Vamos retomar o tema da filiação,
ressaltando que a ação de
reconhecimento de paternidade é proposta pelo pai para reconhecer o
filho e,
dentro daquele contexto do art. 1614, a filiação e o reconhecimento
exigem o
consentimento do filho, se maior, ou, se menor, terá 4 anos após
atingir a maioridade
ou a emancipação para impugnar o reconhecimento.
Sabemos também que a ação à
disposição do marido para
impugnar a filiação de criança havida de sua esposa é a ação
negatória de paternidade. Se a mulher não é sua esposa, a
ação
cabível é de impugnação de paternidade.
Por fim, a ação do filho para declarar um indivíduo seu pai é a ação de
investigação de paternidade, cabível contra o suposto pai ou seus
herdeiros.
Provas na
investigação de paternidade
No processo e na prática, o mais
importante é comprovar,
demonstrar a filiação. Às vezes temos algumas maneiras, formas de
comprovar que
determinado sujeito não é o pai de uma criança. Como já dito, há a ação
de impugnação
ou a negatória para provar que alguém não é o pai da criança.
Algumas provas dizem respeito ao
comportamento dos cônjuges.
Exemplo: a pessoa a que está sendo imputada a condição de pai demonstra
que, na
época da concepção, estava viajando, e, por isso, não teve
possibilidade de
contato físico com a mulher que o aponta. Não. É uma prova importante.
Ou,
então, pode também demonstrar de forma clinica que, à época em que a
mulher
estava no período fértil o homem estava com impotência generandi,
incapaz de gerar prole, e não poderia ter aquela
criança.
Temos, também, a demonstração de que
a mulher, na época em
que teve a concepção, era uma pessoa de relacionamentos múltiplos, e
que,
portanto, ela tinha a possibilidade de vários possíveis pais para
aquela
criança.
Ou ainda a existência de algum
escrito, documento, que também
é importante. Tudo pode entrar para o convencimento do juiz.
Em relação à questão das relações
múltiplas ficou famoso em
Brasília, há muitos anos, um caso em que o sujeito foi a “certo bar ali
na 9”, no
tempo em que era frequentado só por héteros. O cidadão tinha a mania de
levar,
no bolso, uma fotografia de uma mulher atraente em poses sensuais de
biquíni, e
ele sentava nas mesas com as pessoas e tirava a foto do bolso para
exibi-la e esnobar,
dizendo “olhem a mulher que eu estou pegando!” Isso chamou atenção das
pessoas
em volta, que reconheceram a mulher. Outro lhe disse: “eu também já saí
com
essa mulher...” e mais outros, provavelmente até um garçom. De cada
homem que
dizia “eu também”, o esperto anotava no verso da fotografia os nomes,
telefones
e endereços das pessoas. Claro que ele usou como testemunhas para
comprovar que
a mulher era de múltiplos relacionamentos.
São provas que podem ocorrer! Mas há
outros tipos de provas
que são levados mais em consideração pelo nosso ordenamento jurídico.
Começa, claro, com a prova
testemunhal. Ainda que tenha valor, os juízes fazem ressalvas
com relação à
prova testemunhal na medida em que a matéria de reconhecimento ou
investigação
de paternidade leva muita polêmica e emoção. Também pela qualidade das
pessoas
que geralmente são invocadas a testemunhar, que podem ter proximidade
com uma
das partes. ¹
Há também o exame
prosopográfico. Prosopografia
é “descrição das
feições do rosto”. Sabemos que a célula humana tem 46 cromossomos,
sendo 23 da
mãe e 23 do pai. Isso significa que os filhos sempre têm alguma
característica
de seus pais. Qualquer feição facial, branco dos olhos, testa,
curvatura do
rosto, ângulo da ponta do nariz, saliência do queixo, e muitos outros
fatores
anatômicos. Faz-se a análise visual de um conjunto de semelhanças e aí
temos o exame
prosopográfico, que determina se alguém tem ou não características de
um
suposto genitor. Quantas vezes não ouvimos a expressão “é a cara do
pai!” Sempre
aparece alguma coisa. Isso é o exame prosopográfico. ²
Há também o exame
de
sangue, que tem valor para afastar
a filiação. Determina os tipos sanguíneos A, B, O, AB, positivos ou
negativos.
Depois temos o exame
da arcada dentária, que é muito utilizado pela polícia
científica que, em
casos de desastres e incêndios, lançam mão dele para estabelecer
vínculos de
parentesco. Indica um parentesco, mas não necessariamente a filiação.
E, depois, a rainha das provas, o DNA. O DNA é a análise das células das
pessoas, do pretenso pai e
do filho. O pai tem 46 cromossomos, 23 encontrados no filho, que,
detectados,
fica demonstrada positivamente a filiação. São cromossomos encontrados
na
célula do pai, e outros encontrados na célula da mãe.
O teste de DNA pode ser feito não
apenas a partir do sangue,
mas de qualquer célula que tenhamos em nosso corpo humano. Saliva,
líquido
seminal, cabelo, o que for. Tem chance de acerto superior a 99%. De
acordo com
Maria Helena Diniz, só se repete um teste de DNA a cada trinta bilhões
de
testes. Não há, portanto, chance de se elidir o teste de DNA. Ele
realmente dá
uma segurança muito grande quanto à determinação da filiação.
