Vamos estudar o empregador hoje para
depois estudar a
relação jurídica de trabalho em si.
Veremos o que é o empregador, o grupo
de empresas e a
sucessão de empresas. A empresa pode ser incorporada, cindida, fundida,
ter
quotas transferidas, etc. Existe regulamentação própria no Código Civil
para
essas transformações.
Temos o art. 2º da CLT para sabermos,
tecnicamente, o que é
empregador: “Considera-se empregador a
empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade
econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
[...]”
A primeira dica é que o empregador é
uma empresa, individual
ou coletiva. A ideia de empresa já estudamos no Direito Societário, mas
essa
empresa, como sujeito ou objeto, conforme visto no Código Civil, é uma
operacionalização, uma atividade empresarial propriamente dita.
Também estudamos o que é uma empresa
individual, que é
aquela que pertence a uma só pessoa. Não temos em nosso Direito a
figura da
empresa de um sócio só. Só se pode falar em sociedade com dois ou mais
sócios.
Celebram contrato social duas ou mais pessoas. É o art. 981, que
estudamos em
Direito Empresarial: “Celebram contrato
de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com
bens ou
serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre
si, dos
resultados.”
O empresário individual tem
responsabilidade ilimitada em
relação aos gastos da empresa. Se ele quiser constituir uma empresa
sozinho,
ele poderá, mas terá sua responsabilidade estendida ao seu patrimônio
pessoal.
E empresa coletiva, o que é? Estamos
tentando ajustar o
Código Civil de 2002 com a CLT, um Decreto-Lei de 1943. A ideia é que
houvesse
dois ou mais sócios. Empresa coletiva, para nós, aqui no Direito do
Trabalho, é
qualquer tipo de empresa. Quais as sociedades? Sociedade anônima,
sociedade
limitada, sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita por ações,
sociedade em comandita simples e sociedade em conta de participação. A
expressão
empresa, seja individual ou coletiva, abrangerá qualquer espécie de
empresa,
até mesmo a Caixa Econômica Federal. Vamos interpretar bem
ampliativamente
aqui.
O Código Civil estabelece quais são
os tipos de sociedade, e
não há como se criar, em nosso Direito, um tipo novo, distinto de
sociedade
hoje. O próprio cartório não aceitará o registro de sociedade de tipo
não
existente.
O que é mesmo empregador? Vamos
decorar de uma vez por todas
o art. 2º da CLT: empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os
riscos da
atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de
serviço.
Quando a Consolidação fala “assume riscos da atividade”, significa
que se podem ratear entre os
sócios os resultados positivos e negativos. O que é risco econômico? Se
tenho
uma atividade econômica, uma empresa de software, e o governo, meu
principal
comprador, deixa de importar minhas soluções, não poderei imputar ao
governo a
responsabilidade pelo meu problema comercial, mesmo que as
consequências
atinjam, e devem atingir, o conjunto de empregados que eu tenho (ou
tinha).
A empresa ou empresário saberá do
risco de sua atividade. O
Judiciário julgou o bingo como proibido, e as empresas resolveram
imputar ao
Estado a responsabilidade pelas consequências. Até hoje não foi feita
lei sobre
bingo.
As empresas de ônibus não podem
responsabilizar seus
cobradores no caso do desaparecimento de valores causados por furto ou
roubo. O
mesmo para frentistas de postos, que não poderiam ser responsabilizados
pela
consequência do recebimento de cheque sem fundo, salvo se descumprirem
as
diretrizes de segurança ao aceitar um cheque.
E o prejuízo causado dolosa ou
culposamente pelo empregado?
Esses terão disciplina diferenciada. Sendo culposo, só poderá haver o
desconto
no salário se houver previsão contratual. Se doloso, não precisa haver
previsão
contratual. O que se sugere ao empregador é que ele elabore o contrato
dispondo
que o prejuízo causado por ato culposo pelo empregado importe desconto
de
salário e, na dúvida, ainda que haja indícios de que o ato foi doloso,
o que o
empregador deve fazer é classificar o ato como culposo e descontar com
base no
contrato. Se ele se prontificar a classificar como doloso, ele terá o
ônus de
provar não só o dolo, mas que esse dolo ensejou a possibilidade de
desconto.
