Direito Administrativo

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Princípios do Direito Administrativo

 

Aos que estão vindo à aula pela primeira vez, o professor recomenda que faça o download dos quatro documentos que ele colocou no espaço aluno. Até agora só 50% da turma fez download. É semana de carnaval, mas comecem a mostrar interesse!

Vamos para os princípios de Direito Administrativo. É um assunto que se revela de suma importância, mesmo que não desperte muitas paixões por ser uma questão mais filosófica do que propriamente jurídica. Definir princípios é tarefa da Filosofia, e não do Direito Administrativo. A Resolução nº 75 do Conselho Nacional de Justiça colocou Filosofia do Direito como disciplina obrigatória para a carreira da magistratura, então temos que nos acostumar desde já. Mas, em nossa vida pessoal, e em vários campos de ação humana, temos princípios. São conjuntos de proposições que estão na base de tudo, orientando as ações. Em geral, no campo da ciência, são as ideias que estão na base. No Direito Administrativo, os princípios são o que legitimam as normas.

Aqui também existe a importância da autonomia de um ramo do Direito. Não significa autonomia somente do ponto de vista científico que um ramo do Direito se separa de outros por ter normas próprias, mas também por possuir institutos jurídicos e normas próprias que não são encontrados em outros ramos do Direito. Não é somente na acepção do termo, em sua origem etimológica que devemos separar os campos do Direito. E nem por razões legislativas, apesar de serem um norte: na Constituição temos a competência privativa e concorrente de cada ente federativo. Comentamos também que a Constituição não usa a expressão Direito Administrativo.

Há autores que separam o Direito Administrativo do Financeiro e do Tributário, enquanto outros tratam como subdivisões.

Vimos alguns conceitos de Direito Administrativo, e também vimos que alguns autores nacionais, como Hely Lopes de Meirelles e José Cretella Júnior tratam o Direito Administrativo como um conjunto de princípios. Ramo do direito público que estabelece princípios de funcionamento dos órgãos públicos em geral para atingir as finalidades do Estado.

Importante observar que não temos uma codificação do Direito Administrativo brasileiro. Não tem como, e isso dá ampla liberdade para cada ente da Federação legislar sobre Direito Administrativo, no exercício de sua função administrativa, independente da codificação própria. Não há um Código Administrativo. Não há Código também no Direito Previdenciário e no Financeiro. Fazem-se, de vez em quando, alguns estatutos, como é o da Criança e do Adolescente. E mesmo a diferença entre Código e Estatuto não é tão clara. É o legislador que define.

Isso faz com que a existência de princípios oriente a Administração Pública, em todos os entes federativos, o legislador e até os Tribunais, no exercício das funções jurisdicionais. Há, por exemplo, o princípio da legalidade. Quando o CNJ editou uma resolução proibindo a prática do nepotismo no Judiciário, surgiram ações, até de juízes, entendendo que a resolução era inconstitucional, pois não havia lei, e tal resolução era atentatória da legalidade, e ninguém seria obrigado a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei (Constituição, art. 5º, inciso II.) Muito embora fosse a moralidade o que estivesse subjacente à Resolução. Foi necessário, então, que houvesse uma declaração de constitucionalidade para dar respaldo jurídico. O Mininstro do STF Carlos Ayres Britto disse que a legalidade está mais ampla agora, englobando a juridicidade, com observância a princípios a serem observados por alguns órgãos, tais como o CNJ e o CNMP. Além, é claro, dos princípios norteadores da Administração Pública, no caput do art. 37 da Lei Maior: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. São princípios que orientam a conduta do legislador e também do Poder Judiciário.

 

Classificação dos princípios

Esses princípios estão na lei, na doutrina e são também fixados pela jurisprudência. José Cretella Júnior dá uma classificação de princípios que se aplicam a todas as ciências, outros que se aplicam a somente a algumas delas, e a algumas disciplinas de determinadas ciências. No Direito Administrativo, o professor ainda diria que há princípios aplicáveis a assuntos particulares de uma disciplina.

O autor chama, então, de...

