Direito Administrativo

segunda-feira, 14 de março de 2011

Continuidade do serviço público e princípios norteadores da Administração Pública

 

Começamos na aula passada falando sobre alguns princípios expressamente mencionados em nossa legislação, mas que têm uma importância fundamental do ponto de vista doutrinário, de tal forma que alguns autores se debruçam mais sobre eles. Há dois desses princípios que, segundo a doutrina, são a base de toda a construção do Direito Administrativo do Brasil: supremacia do interesse público sobre o particular e o da indisponibilidade dos bens públicos. Prevalecem inclusive sobre alguns direitos e garantias fundamentais do cidadão, garantidos pela Constituição, que decorre desse princípio que faz com que a Administração Pública tenha um regime de direito público estabelecendo a supremacia do interesse público sobre o privado.

A indisponibilidade dos bens públicos, outro princípio que aprendemos desde a primeira aula, dispõe que o patrimônio público, que é gerido por administradores públicos e constitui, por isso mesmo, um poder-dever de acordo com as suas atribuições de fazer a gestão desse patrimônio, seja administrado da maneira adequada.

Temos também o princípio da continuidade da prestação dos serviços públicos, o tema da aula de hoje. Não está disposto de forma taxativa no texto constitucional, mas sim de forma intrínseca.

Na Lei 8987/95, em seu art. 6º, há uma referência à expressão “continuidade dos serviços públicos” para que sejam considerados adequados:


Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

§ 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.

O princípio da continuidade dos serviços públicos, objeto de concessão ou permissão para que se exerça a atividade, prevê, em tese, que os serviços públicos não podem ser interrompidos já que a sociedade demanda tais serviços. Exemplo: militares. Há a proibição constitucional das Forças Armadas de sindicalizar-se e exercer o direito de greve, no art. 142, § 3º, inciso IV:

IV - ao militar são proibidas a sindicalização e a greve;

No caso dos trabalhadores regulados pelo regime da CLT, existe o direito de greve, previsto na Lei 7783/89. Também se aplica o direito de greve, garantido pela Constituição de 1988, aos trabalhadores celetistas de empresas públicas. Há também as greves levadas a cabo por servidores regidos pela Lei 8112/90, em que não se disciplina o direito de greve. No caso dos militares, temos a vedação da greve em caráter absoluto.

Por que isso tem acontecido apesar de não haver lei específica? Porque sindicatos impetraram mandado de injunção perante o Supremo Tribunal Federal, que passou a admitir, provisoriamente, o regime de greve das empresas privadas para as greves no serviço público ante à ausência de lei disciplinando a matéria constitucional, o que dificulta o exercício de um direito fundamental.

No tocante a alguns serviços públicos que são objeto de concessão ou permissão através dos particulares, a Lei 8987/95, no art. 6º, acima transcrito, contém a definição de serviço adequado: aquele que é prestado com regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas. A continuidade de serviços públicos objeto de concessão ou permissão nos termos da Lei 8987/95, § 1º do art. 6º é mencionada como um dos requisitos necessários para que se considerem serviços públicos adequados aos usuários. É um princípio implícito na Constituição, assim definido pela doutrina. No caso dos serviços públicos, a Lei 8987 estabelece que a continuidade da prestação de serviços será caracterizada pela sua não intervenção, salvo por motivos de caráter técnico; em outras palavras, não se admite interrupção na prestação dos serviços.