A admissão do empregado pode se dar
de forma verbal ou
escrita ou até tácita. A escrita ou verbal contém declaração de
vontade. No
contrato tácito, não se tem a declaração de vontade, mas tem-se o consentimento omissivo das partes. É o
comportamento das partes que leva a crer que existe o contrato. Daí
dizer que o
contrato é sintomatológico.
Significa
que o contrato está ligado a sintoma, que por sua vez está ligado ao
princípio
da primazia da realidade. Em outras palavras, o que se está sentindo;
em última
análise, a ideia de sentidos. Daí perceber o que está ao redor de um
sujeito e
saber o que está acontecendo. É outra pessoa, de fora da relação
jurídica,
notar que existe uma relação jurídica de contrato de trabalho: saber
que,
naquela história, há um sujeito que se encaixa na descrição do
empregado e na do
empregador. Assim se obtém o reconhecimento da relação trabalhista.
Não conseguimos muito ver contratos
tácitos no todo, mas há
muitas cláusulas tácitas. Exemplo: havia supermercados em que havia uns
homens que
empurravam o carrinho até o carro do cliente e ajudavam a colocar as
compras no
porta-malas. Esses indivíduos desapareceram. Também os auxiliares de
frentistas
de postos de gasolina, aqueles sem uniforme mas que sabiam operar a
bomba muito
bem. Desapareceram por que se tratava de contrato tácito, que depois
vinham a
requerer em juízo o reconhecimento da relação de trabalho. Vendedores
de rua do
Correio Braziliense, aqueles que andavam de colete amarelo com a marca
do
jornal vendendo exemplares em semáforos também não são vistos com tanta
frequência.
Também temos a ideia de que o
empregador é aquele que assalaria.
Enquanto o empregado é
aquele que recebe o salário, o empregador é aquele que paga-o. É a
coerência do
art. 2º com o art. 3º. Pagar salário é ônus do empregador, enquanto
ônus do
empregado é trabalhar.
Poder de direção:
o empregador é quem assalaria e dirige a prestação do serviço. Essa
direção da
prestação pelo empregador corresponde a qual elemento da figura do
empregado? À
subordinação. Enquanto o empregado realiza atividade sob dependência, o
empregador é aquele que dirige. Enquanto o empregador é o que
assalaria, o empregado
é aquele que recebe salário. Essas definições, portanto, são coerentes,
até
correspondentes.
O problema surge quando o contrato
não está assinado ou, assinado
como figura afim, deseja-se caracterizar como contrato de emprego. Não
diarista, mas doméstico 1.
A direção, portanto, é um modo de
como a tarefa será
cumprida e como ele organizará sua atividade.
Quando se tem um desvio de função, é
porque há um desvio no
poder de direção. Esse abuso poderá trazer consequências ruins, como
aquela em
que determinado trabalhador é contratado para uma função, mas acaba
exercendo outra
função maior, que seria merecedora de um salário maior.
Ou o contrário, que é caso de desrespeito ao status,
que pode inclusive acarretar dano moral. Exemplo: ser
alocado numa atividade de digitador enquanto o sujeito tem condições de
programar criativamente em Java. Então, toda vez que for analisada uma
relação
de emprego, pode-se alegar que um lado teve vantagem, mas pode não ser
somente
isso. Cabe ao talento do advogado. Não se reclama do salário, mas do
tratamento
que se recebe.
A análise dessa relação
empregado-empregador passa por outra
ciência também, que é a administração de empresas. Não é assunto
exclusivo do
Direito. Pode-se alegar por essa visão, mas o Judiciário só tem a visão
do
Direito. É assim que eles julgarão.
Houve uma ocasião em que a ECT usou a
imagem de um empregado
(carteiro) para um calendário: o empregado ajuizou pedido de
indenização pelo
uso da imagem. A defesa, pensando com cabeça de administrador de
empresas,
sustentou que ele era humilde e, com a fotografia, viabilizou a
divulgação da
imagem dele, o que teria aumentado seu prestígio na comunidade. Mas os
órgãos
julgadores não têm essa visão; a ideia não deveria ser fazer com que o
carteiro
ficasse como modelo da coisa. Passou-se a ideia de que os Correios são
uma
empresa formada por gente do povo e que trabalha para o povo.
Então, ao analisar, não se deve ver
somente o foco do
Direito, mas também na perspectiva da empresa.
