Vamos então concluir o renascimento.
Vamos ver o terceiro
componente que é a economia do renascimento.
Tem-se uma tradicionalíssima imagem
falsa do mundo feudal. É
o resultado de um trabalho dos iluministas que fizeram uma clivagem que
dividiria a “idade das trevas” da “idade das luzes”. Essa construção
que
reservou ao mundo medieval a condição de idade das trevas tem seu quê
de
infundada, e falsa. O mundo feudal foi sim um momento de
superdesenvolvimento
da tecnologia. Não podemos esquecer que no medievo de 800, os árabes
desembarcaram na península ibérica, que eram os detentores da ciência e
tecnologia mais avançada do mundo. Trouxeram coisas que fizeram a
diferença. Pólvora,
esfiha, charuto, culinária... passaram apenas 700 anos lá.
Ali se institucionaliza a preocupação
maior com o saber, com
a criação da Universidade pela Igreja, em Salamanca, Coimbra, Oxford,
Paris... a
própria academia de Platão e o Liceu de Aristóteles eram Universidades.
Havia
uma até no Afeganistão. Era o centro de alta sabedoria e de rotas
comerciais. No
mundo ocidental, entretanto, funda-se a Universidade no mundo medieval.
Outra frente de inovação foi pela via
do mar e do comércio. Por
volta dos séculos X, XI e XII se desenvolveu a arte náutica. Muito
ajudada
pelos insights advindos do mundo
árabe, que, não se pode negar, civilizaram a Europa. Investiram contra
as
discriminações interreligiosas; nas cidades espanholas, onde os árabes
plantaram raízes frequentemente tinham-se Igrejas, Mesquitas e
Sinagogas, num
clima de liberdade religiosa de alta civilidade.
Os árabes, quando desembarcaram na
Europa, dormiam havia
mais de 2000 anos em tapetes confortáveis. Um desses árabes que veio à
Europa
foi Aladino, sobrinho de Saladino (1138 – 1193), que resistiu
aos cruzados, por si só um iluminista do mundo da baixa idade média
oriental.
Saladino também era Patrono de pesquisas científicas, tecnológicas, das
armas,
das letras, dos espetáculos. Tudo isso trazido para o Ocidente por
Aladino.
Hoje o islamismo está bem diferente.
Corrompido nalguns
países. Mas foi algo fantástico.
Os árabes promoveram a expansão da
área agricultável na Europa,
multiplicaram a população medieval, revolucionaram a dieta, e motivaram
o que
se chamou de revolução industrial medieval.
O comércio que se estabelece entre o
Ocidente e o Oriente
irá libertar a terra, e estabelecerá um novo tipo de trabalhador, o
mercador.
Isso causou uma revolução jurídica, e nasceu a autonomia do sujeito.
Nasce com
os mercadores.
Nas cidades portuárias, fez-se um
esforço para que lá não
incidisse a autoridade do Papa, nem reinasse o Rei, nem mandasse o
Barão da
Terra. Assim conseguiram estabelecer diretrizes normativas para a vida,
e os
mercadores conseguiram institucionalizar a vida das cidades mercantis
para que houvesse
regras que se conduzissem ao funcionamento das instituições, que devem
estabelecer as Posturas Municipais. Surgiram os Concelhos Municipais,
que foram
outra revolução. Nas cidades mercantis, passou-se a votar para saber
quem seria
conselheiro. Começa aqui a representação, um sistema eletivo e
representativo
que irá marcar a modernidade. Manifestação autônoma da vontade por meio
do
voto.
Dessas posturas mercantis começou a
nascer o Direito
moderno, legislado, legitimado pela sociedade civil, chamada a
instituir as
demais instituições. Foi o que Hegel disse: a sociedade civil gerará a
sociedade política, que é consequência da vontade instituidora da
sociedade
civil. Isso é definitivo para o estabelecimento do quadro institucional
do
Direito moderno. Ideia de Estado que não se autolegitima. Trilhou-se um
caminho
pós-absolutista. Foi uma minoria organizada que fez história. As
maiorias
inorgânicas sofrem a história. Os mercadores são as minorias abraâmicas
desse
mundo.
A afirmação do indivíduo na história
reclama autonomia,
vontade e liberdade. É esse o caminho traçado pelos mercadores. Pelo
mar, há a
fronteira da liberdade. Papa, barão e rei não têm influência aqui.
Assim foi
possível d1 gerar d2, que
gerou d3, em que “d”
é dinheiro. Capital é um dinheiro grávido, dinheiro fêmeo, que se
replica,
gerando outros dinheiros. É trabalho humano cristalizado, congerminado.