Outro assunto que não é muito ligado ao com o Direito Administrativo, mas que tem ligação com a continuidade da prestação de serviços públicos é o Direito Financeiro e Orçamentário, no que se refere ao atraso na publicação das leis de orçamento. São essas leis que autorizam o uso de despesas públicas. Para realizar licitação, por exemplo, é necessário justificar a existência de recursos. Se não existe lei de orçamento autorizando a realização de despesas por algum motivo, este poderá ser, na área federal, a não remessa do projeto de lei do orçamento do Poder Legislativo ao Executivo, por vários anos. Isso fazia com que, na ausência de leis de orçamento, nenhuma despesa pública pudesse ser realizada. Consequentemente, a prestação de serviços públicos estaria impossibilitada pela inexistência de leis de orçamento autorizativas da realização das despesas, daí ferindo a continuidade da prestação. Isso aconteceu, desde a Constituição de 1988, em vários anos, na área federal. Só em três anos é que esse fato não aconteceu. A Lei Orçamentária Anual, LOA, tem a função de autorizar a realização de despesa; se não existe lei que autoriza a gastar, nada pode ser comprado e nem se podem pagar os funcionários públicos por falta de autorização! Uma LOA publicada em 22 de fevereiro, por exemplo, causaria um conflito entre o princípio da continuidade dos serviços públicos e o da legalidade. O que fazer? Nenhum governante até hoje veio para dizer: “não temos o dinheiro do orçamento, então os funcionários públicos não poderão receber”. Mas é uma situação que envolve um risco, pois, sem lei autorizando a realização de despesas, todas as despesas realizadas nesse interregno seriam ilegais. E a culpa não é dos gestores, que depois terão suas contas apreciadas pelos órgãos do controle. Foi por uma falha do Poder Legislativo que, simplesmente, não cumpriu uma obrigação constitucional. E, na ausência de uma solução jurídica para o problema, algo teve que ser pensado para os dias atuais. Antigamente havia uma solução simples na Constituição de 1967, que era a promulgação pelo Executivo, como lei, do projeto enviado ao Congresso Nacional, medida essa que foi tida como autoritária e removida da Constituição de 1988.

Então, o que se fez na prática para evitar o problema decorrente da inexistência de lei de orçamento que fatalmente culminaria na quebra da continuidade da prestação dos serviços públicos? Foi editada outra lei de natureza orçamentária, mas que não é propriamente a lei de orçamento, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, a LDO: as prioridades do governo são apreciadas pelo Poder Legislativo. Começa a ser elaborada dia 15 de abril e, depois, o Congresso tem que restituir até o termino da primeira sessão legislativa ordinária. É uma lei importante porque define a política orçamentária do Brasil. Passou a instituir um dispositivo que hoje se denomina execução provisória do projeto de lei de orçamentária, prevendo que até 31 de dezembro, se o Presidente da República não sancionar o projeto de lei de orçamentária, as disposições poderão ser executadas provisoriamente na proporção de 1/12. É a execução provisória do projeto de lei do orçamento. É o único país do mundo que passou a permitir, por lei, uma execução provisória de um projeto de lei em discussão. Solução casuística e inusitada para resolver esse problema.

Do ponto de vista jurídico, não é saudável essa solução porque cria insegurança jurídica. Se a medida provisória já gera controvérsias na área tributária, imagine se virar moda a execução de normas de projetos de lei em discussão! E se for arquivado o projeto, no final das contas? E como ficam as despesas realizadas com base nessa autorização? Poderão ser objeto de emendas parlamentares que suprimam a despesas? Para isso não há solução.

É um fato que tem ocorrido na área federal que tem pertinência com a continuidade dos serviços públicos e lei de orçamento. Como a Administração Pública continuaria a funcionar dentro de um caráter de legalidade plena? Foi uma solução bem brasileira. Felizmente, nos dois últimos anos, o Congresso Nacional se sensibilizou mais pelo problema, e tem conseguido devolver os projetos de lei de orçamento para que possa ser publicada em tempo hábil a abranger o ano civil. A LOA vale de primeiro de janeiro de cada ano até 31 de dezembro daquele ano.

 

Princípios básicos da Administração: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência

Muitas vezes não se dá a devida importância aos princípios. No Direito Civil, na Lei de Introdução ao Código Civil (atualmente chamada de Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, com alteração pela Lei 12376/10), está previsto que, quando não houver lei, o juiz não poderá deixar de julgar. Terá que fazer a integração, usando a analogia, os costumes e os princípios gerais do Direito. Estes que passaram a constar da Constituição, numa ligação específica com o Estado Democrático de Direito e com os direitos e garantias fundamentais. É pela relevância desses princípios para o funcionamento da Administração. Sabemos que a norma é ou princípio ou regra; são a base de toda a ciência, as proposições que as orientam, e justificam a autonomia do Direito e de seus ramos. Há princípios jurídicos peculiares, inerentes a cada um desses ramos.

