Direito Administrativo

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Licitação dispensada



Vamos continuar falando de outros casos em que a legislação permite que não seja realizada a licitação, em que a alienação pode ser feita diretamente.

Em relação à Lei 8666/93, que já sofreu várias modificações, tivemos uma ação direta de inconstitucionalidade que suspendeu a produção de efeitos jurídicos em caso de doação e permuta em virtude de ofensa ao princípio federativo, já que em nossa Constituição, desde 88, se atribuiu à União a expedição das normas gerais de licitações e contratos. É, entretanto, um conceito vago e abstrato e que somente o Judiciário pode determinar o que é “norma geral”. Dependendo da interpretação pode-se tirar do ente político a competência para legislar sobre as normas que regem a alienação de bens de seu patrimônio.

O que a legislação permite é a não realização do procedimento da licitação, mas não retira outras exigências, como justificar o porquê de não se estar licitando. Pressupostos de fato e de Direito, motivação dos atos administrativos, mesmo porque isso deve ser objeto de publicação e ratificação para que possa produzir os efeitos jurídicos decorrentes do ato que dispensa o procedimento licitatório. Em caso de bens imóveis, deve haver observância do interesse público, avaliação, autorização legislativa, mas não em todos os casos; enfim, tudo o que a legislação estabelece deve ser observado; exceto quanto à dispensa de licitar.

Vimos na aula passada que não só a Lei 8666, mas outras legislações também trazem disposições que afastam a necessidade do procedimento licitatório. Não veremos a legislação extravagante por causa do nosso tempo disponível até o fim do semestre. Vimos, então, que são três as situações em que não pode ocorrer a licitação, que é a contratação direta por parte da Administração Pública nos casos de inexigibilidade, que é a impossibilidade jurídica de haver competição, ou porque:

Outras hipóteses são de dispensa porque a lei assim estabelece, ou seja, porque a contratação pode ser feita de maneira direta em função de a lei permitir, incondicionalmente, independente de haver discricionariedade da Administração Pública, e a outra é a licitação dispensável, em que haverá discricionariedade da Administração. Na licitação dispensada a lei já estabelece a possibilidade de dispensar em função das hipóteses. A dispensável requer o uso da discricionariedade administrativa para se decidir se irá ou não haver licitação. Na dúvida, dever-se-á sempre licitar.

Os casos de licitação dispensada é uma parte relativamente complicada da lei porque o legislador faz uma mistura de conhecimentos que dizem respeito não somente ao regime jurídico da Administração Pública, mas também de institutos jurídicos do Direito Civil, e cria novos, os de alienação no Direito Administrativo, e trata também de certas situações relativas a bens no tocante ao seu uso, que vamos ver em Direito Administrativo II. Bens públicos, sua aquisição, alienação e uso, inclusive por parte de terceiros. Então, para quem depara à primeira vista com a lei, não podemos ver tudo, então o professor procurou condensar isto para a prova. Então, atenção ao esquema!

Essa primeira hipótese de licitação dispensada está no art. 17, incisos I e II, a lei também não dá ordenação sequencial dos casos em que não ocorrerá a licitação; começa com a licitação dispensada, depois vai para a licitação dispensável e por fim para a inexigibilidade. Aqui estamos fazendo o contrário: começamos com a inexigibilidade, licitação dispensada e depois licitação dispensável.

Os casos de licitação dispensada, no art. 17, são todas aquelas situações que tratam de alienação de bens, sejam esses bens móveis ou imóveis. E também é uma situação sensível, e todo cuidado devemos tomar porque já vimos que, em função do princípio da indisponibilidade do interesse público, o gestor de bens públicos gere um patrimônio que pertence à sociedade, e deve fazê-lo de maneira mais eficaz no sentido de preservação do interesse público. É importante observar que são casos em que a Administração Pública obterá recursos com a alienação de bens, ou não, conforme o tipo de alienação, como o caso da mera mutação patrimonial, ou de formas que o Estado utiliza para que o particular possa usar bens públicos.

Alienação, no Direito Civil, é algo restrito; envolve só venda, doação ou permuta. Em Direito Administrativo é mais complexo: envolve também investidura, venda, aforamento, locação, permissão de uso, concessão de direito real de uso, legitimidade de posse e concessão de título de propriedade e direito real de uso. Em Direito Financeiro é bem mais restrito, e só interessam as formas que resultem em dinheiro público, em receitas públicas. Em função do princípio da indisponibilidade do interesse público e da preservação do patrimônio público em função desse princípio, temos a Lei de Responsabilidade Fiscal, com um dispositivo interessante que diz respeito exatamente à preservação do patrimônio público no art. 44, mais especificamente quanto à possibilidade de alienação do patrimônio público para obtenção de dinheiro:

Art. 44. É vedada a aplicação da receita de capital derivada da alienação de bens e direitos que integram o patrimônio público para o financiamento de despesa corrente, salvo se destinada por lei aos regimes de previdência social, geral e próprio dos servidores públicos.

