, ao credor assistirá o direito de cobrança do título contra qualquer um sem o prévio protesto. Referida cláusula poderá ser inserida pelo sacador, pelos endossantes ou pelos avalistas.

Então Leopoldo veio à aula e aprendeu as figuras do protesto necessário e facultativo. Ele escreverá: “pague-se a Diogo a quantia de 600 unidades monetárias sem despesa (ou sem protesto)”. Neste caso não haverá necessidade de protesto contra qualquer um, seja o devedor principal ou os codevedores. Assim, Talita poderá ir diretamente ao Judiciário para cobrar de qualquer uma das pessoas, sem a necessidade de ter ido ao cartório fazer o protesto. Qualquer um da cadeia pode fazer, pois isso é benéfico ao credor.

Na aula passada falamos que, se Talita comparece à casa do Arthur para receber o valor da letra e aquele não paga, ela leva o título ao cartório, que envia uma notificação ao Arthur para que pague em 48 horas; se não pagar, o cartório irá lavrar um termo de protesto. Seu nome agora está sujo pois está protestado. Sem dar muita importância a isso desde já, Arthur vai ao GamBar beber hoje depois da aula e dá um cheque para o pagamento. O gerente consulta e vê que o nome dele está protestado e recusa o recebimento. Situação vexatória para Arthur. Ele, agora com peso na consciência, procura Talita para pagar aquela letra de câmbio, e paga. Ela dá a quitação a ele. Mas ainda assim seu nome permanece sujo.

E agora, como Arthur procederá para limpar seu nome? Ele deverá ir ao cartório munido da quitação de prova. O cartório irá cancelar o protesto. Isso remete à ideia de sustação de protesto. O que é sustar um cheque? É impedir que ele seja pago. No protesto, a sustação é impedir que ele seja realizado. A diferença entre cancelamento e sustação é que esta é uma ação cautelar. Imagine que Talita apresenta para Arthur aquela letra de câmbio para que pague-a. Ele responde dizendo que não foi ele quem prestou aquele aceite, e que a assinatura ali presente é falsa. Talita, farejando um calote, anuncia que irá protestar o título. Ela, então, vai ao cartório e este manda a notificação para que Arthur pague nas 48 horas. Arthur, quando for cobrado sem ter prestado aceite verdadeiro, ajuizará ação de sustação de protesto. Se for dado provimento pelo juiz, ele informará ao cartório que não proteste o título, provocando a suspensão do ato do protesto do título.

O cancelamento, por sua vez, é posterior ao protesto do título.

A legitimidade para ajuizar ação de sustação de protesto é do devedor, e isso está pacificado no STJ. Havia um colégio aqui em Brasília em que a taxa de inadimplência entre seus alunos era elevada, então a administração da escola resolveu que, de pronto, protestaria todas as mensalidades não pagas. O pai do aluno, então, comparecia ao colégio para quitar e, posteriormente, ajuizava pedido de danos morais por ter tido seu nome protestado pela escola. Na verdade, é dever do devedor procurar o cartório e apresentar a quitação para que se cancele o protesto. Daí se tirou que o pedido de danos morais era inadmissível.

Procede-se ao cancelamento do protesto mediante formulação de pedido pelo devedor ou terceiro interessado perante o cartório em que o protesto se processou.

O pedido deverá ser instruído pelo próprio título ou, na falta deste, por declaração de anuência do tomador.

 

Ação cambial

Talita, como sempre, procurou Arthur para cobrar sua letra, mas ele não pagou. Bastante consciente de seus deveres, Talita foi ao cartório para garantir seus direitos creditícios contra o devedor principal e os codevedores. Se ela não conseguiu pela via administrativa, amigável, só restará a Talita ir ao Judiciário.

Para o Direito Cambiário, a doutrina mais clássica e formalista diz que, na ação cambial, o terceiro de boa-fé tem em sua mão a inoponibilidade das exceções pessoais. Bastante complexo. Mas usaremos uma concepção mais moderna para a ação cambial, além dessa concepção clássica: a ação cambial é a ação executiva tendente à cobrança do título. Por que executiva? Qual é a diferença mesmo entre a ação de conhecimento e a de execução? Satisfatividade. Na ação de conhecimento, obtém-se uma declaração judicial dizendo que se tem um direito. Transformando-o em liquido, certo e exigível, vai-se à execução. Art. 585 do Código de Processo Civil: “São títulos executivos extrajudiciais: I – a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;” o título de crédito é, portanto, um título executivo, líquido, certo e exigível.