Mais um desdobramento seriam os princípios subsetoriais. Há princípios específicos aplicáveis ao Direito Administrativo dentro dele. É o caso dos princípios que regem as licitações. Existem dois que são específicos de legislação dentro do próprio Direito Administrativo, como a vinculação ao instrumento convocatório (edital) e também o julgamento objetivo das propostas. Mais um exemplo de princípio seccional, como também são chamados esses princípios, estão no art. 3º da Lei 8.666/93: 


Art. 3º.  A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

Repetem-se alguns princípios mais amplos de todo o direito público mas que têm um viés próprio no Direito Administrativo. Na Lei 9784/99, que institui o processo administrativo na Administração Pública Federal, ocorre o mesmo: o art. 2º do referido diploma legal começa elencando uma série de princípios que já existem no Direito Administrativo, mas alguns deles são princípios do processo administrativo em si:


Art. 2º.   A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Essa pluralidade, de acordo com Cretella Júnior, mostra que é difícil haver unanimidade na doutrina.

Há ainda outros autores que dividem os princípios em mandamentais ou imperativos e complementares, segundo constem da legislação ou não. Os mandamentais são os que constam na legislação, e são de observância obrigatória. Os complementares são os recomendados pela doutrina ou são utilizados, às vezes, pela jurisprudência com base na própria doutrina. É importante observar que o Direito Administrativo brasileiro teve uma evolução histórica bastante longa, desde 1852, e o professor diria que, talvez excluindo apenas o princípio da legalidade, os demais nunca tiveram uma expressão traduzida dentro da legislação brasileira. Isso ocorre mais desde a Constituição de 1988, conforme vamos demonstrar aqui. Mas temos princípios usados somente pela doutrina, claro. Um grande exemplo é o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, e também da indisponibilidade do interesse público. A importância deles é mais bem colocada pela doutrina.

O professor vai além: os próprios princípios que estão na legislação evoluíram com o tempo. Vide a legalidade: agora chama juridicidade. A interpretação de alguns deles tem variado ao longo do tempo. São princípios que carecem de interpretação sistemática da doutrina a respeito de sua aplicação dentro da realidade.

O que o professor quer que vejamos, neste preâmbulo, é a importância desses princípios na Administração. Também teremos a aplicação de parte desses princípios mais especificamente em matéria tributária.

Normalmente, a doutrina, no Direito Administrativo brasileiro, começa discorrendo sobre os princípios constitucionais, que estão no art. 37 de nossa Constituição. O marco referencial ao termo “princípio” dentro do Direito Administrativo encontra-se na Lei 4320/64, baixada sob a vigência da Constituição de 1946, que foi a primeira Constituição brasileira que estabeleceu competência à União para legislar sobre normas de Direito Financeiro. Mais especificamente, o capítulo que trata sob despesas públicas introduziu, lá no art. 70, a expressão “princípio da concorrência”, ao determinar o seguinte: 


Art. 70.  A aquisição de material, o fornecimento e a adjudicação de obras e serviços serão regulados em lei, respeitado o princípio da concorrência.

A inspiração veio de uma norma de 1922 que disciplinava a competição entre concorrentes para a realização de obras públicas. Isso virou um princípio. Hoje, o termo ‘licitação’ é o meio pelo qual outro princípio constitucional deve ser observado, que é o princípio da isonomia, que deve ser observado pela própria Administração Pública; alguns autores dizem que é um princípio, outros que é um processo, constituído de vários atos administrativos. Para que o Estado adquira de terceiro bens e serviços para realizar suas funções, deve ser observada a competitividade para que ele receba a melhor proposta, para que atenda ao interesse público. A concorrência, por isso, foi considerada posteriormente como um princípio a ser observado pela Administração Pública para realizar despesas como a aquisição de material, prestação de serviços e adjudicação de obras públicas – a entrega ao vencedor do certame, na época chamada de concorrência.

Em 1967, surge o Decreto-lei nº 200 de 25 de fevereiro, que estabeleceu, no Título II, princípios fundamentais:

TÍTULO II

DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

Art. 6º As atividades da Administração Federal obedecerão aos seguintes princípios fundamentais:

I – Planejamento.

II – Coordenação.

III – Descentralização.

IV – Delegação de Competência.

V – Contrôle.

Esse decreto-lei tem uma fundamentação jurídica curiosa: nessa época, já havia sido outorgada a Constituição de 1967:

Art. 189.  Esta Constituição será promulgada, simultaneamente, pelas Mesas das Casas do Congresso Nacional e entrará em vigor no dia 15 de março de 1967.

Brasília, 24 de janeiro de 1967; 146º da Independência e 79º da República.

Como é que poderia um decreto-lei, já que a Constituição que o fundamenta só entraria em vigor em março, foi editado? O que permitiu foi a edição dos atos de exceção, no caso, o Ato Institucional nº 4. Não existia essa espécie normativa na Constituição de 1946, que só começou na de 1967. Não se poderia baixar um decreto-lei sem fundamentação constitucional. Viram qual é o fundamento jurídico desse decreto?

