Direito Processual Civil

terça-feira, 8 de junho de 2010

Aspectos da execução por quantia certa fundada em título executivo extrajudicial - principais inovações trazidas pela Lei 11382/2006



Hoje vamos nosso programa. Na quinta-feira, como sabemos, não haverá aula. Terça-feira temos revisão e correção de um exercício que o professor nos mandará pelo espaço aluno. Além dos exercícios, é interessante que estudemos antes para aproveitarmos melhor a aula de revisão.

Vamos ver hoje os aspectos aplicados subsidiariamente ao cumprimento da sentença, por força do art. 475-R. “Aplicam-se subsidiariamente ao cumprimento da sentença, no que couber, as normas que regem o processo de execução de título extrajudicial.” É claro que não veremos tudo pois a parte do Código dedicada à disciplina dessa execução conta com cerca de 130 artigos. Correspondem quase a um livro do Código. A ideia aqui é dar uma noção geral especialmente no que repercute no cumprimento da sentença.

Em 2006, tivemos uma alteração feita pela Lei 11382, muito interessante pois o Código já é antigo, e estamos em vias de aprovar um novo. O duplo grau de jurisdição obrigatório, na proposta da comissão constituída para redigir um novo CPC, acaba. Mas temos alguns institutos que são aparentemente burocráticos, que, todavia, temos que entender. Quando temos uma regra que estabelece o momento de deduzir uma reconvenção, isso já não se trata de um instituto burocrático.

Professor está otimista com o que há por vir no novo Código, exceto que, neste ano, por causa das eleições, os parlamentares estarão preocupados com outras coisas, que podem contaminar o processo de deliberação. O Código é uma questão técnica, e não se trata de uma lei em que se discute se parte da sociedade é a favor ou contra.

O Código de 73, na parte de execução, sofreu significativas mudanças.

Antes, na execução, o devedor era citado para pagar ou nomear bens à penhora. O prazo era de apenas 24 horas. O que acontece? Como ele tinha o direito de nomear bens à penhora, ele o fazia, pois pagar em 24 horas era impossível. Havia incidente quando o credor discordava do bem apontado e o juiz tinha que resolvê-lo, o que consumia muito tempo.

Hoje o devedor não tem mais o direito subjetivo de nomear bens. Hoje ele é citado para pagar, em três dias. O prazo se estendeu, tornando mais viável o pagamento.

Não realizado o pagamento, ocorre a penhora, e nisso o credor poderá adiantar, já na petição inicial, indicando os bens penhoráveis que possam ser objeto dessa diligência caso o pagamento não seja feito. Art. 652: “O executado será citado para, no prazo de 3 (três) dias, efetuar o pagamento da dívida.

§ 1º Não efetuado o pagamento, munido da segunda via do mandado, o oficial de justiça procederá de imediato à penhora de bens e a sua avaliação, lavrando-se o respectivo auto e de tais atos intimando, na mesma oportunidade, o executado.

O mandado já fica em poder do oficial. Perguntamos: pode haver citação por correio para execução? É uma regra do processo de conhecimento aplicado à execução. Para responder, temos que voltar ao art. 222, letra d. “A citação será feita pelo correio, para qualquer comarca do País, exceto: [...] d) nos processos de execução;” Não pode, portanto. As regras do processo de conhecimento são aplicadas subsidiariamente aqui no processo de execução. Aqui fala-se em citação, mas nesta região do Código que estamos estudando (artigos 600 em diante) o legislador não vai até os pormenores da citação, que está no Livro I. No que não conflitar com as regras próprias do sistema, usamos subsidiariamente as regras dos outros procedimentos. Neste caso, temos uma disposição expressa dizendo que no caso devemos aplicar as regras do processo de conhecimento ao processo de execução. E também são aplicáveis subsidiariamente procedimento do cumprimento de sentença as regras do processo de execução do título executivo extrajudicial. Temos, dessa forma, uma cadeia que chega ao cumprimento de sentença.


Embargos

Os embargos, que já falamos antes, têm natureza jurídica de ação e a finalidade deles é viabilizar a defesa do devedor no processo de execução. Uma petição inicial dará origem a um procedimento, ou melhor, a um processo que é dependente da execução, mas que com ela não se confunde. Enquanto a execução tem um objeto específico que é a expropriação de bens, no caso da execução de obrigação de pagar quantia certa, nos embargos viabiliza-se a defesa do devedor. Pode desconstituir a execução. Se o juiz, no processo dos embargos, chegar à conclusão da nulidade do título, a execução será desconstituída. É um processo de conhecimento de cunho defensivo, sem objeto amplo, em que se busca conhecer somente aquilo que possa repercutir no objeto da execução.