É assunto de Direito Financeiro que tem ligação com Direito Administrativo. Está no capítulo da gestão patrimonial, na preservação do patrimônio público.

O que o legislador quer dizer é que o patrimônio público pode ser transferido a terceiros através da venda de bens, sem falar em doação e permuta, pois essas não trazem dinheiro, nem dação em pagamento, de cumprimento de obrigações, que implicam até em saída patrimonial, mas do produto da alienação de bens que importem geração de receita para o Estado. Venda de bens significa uma redução nos ativos patrimoniais. Neste caso, deverá haver a utilização do dinheiro para compensar a perda. Não se pode usar com material de consumo, pagamento de pessoal, e outras despesas classificadas como correntes, pela Lei de Orçamentária, que são as necessárias para o funcionamento da máquina pública. Combustíveis, papéis impressos, remédios, etc. Ou seja: não se pode vender algo durável para comprar produtos não duráveis.

O objetivo do legislador com essa medida é preservar o patrimônio público. O Estado que obteve receita com venda de seu próprio patrimônio deve utilizá-lo com aquisição de capital. Compra de imóveis, por exemplo, ou terrenos, de bens imóveis de terceiros, que não acarretem um aumento de produção nacional mas aumentam a propriedade de bens do Estado.

É importante observar, preliminarmente, que a lei estabelece conceitos. Conceitos que são diferentes do Direito Civil, no que se refere à expressão “alienação de bens”: o que o legislador de Direito Administrativo quis dizer com alienação de bens? Podemos ter alienação de bens no sentido diferente daquele usado no Direito Civil, como também é diferente do Direito Financeiro em que só interessa a alienação de bens para gerar dinheiro. No art. 6º, inciso IV o legislador caracteriza o que seja alienação para essas finalidades de licitação, ao dizer que toda transferência do domínio de bens para terceiros:

Art. 6o  Para os fins desta Lei, considera-se:

I - Obra - toda construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação, realizada por execução direta ou indireta;

[...]

III - Compra - toda aquisição remunerada de bens para fornecimento de uma só vez ou parceladamente;

IV - Alienação - toda transferência de domínio de bens a terceiros; [...]

[...]

XI - Administração Pública - a administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas;

[...]

Esse art. 6º é importante porque a lei concentra vários conceitos: um deles é o de obra. O que é obra para esta finalidade? O que é Administração Pública? Estão respectivamente nos incisos I e XI. Há uma série de conceitos nesse art. 6º.

Esse conceito de Administração Pública é o conceito sob o aspecto subjetivo, que já vimos antes. Subjetivo ou formal que leva em conta as pessoas jurídicas que integram a Administração Direta com seus órgãos, e a Administração Indireta, em que o poder público mantém o controle acionário.

Note que o legislador não menciona os chamados fundos. No art. 1º, parágrafo único, temos:

Art. 1o  Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Parágrafo único.  Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Há uma pequena expressão chamada “fundos especiais”, e o legislador não colocou o fundo como ente de Administração Pública. Sob o aspecto administrativo, esses fundos não fazem parte da Administração Pública sob o aspecto de Direito Administrativo, mas sob o aspecto de Direito Financeiro e Orçamentário. Fundos especiais é um conceito de Direito Financeiro que significa que certas receitas do Estado, quando são previamente, por lei anterior, determinadas ao atendimento de certas finalidades, portanto receitas afetadas ou vinculadas, essa afetação ou destinação de produtos a essas finalidades faz com que isso só possa ser feito através da constituição de fundos especiais, que não são pessoas jurídicas nem pessoas administrativas, mas que nas leis de orçamento são equiparadas aos órgãos que integram a Administração Pública Direta ou Indireta conforme o caso.

Certamente o legislador tem razão quando não coloca os fundos especiais como integrantes do conceito subjetivo de Administração Pública, mas deixa meramente como um conceito orçamentário. ¹ Como os fundos não fazem parte da estrutura da Administração Pública o legislador não o colocou, mas determina que os fundos sigam as regras de licitações de acordo com as regras estabelecidas na lei, pois há movimentação de dinheiro público.

