Falamos na aula passada sobre a
contestação e hoje vamos falar sobre exceções e a reconvenção.
A primeira observação sobre as
exceções é que elas são instrumentos processuais a disposição das partes,
apesar de estarem dentro parte de resposta do réu. o autor também pode usar as
exceções. É o que fica claro ao ler o art. 304 do Código de Processo Civil: “É lícito a qualquer das partes argüir, por
meio de exceção, a incompetência (art. 112), o impedimento (art. 134) ou a
suspeição (art. 135).”
A exceção é um instrumento
processual de uso das partes, e não exclusivamente do réu. Mas é muito mais
comum, específicamente no caso da exceção de incompetência, o uso pelo réu. A opção
do legislador por colocar como uma das hipóteses de defesa é que na prática é
uma situação mais comumente usada pelo réu.
Exceção, além de indicar esse
instrumento processual, tem como sentido genérico o significado de defesa, de
modo geral. Estudamos a distinção entre prescrição e decadência, e a primeira,
como vimos, é um meio de defesa: trata-se de uma exceção.
O que nos interssa na aula de
hoje é a exceção como instrumento processual, por meio de de autos apartados:
petição escrita destinta da contestação. Os autos serão separados dos autos da
ação.
Qual a finalidade? Como veremos, no
caso da exceção de incompetência e também da exceção de suspeição, esse ato
interessa ao incidente, e não à ação propriamente. Assim, evita-se a poluição
do processo com registros que não interessam diretamente à ação.
Vamos ver o art. 305: “Este direito pode ser exercido em qualquer
tempo, ou grau de jurisdição, cabendo à parte oferecer exceção, no prazo de 15
(quinze) dias, contado do fato que ocasionou a incompetência, o impedimento ou
a suspeição.”
Parece contraditório, mas não é.
Quando ele diz que pode ser feito ao mesmo tempo, temos que ter em mente que
tempo e prazo não se confundem, e têm sentidos diversos. Muito embora o prazo
seja um intervalo de tempo delimitado. Tempo é qualquer momento do processo, ou
seja, não havendo uma limitação temporal sobre determinado tempo.
O prazo fluirá a partir da causa
que o determine, como a que determina a incompetência, a suspeição, ou o que
for.
Chegaremos à conclusão de que, se
não for arguida no prazo, ocorrerá prorrogação.
No caso da incompetência, o que
temos quase sempre é que a exceção será usada pelo réu. Não existe a escolha. Existindo
no foro mais de um juízo com a mesma competência, o foro será escolhido pelo
autor. Diferentemente da reconvenção, esse prazo não está na dependência do
oferecimento da contestação. Se o réu oferecer a contestação no décimo dia, o
prazo para a exceção continuará ocorrendo. A reconvenção, por sua vez, tem que
ser apresentada em conjunto com a contestação.
É possível, em princípio, a
exceção de incompetência ser utilizada pelo autor também, como numa hipótese em
que o autor ache que há prevenção daquele foro, pela existência de uma ação
conexa, mas, ao ser distribuída, não ter sido observada essa prevenção. Na
prática, é muito raro acontecer, até porque a distribuição, nesses casos, como
tem natureza administrativa, não caracteriza reconhecimento de ofício pelo
juiz.
Parágrafo único do art. 305: “Na exceção de incompetência (art. 112 desta
Lei), a petição pode ser protocolizada no juízo de domicílio do réu, com
requerimento de sua imediata remessa ao juízo que determinou a citação.”
A suspeição e o impedimento
poderão surgir no curso do processo. Se houver uma remessa de autos que o juiz
entenda como decorrente de conexão ou continência, a parte poderá recorrer
dessa decisão. A parte não fará uso da exceção de incompetência neste caso; ela
utilizará o recurso.
A causa de suspeição motivada
pela parte não deve interferir no curso normal do processo, não deve ser
reconhecida. Como o réu ofender o juiz para que, daí para frente, ele argua a
suspeição do juiz. Mas, por outro lado, se a causa for anterior, aí sim poderá
ocorrer. Ou então casamento entre advogada da causa casar com o juiz.
Então, quando o Código diz “em
qualquer tempo” significa que não há limitação do momento em que ocorre.