Antes, tínhamos uma sistemática de que o devedor só poderia opor embargos depois de garantida a execução por meio da penhora. Não havia possibilidade de se defender. A jurisprudência e a doutrina acabaram criando uma solução, dentro dessa solução, um instrumento chamado exceção de pré-executividade. Era uma forma de defesa do devedor em que ele podia suscitar questões de ordem pública às quais o juiz poderia conhecer de ofício sem a necessidade de garantia por penhora. Era um jeitinho. Toda a matéria deveria ser deduzida por meio de embargos. Mas, para embargar, era requisito que a execução fosse garantida por meio de penhora.

O devedor já havia pagado, mas para se defender ele tinha que nomear bens à penhora somente para dizer: “eu já paguei”. Se a questão dizia respeito à legitimidade da dívida, ou das partes para a execução, prescrição ou pagamento, isso poderia ser alegado por meio da exceção de pré-executividade. Não excluía a possibilidade de o devedor apresentar embargos, mas, na prática, demoraria mais. Então o legislador veio para dizer que os embargos podem ser opostos independentemente de penhora. Para que penhora nessa situação?

Por outro lado, os embargos tinham invariavelmente efeito suspensivo, e o devedor usava-o para procrastinar. O juiz não tinha a possibilidade de deliberar sobre o efeito.

A rejeição liminar dos embargos era muito difícil porque, sendo ação de conhecimento, o juiz ficava numa situação complicada: poderia rejeitar liminarmente, mas poderia estar tolhendo o direito de defesa do devedor.

E o efeito suspensivo? Ele passa a ser possível, só ocorrerá quando decorrer de uma decisão do juiz quando verificar, a exemplo da impugnação no cumprimento da sentença, a relevância dos fundamentos e o risco de prejuízo irreparável ou de difícil reparação para o devedor no caso de prosseguimento da ação.

Art. 739-A: “Os embargos do executado não terão efeito suspensivo.

§ 1º:“O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando, sendo relevantes seus fundamentos, o prosseguimento da execução manifestamente possa causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes.”

O legislador, portanto, estabeleceu que os embargos podem receber efeito suspensivo caso fundamentado o risco e a penhora ou caução sejam feitas como garantia.

Quanto ao excesso de execução por meio dos embargos, o embargante deverá declarar na petição inicial o valor que entende correto, a exemplo da impugnação no cumprimento de sentença. O devedor deve alegar não só que há excesso, mas qual é o valor que entende correto. Se o credor está exigindo 100 unidades monetárias, mas o devedor só concorda que são devidas 80, este demonstrará com uma memória discriminada de cálculos. Mesmo que seja uma prova elaborada unilateralmente pelo devedor, isso evitará que a alegação vazia por parte do devedor de que simplesmente “há excesso”, que costumava ser feita antes, impusesse uma instrução só para averiguá-la, para depois ver que o valor apontado pelo credor estava correto mesmo. Era um dos institutos mais usados para protelar o pagamento.

Hoje, o juiz pode rejeitar liminarmente se a memória discriminada não for apresentada. O uso indevido dos meios de defesa com a finalidade de protelar ficou um pouco mais difícil.

A rejeição liminar, nos demais casos, além desse, estão previstos também no art. 739: “O juiz rejeitará liminarmente os embargos:

I – quando intempestivos;

II – quando inepta a petição (art. 295); ou

III – quando manifestamente protelatórios.

Mesmo fora dos casos de excesso, quando o juiz verifica, ao analisar, que os embargos não tem nenhuma relevância e que eles têm evidentemente uma finalidade de retardar o processo, ele poderá rejeitar liminarmente.

Hoje, portanto, não é mais necessário garantir o juiz para opor embargos. Mudou também a regra sobre o acolhimento do efeito suspensivo.

