Direito Administrativo

terça-feira, 19 de abril de 2011

Conclusão da classificação e introdução aos elementos dos atos administrativos

 

Vamos concluir hoje a parte de classificação dos atos administrativos. Em seguida, vamos começar hoje mesmo os elementos e requisitos dos atos administrativos. Depois para atributos e extinção dos atos e fechamos a prova.

O professor está resumindo a matéria. Atos administrativos é uma parte muito extensa. Há muito na doutrina sobre o tema.

Vimos vários critérios de classificação dos atos administrativos. Atos normativos, enunciativos, atos negociais, e atos primitivos. Se guardarmos essas noções e espécies de atos administrativos, os outros critérios que começamos ontem serão muito mais fáceis de entender. Atos simples, compostos, complexos...

 

Classificação quanto aos efeitos

Alguns atos administrativos possuem efeitos apenas internos, ou seja, atingem somente os próprios órgãos ou seus agentes. Esses atos, como têm efeitos apenas internos, eles não geram, a princípio, direitos adquiridos, não são objeto de publicação oficial extensa, como as portarias ministeriais. Mas há certos tipos de atos de meio mais restrito, como os publicados em boletins de pessoal. Há um meio interno de se publicar, mas sem alcance tão intenso. Alguns só são levados a conhecimento dos interessados. Os atos de efeitos internos não necessitam de ampla publicidade porque não geram direitos adquiridos, e são simples comunicações, atos de expediente, como os memorandos circulares e os ofícios de autoridades administrativas para outras, que dispensam publicação.

Cuidado, porque isso não significa que são permitidos atos secretos, como os do Senado em 2009. Atos sigilosos são tornados públicos eventualmente. A Administração pode entender que necessitam sigilo determinados atos, como os relacionados à segurança.

As regras de publicidade podem ser diferenciadas para diferentes atos, como a abertura de licitação, que é amplamente divulgada. Os atos que produzem efeitos externos têm, em regra, publicidade mais ampla porque atingem direitos dos administrados. Por outro lado, notificação em matéria tributária, como a feita pela Secretaria da Receita Federal ao contribuinte quanto às suas pendências é um ato de publicidade bem mais restrita.

Observação: os registros sobre a vida funcional do servidor são registrados em apostilas, e os novos fatos são nela averbados.

Só a lei pode determinar que atos são sigilosos e restringir sua publicidade. A divulgação da remuneração de cada servidor público pode atingir a intimidade e a segurança pessoal de cada servidor.

Essa classificação tem essa importância no sentido de disciplinar os efeitos quanto ao alcance: órgãos e agentes somente, ou os administrados.

 

Classificação quanto às prerrogativas

É outra classificação que não é mais usada, mas ainda aparece esporadicamente. São os atos divididos em:

  1. Atos de império, que são os atos de autoridade ou atos baseados em poderes extroversos do Estado,
  2. Atos de gestão;
  3. Atos de expediente.

Essa divisão dos atos administrativos remonta ao período da criação dos Tribunais Administrativos no Direito Francês, momento em que se pensou na teoria da dupla personalidade do Estado. Uma personalidade atuando com prerrogativa de direito público, com base no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, e outros atos imperiais não de superioridade sobre o particular, mas baseando-se no princípio da indisponibilidade do interesse público, atuando como se fosse um particular, praticando atos sob a perspectiva ótica negocial.

A desapropriação de uma propriedade particular é um ato de império, e não decorre da manifestação de vontade do proprietário. Mesmo que seja um direito fundamental à propriedade, ela não é um direito absoluto. Ela pode desapropriar um bem particular com base em suas prerrogativas de direito público, insuscetíveis de serem responsabilizadas civilmente. A dupla personalidade é ter personalidade de direito público e de direito privado. Pode alugar e alienar bens para o particular, que são atos comerciais de direito privado.

Essa classificação dividia o Estado em dupla personalidade, nos atos de império, os atos de direito público, e os de gestão, de bens patrimoniais do Estado, que são atos de direito privado.

Consequência disso é a teoria da irresponsabilidade do Estado no que se refere aos atos de império, cujo corolário é a teoria da responsabilidade do Estado no que se refere aos atos de gestão. Remonta à França no período imperial e não tem mais aplicação no Direito Brasileiro. É uma reminiscência histórica que alguns colocam dentro da doutrina.