Pois bem. Nele, há os princípios da Administração Pública. Pretendia-se promover uma ampla reforma administrativa dentro da Administração Pública Federal. O Governo Federal passou a estabelecer esses princípios, chamados fundamentais. E a legislação não está revogada! A doutrina brasileira do Direito Administrativo é praticamente omissa a respeito desses princípios; não faz referência a eles. Talvez porque estejam mais preocupados com o funcionamento dos princípios, e não com sua fundamentação. Na época, buscava-se um funcionamento mais eficiente da Administração. Esse decreto-lei foi muito importante, além disso, pois instituiu o termo “licitação”. Concorrência passou a ser um tipo de licitação. Surgiram também as “pessoas jurídicas administrativas” com esse decreto. Tudo buscava, essencialmente, melhorar o funcionamento da Administração. É a norma que rege esse funcionamento até hoje.

Vamos aos princípios.

 

Planejamento

Por que se estabeleceu que a Administração Pública deveria observar um planejamento? Para começar, o planejamento não está contido em nenhum diploma legal de Direito Administrativo. É um processo percorrido pela Administração Pública em etapas, que vão desde o diagnóstico de uma situação presente, até o prognóstico do que se deverá fazer no futuro. Assim como fazem os médicos.

Também há o termo “sistema”, usado muito do Direito Administrativo. Conjunto de partes que são consideradas sob a égide de determinados princípios. O Sistema Tributário Nacional é um conjunto de tributos praticados em nossa Administração orientados por uma série de princípios. Temos também sistemas de planejamento dentro da área Federal e Estadual. Tanto que se criou o Ministério do Planejamento, um órgão para realizar essa função. A partir daí, todos os ministérios passaram a ter secretarias de planejamento, como uma forma de se ter um sistema de planejamento dentro da área federal.

O planejamento, no que se refere ao prognóstico, tem instrumentos para alcançá-lo. São os chamados instrumentos de planejamento. Às vezes se confunde a elaboração de um plano como sendo a conclusão de um processo de planejamento. Note o encaminhamento do plano de governo no início do mandato. É apenas um instrumento do processo de planejamento, que será pensado, avaliado, aprovado e filtrado por um processo de feedback. No Brasil se fez confusão há muito tempo sobre o que é “plano de governo”. Daí havia os planos empíricos e a segunda fase, a fase em que se usava a racionalidade. Os planos empíricos eram elaborados para ganhar eleições. Diferencia-se, portanto, o plano de campanha do plano de governo.

Um famoso foi o plano de metas de Juscelino, com 30 metas em cinco anos. Brasília foi a última meta a ser implementada. Não se imaginava como se pudesse transferir a capital do Rio de Janeiro para o Centro-Oeste, que nada tinha! Um estudo da FGV estimou em 500 bilhões de reais a construção de Brasília, tomando-se o volume de gastos da época e tentando mensurá-lo em quantitativos atuais. É uma grosseira estimativa, mas é um começo. E os apartamentos para os funcionários públicos morarem aqui! Como a União, sozinha, não tinha dinheiro para a construção dos imóveis funcionais, o Presidente JK estabeleceu que cada funcionário contribuiria para um instituto de previdência. Exemplo: instituto de aposentadoria dos ferroviários, e assim sucessivamente. A Asa Sul e um pouco da Asa Norte foram construídos por esses institutos de aposentadoria, que desviaram a finalidade de prever a aposentadoria dos funcionários para a construção. A situação ficou insustentável.

Humberto Castello Branco mandou vender os apartamentos funcionais e unificou o sistema de previdência social, o antigo INPS, hoje INSS. Acabou com os institutos de previdência privada.

Não havia controle na construção de Brasília, daí JK respondeu a vários inquéritos durante os governos futuros, do tempo militar. Os militares tinham um propósito maior de desenvolvimento nacional e segurança.

Veja o Decreto-lei 200, em seu art. 7º:

Art. 7º.  A ação governamental obedecerá a planejamento que vise a promover o desenvolvimento econômico-social do País e a segurança nacional, norteando-se segundo planos e programas elaborados, na forma do Título III, e compreenderá a elaboração e atualização dos seguintes instrumentos básicos:

a) plano geral de govêrno;
b) programas gerais, setoriais e regionais, de duração plurianual;
c) orçamento-programa anual;
d) programação financeira de desembôlso.