Vimos a classificação dos princípios de José Cretella Júnior, na qual estudamos que há alguns se aplicam a todo o Direito, ou a todas as ciências, ou a disciplinas delas, ou a assuntos dentro de disciplinas.

Os princípios básicos da Administração Pública têm vários nomes dados pela doutrina, colocados para a Administração Direta, Indireta e instituições mantidas pelo poder público. Há a famosa sigla chamada “LIMPE”, amplamente propagada em cursinhos preparatórios para concursos.

Vamos aos princípios de per si.

 

Legalidade

A legalidade possui um sentido amplo e um sentido restrito. O sentido restrito está no inciso II do art. 5º da Constituição da República:


Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; [...]

No direito público restringe-se a legalidade, e só se permite fazer o que lei permite. Por exemplo: nullum tributum sine praevia legem (não há tributo sem lei anterior que o defina). Assim como no Direito Penal, como na regra do art. 1º do Código Penal:

Art. 1º.  Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.

Os crimes no Direito Penal têm que ser tipificados, o que é legalidade em sentido estrito. Nesses dois campos do Direito, o princípio da legalidade é ainda mais restrito do que nas normas gerais de Direito Administrativo. Deve-se tipificar o crime e o tributo. Outra legalidade em sentido estrito na Constituição é o art. 70:

Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

Até a palavra “legalidade” está expressa nesse comando constitucional.

Outro aspecto da legalidade é a legalidade em sentido formal: a Administração Pública só pode fazer o que é estabelecido em lei, seja ela ordinária, complementar ou delegada. Lei em sentido formal é ato normativo estabelecido pelo Poder Legislativo ou por delegação do Poder Legislativo.

No Direito Administrativo existem várias disposições sobre a exigência de lei. São quase todas leis ordinárias. O texto constitucional exige lei complementar em matéria administrativa. Há uma única referência no art. 37 no que se refere à atuação das fundações a serem instituídas por lei, no que se refere à sua área de atuação. Essa área de atuação tem que ser regrada por lei complementar. Mas é curioso observar que algumas normas não são específicas de Administração, mas gerais. Nossa Constituição exige normas gerais de Direito Financeiro, normas gerais de Direito Tributário e normas gerais de Licitações e Contratos.

No Direito Financeiro e tributário, normas gerais só podem ser baixadas por lei complementar. No Direito Administrativo, normas gerais sobre licitações e contratos são baixadas por leis ordinárias. Essa facilidade de ser disciplinadas por lei ordinária faz com que haja maior flexibilidade para disciplinar as leis. A Lei 8666/93 já teve cerca de 50 modificações, especialmente no que tange à dispensa de licitação e licitação dispensada. Assim dá-se mais flexibilidade para a edição de normas administrativas. É mais difícil no Direito Financeiro e no Direito Tributário.

Leis delegadas são leis baixadas pelo Poder Executivo com autorização do Legislativo. São cerca de treze, onze das quais sobre normas administrativas. Diferente de Minas Gerais, em que o prestigio político do governador Aécio Neves permitiu-o editar 120. Importante observar que, por força do art. 68 da Constituição, veda-se a existência de lei delegada sobre matéria reservada à lei complementar, como também não pode haver medida provisória sobre matéria reservada à lei complementar.

Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.

§ 1º - Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre: [...]

Não se fala mais em princípio da legalidade, mas de juridicidade e da juridicidade administrativa. É uma ideia importada da Constituição Alemã. No Brasil isso não está no texto constitucional, mas tem sido aplicado pelo STF e também está presente na Lei 9784/99, no art. 2º. § 1º: atuação conforme a Lei e o Direito:

Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

I - atuação conforme a lei e o Direito; [...]

O princípio da legalidade em sentido estrito, sob o aspecto formal, manda que a Administração deve funcionar com base na lei, meramente nela. Mas essa não é mais nossa realidade. Aplica-se a alguns atos baixados pelo Legislativo, mas existem outros atos que obedecem ao princípio da juridicidade administrativa se vierem a ser aplicados de acordo com o que a Constituição estabelece sem a necessidade de lei.