Esses dois conceitos são interessantes na medida em que se estipulam o que é alienação para a finalidade de licitação, bem como conceito de Administração Pública.

As hipóteses de alienação de bens, sejam eles imóveis ou móveis, são diferentes das que vimos no Direito Civil. Nalguns casos, se refere a essa transferência de domínio que o Direito Administrativo cria, que é o conceito de investidura, e outras formas que dizem respeito não propriamente à aquisição da propriedade, a partir da alienação dos bens, mas formas de uso de bens públicos que a legislação estabelece. Aforamento, por exemplo, é uma expressão usada quando a União transfere o domínio útil desses terrenos para um particular, mediante uma retribuição anual chamada foro ou aforamento. Pagamento do particular para se ter o domínio útil. Também é assunto de Direito Administrativo II. Espécies de bens públicos que são propriedade do Estado. Terrenos de Marinha, por exemplo, que são propriedade da União, que ela adquiriu em função da necessidade de proteger o território.

Também pode se dar a alienação por meio de locação, não graciosa, mediante contrato.

Permissão de uso é um ato unilateral pelo qual se transfere a particulares o uso de determinados bens públicos por determinadas razões de interesse coletivo. Também é matéria de Direito Administrativo II, que é diferente da concessão de direito real de uso. Em Administrativo II, as expressões permissão e concessão são utilizadas em dois aspectos: permissão e concessão de serviços públicos, em que não se dispensa licitação, exige-se contrato, mas aqui temos outras expressões que não a prestação de serviços públicos, relativas ao uso de bens públicos, que são chamadas de cessão de bens públicos, concessão de bens públicos, concessão de direito real de uso de bens públicos, e outras maneiras são a forma de autorização, que não está contemplada aqui. Fala-se em cessão de uso quando existe a transferência de bens entre pessoas jurídicas. Simplesmente a cessão do uso de bens certos e determinados entre órgãos que fazem parte do mesmo ente político. É um tipo de movimentação patrimonial pública que chamamos de intragovernamental, na mesma esfera de governo. A cessão de uso, na realidade, é uma forma de alienação de bens que ocorre apenas dentro da Administração Pública Direta dentro dos mesmos entes governamentais.

O termo concessão de uso, que é parecido com a locação do direito privado, é a concessão de forma não graciosa. O comodato é gratuito, e é a forma pela qual se permite a utilização do bem público de forma gratuita, o que ocorre também no Direito Civil. Mas no Direito Administrativo, além da locação e do comodato temos também a concessão de uso, que é um contrato assinado entre o poder público e o particular para o uso de um bem que é de domínio público do Estado.

A concessão de uso ocorre, por exemplo, no caso da instalação de boxes em mercados públicos, outra é de restaurantes em locais públicos, e até as sepulturas em cemitérios, que inclui um ato de concessão de uso, que pode envolver o uso de bens móveis ou bens imóveis conforme o caso.

A concessão de direito real de uso é uma forma contratual, mas relativa apenas a terrenos, e não envolve imóveis edificados nem bens móveis. Na concessão do direito real de uso a legislação estabelece uma forma de transferir o domínio útil do terreno público para particulares em função do processo industrialização, do desenvolvimento de programas habitacionais, ou outros de interesse social. Concessão de direito real de uso é somente para terrenos.

Há outras formas que lei prevê dentro desse conceito de alienação de bens imóveis.

No caso de bens móveis, a legislação só menciona doação, permuta e venda. Não há nenhuma novidade em relação ao Direito Civil. Faltou falar da investidura. Normalmente o conceito de investidura é pensado sob a ótica do exame dos servidores públicos, que também é um assunto de Direito Administrativo II, que corresponde ao ato de dar posse a alguém que passou em concurso público. Mas aqui temos outro conceito de investidura, em primeiro lugar no art. 17, § 3º, inciso II:

Art. 17.  A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:

[...]

§ 3o  Entende-se por investidura, para os fins desta lei:

I - a alienação aos proprietários de imóveis lindeiros de área remanescente ou resultante de obra pública, área esta que se tornar inaproveitável isoladamente, por preço nunca inferior ao da avaliação e desde que esse não ultrapasse a 50% (cinqüenta por cento) do valor constante da alínea "a" do inciso II do art. 23 desta lei;

II - a alienação, aos legítimos possuidores diretos ou, na falta destes, ao Poder Público, de imóveis para fins residenciais construídos em núcleos urbanos anexos a usinas hidrelétricas, desde que considerados dispensáveis na fase de operação dessas unidades e não integrem a categoria de bens reversíveis ao final da concessão.