Recentemente autores têm falado em outros atos de gestão, que dizem respeito à atividade rotineira do Estado, de apoio, de andamento em matéria processual. É comum dizer: “hoje não haverá expediente” na Administração Pública. Não havendo, tudo paralisa. Atos de expediente, na verdade, são atos necessários ao funcionamento da Administração Pública relacionados principalmente às áreas de apoio e de andamento de processos. Cadastramento de processos, formação e distribuição são atos de mero expediente, assim como o protocolo de processos judiciais, todos esses atos desprovidos de caráter decisório.

 

Classificação quanto aos resultados

Outra classificação comum no Direito é a quanto aos resultados da prática do ato. Há os atos constitutivos e desconstitutivos, declaratórios e modificativos. É exatamente o conceito de ato administrativo: criação, modificação ou extinção de direitos. Ato administrativo constitutivo é o que cria nova situação jurídica, por exemplo, a nomeação de um servidor público para um cargo em comissão, ou expedição de um alvará de construção. Cria uma situação jurídica nova. O desconstitutivo é o contrário: se houver a exoneração ou demissão do servidor, ele desconstitui a situação jurídica anterior. É exatamente o oposto de constitutivos. Autores em geral só falam em atos constitutivos e declaratórios.

Os atos modificativos, já que os atos administrativos podem criar, modificar e declarar direitos, são aqueles que modificam uma situação anterior sem desconstituir o ato. Por exemplo, a mudança do funcionamento do horário de uma repartição pública, ou a mudança do local de uma reunião. Não extingue o ato. Modifica uma situação anterior, sem extingui-la.

Os atos declaratórios são os que evidenciam uma situação jurídica. Certidões, atestados, que declaram uma situação anteriormente existente.

O ato pode ser ao mesmo tempo constitutivo e declaratório. Exemplo: na área tributária isso é típico. Em matéria de administração tributária há o lançamento do tributo, que visa individualizar o sujeito passivo e sua obrigação tributária para que o Estado possa constituir em seu favor um crédito tributário. A obrigação é o débito, e o crédito é o direito subjetivo do Estado de exigir o cumprimento daquela obrigação sob a ótica do sujeito ativo. O procedimento do lançamento é matéria de administração tributária, um conjunto de atos administrativos vinculados e de realização obrigatória sob pena de responsabilidade funcional, porque o sujeito passivo tem o direito de saber qual sua obrigação e os elementos constitutivos do ato. Qual fato que gerou a obrigação, o montante da obrigação, o que ele deve, por que ele deve, e quanto. O lançamento é ato declaratório e constitutivo? Ou só um ou outro? Isso foi matéria de discussão durante muito tempo. É declaratório quanto à obrigação preexistente, mas constitutivo do crédito tributário. Portanto, temos um ato híbrido.

No Direito Administrativo mesmo não há muitos exemplos.

 

Classificação quanto à natureza do ato (Léon Duguit)

Outra classificação, que também remonta à França e não é mais utilizada na prática brasileira é a classificação de um civilista francês chamado Léon Duguit. Duguit foi um civilista e constitucionalista que estabeleceu uma classificação de atos jurídicos que alguns autores pretenderam, em princípio, transportar para o Direito Administrativo. Atos subjetivos, atos-condição e atos-regra. O ato-regra se assemelha aos atos gerais e abstratos que vimos na aula anterior: atos sem destinatário específico, mas baseiam-se em meras hipóteses de determinadas situações e podem ser modificados unilateralmente pela própria Administração. Decreto que estabeleça um regulamento, por exemplo.

Já o ato subjetivo é o que atinge situações particulares, individuais, e só podem ser modificadas pela concordância das partes. Um exemplo é o contrato, aplicado ao direito privado em geral. Prevalece a famosa máxima pacta sunt servanda. Isso impede o ato subjetivo à modificação do contrato de maneira unilateral. Mas essa discriminação do ato não pode ser aceita em Direito Administrativo, por causa das prerrogativas do poder público, em que o Estado pode, unilateralmente, rescindir os contratos administrativos. Claro que não poderá fazer isso arbitrariamente; deve haver motivação.

É uma ideia que veio do direito privado e tentaram importar para o Direito Administrativo. A doutrina então não aceita bem por causa das prerrogativas do Estado.

