Direito do Trabalho

quarta-feira, 24 de março de 2010

Figuras afins ao empregado - conclusão


Vimos as figuras dos trabalhadores domésticos, rurais, prestadores, que são todos trabalhadores. O empregado é uma espécie. O que é mesmo? Pessoa física que realiza uma atividade não eventual, sob dependência, mediante salário. Se não houver contrato formal firmado, esses elementos se provam por meio do princípio da primazia da realidade. O elemento da dependência só pode ser provado pelo processo.

Vamos para a empreitada.

 

Empreitada

A empreitada tem previsão nos arts. 610 e seguintes do Código Civil. Há empregador e empregado na relação de trabalho comum. Na empreitada, temos o tomador, chamado dono da obra, e o empreiteiro, o trabalhador.

O contrato de empreitada está destinado à realização de serviços braçais. Alguns autores atentam para o teor discriminatório desse termo: empreiteiro versus profissional liberal. Mas ambos são autônomos, pessoas físicas.

Temos duas formas de empreitada: contrata-se a mão-de-obra ou um resultado. O dono da obra pode adquirir o material enquanto o empreiteiro faz o serviço. É comum o empreiteiro só trazer a mão-de-obra, mas não o material. Em geral o dono da obra e o empreiteiro vão juntos atrás do material de construção. Mas, dentro dessa questão, conseguimos diferenciar o que se quer. Na relação de empreitada, o empreiteiro entrega uma obra mediante um serviço ajustado. Quer-se que ele realize determinada tarefa, como construir ou reformar parte de um imóvel, ou simplesmente empregar sua mão-de-obra. Construir uma churrasqueira, por exemplo, é um serviço de empreitada.

O empreiteiro pode ser somente pessoa pessoa física ou pode também pessoa jurídica? Pode ser qualquer uma das duas. O tomador pode contratar tanto a pessoa jurídica como também pode contratar a pessoa física diretamente. Pode-se contratar uma sociedade, que trabalhe com serviços de empreitada. Dessa forma contrata-se uma pessoa jurídica.

E o empregado? Como sabemos, somente poderá ser pessoa física. O empreiteiro, que pode ser pessoa física ou pessoa jurídica, por sua vez, é remunerado por sua obra, pelo resultado. O empregado trabalha habitualmente, mês a mês.

E a questão do risco da atividade: de quem é? Na relação de empreitada, o risco da atividade será do empreiteiro. Risco da atividade é assumir lucros e prejuízos. Já o empregado não se responsabiliza por danos causados culposamente, nem pode depender dele o pagamento das contas da empresa, como luz, água e telefone.

A obrigação de fazer do empregado é infungível, pessoal, intuitu personae. Também chamada “obrigação de fazer infungível”. E quando se contrata o empreiteiro, a obrigação de fazer é fungível ou infungível? Dependerá. O vencedor de uma licitação pode acabar tendo liberdade para subcontratar outras. Neste caso, a obrigação de fazer será fungível. Mas o empreiteiro pode ter sido contratado justamente porque seu trabalho tem fama de ser bom; neste caso ele é insubstituível, portanto, intuitu personae.

 

Contrato de agenciamento

O que estamos fazendo aqui? Estamos estudando com o objetivo de diferenciar se o sujeito é empreiteiro, se é agente ou se empregado, justamente para saber se em favor dele incidirão direitos sociais. É que, quando um empreiteiro, ou mesmo agente, que na verdade trabalhava como empregado busca o reconhecimento do vínculo de emprego com seu empregador, essa busca da tutela jurisdicional irá começar com ajuizamento da ação. Se a resposta for favorável, significa que, da data do ajuizamento da ação cinco anos para trás temos uma relação de emprego gerando direitos para o empreiteiro. Assim, ele receberá cinco anos de décimo terceiro, de adicional noturno, de adicional de insalubridade se for o caso, e todos os privilégios. É um valor significativo, com que o empregador deverá se preocupar.

O que é um contrato de agência? Art. 710 e seguintes do Código Civil: “Pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada. Parágrafo único. O proponente pode conferir poderes ao agente para que este o represente na conclusão dos contratos.” Nesse tipo de relação, temos um tomador e um agente/representante comercial ou distribuidor. São pessoas que executam determinadas atividades em prol do tomador. Exemplo: tenho uma empresa de produtos de cama, mesa e banho e, dentre outras, duas pessoas trabalham para mim: Joanna, que contratei como empregada, e Johannes, que contratei como representante comercial. Aquela tem carteira de trabalho, enquanto este constituiu uma pessoa jurídica para que então contratasse comigo.

O que é um contrato de agência? Vamos ver a definição de Gagliano: “é o negócio jurídico em que uma pessoa, física ou jurídica, assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada.

Qual é a semelhança entre o contrato de agência e o contrato de emprego? Primeiro, o caráter não eventual. Segundo, a retribuição. Aqui denomina-se retribuição, enquanto na definição de empregado denomina-se salário.