Uma diferença que precisamos
saber é que, enquanto a incompetência relativa o juiz não pode declarar de
ofício, a suspeição e o impedimento supervenientes constituem deveres do juiz
de se afastar do processo. Mas isso não quer dizer que em todo caso de
suspeição ou impedimento ele estará agindo errado, até Porque isso pode passar
despercebido. Mas, uma vez alertado pela parte, ele terá uma oportunidade para
se afastar. A parte pode não ter razão, ou a alegação pode não ser forte o
suficiente.
Ainda sobre o parágrafo único do
art. 305: prevê-se, aqui, a possibilidade da exceção de incompetência ser
apresentada no juízo do domicílio do réu. como isso é possível? A única
possibilidade que visualizamos para aplicação prática desse dispositivo é quando
o réu tenha sido citado por carta, como de ordem ou carta precatória (o caso
mais comum.) Quando começa a correr o prazo? Tanto para contestação quanto para
exceção: quando a carta cumprida é juntada aos autos. Então, no recebimento, o
juiz suspenderá o prazo, assim, facilita-se a defesa do réu.
Vamos agora ao art. 306: “Recebida a exceção, o processo ficará
suspenso (art. 265, III), até que seja definitivamente julgada.”
Aqui temos duas possibilidades
para esse recebimento: encontraremos decisão do STJ num sentido, mas o próprio Código
já indica o momento do recebimento. Assim, a questão passa a ser: é do
protocolo da petição inicial ou do recebimento pelo juiz? O juiz pode instaurar
procedimento, pois há possibilidade de rejeição em caráter liminar. A suspensão
do processo é contrária à celeridade processual. O só fato de apresentar o
incidente não pode ter o efeito de suspender.
No caso do impedimento e da
suspeição, damos ao juiz uma oportunidade para reconhecê-las. A partir do momento
em que ele é cientificado de que a parte entende que ele é suspeito ou
impedido, ele poderá se afastar.
Efeitos
Se a exceção é acolhida, qual o
efeito? Deslocar o processo de um juízo para outro que, no entender da parte,
seja competente.
Não basta a arguição genérica da
incompetência, ela tem que ser fundamentada. Art. 307: “O excipiente argüirá a incompetência em petição fundamentada e
devidamente instruída, indicando o juízo para o qual declina.”
Neste caso, a parte, no momento
em que arguir a incompetência, deverá dizer qual é o foro competente e
justificar. Também se pode invocar cláusula contratual de eleição de foro aqui.
Excipiente é aquele que argui a exceção. A parte contrária é o excepto. Essa denominação é importante
porque a exceção pode ser usada por autor ou réu.
Art. 308: “Conclusos os autos, o juiz mandará processar a exceção, ouvindo o
excepto dentro em 10 (dez) dias e decidindo em igual prazo.”
Se o juiz entender que é
manifestamente improcedente a exceção? Art. 310: “O juiz indeferirá a petição inicial da exceção, quando manifestamente
improcedente.”
Significa que ele não irá
instaurar um procedimento de um incidente, e não suspenderá o processo. Dessa
decisão, que é interlocutória, também cabe recurso de agravo.
Art. 309: “Havendo necessidade de prova testemunhal, o juiz designará audiência de
instrução, decidindo dentro de 10 (dez) dias.”
É possível a realização de uma
audiência de instrução para ouvir testemunhas, mas ficará restrita ao objeto do
incidente, e assim investigar se há algum fato que suporte a alegação da
exceção.
A decisão não encerra o processo,
só o incidente processual.
O juiz que recebe, se não
concordar com a remessa, e entender por competente o juiz que lhe remeteu, aquele
poderá suscitar um conflito negativo de
competência. Ele não mandará de volta, claro. Mas, se entender que a
competência não é dele nem do outro, mas de um outro órgão, e que essa
incompetência seria absoluta, ou de outro seguimento do Judiciário? Então ele
poderá mandar, ex officio, para o
outro juízo.
Exceções de impedimento e suspeição
Aqui o juiz não poderá se manifestar de ofício. O
art. 312 prevê que “a parte oferecerá a
exceção de impedimento ou de suspeição, especificando o motivo da recusa (arts.
134 e 135). A petição, dirigida ao juiz da causa, poderá ser instruída com
documentos em que o excipiente fundar a alegação e conterá o rol de
testemunhas.”
Aqui, temos, diferentemente da
exceção de incompetência, em que há o estabelecimento de uma relação entre uma
parte e outra, não há aqui, no caso da suspeição e do impedimento, participação
da parte contrária no procedimento.