Na evolução do teste de DNA tivemos
uma trajetória muito
interessante. Quando surgiu o teste, imediatamente foi uma descoberta
que todos
queriam experimentar. Quem tinha dinheiro fazia, e o juiz aceitava o
resultado rapidamente.
O juiz acabou ficando sem nenhum poder decisório; o teste de DNA era
certeiro. Começou-se
a notar que o juiz começava a perder o poder de decidir, que transferia
para um
laboratorista, que realmente passava a ser o senhor da verdade. Era o
laudo que
esse técnico que determinava a existência ou não da paternidade.
Começaram a
surgir denúncias sobre negócios em torno de testes de DNA. Era e é
fácil
oferecer R$ 3 milhões para que alguém redija um documento dizendo
“positivo”.
Daí os juízes começaram a ter certas restrições. Tanto que, na esteira
desses
embates, o STJ fixou uma posição assim: se houver algum problema ou
questionamento,
os juízes não deverão aceitar de plano o resultado do teste de DNA.
Devem,
primeiro, observar o conjunto probatório. É tudo isso: a semelhança,
comportamento da pessoa dentro da sociedade, amizades que tem, tipo de
vida que
leva, e tudo deve ser valorado. Se a dúvida persistir, aí sim faça o
segundo
teste em outro laboratório, e só então o juiz decide. O intuito é fugir
dessa
facilidade que se tinha quanto ao resultado do teste de DNA.
Ficou famosa a decisão em relação à
família de Ayrton Senna
quando, numa cidadezinha em que ele tinha fazenda no interior de São
Paulo,
chamada Parquinho, com pistas de Kart e tudo, quando faleceu, ele era
solteiro
e não tinha filhos. Os irmãos dividiram entre si a fortuna.
Lembrem-se, agora que qualquer ação
investigatória é imprescritível, pode ser feita a qualquer tempo; se a
pessoa já faleceu pode-se fazer através dos filhos. O DNA permite a
investigação
desde que haja uma fonte de comparação. E, dentro desse contexto,
apareceu uma
filha de uma cabeleireira em que as pessoas diziam: é a cara do Senna!
Aconselhada
por alguém, mesmo sem nunca ter tido relações com Ayrton, e notando as
semelhanças, a menina resolveu propor uma ação de investigação de
paternidade,
dando como pai Ayrton Senna. Nesse processo, que ficou famoso, uma das
exigências foi que fossem feitos três exames de DNA, um deles no
exterior, exatamente
para estabelecer o teste sem manipulação. Todos deram negativo.
Essa é a dificuldade do DNA. Além
dessa recomendação de não
se aceitar de pronto, temos também, na evolução da prática, alguns
ataques aos
testes de DNA. Por exemplo: a paternidade socioafetiva. O Tribunal de
Justiça
do Rio Grande do Sul tem decidido que, mesmo comprovada a paternidade
biológica,
se se fizer o cotejo entre paternidade biológica e paternidade
socioafetiva,
esta última deve prevalecer. É um conceito que já ouvimos e já
dissemos: “pai é
quem cria”, e não quem fornece o material genético.
E outra brecha no DNA surgiu também
no art. 1614. Mesmo com
o teste de DNA, aquele que foi reconhecido pode impugnar o
reconhecimento,
desde que maior, ou, se menor, nos quatro anos seguintes ao atingimento
da
maioridade ou da emancipação. É uma forma que temos na vontade: ela
deve
prevalecer sobre o teste de DNA.
Art. 1614. O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação. |
Aproxima-se muito da paternidade
socioafetiva. Normalmente,
o exemplo dado em sala de aula, a mulher que estava sendo reconhecida
apontou
os pais generais. Estão mais ou menos na mesma ideia.
A posse de
estado de filho
também não leva à prevalência do teste de DNA. O que posse do estado de
filho? A
ideia de “filho de criação”. A criança leva nomen,
tratactus e fama
de filha de uma pessoa. Em outras palavras, a criança tem nome da família, é tratada
como pessoa da família, e o mundo reconhece aquela criança
como membro da família.
Portanto o teste de DNA, apesar de
ser a rainha das provas,
tem essas restrições quanto à sua prevalência.
Do outro lado, temos a presunção de
paternidade. Aquele que é
apontado como pai tem o direito de se recusar, mas essa recusa leva à
presunção
de que ele é pai. Os juízes decidem sobre isso. No caso que colocamos
antes, o
juiz de Brasília decidiu que a mulher era filha do autor da ação de
reconhecimento de paternidade, simplesmente porque ela havia se
recusado a
fazer o teste de DNA.