E quanto às distinções? O que distingue o agente da definição de empregado? O agente pode ser pessoa jurídica ou pessoa física e o empregado pode ser somente pessoa física. Essa é a primeira. Aliás, qualquer figura que puder aparecer na forma de pessoa jurídica já será diferente do empregado. O vínculo de dependência, também, só existe na relação de emprego. Significa que, no contrato de agência, não existe subordinação jurídica. Leia no artigo: “em caráter não eventual e sem vínculos de dependência”. Alguns falam: “sem vínculo de dependência”, ou “sem vínculo de subordinação”. Que subordinação? Subordinação jurídica.

Não havendo subordinação, existe uma técnica própria que não é fiscalizada, nem coordenada nem controlada pelo tomador. Coisa que não ocorre na relação empregado-empregador. Na relação de emprego, o empregador pratica os verbos fiscalizar, controlar e coordenar sobre a atividade do empregado. Quando se fala em obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, até a doutrina coloca que o promoter, aquele que promove festas, se coloca também na condição de agente. Um empresário de artistas também está enquadrado aqui, de acordo com a doutrina. Coloca-se determinada área para a pessoa trabalhar. O sujeito fica sempre numa mesma praça, v.g. uma mulher que vende cosméticos como ambulante. Então, quando alguém vir a cara de Johannes, meu agente, a pessoa já se lembrará de cama, mesa e banho. É uma técnica de marketing.

 

Contrato de distribuição

O Código Civil trouxe as previsões tanto para o distribuidor quanto para o agente.

O contrato de distribuição é o negócio jurídico em que uma pessoa, física ou jurídica, assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, tendo desde já, em sua detenção, a coisa objeto do negócio. Essa definição também é de Gagliano, em obra de 2008.

Qual a similitude entre o distribuidor e o empregado? O caráter não-eventual da atividade, que é a mesma coisa que habitualidade. E a diferença? O distribuidor pode ser pessoa jurídica e não tem vínculo de dependência. E a diferença entre o distribuidor e o agente? A detenção da coisa: o distribuidor possui a coisa, enquanto o agente apenas negocia-a. Funciona assim: Cléo vende cosméticos de determinada marca. Mas ela traz os produtos, andando com eles na mão. Neste caso, ela é considerada distribuidora. Mas se ela é agente da empresa, ela apenas terá um folheto ou catálogo e exibirá os produtos aos potenciais compradores. O agente negocia, enquanto o distribuidor tem a coisa em sua mão.

 

Representação comercial

Qual é o papel do representante comercial? Maria Helena Diniz traz o seguinte conceito: representação comercial é o contrato pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a realizar certo negócio, em zona determinada, com caráter de habitualidade, em favor e por conta de outrem, sem subordinação hierárquica. Essa definição abraça a definição de agente e de distribuidor. A diferença entre agente e distribuidor é mais fácil de ser identificada. Quando entra em jogo a figura do representante comercial, as coisas ficam mais complicadas para nós pois o novo Código Civil não trouxe a distinção. E temos também uma lei específica sobre a representação comercial, que é a Lei 4886/65 (diploma que sofreu algumas alterações com a Lei 8420/92). O tomador pode inclusive exigir exclusividade na representação comercial. E essa exclusividade não caracteriza, por si só, o contrato de emprego, muito embora, se há exclusividade, tem-se uma relação de caráter próximo da habitualidade.

Leia agora o art. 1º da Lei 4886/65: “Exerce a representação comercial autônoma a pessoa jurídica ou a pessoa física, sem relação de emprêgo, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para a realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para, transmití-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios. Parágrafo único. Quando a representação comercial incluir podêres atinentes ao mandato mercantil, serão aplicáveis, quanto ao exercício dêste, os preceitos próprios da legislação comercial.1

Para complicar mais um pouco, temos a definição de Humberto Theodoro Jr. de representação comercial: “É, em suma, a ausência de um contrato de trabalho que caracteriza o agente comercial e o distingue do viajante ou pracista, na tarefa da conquista de clientela para a empresa a que servem uns e outros.” Em outras palavras, fala-se na ausência de um contrato que tenha esses elementos: pessoa física prestando trabalho não eventual, sob subordinação mediante salário.

E há um sujeito chamado de “representante assalariado”, também conhecido como viajante ou pracista. Eu posso ter minha empresa de frango, e Johannes, que enjoou da área doméstica, passou a trabalhar para mim como “emissário”, vendendo frangos lá no estado da Paraíba. Pronto: agora não há mais fiscalização, coordenação nem controle. Johannes está agora na condição de viajante ou pracista, também chamado de “representante assalariado.” Ele não é autônomo. São pessoas distintas do agente e do distribuidor, que são autônomos. O viajante só pode ser pessoa física. Ele pode ser identificado pelo princípio da primazia da realidade, pelo grau de subordinação, pela não-eventualidade. Não é nada fácil. No Judiciário, identificar as figuras afins é uma das tarefas mais difíceis.

Mas note que o representante comercial, que vai a campo negociar produtos da empresa de seu tomador, tem que estar muito alinhado com o pensamento da empresa. Por isso ele inclusive participa de reuniões e está bastante inserido no ambiente daquele que o contratou.

Quais as diferenças entre o viajante ou pracista do agente ou representante comercial? Há cinco:

Se um empresário individual é contratado na condição de agente, ele poderá tentar a mudança para a condição de empregado.


1 – O professor não comentou em detalhes a Lei 4886 nem falou sobre o art. 1º dela.