Direito Empresarial - Cambiário

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Duplicata - continuação


Na aula passada vimos conceito, natureza jurídica, partes, a parte introdutória da duplicata.

Falamos que a duplicata é um título de crédito causal, tendo em vista que ela tem uma causa, que é a extração da fatura, para qualquer compra e venda a prazo. Obrigatoriamente o comerciante que vende uma mercadoria ou serviço deverá extrair uma fatura, e a partir dela ele poderá extrair a duplicata.  Mitiga-se, no caso da duplicata, o princípio da autonomia, mas ainda assim aplicam-se os princípios da cartularidade, literalidade, e inoponibilidade das exceções pessoais.

Por causa da aplicabilidade desses princípios, à duplicata serão aplicadas as mesmas disposições sobre o endosso e aval. Ou seja, teremos endossos próprios e impróprios; dentro dos próprios teremos o endosso em preto e o em branco, e entre os impróprios teremos o endosso póstumo, endosso mandato, endosso caução, e os avais, com a mesma regra de equivalência, podendo ser simultâneos ou sucessivos.

Obedecem as duplicatas a mesma normatização dos demais títulos de crédito no que respeita ao endosso e ao aval do título.

 

Aceite de duplicata

Quanto ao aceite, qual é o título de crédito no qual vimos a figura do aceite? A letra de câmbio. O que significava o aceite na letra de câmbio? O comprometimento a pagar. O aceite, na letra de câmbio, era prestado pelo terceiro a quem a ordem de pagamento era endereçada, que iria aceitar aquela obrigação e a partir daquele momento passaria a se vincular à obrigação do título de crédito. Ocorre que, na duplicata, não temos a terceira pessoa. Se lembrarmos das situações jurídicas, temos apenas duas: sacador, que é o emitente do título, e o sacado, que o recebedor da mercadoria. Então não faz sentido falar em aceite como vinculação da pessoa à obrigação, pois ela já está obrigada. Mas falamos algo sobre o aceite nos requisitos de validade, lembram? Era a declaração. Existe, dentro dos requisitos de validade, um campo específico em que se presta o aceite, onde se escreve uma declaração reconhecendo a exatidão e a obrigação de se pagar aquela duplicata. O aceite na duplicata será exatamente o reconhecimento da exatidão do título, de que o título obedece a tudo que foi negociado entre vendedor e comprador.

Vamos formalizar: o aceite é o reconhecimento da exatidão da duplicata pelo comprador caracterizando-se assim o seu compromisso em pagá-la.

A duplicata será encaminhada para o aceite dentro de trinta dias de sua emissão cabendo ao comprador devolvê-la em até dez dias do recebimento se esta não for vencível à vista, obedecendo três formas de operacionalização previstas na lei. Antes de sabermos quais são, vejamos como funciona: Maria Júlia comprou uma BMW lá na concessionária e vai pagar com uma fatura daqui a 45 dias. A concessionária tem até 30 dias da emissão da duplicata para enviá-la à compradora, que prestará o aceite em até 10 dias do recebimento. Ela terá que devolver a duplicata para que a concessionária aguarde o dia do  vencimento para que o pagamento seja feito, ou para que se faça a cobrança judicial. Isso se não for um vencimento à vista, pois, se o for, quando a duplicata é encaminhada à Maria Júlia, ela terá a vista do título, que se tornará vencível e terá que ser pago imediatamente.

Então, vamos às formas de prestação do aceite da duplicata que a lê prevê:

E qual é o comprovante de que Maria Júlia recebeu a mercadoria? A fatura mesmo não é um comprovante; o que a fatura faz é documentar a compra e venda, listando a(s) mercadorias(s) e os respectivos preços. O comprovante é a nota fiscal. Mas o que exatamente na nota fiscal, já que ela apenas materializa a operação? No final da nota fiscal tem uma parte destacável, onde assinamos, que é o comprovante de entrega da mercadoria. Uma parte fica com o vendedor, outra com o comprador. No caso de um carro, não será tão simples; a loja fará um termo de aceitação do veículo. Se Maria Júlia tivesse motivos, ela faria a...

 

Recusa do aceite

Na hipótese da duplicata, o aceite é obrigatório, cabendo sua recusa em apenas três situações previstas em lei, sendo elas:

Vamos voltar ao aceite por presunção: a BMW tem um comprovante de recebimento da mercadoria. Se não houver nenhuma dessas hipóteses, Maria Júlia não poderá recusá-la.