Veja a expressão “instrumentos básicos”. ¹ Estabeleceram-se instrumentos de planejamento com dois propósitos fundamentais: segurança nacional e desenvolvimento econômico e social do país. Por isso que, depois, passaram a existir os planos nacionais de desenvolvimento econômico e social. Deixaram de ser criados com a Constituição de 1988.

Hoje se fala em estratégias de governo, de programas de governo. A Filosofia de planejamento é típica de países totalitários, como a União Soviética de outrora. Nos Estados Unidos, por exemplo, não existe planejamento centralizado. Normas de regulação econômica da União sancionadas por Obama não foram seguidas em vários estados. Não se pode estabelecer um plano e querer que todos os entes sigam num país democrático, até por causa do pacto federativo e autonomia das pessoas políticas.

A Constituição de 1988, no art. 165, passou a conter alguns “planejamentos”: PPAs, os planos plurianuais, chamados por FHC e Lula de diferentes nomes. 


Seção II
DOS ORÇAMENTOS

        Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:

        I - o plano plurianual;

        II - as diretrizes orçamentárias;

        III - os orçamentos anuais.

        [...]

Plano da Administração Pública de médio prazo, elaborado dentro da observância do Estado Democrático de Direito organizado sob a forma de Estado Federado. Os estados também têm que elaborar seus PPAs. Os investimentos de médio prazo só podem ser realizados se estiverem no plano, sob pena de crime de responsabilidade. No passado resolviam criar novas obras, se possível desativando obras dos antecessores. Coisa típica de países subdesenvolvidos, uma descontinuidade. Esses planos não coincidem com o mandato dos governantes. Antigamente as duas coisas eram coincidentes. Hoje entram em vigor no segundo ano de mandato e vão até o primeiro ano do sucessor. Isso para evitar o efeito descontinuidade. O novo governante terá oito meses para elaborar novo plano. O governante não pode iniciar novos investimentos sem lei que autorize a inclusão no plano.

O segundo instrumento é a Lei de Diretrizes Orçamentárias, contendo orientações orçamentárias. São fundamentais para o estabelecimento das chamadas políticas públicas. São anuais. A LDO para 2012 começa a ser elaborada em 2011. Mas sua vigência não é exatamente anual; ultrapassa um pouco.

As leis periódicas que têm vigência anual mesmo são as LOAs, as Leis Orçamentárias Anuais. Acabam em 31 de dezembro de cada ano.

Quando falamos em planejamento empírico e científico no Brasil, isso se trata de planos feitos pelo governo sem viabilidade orçamentária. Planos viáveis e racionais, que possam ser implementados, dependem de orçamento. Do contrário corre-se o risco de se perder o plano.

Há um artigo na Lei de Licitações e Contratos que manda que não se realizem licitações sem previsão orçamentária.

Art. 7º  [...] § 2º  As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando: [...]

II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os seus custos unitários; [...]

Importante observar que o planejamento é normativo para o setor público, e indicativo para o privado. Veja o art. 174 da Constituição:

Art. 174.  Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

O plano é aprovado por lei. Do contrário, responde o administrador por crime de responsabilidade. As tipificações de crimes de responsabilidade não avançaram na regulamentação por falta de interesse da classe política.
 

Princípio da coordenação

É o segundo princípio. O Governo de 1967 criou o Ministério do Planejamento e Coordenação Geral. A ideia é planejar e colocar em ordem, fiscalizar logo em seguida. Alguns até colocam coordenação como sinônimo de planejamento. Criavam-se departamentos também. Aqui no CEUB havia, antes, o departamento de direito público, de direito privado e direito processual. Hoje não existe mais, mas ainda há coisa semelhante na UnB.
 

Descentralização

É o segundo princípio. Descentralizar significa, como você está imaginando, “tirar do centro”. Hoje em dia existe uma diferença no Direito Administrativo entre descentralizar e desconcentrar. Na realidade, quando se falava em descentralização, via-se a descentralização de certos serviços mediante convênio ou contrato de concessão para a iniciativa privada. Daí criaram-se as entidades de Administração Indireta. Retira do núcleo do poder certas atividades, criando outras pessoas jurídicas, para atuar na periferia do poder. São as autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista. A descentralização passou a significar exatamente isso: processo pelo qual a Administração Pública retira do ente político determinada atribuição, para dar mais flexibilidade de ação, autonomia administrativa e financeira, criando outras pessoas jurídicas ao lado do Estado, como as autarquias, pessoas jurídicas de direito público, e as de direito privado, como as sociedades de economia mista e empresas publicas.