 

Penhora por meio eletrônico

Essa é a penhora online, que hoje é feita no que diz respeito aos depósitos bancários pelo Bacen Jud. Foi desenvolvido para tornar mais ágil e reduzir o ônus que recaía sobre o Banco Central para repassar ofícios em papel para as instituições financeiras. Hoje os juízos todos, trabalhistas, estaduais, federais, e também os criminais, quando se tratar de indisponibilidade de bens, poderão realizar a penhora por meio desse sistema. O juiz, quando receber uma execução, determina a citação, e, não sendo feito o pagamento, vinha a discussão: esse bloqueio eletrônico só poderia ser determinado depois de se esgotarem as outras possibilidades, como as diligências junto a cartórios de registro de Imóveis, correios, capitania dos portos, bolsa de valores, Detran... ou seja, buscavam-se bens em geral. Mas isso é supérfluo; essa exigência era uma resistência cultural. Verdade é que o dinheiro está no topo da ordem de preferências na penhorabilidade. Assim, por que esgotar outros meios, se é este o procedimento que tem por finalidade obter o bem que está na primeira posição na ordem de preferência na penhorabilidade?

O art. 655 prevê essa ordem preferencial. Preferencialmente significa que a ordem é impositiva. O credor pode concordar que seja um bem que não esteja na mesma ordem. “A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:

I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;

II – veículos de via terrestre;

III – bens móveis em geral;

IV – bens imóveis;

V – navios e aeronaves;

VI – ações e quotas de sociedades empresárias;

VII – percentual do faturamento de empresa devedora;

VIII – pedras e metais preciosos;

IX – títulos da dívida pública da União, Estados e Distrito Federal com cotação em mercado;

X – títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;

XI – outros direitos.

§ 1º Na execução de crédito com garantia hipotecária, pignoratícia ou anticrética, a penhora recairá, preferencialmente, sobre a coisa dada em garantia; se a coisa pertencer a terceiro garantidor, será também esse intimado da penhora.

§ 2º Recaindo a penhora em bens imóveis, será intimado também o cônjuge do executado.

O que são esses outros direitos? O crédito que, por exemplo, o devedor tenha numa ação de conhecimento. Pode estar na fase de execução e não ter dinheiro, mas ter o crédito. O crédito pode ser penhorado. Nisso faz-se a “penhora no rosto dos autos”, assim chamada porque a penhora é escrita na capa dos autos para que ninguém esqueça e faça o pagamento. O processo seguirá até o final e, só então, ele será transferido à conta do juízo da execução.

Dinheiro é o primeiro sempre, portanto não pode haver, não há razão para que haja necessidade de esgotamento de outros meios.

Na prática, como funciona? O juiz tem um acesso direto ao sistema e cadastra uma ordem de bloqueio. Ao fazê-lo, o BACEN repassa a ordem para todas as instituições financeiras. O problema é que não existe um direcionamento, e o bloqueio é feito em todas elas, em todas as instituições que o devedor possa ter uma conta. O problema seria eleger a instituição financeira que teria preferência no bloqueio. É o mercado e, se assim fosse feito, os clientes evitariam-na. Se houvesse solução, o BACEN já teria adotado. Se fosse somente de bancos oficiais, quem tivesse dívida não iria ter conta em bancos oficiais.

 

Alienação pelo exequente, por corretor credenciado, por Internet ou hasta pública

O que temos de inovação é a possibilidade da alienação por iniciativa privada ou pela Internet. Há empresas que estão se especializando em leilões eletrônicos de bens penhorados. O leilão online pode ser feito pelo próprio órgão do Judiciário ou pela empresa credenciada. A vantagem dessas formas incorporadas é que, ao mesmo tempo em que precisamos buscar efetividade e celeridade, ela deve ocorrer de forma menos onerosa para o devedor. Quando levamos um bem qualquer a leilão e damos uma publicidade que muitas vezes fica restrita a uma divulgação na parte de anúncios dos jornais, ninguém lê. Nem resolvia o problema da divulgação caso fosse feita a publicação no Diário Oficial ou no próprio quadro de avisos do órgão Judiciário; isso ainda fica limitado. Com a Internet, isso se amplia consideravelmente. A partir do momento em que temos uma divulgação maior, a possibilidade de alcançar o valor é muito maior, e aí alcançam-se mais interessados, portanto o bem acaba arrematado também por valor maior.

Essa deficiência na divulgação gerava um problema para o devedor pois seu bem era alienado por valor abaixo do que realmente valia. Somente os interessados na área freqüentavam os leilões pois eram eles os atentos aos tímidos meios de comunicação; inclusive a atividade de alguns era adquirir por valor menor do que o de mercado determinado bem leiloado.