Onde isso aparece dentro de forma expressa dentro dos pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal? Foi quando o Conselho Nacional de Justiça baixou a Resolução nº 7 de 2005 proibindo o nepotismo dentro do Poder Judiciário. Mandados de segurança foram impetrados questionando a legalidade. Carlos Ayres Britto disse: “juridicidade!” Legalidade formal, existência de lei em sentido formal, mas também a um conceito mais amplo, de juridicidade, que abrange o uso de princípios jurídicos e outros dispositivos normativos.

Nossa Constituição estabelece como sendo de competência do Conselho Nacional de Justiça (art. 103-B, § 4º, da Constituição):

§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;

Ou seja, é competência do CNJ: velar pela observância dos princípios fundamentais da Administração Pública. A finalidade do ato é a proibição da prática de nepotismo.

Veremos na Lei 8429/92 que constituem atos de improbidade administrativa a inobservância dos princípios de legalidade, de lealdade, de probidade.

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: [...]

Outra observação: também há outro ato normativo que pode ser baixado pelo Presidente da República, com base na Constituição, que são os decretos autônomos. Não são decretos regulamentando outras normas. Extinção de cargos e funções quando vagos, por exemplo, ou para disciplinar a organização e funcionamento da administração federal desde que não haja aumento de despesa e criação ou extinção de órgãos. Lembrando ainda que compete ao Presidente da República expedir decretos para a fiel execução das leis. O princípio da legalidade tem esse outro viés quanto aos atos normativos em sentido formal.

O que importa é o princípio da juridicidade administrativa. Não se precisa de lei apenas no aspecto formal, mas também de princípios e outros dispositivos, bem como mandamentos constitucionais que estabelecem atribuições. Não está na Constituição, mas na Lei do Processo Administrativo Federal (9784/99), que fixa seus critérios próprios.

A Lei 4320/64 é uma lei de Direito Financeiro que trata do controle dos atos de execução financeira e orçamentária com base no princípio da legalidade. Há também a Lei 4717/65, sobre a ação popular, permitindo a proteção popular do patrimônio público.

O art. 3º da Lei 8666/93, que já vimos, também é um exemplo de diploma legal em que temos menção ao princípio da legalidade:

Art. 3o A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.
 

Impessoalidade

O segundo princípio é a impessoalidade. Significa que os atos não podem revelar interesse ou conveniência para alguém. Há os atos discricionários da Administração Pública, e também os vinculados: a lei não deixa brecha para o administrador agir conforme seu próprio alvedrio.

É nos atos discricionários que vemos essa possibilidade: nepotismo, por exemplo. Designar para cargos de confiança pessoas que tenham laços de consanguinidade.

No que se refere à própria atuação do servidor, o que se exige é a prática do ato de acordo com o interesse público. O interesse é vago, indeterminado, impreciso, vezes explicito, vezes implícito na legislação. Sem a tipicidade, pode ocorrer o desvio de finalidade. Alguns autores falam em princípio da finalidade em contraste com o princípio da pessoalidade. Como mandar um inconveniente colega de trabalho para um estado distante. É um desvio de finalidade, que esbarra no princípio da impessoalidade.

A impessoalidade também é importante no que tange ao pagamento de precatórios judiciais. Os recursos têm que estar previstos nas leis de orçamento. Não pode haver nomes de pessoas na lei de orçamento. Não se pode colocar o nome dos beneficiários dos precatórios. É um aspecto da impessoalidade.

Além disso, já falamos sobre o art. 2º da Lei 9784:

Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.  [...]

O art. 37, § 1º da Carta da República contém uma regrinha importante sobre a publicidade de atos relacionados à realização de obras e serviços que não podem conter o nome de agentes ou pessoas com o objeto de promoção pessoal.

§ 1º - A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

Também as suspeições nos processos administrativos, em que não se pode atuar em processos de amigos ou familiares.

Observação: às vezes, em procedimentos de licitação, a administração, ou melhor, os servidores podem conjugar interesses particulares com interesses públicos, e há atos normativos pertinentes. Uma coisa é o julgamento objetivo das propostas, que reflete diretamente a impessoalidade. Tipo de licitação é maneira de fazer o julgamento. Técnica, preço, qualidade, etc. e, claro, a Resolução nº 7 de 2005 do CNJ, da qual já falamos antes.