Art. 313: “Despachando a petição, o juiz, se reconhecer o impedimento ou a
suspeição, ordenará a remessa dos autos ao seu substituto legal;” [...]
Diferentemente da exceção de incompetência em que o processo é remetido para
outro juízo, aqui o juiz se afasta do processo, mas continua na mesma vara e o
substituto assume. O cartório e a secretaria são os mesmos.
“...em caso contrário, dentro de 10 (dez) dias, dará as suas razões,
acompanhadas de documentos e de rol de testemunhas, se houver, ordenando a
remessa dos autos ao tribunal.”
Isso é uma causa de recusa do juiz, do julgador, não do juízo. Útil para quando algum juiz já
tiver conhecimento pessoal sobre determinada causa.
Parte do incidente, pois ele está
se defendendo, alegando que não existe esse impedimento ou suspeição. Quem irá
julgar? O Tribunal, que examinará os autos da exceção somente. Os autos
principais permanecerão no juízo originário, em suspenso.
Art. 314: “Verificando que a exceção não tem fundamento legal, o tribunal
determinará o seu arquivamento; no caso contrário condenará o juiz nas custas,
mandando remeter os autos ao seu substituto legal.”
Rara hipótese em que o juiz é
condenado, em função do dever que tem o magistrado de não atuar em causas em
que esteja impedido. configura descumprimento de dever funcional. Essa atuação
pode configurar algo mais? Sim. Isso pode caracterizar infração disciplinar, se
ficar provado que ele queria atender a um determinado interesse.
O procedimento, em qualquer caso,
é muito simples. As decisões se justificam pela própria natureza das causas. O que tem em comum é que a existência
de impedimento ou suspeição são pressupostos processuais relativos ao julgador.
São hipóteses de afastamento do julgador com a determinação da remessa dos
autos para outro.
E se se tratar de incompetência
absoluta, o procedimento é esse mesmo? No caso da incompetência absoluta, como
vimos na aula passada, é uma das hipóteses em que dispensa-se a exceção, e o
réu irá arguir no corpo da própria contestação. Dispensa-se exceção para o caso
de incompetência absoluta.
A reconvenção
Também classificada sob o a
resposta do réu, ela tem natureza de ação. Na reconvenção, o réu pede tutela
jurisdicional em seu favor contra o autor. Então, no mesmo processo, o réu pede
ao juiz a condenação do autor a lhe pagar determinado valor, por exemplo. A
contestação não se presta a isso, pois tem natureza de defesa.
Requisitos da reconvenção: estão
no art. 315. Há limitação de objeto: “O
réu pode reconvir ao autor no mesmo processo, toda vez que a reconvenção seja
conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa.
Parágrafo único. Não pode o réu,
em seu próprio nome, reconvir ao autor, quando este demandar em nome de outrem.”
O requisito para que essa
pretensão do réu em face do autor possa ser deduzida por meio de reconvenção é
que haja conexão com a ação ou com os fundamentos da defesa. Por que é assim?
Porque o legislador quis? Isso não é resposta. Precisamos entender a lógica dos
institutos. Temos que ter soluções adequadas para aquilo que surgir na prática.
Os estudiosos dos ramos do direito material até dizem que o processo é
formalismo. O excessivo formalismo surge exatamente como consequência da falta
do estudo aprofundado do processo. Quando há domínio maior do significado da
forma, do sentido lógico dessa forma, então, por que há essa restrição? Porque,
na verdade, se entendermos que a reconvenção é possível qualquer demanda, isso
acarretará prejuízo para a insturção da ação.
No procedimento sumário, não
temos a previsão da reconvenção, até porque é um procedimento mais simples. Mas
o § 1º do art. 278 prevê que: “É lícito
ao réu, na contestação, formular pedido em seu favor, desde que fundado nos
mesmos fatos referidos na inicial.” Também chamado de pedido contraposto ou
reconvencional. Há essa possibilidade, mesmo no procedimento sumário, mesmo que
não se trate de reconvenção propriamente dita.
Qual a diferença? Qual é mais ampla?
A reconvenção, claro. Por quê? Porque nela o pedido é possível desde que
fundado nos mesmos fatos trazidos pelo autor. Os fatos, na verdade, são uma
parte da causa de pedir (junto com os fundamentos jurídicos). Então, veja o
exemplo do acidente de trânsito, em que alguém se sente prejudicado e propõe
uma ação, apontando o condutor do outro veículo como causador dos danos. O
motorista daquele veículo pode entender que ele não teve responsabilidade e
aproveite essa oportunidade para pedir, naquele mesmo momento, já que se trata
do mesmo fato, que o autor lhe indenize. Isso é uma ação denominada
reconvenção, que tem como causa de pedir o mesmo fundamento da ação do autor.
