Na aula de sábado concluímos a audiência e começamos o
estudo da sentença. Audiência é matéria de prova. Sentença cairá somente na
próxima pois está associada à coisa julgada, que não conseguiremos terminar.
Com relação à sentença, falamos na aula passada sobre o
conceito legal; falamos também sobre a classificação, que neste caso é
classificada como de mérito ou terminativa, e falamos sobre o princípio da
congruência, que estabelece que a sentença deve ter, como objeto, o que foi
discutido no processo: o pedido do autor e o que foi deduzido pelo réu. A
sentença tem que ficar vinculada a isso. O juiz não pode deixar de se
pronunciar sobre nenhum ponto, a não ser nos casos de formação de pedido
subsidiário.
Os vícios decorrentes do descumprimento do princípio da
congruência são a sentença extra petita,
ultra petita e citra petita. Isso acarreta nulidade da sentença. A sentença extra petita pode ocorrer em razão de
dois vícios: um, quando o juiz concede ao autor tutela de natureza diversa da
pedida, como por exemplo o autor formular um pedido declaratório puro, e o juiz
condena o réu; ou então pode condenar o réu em objeto diverso: o pedido é
condenatório (em que o autor pede a restituição do bem), mas o juiz condena o
réu a ressarcir ou a pagar indenização, mesmo sendo a entrega do bem possível. É
outro caso de sentença extra petita. Agora
vamos para os...
Requisitos da
sentença
Do ponto de vista formal, no princípio da congruência,
encontraremos, de forma bem nítida, a norma do art. 458. “São requisitos essenciais da sentença:
I – o relatório, que
conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o
registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;
II – os fundamentos,
em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;
III – o dispositivo,
em que o juiz resolverá as questões, que as partes lhe submeterem.”
Antes de falar sobre os requisitos, precisamos entender a
sentença não apenas como ato processual, mas também como título executivo
judicial. E, como título executivo judicial, a sentença precisa ter um mínimo
da autonomia que permita ser compreendida e entendido o contexto em que ela foi
proferida, mesmo quando tomada fora dos autos. O relatório, que delimita quem são as partes, já que a sentença só
poderá estabelecer obrigações a elas, trará uma síntese do pedido e da defesa e
fará um registro dos principais acontecimentos.
Nos fundamentos,
o juiz analisará as questões de fato e de direito. Nessa parte, o juiz irá
motivar sua conclusão, justificando-a, registrando no dispositivo. É aqui que
ele apreciará as questões processuais preliminares, a análise das questões de
fato e de direito, avaliação da prova, interpretação da norma e aplicação da
norma legal ao caso concreto. O relatório, na verdade, delimita o objeto da
análise. O fundamento é a parte em que o juiz justifica sua conclusão.
O dispositivo,
por fim, é a conclusão. Aqui ele resolverá as questões que as partes lhe
submeterem. Por via de regra, é a parte mais resumida da sentença, pois ele conterá
apenas aquele comando que define a solução do litígio. “À vista do exposto, julgo procedente o pedido do autor e condeno o réu
ao pagamento do valor de R$ 12,96.” Não deixa de ser a parte mais
importante. Por quê? Porque as outras duas são a preparação desta. Note, por
exemplo, que os fundamentos não transitam em julgado. O dispositivo tem que ser
sintético, e não poderá conter justificativas, que devem estar na
fundamentação. É a parte dispositiva que transita em julgado. Por isso temos a
ação declaratória incidental, afim de que produza coisa julgada sobre
determinado fato. Um exemplo que sabemos é o do sócio que pede lucros e
dividendos de uma sociedade enquanto os outros alegarem que ele é estranho à
empresa. Aquela condição de sócio poderá ser questionada novamente no futuro,
se não estiver em sentença. Quando a parte, no caso o autor, se pronunciar
sobre aquela questão por sentença, ela irá ser resolvida não como um
fundamento, mas como uma questão que foi deduzida em juízo. E aí sim, somente depois
de haver ação declaratória incidental que a declaração (de que o sujeito é
sócio da sociedade) poderá ser alcançada pela força da coisa julgada.
Falaremos, depois, sobre o alcance da coisa julgada sobre os elementos do
processo.
O dispositivo conterá tão somente a resolução do litígio.
Conterá a decisão do juiz com relação às questões que foram levantadas. Quando
falamos das preliminares, se o juiz afasta uma delas, ele irá conhecer o
mérito. Se acolher uma preliminar, o dispositivo será a extinção do processo,
com fundamentação, é claro. Mas a lógica é a mesma. A única diferença é que, no
caso das sentenças terminativas, o Código prevê a possibilidade de a sentença ser
proferida de forma simplificada, resumida, mas não dispensa nenhum requisito.
A segunda parte do art. 459 diz isso. “O juiz proferirá a sentença, acolhendo ou rejeitando, no todo ou em
parte, o pedido formulado pelo autor. Nos casos de extinção do processo sem
julgamento do mérito, o juiz decidirá em forma concisa. Parágrafo único. Quando
o autor tiver formulado pedido certo, é vedado ao juiz proferir sentença
ilíquida.” Porque mesmo nas sentenças terminativas precisamos da
fundamentação, que é uma garantia constitucional, que assegura à parte ter
condições de, divergindo daquela conclusão, recorrer. Só a conclusão por si só
permite identificar se a parte concorda ou não com aquela conclusão.
Observação: a sentença tem o mesmo formato em qualquer tipo
de procedimento. No procedimento sumário, como existe uma tônica para o
princípio da oralidade, as questões submetidas a julgamento são via de regra
mais simples, o que se espera é que o juiz possa julgá-las na audiência.