De qualquer forma, o Judiciário não
tem o poder de forçar a pessoa a
fazer o teste. Houve
uma decisão histórica também no Supremo Tribunal Federal, de relatoria
do
Ministro Marco Aurélio, em que uma juíza do Rio Grande do Sul forçara
um senhor
a se submeter a um teste. Ele ajuizou habeas
corpus, e o Supremo decidiu, por unanimidade, da
inviolabilidade da
estrutura e informações genéticas da pessoa. O indivíduo não pode ser
forçado a
fornecer dados de sua intimidade genética.
Mas aqui temos, por outro lado, a
presunção. Não pode ser
levado sob vara, mas a negativa gera a presunção de que é pai.
Nesse contexto é que colocamos a
matéria relativa à
comprovação da filiação. Essas provas são utilizadas em todos os tipos
de ação
que tratam da declaração do vínculo de parentesco entre uma pessoa e
aqueles
que o geraram.
Aqui, o momento em que se
estabelece essa relação de paternidade é o momento da concepção. São os
direitos do nascituro assegurados desde o momento da concepção.
Com isso terminamos a matéria para a
prova!
Aqui deixamos de ver adoção. O tema
da adoção fugiu do nosso
Direito de Família e ganhou um corpo próprio a partir do Estatuto da
Criança e
do Adolescente. O que temos no Código Civil diz respeito à adoção de
maiores.
Adoção de menores na infância e juventude fica no ECA. Quanto à adoção
de
maiores, posso perfeitamente adotar uma menina de 40 anos!
Noções de
tutela e
curatela
Ficaram também de fora a assistência,
tutela e curatela.
A curatela existe quando alguém
assume toda a
responsabilidade por outra pessoa que é incapaz. O instituto tem uma
relação
direta com a incapacidade da pessoa, incapacidade para atos da vida
civil. Exemplo
é a pessoa que passou a ter mal de Alzheimer, e não mais reconhece seu
ambiente, seus familiares, foi declarado incapaz, e o juiz nomeia um
curador.
Tem todos os poderes quanto aos atos dessa pessoa, e quanto ao
patrimônio dessa
pessoa.
A tutela é temporária. Surge
normalmente em razão da idade.
Quando a pessoa que ainda é relativamente incapaz, naquele período de
incapacidade
ela terá um tutor. De qualquer maneira, tutores e curadores são
obrigados a
prestar contas da tutela e da curatela ao Poder Judiciário.
Lamentavelmente o
Poder Judiciário não acompanha com a devida atenção as contas dos
tutores e dos
curadores. Há alguns anos, houve um menino que herdou o patrimônio de
mais de
30 milhões de reais dos pais que faleceram num acidente de carro, o
juízo
nomeou tutor, vê nove anos depois, o menino, que então contava com 18
anos,
devia cerca de R$ 3 milhões. Má administração do tutor(a). Em tese, o
Estado poderia arcar
com a irresponsabilidade pela culpa in
vigilando e in eligendo.
Mas quem iria se responsabilizar? Daqui começamos a entender
o porquê de não ser possível fiscalizar.
Entra-se com a guarda a partir da
responsabilidade parental,
que pode ser o avô, ou quem for. Na guarda, quando dada para estranhos,
conferem-se
responsabilidades como se fosse o pai ou a mãe. A tutela confere
somente
poderes de administração do patrimônio do menor que perdeu os pais. A
curatela
é para pessoa que, embora maiores, perderam a capacidade de agir
plenamente por
conta própria. Não há perda de vínculo com os pais na tutela e
curatela. Os
avós, no caso do órfão acima, estavam vivos quando morreram os pais,
mas foi
dada a guarda para um tutor.
Matéria: o professor entende o futuro
advogado deve saber
manejar o idioma. Principalmente quando deve defender seu cliente. A
prova,
portanto, é subjetiva. Conteúdo é a partir de regime de bens,
inclusive. separação
e divórcio, mais centrado em divórcio, união estável, guarda e
responsabilidade, e filiação. Três temas que surgiram durante o curso:
alimentos gravídicos, Emenda Constitucional nº 66 e união homoafetiva
como
entidade familiar. No caso da união homoafetiva como entidade familiar
o
professor gostaria de chamar atenção quanto à decisão do Supremo. Quais
os
direitos que assumem os companheiros pelo fato de terem sido declarados
entidade familiar? É uma questão de se pensar, para reflexão. Na
realidade, o
ponto de partida é a Constituição. Temos, na Constituição, a família,
que
merece a proteção do Estado, que é constituída pelo casamento, pela
entidade
familiar da união estável entre homem e mulher, e pela união
monoparental.
Invadindo a seara do Legislativo, o Supremo criou mais um tipo de
entidade
familiar. Temos agora a entidade homoafetiva criada entre duas pessoas
do mesmo
sexo. E aqui temos que estabelecer que os direitos do homocompanheiro
serão
equiparados aos direitos do companheiro da união estável entre homem e
mulher.
O único tema que fica de fora é a adoção, que é mais complexo, e a
sociedade
brasileira ainda faz muitas restrições à adoção por casais
homoafetivos.
Quais os direitos dos parceiros do
mesmo sexo? São aqueles direitos
que falamos ao longo do curso: direitos reconhecidos para os
companheiros
homoafetivos. Previdência, saúde, partilha de bens, entre outros.