Por fim, os atos-condição são aqueles praticados com base nos chamados atos-regra (que são atos gerais e abstratos). Os atos-condição poderiam, mediante acordo entre as partes, ser objeto de alteração unilateral por parte de quem editou o ato. Exemplo: a nomeação do servidor público para um cargo de livre nomeação como a Constituição garante. O ato é unilateral do administrador, mas sua permissão para fazê-lo está prevista num outro dispositivo legal, como a Constituição ou qualquer outra espécie normativa. Seria possível modificar a situação independentemente da concordância da outra parte, como a exoneração ad nutum. O servidor em cargo de confiança pode ser exonerado a qualquer momento, sem justificativa.

Em matéria de Direito Financeiro, a classificação de Duguit teve aplicação. O que é uma lei de orçamento? É autorizativa ou impositiva? Essa pergunta fez aparecer, dentro da doutrina, um duplo conceito de lei: leis autorizativas e impositivas. Paul Laband, teórico alemão, apresentou a teoria do duplo conceito de lei.

A função da lei de orçamento é autorizar o governo a realizar despesa pública. Precisa haver um ato do Poder Legislativo que permita isso.

 

Classificação quanto à forma

Outra classificação que aparece também é quanto à forma do ato: implícito, explícito ou tácito. A forma é a lei que determinará. Os requisitos do ato administrativo estão em lei. Apresentamos, antes, a classificação dos atos administrativos quanto à espécie, quanto à forma ou exteriorização do ato. Em todos aqueles casos temos atos explícitos, decretos autônomos, decretos regulamentares, resoluções, deliberações... são todos escritos, então são explícitos.

Ao contrário do ato explícito, há a possibilidade de Administração Pública não se manifestar, mas ainda assim podermos dizer que um ato foi praticado. Neste caso, estamos falando de um ato tácito. Silêncio do Poder Executivo importa sanção tácita de lei promulgada pelo Congresso Nacional. Diante do silêncio da Administração Pública, primeiramente deve haver uma solução jurídica, prevista em lei, se isso tiver lesando direitos. Na Lei 9784/99 temos prazo decadencial de cinco anos para que a Administração se manifeste sobre atos que beneficiem o interessado, salvo comprovada má-fé. Não se manifestar nesse período sobre concessão de aposentadoria é motivo para recurso ao Supremo. Neste caso dependerá do tipo de ato quanto ao grau de liberdade de prática: atos vinculados geram um direito àquela situação. Se discricionário, o Poder Judiciário irá designar um prazo para o administrador se manifestar, mas o juiz não poderá decidir de imediato. Essas são as soluções dadas pela doutrina.

Há também o ato chamado implícito: não há manifestação da Administração expressa em um sentido, mas ela pratica atos que indicam que ela concordou com determinada situação. Exemplo: um servidor requer licença paternidade, e a administração não se manifestar em relação ao pedido, mas credita na conta dele o respectivo valor, mesmo enquanto ele esteve afastado. Todavia, em geral, os autores que falam sobre isso não dão exemplos. É melhor considerar somente os atos expressos e os tácitos. Os implícitos quase que se confundem com os tácitos.

 

Classificação quanto à formação

Por último, classificamos os atos quanto à formação. O ato pode ser nulo, anulável ou inexistente. O professor aproveitará essa classificação dos atos válidos para iniciar o próximo tema, que são os elementos dos atos administrativos. Alguns autores apontam cinco, outros seis, outros sete. Faz-se ao inverso do art. 2º da Lei 4717/65, que originariamente regulou a ação popular. Curioso é que a doutrina se apoiou no raciocínio inverso da lei que regula a ação popular e transportou para o Direito Administrativo.

Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de:

a) incompetência;

b) vício de forma;

c) ilegalidade do objeto;

d) inexistência dos motivos;

e) desvio de finalidade.

[...]

A norma começa com a redação: “são nulos os atos...” Daqui vem o conceito de nulidade. Então tiramos que são válidos os atos tomados no sentido inverso. Por exemplo, ao ler a alínea “a”, temos que é nulo o ato praticado por autoridade incompetente. Logo, tiramos que a competência da autoridade é um dos requisitos de validade do ato administrativo. Aqui estão os requisitos que a doutrina passou a interpretar numa concepção clássica, baseada nessa lei, que são a competência, que torna o ato nulo, além do vício de forma, ilegalidade do objeto, o conteúdo do ato, inexistência dos motivos, e desvio de finalidade. Viram a construção? Depois basta continuar a análise para os outros requisitos: já que a alínea “b” prevê que são nulos os atos eivados de vício de forma, tiramos que o segundo requisito de validade do ato administrativo é a inexistência de vício de forma. E assim sucessivamente.