Dentro do poder de direção, temos
três poderes: de
organização, disciplina e de controle. O de organização é o que o
empregador
estrutura o patrimônio e esforço de pessoas para atender aos fins da
empresa. Dentro
de uma pizzaria, por exemplo, cada um já sabe exatamente onde ficar.
Quais as
pessoas que integram essas empresas? Sócios, empregados, colaboradores,
estagiários, e terceirizados. Colaborador é um eufemismo para
empregado, pois,
por incrível que pareça, há quem pense que “empregado” é um termo
pejorativo.
Conselho consultivo, ou espaço de
desporto também é
atribuição da estrutura organizacional da empresa, e quem o cria é o
empregador. Daqui tiramos a primeira faceta do poder de direção.
O poder disciplinar, por sua vez, é a
capacidade do
empregador de realizar diligências, buscas, escutar o empregado, e, em
decorrência disso, aplicar ou não determinada punição. Determinar como
o
empregado se colocará. Quando estudamos a figura da dependência (um dos
elementos caracterizadores do empregado de acordo com o art. 3º da
CLT),
estudamos a dependência disciplinar. O poder disciplinar está dentro do
poder
de direção, mas a direção não se resume à disciplina pois a direção
também
passa pela organização. Por outro lado há também a subordinação
jurídica: fiscalizar,
controlar e coordenar a atividade do empregado. Isso é o art. 2º da
CLT.
O que se discute nesse poder
disciplinar é que o empregador
pode limitar os dias de trabalho, como estabelecendo punições de
suspensão.
Isso dá um prejuízo enorme para o empregado. Nisso a doutrina começou a
tentar
explicar por que o empregado pode ser punido a ponto de ter seu salário
reduzido, sem haver acordo ou convenção coletiva. Não é redução
propriamente
dita, mas em virtude de uma pena por falta disciplinar. Como explicar?
Três correntes
principais.
1.
Primeira:
teoria contratualista. É a majoritária. Há uma liberdade de contratar e
uma
submissão do empregado às regras contratuais. Ao assinar o contrato de
trabalho, o empregado se submete à possibilidade de ser punido por
algum fato,
como desrespeito ao regulamento da empresa ou da lei.
2.
Teoria
da propriedade privada: no sentido de que a empresa pertence ao
patrimônio do
empregador. Ele tem o poder sobre o patrimônio. Então, toda vez que o
empregado
descumprir uma ordem, ele trará prejuízo para o patrimônio. É como se o
empregador estivesse pagando por um serviço que não estivesse sendo
realizado.
O esforço torna-se menor que a remuneração, pois o empregador está
pagando por
serviço não prestado. Isso corresponde ao empobrecimento sem causa do
empregador e enriquecimento sem causa do empregado, que recebe como se
trabalhando estivesse. Mas o empregado pode deixar de colocar
combustível num avião
particular, ou deixar de apertar os parafusos de uma roda de um carro,
enfim,
coisas mais graves. Omissões aparentemente não tão graves podem trazer
consequências gravíssimas. Como colocar o filho para controlar o
tráfego aéreo.
Risco de dano é dano, e risco de prejuízo é prejuízo, pelo menos assim
pensa o
STJ. Legítima defesa do empregador: não precisa o empregador ir a juízo
para
pedir autorização para punir.
3.
Teoria
Institucionalista: é o uso da autoridade do empregador para alcançar o
bem comum.
Cabe ao empregador aplicar a punição para que o empregador respeite os
demais,
a empresa e a clientela. É uma ideia de responsabilidade social. Não é
uma
visão contratual ou negocial.
Por que estamos estudando essas três
teorias? Para
justificar o poder de punir do empregador, que traz, como prejuízo para
o
empregado, a redução de salário.
Poder de controle: já vimos que o
poder de direção é
abrangente. O poder de controle habilita que o empregador acompanhe o
desenvolvimento dos resultados e da conduta do empregador. Como
funciona isso?
O que é esse controle da atividade, do resultado? É saber se realmente
o que é
feito é na qualidade e quantidade previstas, como 20 camisas em 4
horas, ou
qualquer que tenha sido a diretriz fixada pelo empregador desde que
humanamente
razoável.
O controle pode ser feito dentro ou
fora da empresa. O
empregado é controlado de fora da empresa, por exemplo, nos serviços de
atendimento por chat das empresas, como as aéreas. Assim o empregador
controla
porque tudo fica registrado. Esse controle não fica perdido enquanto o
empregado está afastado do ambiente físico da empresa.