Desconcentração é outro conceito: não se cria uma nova pessoa jurídica; esse "afastamento do centro" ocorre dentro da mesma. Pode ser dentro da Administração Pública Direta ou Indireta. Passou a ser um procedimento pelo qual, com base na hierarquia, os órgãos foram distribuídos dentro da Administração Pública Direta ou Indireta. Por exemplo: já que o Presidente da República não faz tudo sozinho, criaram-se então os Ministérios e Secretarias. Esse processo todo é a desconcentração. Na desconcentração, vige a autotutela.
 

Delegação de competência

O que é a competência? Veremos que é o conjunto de atribuições conferidas pelo direito positivo às pessoas jurídicas, aos órgãos e agentes dentro da Administração Pública. É fundamental essa noção porque na prática, a validade de qualquer ato administrativo depende da competência. Se no direito privado a validade da prática depende da capacidade, aqui no Direito Administrativo é fundamental a verificação da competência para a prática do ato, sob pena de nulidade. 

As empresas públicas e sociedades de economia mista também têm, internamente, a desconcentração. Há gerências e setores, cada um com sua competência. A desconcentração não é típica só da Administração Pública Direta, mas também da Indireta.

Esse conjunto de atribuições fixado pelo direito positivo começa na Constituição e vincula os entes federativos, nos diferentes poderes. Conselho de Defesa, Conselho da República, Senado Federal, Poder Judiciário, etc. Por isso se criam os regimentos internos.

Delegação de competência: a palavra "delegação" tem dois sentidos: o sentido corriqueiro/coloquial, que é uma comissão ou representação, enviada a determinados eventos. Delegação esportiva, por exemplo. Se no Direito Civil temos a procuração ou mandato para que outros pratiquem atos em nosso nome, no Direito Administrativo não existe isso. Os titulares dos órgãos podem transferir suas atribuições para outros órgãos, desde que haja outros e previsão legal, mesmo sem subordinação hierárquica. Atividades do Presidente da República podem ser delegadas para os Ministros. O contrário da delegação de competência chama-se avocação. Vamos ver no futuro.

Hoje, na área federal, o que regula o assunto é a Lei 9784/99, em seu art. 11.

Art. 11.  A competência é irrenunciável e se exerce pelos órgãos administrativos a que foi atribuída como própria, salvo os casos de delegação e avocação legalmente admitidos.

A delegação pode ser realizada em alguns casos, mas não em outros. Exemplo: competência exclusiva/privativa. Quando se trata de ato normativo, também não se fala em delegação.

A delegação de competência é um instrumento que também tem centralização. É uma forma de colocar a Administração Pública mais perto dos administrados. A concentração é o contrário: as coisas são centralizadas nas autoridades superiores. Para a Administração funcionar melhor, usa-se a delegação de competência.

Há o caso da fiscalização dos órgãos de trânsito no exercício do poder de polícia sobre a circulação de veículos. Os que estiverem sem IPVA pago terão o veículo recolhido. Fiscalização de trânsito é diferente de fiscalização tributária. Quem deveria promover esta seria a Secretaria de Fazenda do Distrito Federal, e não o Detran. Mas admite-se a delegação até por convênio. Na verdade, não é tarefa de órgãos fiscalizadores punir o contribuinte sem que lhe seja dado o direito de recorrer em processo administrativo. É um resquício do período autoritário. Ninguém reclama disso, infelizmente. Por que só se pode transferir o veículo depois de pago o IPVA? A pessoa poderia não ter o dinheiro na época! São algumas truculências que acontecem, mas que resultam dessa delegação.
 

Controle

O controle dos atos da Administração Pública hoje em dia é muito mais vasto. O controle do Decreto 200 é o controle hierárquico, dos subordinados. Esse assunto de controle, que não faz parte do Direito Administrativo I, é bastante amplo, e há uma unidade própria só para tratar disso. Temos o controle legislativo, político e financeiro, e também o administrativo, realizado pela própria Administração, chamado tutela ou autotutela, aquela sob supervisão, esta sem supervisão.

Há o controle político-financeiro, o controle jurisdicional, ações civis públicas, a ação popular, além de outros instrumentos como as ouvidorias.

Esse é um panorama geral dos princípios fundamentais que estão no decreto-lei 200/67.


  1. Neste momento o professor disse “o que não estiver nos apontamentos não será cobrado”.