O capitalista
já acumulou capital. O capital é cientificamente definido como a
acumulação do
produto do trabalho humano. Isso levará à riqueza e ao lucro puro, que
é o
lucro desonerado do pagamento de fatores produtivos, e da necessidade
de se
fazer qualquer reversão. É o lucro que pode ser aproveitado para a
perdularice.
Só para dar uma ideia básica, uma das
ideias do capitalismo
é a circulação do capital. Isso foi escrito por Karl Marx em seu livro
O
Capital. Atribui-se a Marx várias coisas, inclusive a condição de
cientista. Ele
faz um julgamento negativo do lucro.
Marx diz que o capital resultaria
disso: imagine uma fabrica
de aviões, que tem um custo global de funcionamento de 1000 unidades
monetárias/dia.
Na primeira jornada de trabalho, de 4 horas, se fabrica um avião. Esse
avião
custa, no mercado, 1000 unidades monetárias. Significa que a venda
desse avião pagou
por duas jornadas de trabalho. Pronto, está criada a chave da riqueza!
Como se
ninguém houvesse descoberto isso! Essa é a “mais valia”: criação de
mais valor
do que fora gasto, em força de trabalho, para produzir a riqueza. Daí
vem a
obra O Capital, que desencadeou o surgimento da figura de Marx político
e Marx “profeta”.
Ele se divorciou no Judaísmo, mas o Judaísmo nunca se divorciou dele.
O que o renascimento resolveu fazer
foi investir na
celeridade da produção. Os mercadores do renascimento foram os
primeiros
acumuladores de capital, e descobriram uma forma de realizar a
multiplicação da
riqueza em velocidade maior do que as formas de realizar riqueza
existentes no
mundo de até então. Houve, portanto, uma transfiguração material da
história. Entre
eles estarão fortemente os judeus, supostamente perseguidos, mas que se
tornaram, desde já, os banqueiros do mundo medieval. Serão financistas
dos mercadores,
e lucrarão com a expansão do comércio. 5042 essa gente investirá em
ciência e
na navegação de longa distância. A ordem era adicionarem-se terras
novas à
concepção de espaço. Há de se acelerar o tempo. Um exemplo de
investimento
nesse sentido foi a Escola de Sagres, obra de judeus que financiaram a
arte
náutica nas cidades costeiras de Portugal. O objetivo era descobrir
terras
novas, o mundo novo. Só que, quando seus serviços a Portugal, o judeu
italiano
Cristóvão Colombo foi rejeitado, muito embora o ministro da fazenda
português,
outro judeu, Isaac
ben Judah Abrabanel
(1437 – 1508), tenha exposto todas as vantagens em se
celebrar um
contrato de expedição com o navegador. Ben Abravanel (outra pronúncia
do nome)
era ascendente direto de Silvio Santos.
O mundo das grandes navegações, o
mundo das grandes
descobertas é o mundo que, ao mesmo tempo, é unitário e dual, que
nascerá daí.
Há uma projeção oceânica da Europa, criando o pacto Colonial: nações de
um
lado, colônias no além-mar. Isso foi tão decisivo para o futuro da
humanidade
que daí resultaram os blocos globalizantes, e pode-se dizer que esta é
a origem
da divisão internacional do trabalho, com o embrião do que se tornaram,
nos
séculos XIX em diante, os países subdesenvolvidos e desenvolvidos.
Exceções:
Canadá, Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia. Isso porque esses
países
foram criados como colônias de povoamento.
Do Pacto Colonial, chega-se ao
mercantilismo, começando em
Portugal e Espanha, indo depois para Inglaterra e Holanda. Nascem três
fenômenos: capitalismo comercial, que gera o industrial, que gera o
financeiro.
As formas de capitalismo que nasciam iam dominando as anteriores; o
capitalismo
industrial dominou o comercial, ao passo que o financeiro dominou o
industrial,
quando se instaurou. Foram banqueiros sobretudo judeus que estiveram,
no
início, à frente do capitalismo financeiro. Tudo isso possibilitado
pelo
espírito do renascimento, supervaloração científica, supernavegação,
grandes
descobertas, estabelecimento do pacto colonial, e da afirmação do
mercantilismo, de onde nascerá a experiência do capitalismo comercial,
que
depois evoluiu para a forma industrial e, por último, financeiro.
Por isso podemos dizer que foi uma época de grande mutação material, com a expansão das fronteiras e colônias; jurídico-política, com a afirmação do Estado Absoluto; mutação ideológica, com retorno do paganismo.
Intérpretes do capitalismo: Joseph Schumpeter (1883 – 1950), Max Weber (1864 – 1920), Karl
Marx (1818 – 1883), David Ricardo
(1772 – 1823) e Adam Smith (1723 –
1790).