Exemplo da primeira situação: a concessionária entregou um comprovante de entrega da mercadoria para Maria, mas, dois dias depois, o carro simplesmente para de funcionar. Tivemos até um caso em que um homem trocava de carro todo ano; a concessionária pegou o modelo antigo do sujeito e colocou no pátio de seminovos para venda. Alguém comprou o carro de segunda mão e descobriu que o hodômetro havia sido adulterado, para fazer parecer que o carro havia percorrido menos quilômetros, e assim justificar a venda por um preço maior. Revoltado, o comprador do seminovo ajuizou contra o fabricante e contra a concessionária. O fabricante tentou demonstrar que nada tinha a ver com aquela adulteração, pois não vendia carros seminovos, mas somente carros 0km para a concessionária. “O ato ilícito foi praticado pela concessionária e não pelo por mim” - sustentou o fabricante.

Isso foi uma mercadoria recebida com avaria. Nessa hipótese, o comprador poderá recusar a duplicata.

Vício na quantidade ou qualidade: havia uma loja que vendia determinada marca de calças jeans, que resolveu parar de pagar as duplicatas da mercadoria recebida do fabricante porque houve excesso. Incomum, mas no caso o excesso estava causando prejuízo para a loja pois ela não estava conseguindo renovar o estoque e incluir a nova coleção.

Por fim, divergência no prazo e preço ajustados. Não posso vender uma BMW por R$ 549 mil e enviar uma duplicata no valor de R$ 564 mil.

Não havendo nenhuma delas, o aceite da duplicata é obrigatório.

Se ela não pagar a duplicata, aí sim vamos para as consequências. A loja fará o...

 

Protesto

Qual a finalidade dele mesmo? Incorporar fato relevante ao título para assegurar o direito contra os codevedores daquele. Funcionará como os demais títulos à exceção do prazo. Em razão da finalidade do protesto, a disciplina deste para com a duplicata será a mesma dos demais títulos, ou seja, a existência de um protesto facultativo contra o devedor principal e um protesto necessário contra os codevedores.

Para a duplicata, no entanto, a extração do protesto ocorrerá em até 30 dias do vencimento na praça designada para seu pagamento.

Na letra de câmbio, o prazo era de um dia útil. Aqui na duplicata, temos 30 dias do vencimento para realizar o protesto.¹ Se determinamos que Maria Júlia teria que pagar essa duplicata aqui em Brasília, o protesto terá que ser tirado nos cartórios de protesto do Distrito Federal. O local será de acordo com o domicílio do devedor.

No aceite por presunção e por comunicação, existe a hipótese do comprador reter a duplicata. No aceite por comunicação, a compradora aceita e envia uma comunicação por escrito dizendo que aceitou. No protesto por presunção, Maria Júlia não se pronuncia, se aceitou ou não, mas mesmo assim ela tem a possibilidade de reter aquele título. Ela não paga na data do vencimento. Como vou fazer para protestar o título se eu não o tenho? Eu posso fazê-lo, apenas para duplicata. Não se pode protestar nota promissória, cheque e letra de câmbio sem ter o título em mãos. Mas a duplicata pode ser protestada sem estar presente, por previsão legal na Lei da Duplicata e Lei de Protestos. É o protesto por indicação. Lembram-se dos requisitos de validade da duplicata? Um deles era o número da fatura. Por que eu preciso dele? Porque a duplicata é vinculada, e todas as informações da duplicata são oriundas da fatura. Com base nas informações da fatura, envio a informação para o cartório e ele lavrará um instrumento de protesto. Extraído o protesto, vamos para a cobrança judicial.

Protesto por indicação, portanto, é a forma de protesto prevista para a duplicata em face da ausência do título, consistente na indicação dos seus elementos ao cartório afim de que este realize o protesto do título, cujo instrumento instruirá a execução judicial a ser promovida.

Duas observações. Primeira: para executar, sempre precisamos do título. Mas e se o devedor o reteve? Faço o protesto por indicação, e o instrumento de protesto poderá substituir o título na execução judicial. A segunda observação é que a figura do protesto por indicação não significa que a duplicata foge ao princípio da cartularidade. A cartularidade subsiste, e ainda precisamos ter o título, o documento, sendo enviado para Maria Júlia para que depois eu possa extrair um protesto por indicação ou não. Isso não torna o título virtual, como defendem alguns autores. Ainda não temos legislação específica nesse sentido. A duplicata continua sendo um documento físico. Há bancos que trabalham com um serviço chamado “duplicata eletrônica”, que na verdade não é uma duplicata. É apenas um canal de comunicação pelo qual os fornecedores de mercadorias ou de serviços enviam para o banco informações sobre a compra e venda. A duplicata ainda obedece ao princípio da cartularidade. Fran Martins fala sobre isso em sua obra.

