Na
aula passada estudamos
conceito de recurso, recurso em sentido estrito, e recurso em sentido
amplo no
ponto de vista processual. Vimos também a diferença entre recursos e
ações
autônomas de impugnação; recursos são, em regra, o meio judicial
cabível para
impugnar
decisões judiciais, mas também podem-se propor ações autônomas
de impugnação.
Esta forma novo processo, aquele prolonga o já existente.
A
justificativa da doutrina para
a existência dos recursos é a economia processual, unificação da
jurisprudência, ser o órgão superior mais experiente, imperfeição e
insatisfação humana, e a utilidade preventiva, além de outros motivos.
Daí o
próprio Poder Judiciário controla os atos praticados por seus membros.
Vimos
também a ideia de duplo
grau de jurisdição, com o reexame de uma decisão, e aprendemos que não
é uma
garantia absoluta.
Natureza
jurídica do recurso é
que ele é uma extensão do direito de agir, e ônus processual.
Processualmente
falando é um ônus; do ponto de vista das decisões do indivíduo é uma
faculdade.
O
que temos que fazer é
identificar o recurso cabível. Vejam a importância disso: o juiz
profere
decisão, e achamos que é uma sentença. Mas não é uma sentença!
Aprenderíamos,
então, o recurso cabível contra a sentença. E qual seria? Apelação.
Mas, se não
for, o recurso errado fará prevalecer a decisão. Na prática é fácil
pois o juiz
escreve em sua manifestação: “sentença”. O próprio juiz, entretanto,
pode
errar! Não pode a parte nem o advogado dizer que foi induzido a erro; a
parte
tem que apresentar o recurso correto. Não cabe essa justificativa.
Parte
da doutrina e da jurisprudência,
especialmente a trabalhista, entende que é possível recorrer com base
em
erro no
nome do ato. Professor discorda. Profissionais de direito não podem se
render
tão facilmente. Cabe recorrer da decisão que é correta. Por isso que
existem os
recursos! Corrigir erros do juiz.
E
não é simples, principalmente
em primeiro grau. Os conceitos dessas decisões mudaram há pouco tempo,
dado que
nosso Código de Processo Civil data de 1973. Várias reformas já mudaram
o
sistema recursal.
Atos sujeitos a recurso
Que
atos dentro do processo estão
sujeitos a recurso? Dentro do processo há vários atos praticados, seja
pelas partes,
pelos auxiliares, atos do juiz, do Ministério Público... Então, dentro
de um
processo, que devemos encarar como um jogo de resolução de conflitos,
os atos
são a materialização do poder de julgar. Sendo um jogo, há uma
estratégia. Elaboração
de quesitos de perícia, o que perguntar para as testemunhas e em que
momento,
etc.
Somente
os atos jurisdicionais estão
sujeitos a recurso. Ou seja, atos do juiz.
Significa que não se
recorre, em sentido estrito, de um ato da parte. É o juiz que tem o
poder de
decidir, de julgar; atos da parte não têm o condão de atingir a parte
contrária
diretamente.
O
professor já perguntou: podemos
recorrer, em sentido estrito, de um parecer do Ministério Público que
foi
contrário ao seu interesse? Não, mas podemos recorrer do ato do juiz
que
acolheu seu parecer. Cuidado com o termo “juiz” aqui. na verdade
estamos
falando de qualquer magistrado, de todo o Poder Judiciário.
Todos
os atos jurisdicionais são
passíveis de recurso? Não. É recorrível o ato de inspeção judicial?
Não. Apenas
os pronunciamentos são recorríveis:
a
manifestação do juiz, sua exposição, o falar nos autos. O processo
começa por
iniciativa da parte mas é impulsionado pelo juiz. Pronunciamento
jurisdicional
é passível de recurso.
E
aí vamos para a última etapa:
todo pronunciamento do juiz é recorrível? Também não! Às vezes o juiz
fala nos
autos, mas sem causar prejuízo, sem “resolver questão”. Se ele não
resolver
questão alguma, o ato não será passível de recurso. O exemplo mais
clássico é o
despacho.