E a fiscalização da conduta do
empregado: esse tema suscitou
uma discussão muito grande. O empregado pode assumir uma conduta que
você não
gostaria, mas não a ponto de caracterizar culpa do empregado para dar
fim ao
emprego. Uma jovem mulher bonita, por exemplo, tem total liberdade para
posar
nua para uma revista masculina. Mas e se ela for uma educadora de
crianças? Não
é a conduta que o empregador irá desejar dela. O mesmo para o caso em
que ela,
em pleno exercício de seu direito de livre manifestação, declarar que
fuma
maconha. Cada caso é um caso. O que não pode é o empregador ter
prejuízo pelo
comportamento do empregado. É ônus do empregador provar que houve
prejuízo.
Elementos
caracterizadores da relação de emprego
Como caracterizar uma relação
empregado-empregador?
Precisamos de uma sociedade registrada na Junta Comercial, se sociedade
empresária, ou que atenda aos requisitos do art. 966 do Código Civil?
Não.
Precisamos somente de uma tarefa: ler o art. 3º da CLT e verificar se
os
elementos se verificam. O nome da empresa, se é sociedade, que tipo de
sociedade é simplesmente não importa. Só não se tem vinculo
empregatício se o
objeto do empregado for ilícito.
Quais as pessoas equiparadas a
empregador? Art. 2º, § 1º da
CLT: “Equiparam-se ao empregador, para os
efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as
instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras
instituições
sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados. [...]”
veja o profissional liberal: temos um engenheiro, um médico, um
advogado, e sua
secretária. O empregador não precisa ter uma finalidade lucrativa,
necessariamente. Uma instituição beneficente pode ter empregados, mesmo
sem fim
lucrativo. Associação de juízes e a OAB: o clube dos advogados tem
empregados.
Há interpretação analógica no § 1º pela expressão “outras
instituições”. Como
enquadrar? Pela subordinação.
Enfim, quase qualquer instituição
pode ser empregadora. Como
averiguar? Princípio da primazia da realidade.
A palavra trabalhador é colocada como
“aquele que admitido
como empregado.” Se ele for contratado como empregado, tem-se o vinculo
de
emprego. O sujeito pode ser chamado de empreiteiro, mas, se realizar
uma
atividade não habitual mediante salário sob dependência, ele será
empregado. Basta
ler os arts. 2º e 3º da CLT.
Veja o final do § 1º: “...que
admitirem trabalhadores como empregados.” O conceito é
aberto. Então, quem
não tem cuidado torna-se empregador, e não importa o nome que se dá ao
sujeito
que com ele trabalha.
Grupos despersonalizados: são os que
a doutrina indica como
grupos que não necessariamente constituam uma empresa, assim como os
profissionais liberais, que não têm aquela visão de empresa individual
ou
coletiva. A sociedade em comum é o registro? Não. A sociedade em comum
é a
sociedade não registrada, de fato, assim disciplinada pelo Código
Civil. A
sociedade em comum pode ser empregadora, pois, se não pudesse sê-lo,
ela teria
benefício muito grande. Ela poderá exigir o labor de alguém, mas,
quando
demandada em juízo, ela poderia alegar a inexistência de contrato
social. Esse argumento
não cabe no Direito do Trabalho.
E a família? Pode ser empregadora?
Sim, contudo não pela
CLT, mas pela lei do trabalhador doméstico.
E o condomínio? Pode ser empregador?
Sim. E os condomínios
irregulares, de imóveis que não tem escritura pública? Não haverá
problema pelo
mesmo motivo da sociedade de fato. Basta provar que há alguém que se
encaixe na
descrição de empregador.
No § 2º veremos a figura do grupo de
empresas, depois da
Semana Santa.
Ver vídeo no Youtube sobre assédio moral. Assédio moral traz pressão psicológica durante determinado tempo. Não se tem a figura do assédio no Código Penal, nem na CLT, nem na Lei 8112. Temos somente legislações estaduais e municipais. Frases como “vou te dispensar” podem ser consideradas como assédio moral.
1 – Este foi só um exemplo,
pois, na realidade, os diaristas terminam por receber bem mais do que
os
domésticos mensalistas. Daí muitos, hoje em dia, mudarem a forma como
se
apresentam.