 

Triplicata

O que é mesmo uma duplicata? Título de crédito causal representativo de compra e venda mercantil ou serviço com prazo não inferior a 30 dias. A duplicata vem da fatura. O nome “duplicata” vem de “segunda via” (da fatura). A triplicata, então, é uma terceira via da fatura ou uma segunda via da duplicata. É nada mais que uma duplicata que foi extraída uma segunda vez.

Não posso extrair ao léu. A legislação prevê as hipóteses em que ela poderá ser extraída, como em caso de acidentes. A triplicata terá os mesmos requisitos de validade da duplicata extraviada; será idêntica. A única coisa que mudará será o nome. Vamos ao conceito: a duplicata perdida ou extraviada e ainda não aceita obrigará o vendedor a extrair a triplicata, que terá os mesmos requisitos e os mesmos efeitos daquela. É uma determinação legal. Vejam que, se eu mandei e por algum motivo Maria Júlia não recebeu a duplicata, ou ela se recebeu e perdeu, como num caso em que ela esquece a torneira da banheira aberta, inundando a casa e a água destrói a duplicata, sou obrigado a extrair a triplicata. Não posso simplesmente aguardar que ela não aceite para extrair um protesto por indicação, que só existe na hipótese de retenção da duplicata. Se a hipótese é de perda ou extravio da duplicata, eu sou obrigado a extrair uma triplicata com os mesmos requisitos extrínsecos da duplicata para posterior reenvio à Maria Júlia. Isso para duplicata não aceita.

E se a duplicata já foi aceita? Ela aceitou, devolveu para mim, e a enchente de banheiro acontece no meu apartamento. Qual seria a solução? A lei determina que se ajuíze ação de anulação de título. A ação tem que ser ajuizada, a Maria Júlia tem que ser citada para dizer que aceitou aquele título, mas que ele se extraviou em minha casa, portanto tenho cancelar aquele título e extrair uma nova duplicata (não será uma triplicata), pois já foi aceita.

 

Execução da duplicata

Letra de câmbio, nota promissória e cheque são títulos executivos extrajudiciais. Assim como a duplicata, como visto no art. 585 do CPC. A duplicata é executada, mas trará alguns desdobramentos em virtude das hipóteses de recusa do aceite. Vejamos.

A execução da duplicata ou triplicata será regida pelo Código de Processo Civil, uma vez que o art. 585, inciso I deste trata a duplicata como título executivo extrajudicial. Entretanto, a lei das duplicatas traz algumas disposições específicas acerca de suas cobranças.

A duplicata aceita poderá ser executada protestada ou não; quanto à duplicata não aceita, sua cobrança demandará o protesto, o documento comprobatório da entrega da mercadoria e inexistência de motivos legais para a recusa do aceite.

Vamos entender. Primeira hipótese: mandei a duplicata para Maria Júlia. Ela aceitou, devolvendo ou não o título. Ela devolveu, com aceite ordinário, ou por comunicação, retendo o título. Nessa hipótese, poderei ajuizar a execução da duplicata independentemente de protesto. Não confunda isso com protesto facultativo e protesto necessário. Estamos falando de execução do devedor principal. Se eu quiser executar os outros codevedores, o que precisarei fazer sempre? Protestar o título. Se a duplicata foi aceita e não protestada, só poderei executar quem? O devedor principal.

Mas e se ela não aceitou a duplicata, ou devolveu sem o aceite, ou, ainda, reteve sem aceitar? Precisarei protestar a duplicata, juntar a comprovação de que a mercadoria foi entregue, e demonstrar que não existiam nenhum dos motivos ensejadores da recusa do aceite: mercadoria entregue, sem avaria, sem vícios de qualidade e quantidade, e não existiam divergências sobre prazos e valores.

 

Prazos prescricionais da duplicata

  1. Contra o devedor principal e seus avalistas: três anos a contar do vencimento;
  2. Contra os codevedores: um ano a contar do protesto;
  3. Exercício da ação de regresso: um ano a contar do pagamento.

Vamos ver caso concreto de duplicatas na sexta-feira.


1 – Frase incompleta.