Pode-se oferecer o pedaço que não sobrou do terreno para um particular, se ele quiser comprar. O pequeno pedaço decorrente da realização da obra, para que não fique ocioso, para poder usar. Normalmente não se faz na prática. O inciso I trata-se, na verdade, um pedaço de terra que não é de valor significativo, mas o Estado não irá oferecer ao particular sem avaliação.

Esse é um dos conceitos de investidura.

Outra situação é a referente à alienação de determinados imóveis, os anexos das usinas hidrelétricas, como no inciso II acima.

O poder público construiu residências perto (anexas) das hidrelétricas, e depois essas usinas começarão a operar e não terão mais utilidade para o poder público. Não integra a categoria de bens reversíveis ao final da concessão.

Bens reversíveis são aqueles que, uma vez encerrados o ato de concessão, retornam ao patrimônio público. Às vezes o concessionário passa, em função da concessão, a adquirir bens. Extinta a concessão, em que o que se delega é a execução do serviço e não a titularidade, o que a legislação diz é que, terminada a fase de concessão, os bens podem ser considerados reversíveis, retornando à titularidade do ente que concedeu ao serviço público.

Temos, portanto, conceitos diferentes daqueles que são utilizados pelo Direito Civil. Conceito de alienação é mais amplo aqui no Direito Administrativo. Envolve todas essas situações, inclusive a dação em pagamento.

Dação em pagamento é dar uma coisa diversa relativamente a uma obrigação anteriormente assumida, o que é diferente da permuta. Nesta, os bens em negociação costumam ter o mesmo valor. Em Direito Tributário, permuta necessariamente tem que ser igual.

Em linhas gerais é isso.

No caso de bens móveis, não há nenhuma diferenciação e nenhum conceito jurídico diferente do Direito Civil. Dação, doação, permuta e venda.

Mas, ainda que pesquisemos, temos o conceito de bens sob as óticas filosófica, econômica, jurídica e contábil.

Bem, para o homem, é aquilo que satisfaz. Quando esses valores materiais são tutelados pelo Direito, temos o conceito de bens em sentido jurídico. Em sentido econômico temos o objeto da atividade econômica, a produção de bens para atender à coletividade. Houve situações de carência, privação de bens na sociedade, até que o Estado arrogou a responsabilidade de certos bens. Daí veio o conceito de necessidade pública.

Temos o conceito de bens da Administração Pública. Bens da Administração Pública não necessariamente serão caracterizados como todos os bens dos entes que integram a Administração Pública, que são os bens do domínio nacional que pertencem às pessoas jurídicas de direito público: União, Estados, municípios, consórcios públicos, autarquias, fundações, Distrito Federal, os territórios, que hoje em dia são pessoas jurídicas de direito público. Esses bens do domínio nacional que pertencem à pessoa jurídica de direito público são bens da Administração Pública. Os demais são bens particulares ou privados. Bens das empresas estatais são bens privados. Isso tem consequências, como a autorização legislativa para a alienação de bens, que só é obrigatória para as pessoas jurídicas de direito público, e não para as pessoas jurídicas de direito privado. Tanto é que o art. 17 diz o seguinte:

Art. 17.  A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:

I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:

[...]

Bens privados, no caso, para efeito de autorização legislativa em relação à alienação, só se aplica às pessoas jurídicas de direito público, e não se aplica às entidades da Administração Pública, empresas estatais e suas subsidiárias, que são pessoas jurídicas de direito privado, então não há necessidade de autorização legislativa para alienação nessas hipóteses.

Lembrando, ainda, que dentro dos bens públicos, que pertencem às pessoas jurídicas de direito público temos os bens especiais: praças, ruas, rodovias, que às vezes deixam de ser de uso comum do povo para ser objeto de concessão, e o uso comum deve ser um uso normal. Quando houver passeatas ou eventos deve-se comunicar à autoridade administrativa competente. Certos bens não podem ser usados em determinadas situações, como o Eixão nos domingos e feriados.