Talita ajuizará execução de título de crédito, ou execução de título executivo extrajudicial. A ação de conhecimento não será mais necessária. Como uma ação de conhecimento é iniciada mesmo? Petição inicial. O juiz mandará citar o réu, caso defira a inicial. O que o réu fará? Contestação. Volta para o juiz, para que faça o saneamento. Então o juiz verificará se a ação está pronta para ser julgada; se for o caso, então julgará antecipadamente; do contrário, irá atrás dos esclarecimentos, marcando um audiência de instrução e julgamento. Nessa audiência, as partes são convidadas a conciliarem-se, sem conciliação, o juiz fixa os pontos controvertidos e vai para a produção de provas: testemunhal ou pericial, já que a documental deve ter sido produzida com a inicial. Depois de tudo isso, ele proferirá sentença, dizendo quem está certo e quem está errado. Com o título executivo judicial, que é a própria sentença, o autor vai para a execução.

Nisso tudo, foram-se dois anos, pelo menos. Tudo isso para obter um título executivo, no caso, judicial. Mas, se Talita está de posse do título, não judicial (a sentença em seu favor, obtida depois de tanta paciência), mas extrajudicial (a letra) ela pode ir diretamente à execução!

Ação cambial, portanto, é a cobrança do direito creditício mencionado no título de crédito mediante uma ação de execução, uma vez que o art. 585, inciso I do CPC atribui aos títulos de crédito a qualidade de título executivo extrajudicial para. No entanto, para a teoria clássica, será cambial a ação em que o terceiro possuidor de boa-fé tem o direito de invocar a inoponibilidade das exceções pessoais.

Talita resolve propor ação de execução, sabendo que o art. 585, inciso I atribui ao título de crédito a qualidade de título executivo extrajudicial. Mas, para que o juiz mande citar, ele terá que verificar as condições da ação. Há as genéricas e específicas. Genéricas são possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade ad causam. Além dessas três, o juiz terá que apreciar outras duas condições da ação próprias da ação cambial. Uma delas: Talita resolve executar todo mundo. Para se acionar o codevedor, ela precisará ter feito o protesto do título na hora certa, pois era um protesto necessário. Se quiser acionar os codevedores, ela precisará estar instruída com o instrumento do protesto. (Lembrem-se: se não protestar, subsistirá o direito creditício dela contra o devedor principal e seu(a) avalista).

Segunda questão que o juiz observará é se a ação está ou não prescrita. O que é a prescrição? Perda do direito de reclamar um direito em juízo.

Intentada a ação cambial, portanto, deverá ser observado se esta obedece as condições da ação, em especial o prazo prescricional e a presença do título devidamente protestado se a ação for movida contra os codevedores e seus avalistas.

Interesse de agir: traduz-se em binômio e trinômio. O binômio, trazido por alguns autores, é necessidade e utilidade. Talita tem necessidade de ir ao Judiciário para receber. E também seria uma medida útil. Portanto, para esses autores, o interesse de agir estaria satisfeito. Mas outros doutrinadores dirão que faltaria a adequação, que seria o terceiro elemento, fechando o trinômio. Quando se fala em adequação, precisamos ver se a via eleita é adequada ou não para se conquistar o direito. Então, se Talita, por algum motivo, resolve ajuizar uma ação de conhecimento para que então obtenha uma sentença para que só então execute o devedor, essa ação deverá ser extinta sem resolução de mérito (CPC, art. 267, inciso VI) pois não é a via adequada: ela já dispõe de um título executivo extrajudicial, exigível de pronto, portanto uma ação de conhecimento seria inadequada. Com o título na mão, sem prescrição, deve-se ajuizar ação de execução, não de conhecimento.

 

Prazos prescricionais para a letra de câmbio

 

Talita quer cobrar do Arthur, o devedor principal. Ela tem três anos a partir do vencimento. Então ela terá até 12/04/2013 para fazê-lo. Contra codevedores, já que ela não quer receber do Arthur, ela terá até 12/04/2011. Assim, ela procurou Diogo.

Diogo pagou em 12/04/2010. Ele terá seis meses para ajuizar ação de regresso contra as outras pessoas.

Observação: no regresso, o avalista poderá ser demandado.

Observação 2: transcorridos os prazos prescricionais da letra de câmbio, o credor ainda terá três anos para ajuizar a cobrança do título nas vias ordinárias. Art. 206, § 3º, inciso IV do Código Civil: “Prescreve: [...] § 3º Em três anos: [...] IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;”