O próprio exequente, pelo valor da obrigação, pode pedir que um corretor credenciado o faça. Art. 685-C. “Não realizada a adjudicação dos bens penhorados, o exeqüente poderá requerer sejam eles alienados por sua própria iniciativa ou por intermédio de corretor credenciado perante a autoridade judiciária.

A hasta pública tem duas formas, que são a praça e o leilão. A praça é normalmente designada para a alienação pública de imóveis. O leilão é para bens móveis, veículos por exemplo. Essa forma ficou mantida, mas o juiz pode substituir por essa possibilidade do leilão eletrônico. Então, temos, no art. 689-A, a seguinte previsão: “O procedimento previsto nos arts. 686 a 689 poderá ser substituído, a requerimento do exequente, por alienação realizada por meio da rede mundial de computadores, com uso de páginas virtuais criadas pelos Tribunais ou por entidades públicas ou privadas em convênio com eles firmado.

Parágrafo único.  O Conselho da Justiça Federal e os Tribunais de Justiça, no âmbito das suas respectivas competências, regulamentarão esta modalidade de alienação, atendendo aos requisitos de ampla publicidade, autenticidade e segurança, com observância das regras estabelecidas na legislação sobre certificação digital.

Isso tem se difundido bastante. Empresas têm se especializado em leilões eletrônicos. Elas repassam o valor mediante uma remuneração. É rápido e barato porque não tem aquela burocracia das comunicações para hastas públicas, e atinge um universo maior de pessoas.

 

Parcelamento

Outra inovação foi a previsão legal do parcelamento do débito. Podia ocorrer antes desde que mediante acordo entre devedor e credor. Hoje temos uma previsão legal: se o devedor cumprir as previsões legais, ele poderá fazer jus ao parcelamento, e o credor não poderá se opor a isso.

O art. 745-A prevê essa possibilidade: “No prazo para embargos, reconhecendo o crédito do exequente e comprovando o depósito de 30% (trinta por cento) do valor em execução, inclusive custas e honorários de advogado, poderá o executado requerer seja admitido a pagar o restante em até 6 (seis) parcelas mensais, acrescidas de correção monetária e juros de 1% (um por cento) ao mês. [...]” as parcelas serão corrigidas e incidirão juros de 1% ao mês, o que é bem pesado, na verdade.

§ 2º: “O não pagamento de qualquer das prestações implicará, de pleno direito, o vencimento das subsequentes e o prosseguimento do processo, com o imediato início dos atos executivos, imposta ao executado multa de 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações não pagas e vedada a oposição de embargos.

Ele terá que abrir mão dos embargos e incidirá a multa de 10%.

Dica prática: na fase de conhecimento, quando o réu reconhece a dívida, mas não tem condições de pagar tudo, é feito um acordo que implica parcelamento. O que isso representa para o processo de conhecimento? Resolução de mérito, e causa de extinção da fase de conhecimento (art. 269, inciso III). O juiz proferirá uma sentença. Mas os advogados dos autores, na melhor intenção para com seus clientes, pedem a suspensão do processo de conhecimento até o cumprimento do parcelamento e, no final, pedem a extinção, como se isso fosse forçar o cumprimento. Se o devedor, num determinado momento, descumprir, o processo de conhecimento será retomado, o que poderá inclusive causar a prescrição da dívida. O mais razoável seria obter a homologação do acordo, que constituirá título executivo que, se descumprido, bastará o credor executar. Na fase de execução, se houver parcelamento, seja por acordo ou o previsto no art. 745-A, a execução só será extinta ao final, com o pagamento total. O que o Código prevê aqui é a suspensão dos atos executivos.

 

Alegação de excesso de execução

É exigência da apresentação da memória discriminada sob pena de rejeição liminar, que está no § 5º do art. 739. Já falamos.

A finalidade desta aula foi dar uma noção geral de alguns aspectos em que são aplicáveis subsidiariamente ao cumprimento de sentença. A parte de embargos não é aplicável subsidiariamente ao cumprimento de sentença (pergunta de prova!) porque no cumprimento existem regras específicas que disciplinam a defesa do devedor, que é por meio da impugnação. A aplicação da regra subsidiária pressupõe a lacuna, então não há regra própria.

Alienação de bem penhorado pode ser feita pelo exequente ou pela Internet ou por corretor porque não há regras próprias.

Fim da disciplina!