 

Moralidade administrativa

Essa é uma questão conturbada. O que é moralidade administrativa? Foi elevada ao nível constitucional. No art. 5º, inciso LXXIII, temos também a possibilidade de alguém ingressar em juízo com a chamada ação popular levantando a questão da moralidade administrativa:

 LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;

Mas o que é essa moralidade administrativa? É um conceito também vago, impreciso. Tem a ver com os valores dentro de determinado momento, que ao longo do tempo simbolizam o que se pratica. A utilização de veículos oficiais por particulares, viagens pela FAB, carros oficiais transportando famílias, imóveis funcionais usados por primos de parlamentares... Isso foi se modificando. Moralidade administrativa é uma questão complicada de se saber o que é.

Quando se trata de nossa atuação, dizemos que a moralidade é a conduta externa das pessoas, o que também vai se modificando. Não havia divórcio, mas sim separação judicial, o que era malvisto pela sociedade. Alguns autores falam que a moralidade administrativa é a probidade, retidão, ética, legalidade, comportamento da Administração perante a sociedade, que se pauta por determinados valores. Se há presunção de legitimidade dos atos de administração que decorrem da supremacia do interesse público, entende-se que tais atos são moralmente aceitos pela sociedade. É uma questão a ser considerada; quem acha que a moralidade está ligada à probidade, isso terá a ver com a lei de improbidade administrativa, e referir-se-á, entre outras coisas, ao comportamento do Presidente da República.

A Lei 4320 trata do julgamento das contas do Presidente da República à luz da probidade administrativa. Não aconteceu ainda, mas está na lei.

Recentemente alguns autores passaram a fazer relação entre moralidade administrativa e a lei de improbidade administrativa no que se refere, indiretamente, ao art. 11 da Lei 8429, no que tange à probidade ao descumprimento aos princípios da Administração Pública: 

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

É um conceito relativo, motivo pelo qual alguns acham que não deveria ser incluído na Constituição porque são mutáveis.

Publicidade

Também é um princípio que deve ser visto com as devidas cautelas. Transparência é o conceito que logo emerge dessa discussão. Exemplo: Lei de Responsabilidade Fiscal, com a transparência da gestão, além de vários sites na Internet fiscalizando a aplicação dos recursos públicos. A concorrência, que é uma das principais modalidades de licitação, contém o convite, que é um ato “transparente”.

Já se buscou dar transparência quanto à exposição dos nomes dos servidores e quanto recebem. Os sindicatos se movimentaram contra. A Constituição assegura que a remuneração dos servidores tem que ser pública. Há relação de servidores e respectivos cargos, e, ao mesmo tempo, as remunerações de cada cargo, mas não uma relação nominal direta.

 

Eficiência

Não constava na redação original da Constituição, e foi introduzido pela Emenda Constitucional nº 19/1998. Não se trata dos serviços públicos, mas da Administração Pública como um todo. Podem ocorrer colisões entre eficiência e legalidade. O Decreto-lei 200/67 falava em instauração de processo administrativo contra servidor negligente ou desidioso. Não é uma ideia nova, portanto.

Na atual Constituição, no art. 70, temos um dispositivo tratando da fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta. Até os Tribunais de Contas passaram a atuar no controle operacional das contas. É evidente que o controle operacional é visto pelo lado administrativo, com a presteza, forma de agir do servidor e o que a sociedade observa na forma do funcionamento dos serviços.


Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Eficiência é minimização de custos, enquanto eficácia é atingir o resultado. Essa é a diferença.

Para a eficiência existem as ouvidorias, e também o terceiro setor, que são instituições de direito privado que passam a colaborar com o Estado, seja sob a forma de parceria, como organizações da sociedade civil por interesse público, organizações sociais, que celebram contratos de gestão com o poder público, além da própria terceirização.

Quando existe o conflito entre eficiência e legalidade, qual tem que prevalecer? Dentro da ótica jurídica, a legalidade, pelo imperativo da segurança jurídica, afinal estamos num Estado Democrático de Direito.