O ato válido seria o ato que tem as conotações inversas. São os requisitos que preenchem todos os princípios de Administração Pública. Se não observados, o ato não se torna válido. Não é uma análise somente da legalidade, mas também juridicidade. É o sentido da interpretação moderna. É o ato que apresenta todas as características de atender ao princípio da juridicidade. Assim, ele observa também os princípios da Administração Pública.

A falta de um desses elementos, ou um vício significativo em qualquer um deles torna o ato invalido. É uma forma de invalidação do ato administrativo: faltar um dos elementos, ou haver vícios significativos em alguns desses cinco elementos. Se for o caso de vício de competência ou de forma, dependendo da magnitude do vício, o ato se torna anulável. Este é o ato com pequenos vícios de forma quanto à nulidade relativa, quanto à competência e quanto à forma. Pode ser convalidado pela Administração Pública. Aqui existem certas regras, mas não vamos entrar nelas agora.

Todo ato tem que ter uma causa. Não se praticam atos administrativos sem uma causa. Depois, vamos ver quem pratica, qual a forma, qual seu conteúdo e o que se pretende atingir. A finalidade está no outro extremo da causa. Na doutrina, alguns falam em sujeito, e outros falam em competência.

O objeto é o próprio conteúdo do ato.

E o motivo? Significa dizer que o ato tem que ser basear em pressupostos de fato e de direito. Tem que ocorrer a circunstância material e esta tem que estar prevista na lei para que haja, de forma válida, o apontamento do motivo. Se o motivo for inexistente ou ilegítimo, ou seja, em desacordo com a juridicidade, evidentemente haverá vício quanto ao motivo.

Existem pressupostos de fato e pressupostos jurídicos, que são os fios condutores pra que o ato possa ser considerado válido quanto ao motivo.

Daqui aparece a teoria dos motivos determinantes, que apontam os motivos indicados como o fundamento do ato. Ela se liga ao motivo do ato.

Se observarmos bem, quando qualquer Ministro de Estado se dirige ao Presidente da República para fazer qualquer proposição, ele apresenta uma exposição de motivos. Não há nenhum ato aprovado pelo Presidente da República, seja por decreto, seja por projeto de lei enviado ao Legislativo, que não levem essa exposição de motivos. É uma forma de ato administrativo de comunicação oficial entre Ministro e Presidente da República. “Mensagem”, por outro lado, é a forma de comunicação oficial entre o Presidente da República e o Poder Legislativo. Ministros se comunicam pelo ato ordinatório chamado aviso ministerial. São meios de comunicação.

Todo ato administrativo tem uma causa, que é um acontecimento material. Esse acontecimento tem que se enquadrar dentro da norma jurídica. Quando não se enquadra, por motivo inexistente ou por ilegitimidade decorrente do enquadramento, ele, evidentemente, não poderá ser válido.

O ato de punição de um servidor decorre do fato infração. Como será punido? A lei que dirá. Advertência, suspensão, demissão? Deve haver o enquadramento do ato infracional dentro da norma jurídica. Houve realmente a infração? A lei prevê os casos de punição. Observa-se a proporcionalidade e a razoabilidade.

Para finalizar, vamos à motivação.

Não está na causa do ato, mas na forma. A formalidade. A Lei 9784/99 deixa claro, nos arts. 50 e 51, que a motivação é a formalidade, a maneira pela qual se expressa aquele ato ou aquela decisão administrativa; aqui o termo motivação é mais usado em Direito Processual Administrativo.

O art. 93, inciso X da Constituição diz que as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas.

Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

[...]

X as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) [...]

Motivação está na essência, e consta da própria Constituição.

Lei 9784: indicação dos pressupostos de fato e de Direito que determinarem a decisão. No art. 50 temos:

CAPÍTULO XII

DA MOTIVAÇÃO

Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:

I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;

II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;

III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;

IV - dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;

V - decidam recursos administrativos;

VI - decorram de reexame de ofício;

VII - deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;

VIII - importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.

§ 1o A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.

§ 2o Na solução de vários assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos interessados.

§ 3o A motivação das decisões de órgãos colegiados e comissões ou de decisões orais constará da respectiva ata ou de termo escrito.

Aqui temos a motivação. Os atos administrativos deverão ser motivados com indicação dos fatos e argumentos jurídicos. O motivo não necessariamente é explicitado.

A motivação é a explicitação, a forma escrita dos fundamentos de fato e de direito que levaram à prática daquele ato. Não confundir com motivo. Motivação se refere à forma.