E os bens chamados especiais são os destinados à prestação de serviços públicos ou ao funcionamento dos órgãos públicos. Nesses dois casos os bens são inalienáveis por força do próprio Código Civil. São bens afetados, que só podem ser objeto de alienação se forem desafetados, se lhes retirarem essa característica de serem bens de uso comum do povo. Certamente não são essas categorias de bens que a Lei 8666/93 disciplina. São apenas os chamados bens dominicais, aqueles em que os órgãos e as pessoas jurídicas de direito público detêm como proprietários de direito real e pessoal, e que não são bens afetados; não são destinados ao funcionamento da Administração Pública ou à prestação de serviços públicos. Evidentemente eles podem tornar-se afetados também. Pode lhes ser retirada ou conferida a qualidade de dominical. Em sentido inverso, os demais bens públicos, como os de uso especial, podem ser desafetados e alienados, mas é necessária autorização.

Essa observação que o professor faz é exatamente para frisar que o legislador está objetivando dispensar a licitação, no caso de bens públicos, os bens dominicais. Com relação a bens de entidades da Administração Indireta, que são pessoas jurídicas de direito privado, também busca-se dispensar a licitação dos bens que não estão sendo utilizados para o atendimento de suas finalidades essenciais.

Não estão aqui os bens de uso comum do povo nem os bens especiais.

É importante também observar que a lei não caracteriza o que são bens imóveis e bens móveis. Temos que buscar esse conceito no Direito Civil. Art. 79 ao 84 do Código Civil. São não somente bens, mas bens e direitos. A lei trata da possibilidade da venda de títulos e de ações em relação aos bens móveis.

As regras relativas à venda não são as da Lei 8666/93, mas as da legislação aplicada às espécies. Venda de títulos públicos no mercado financeiro envolve desde a Lei de Responsabilidade Fiscal até resoluções do Senado Federal que disciplinam a venda desses títulos. Venda de títulos é a maneira que o Estado tem para obter dinheiro quando não tem dinheiro em caixa para pagar contas. O Estado não tem cheque especial; esse é o recurso do governo.

A alienação de bens se dá, na Administração, em nível intra ou intergovernamental, seja sob a forma de dação em pagamento, de doação, de permuta ou de venda. Essas transações de alienações de bens em nível intergovernamental se dão entre esferas de governo distintas. Em nível intragovernamental a alienação de bens se dá dentro da mesma esfera de governo, da Administração Direta passando para o ente da Administração Indireta.

É importante observar que essa situação da dação em pagamento, que é uma forma de extinção das obrigações envolvendo uma prestação diversa da avençada, não é estranha por si mesma. Não se pode escolher livremente qual a melhor forma de alienação; se doação ou dação em pagamento inter ou intragovernamental. Deve-se confrontar e ver qual a melhor alternativa para o interesse público. Municípios que sejam devedores ao INSS: qual a melhor forma de pagar as dívidas: vender seus bens ou dar em pagamento bens que compõem seu patrimônio disponível? Deve-se fazer um estudo da melhor alternativa.

Em todas essas situações deverá haver assinatura de contrato.

Venda a outro órgão da Administração Pública em qualquer esfera de governo... os demais casos são de alienação para execução de programas de natureza social, programas habitacionais promovidos por órgãos da Administração Pública, ou de regularização fundiária, ou então de determinados imóveis rurais da União situados na Amazônia Legal.

Terras devolutas, bens de propriedade da União, que significam desocupadas, vagas, bens do domínio nacional que não tiveram uma destinação nem estadual, nem municipal, nem se incorporaram ao patrimônio particular de ninguém. Art. 20 da Constituição. Pode ocorrer a situação de legitimação de posse.

E também temos os bens móveis para fins de interesse social. que é um desses conceitos vagos e indeterminados em relação aos quais devemos tomar a devida cautela: qual o interesse social que está sendo atendido? A lei não fala absolutamente nada sobre eles.

Doação, por exemplo, só será permitida após a avaliação da finalidade e proveito dessa alienação. É importante observar também que na venda de bens por empresas estatais que atenda às suas finalidades específicas a licitação também é dispensada, como no caso da Petrobras, em que não se faz licitação quando o objeto é o próprio petróleo, que é o objeto da atividade fim da empresa. Embora a lei não fale também, instituições financeiras sociais não fazem licitação para concessão de crédito, já que é a própria atividade da instituição. A licitação é dispensada.  

Por outro lado, se o Banco do Brasil ou a Caixa quiserem fazer a alienação de um bem, essa alienação deverá seguir a Lei de Licitações e Contratos. Para a atividade administrativa dessas entidades há a obrigação de licitar ou não conforme o caso. O que não se exige é no caso de pessoas jurídicas de direito privado a autorização legislativa.

Amanhã: licitação dispensável, a parte mais extensa.


  1. Em seguida a esta frase o professor falou em uma destinação permitida para recursos dos fundos especiais, provavelmente bens de capital.