Quando pode ser oferecida? Qual é
a oportunidade? Vamos voltar num artigo que pulamos. Art. 299: “A contestação e a reconvenção serão
oferecidas simultaneamente, em peças autônomas; a exceção será processada em
apenso aos autos principais.”
A reconvenção deve ser
apresentada numa petição separada e será jntada aos próprios autos.
Por que há previsão de serem
apresentadas simultaneamente? Preclusão consumativa. É a perda do direito de
reconvir. Não confunda isso com o direito de ação. O ajuizamento da ação
autônoma permanece intacto. Qual o porquê disso? Art. 316: “Oferecida a reconvenção, o autor reconvindo
será intimado, na pessoa do seu procurador, para contestá-la no prazo de 15
(quinze) dias.”
Vejam o seguinte: existe um
desdobramento no procedimento que dependerá de ter sido ou não apresentada a
reconvenção. Se foi aprsentada somente a contestação, o juiz deverá tomar
certas providências, dependendo do conteúdo dela. Mas, se apresentadas as duas,
as providências são outras. Exemplo: o réu, no quinto dia do prazo, oferece a
contestação. No 15º dia, o réu apresenta sua reconvenção. O processo não está
mais no cartório pois já está com carga para o autor. A reconvenção tem que ser
processada em sincronia com a ação. Não é, portanto, uma exigência destituída
de sentido lógico.
Substituição processual e reconvenção
Com a reconvenção, temos o
surgimento de uma nova relação jurídica processual dentro do mesmo processo. No
pólo ativo temos o réu, e no passivo o autor. Houve uma inversão de pólos.
Quando o autor está agindo na defesa de um direito que não lhe pertence, mas o
faz em nome próprio, temos o quê? substituição processual. Por que a
substituição processual impede a reconvenção? Porque a justificativa lógica da
reconvenção é que as partes da relação jurídica processual sejam as mesmas. A
substituição processual só é admitida para o pólo ativo. Então o art. 6º, que
diz que “ninguém poderá pleitear, em nome
próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei”, prevê a possibilidade
de a exceção ser para o pólo ativo, requerer em nome próprio, e não para ser
demandado. Então, se o autor está pleiteando em nome próprio um direito que não
é seu, ele não poderá ser alvo da reconvenção pois não tem legitimidade para
subsitituir, no pólo passivo, aquelas pessoas. Veja o parágrafo único do art.
315: “Não pode o réu, em seu próprio
nome, reconvir ao autor, quando este demandar em nome de outrem.”
O que justifica a reconvenção é
que duas lides podem ser julgadas no mesmo processo pois têm as mesmas partes e
assim observa-se a economia processual.
Outra discussão: se o autor age
em nome próprio mas não é o único titular do direito, poderá o réu reconvir?
Não, pois teriam que ser citadas outras pessoas que não compõem a relação
jurídica processual. Exemplo: condôminos.
Extinção da ação
Art. 317: “A desistência da ação, ou a existência de qualquer causa que a extinga,
não obsta ao prosseguimento da reconvenção.”
A reconvenção tem autonomia em
relação à ação. Se ela for extinta por qualquer motivo, isso não determinará a
extinção da reconvenção.
Para finalizar...
Ações dúplices
Pela natureza do objeto ou pela
especificidade do procedimento, dispensam a reconvenção, e não há necessidade.
Exemplos: ações possessórias. O próprio procedimento já prevê a possibilidade
de o réu pleitear uma tutela possessória na própria contestação. O autor pede a
reitegração na posse de um imóvel dizendo que o réu cometeu esbulho
possessório. O réu responde alegando o mesmo, e inclusive pedindo um interdito proibitório.
Assim o juiz pode condenar o autor a se abster de praticar qualquer ato que
caracterize turbação.
Desapropriação: só pode ser
exercida pelo Estado. A entidade pública expropriante propõe ação de
desapropriação não com a finalidade de obtê-la, que é um ato administrativo,
mas sim para ser imitida na posse. O réu pode pedir que a União seja condenada
a pagar o justo preço. Isso tudo sem necessidade de reconvenção.
Reconvenção é simples, mas exige
o entendimento!