Independentemente de ser proferida em audiência ou depois da conclusão do
processo, a sentença terá que observar esses mesmos requisitos. Proferida em
audiência, ela terá que ser registrada literalmente. Não de forma sintética,
assim como eventuais despachos e decisões.
Limites
Temos algumas situações, que podem acontecer na prática, mas
que não configuram o descumprimento da regra acima. No Direito Tributário, às
vezes temos a figura do contribuinte e do responsável
tributário. Quem é o contribuinte do ICMS? O consumidor de bens e serviços.
Mas quem é que recolhe na Secretaria de Fazenda? O comerciante ou prestador de
serviços. Nisso, se por qualquer razão o consumidor obtiver uma decisão
judicial dispensando-o do pagamento do ICMS, a Fazenda estadual é parte
passiva. Essa sentença irá repercutir no responsável. Ele não é parte, embora a
ele tenha sido imposto um fazer ou não fazer, mas por uma particularidade da
própria relação jurídica. Mas, a rigor, a pessoa que sofrerá as consequências
da sentença necessariamente terá que ter sido parte no processo.
Limite objetivo está no art. 460, que fala sobre os limites
objetivos: “É defeso ao juiz proferir
sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o
réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Parágrafo único. A sentença deve ser certa, ainda quando decida relação
jurídica condicional.”
Para finalizar, vamos ao...
Efeito da publicação
Art. 463: “Publicada a
sentença, o juiz só poderá alterá-la:
I – para lhe corrigir,
de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais, ou lhe retificar
erros de cálculo;
II – por meio de
embargos de declaração.”
Quer dizer que, uma vez publicada a sentença, o juiz não
mais poderá modificá-la, salvo em erro material ou embargo. Os embargos são uma
modalidade de recurso dirigido ao próprio juiz. Interrompe o prazo da apelação.
A parte poderá mudar o fundamento do recurso e deixar de recorrer.
Mas, além dessas duas situações, há outras em que o juiz,
mesmo depois de publicar a sentença, poderá modificá-la. Uma delas é a
retratação. Em que casos? Do indeferimento da petição inicial, em que o juiz,
depois de feita a apelação, poderá se retratar.
Qual é a publicação que produz esses efeitos? Não é a no
Diário Oficial. Lá só vão as sentenças para intimação nas capitais de estado. A
publicação que impede a modificação pelo juiz ocorre quando o processo retorna
ao cartório ou a secretaria do juízo e se torna acessível às partes e qualquer
pessoa. Enquanto o processo estiver com o juiz, mesmo que já tenha assinado, ele
poderá reassinar quantas vezes quiser. Só quando mandar ao cartório que ela
será publicada, o que se chama publicação
em mão do escrivão.
A partir do momento em que a sentença se tornou pública, é
importante que haja um registro do recebimento do processo.
Qual a razão lógica disso? Enquanto as partes não sabem a
decisão, elas estão na expectativa. A partir do momento em que há uma decisão,
se fosse permitida essa alteração, as pressões cairiam sobre o juiz. É uma
proteção das próprias partes e também do juiz. A redação do art. 463 mudou. A
sentença hoje só marca o encerramento da fase de conhecimento em primeiro grau.
Quando terminar a fase de conhecimento, o processo retorna para a execução, o
chamado cumprimento de sentença.
Coisa julgada
Vamos somente começar o estudo da coisa julgada. Já sabemos
o que é: é a eficácia de imutabilidade da sentença. Art. 467: “Denomina-se coisa julgada material a
eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a
recurso ordinário ou extraordinário.” A coisa julgada formal, que é uma das
classificações, é uma espécie de preclusão. A coisa julgada material só é
produzida pela sentença de mérito, que contém a resolução do mérito. A sentença
terminativa, que extingue o processo sem resolução de mérito, produz apenas
coisa julgada formal. E, aqui, poderemos identificar a diferença fundamental
entre uma e outra: uma, formal, projeta seus efeitos para dentro do processo em
que foi proferida. Já a material produzirá seus efeitos para fora do processo,
ou seja, impede que outra ação sobre o mesmo assunto seja ajuizada.
A coisa julgada constitui garantia constitucional, bem como
o ato jurídico perfeito e do direito adquirido. São institutos que estão
associados à segurança jurídica. A coisa julgada é importante, pois, se a
finalidade do processo é a pacificação, é necessária a solução do litígio. Do
contrário, as discussões se eternizariam, e sempre haveria alguém insatisfeito,
que sempre teria um recurso à sua disposição. Os recursos são garantidos, mas
têm que ser limitados. Volte a ler o art. 467. Cessadas as possibilidades de
recurso, ocorre o trânsito em julgado.
Pode ocorrer o trânsito em julgado sem que a parte
interponha recurso. A sentença pode ser rescindida, o que não se confunde mais
com o propósito do recurso. A ação rescisória desconstitui a sentença, mas não
coloca uma nova solução em seu lugar. Um requisito da ação rescisória é a coisa
julgada.
Alcance subjetivo
Art. 472: “A sentença
faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem
prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem
sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados,
a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros.”
A coisa julgada só vincula as partes do processo. Nunca pode
alcançar outros. O responsável tributário, por exemplo, não está sendo
condenado, apenas está tendo contra si algumas repercussões. A sentença apenas
modula o efeito da norma legal naquele caso concreto. Se tivesse efeitos, seria
uma patente violação do devido processo legal, do contraditório e da ampla
defesa.