Os
pronunciamentos judiciais são
ou decisões ou despachos. Quando o juiz fala nos autos, ou ele está
decidindo,
ou está despachando.
E
o que é “questão”, posta entre
aspas desde o começo? Ponto controvertido. Resolver ponto controvertido
é o que
causa prejuízo à parte. O ato que resolve a controvérsia é considerado
decisão
judicial. Por outro lado, o processo tem que caminhar, tem que ser
impulsionado. Isso se faz por meio do despacho.
Exemplos
de despachos: designe-se
audiência. Intime-se a parte. Dê-se vista à parte contrária.
Na prática não é bem assim: há atos que aparentemente têm aspecto de despacho, mas que, no caso concreto, causam prejuízo, daí serem pronunciamentos do tipo decisão. O mero “cite-se” pode causar prejuízo! Há até um artigo chamado: “Da Recorribilidade do Cite-se.” Pode ser passível de recurso por causar prejuízo à parte contrária. Não é que será um despacho recorrível; se é despacho, o ato é irrecorrível. Art. 504 do Código de Processo Civil:
Art. 504. Dos despachos não cabe recurso. |
Há
dois casos que o professor irá
nos mandar, no STJ, com impugnação do “intime-se.” Num foi considerado
despacho, noutro foi considerado decisão. Até um “ao MP” já foi
recorrido. A
remessa dos autos pode ser desnecessária e prejudicial ao andamento do
processo
e à economia processual. É comum juízes escreverem “despacho” e, no
corpo, termos
uma verdadeira decisão. É plenamente recorrível, apesar do nome.
A
primeira coisa, portanto, é
identificar que o ato judicial é uma decisão.
Tipos de decisão
Identificado
que se trata de uma
decisão, temos que identificar seu tipo. São dois tipos proferidos na
primeira
instância, e dois na segunda. Sentenças e decisões interlocutórias,
e
acórdãos e decisões monocráticas, respectivamente.
Primeiro
passo é identificar o
órgão que proferiu a decisão. Se é um tribunal, só podemos estar
falando de um
TJ, de um TRF, do STJ ou do STF. Isso, claro, dentro da justiça comum.
O
processo começa com a petição
inicial e termina num ato que ainda não sabemos. No decorrer, vários
atos são
praticados pelo juiz. Vamos vê-los.
Nosso
Código é de 1973. Sentença,
de acordo com Alfredo Buzaid, autor do Código, era o ato pelo qual o
juiz punha fim ao processo. Não é mais assim, já sabemos. Decisão
interlocutória
era ato
no qual o juiz decidia um incidente sem por fim ao processo. Proferida
uma
decisão no meio do processo, ou seja, uma decisão interlocutória, o
processo
não terminava, e ainda havia atos por serem praticados. São decisões
que
resolvem incidentes. Ao mesmo tempo, cuidado com a expressão “pôs fim
ao
processo”. O ato que põe fim ao processo no primeiro grau era a
sentença. Mas o
processo em si não necessariamente termina aqui; ainda há atos por
serem
praticados pelas partes.
Isso
tudo no passado.
Hoje
temos um conceito novo, com
um processo maior, dividido em duas fases. É o processo sincrético, com
as fases de conhecimento e de cumprimento da sentença. Dizer que
sentença
era o
“ato pelo qual o juiz coloca fim ao processo” não mais procede, pois há
a fase
de execução, do cumprimento de sentença. O processo não termina mais
com a
sentença, do ponto de vista pragmático. Ainda continua em primeiro
grau, e
partirá para a segunda fase. Antes, a execução era um novo processo,
uma nova
inicial, com citação da parte contrária, uma nova relação jurídica
processual.
A sentença, no passado, colocava sim fim no processo. O que surgia
depois era
um novo processo, chamado execução de título executivo judicial. O
devedor,
hoje, é intimado para pagar, e não citado. E felizmente, pois a citação
é um
procedimento muito mais complicado do ponto de vista do interesse do
autor.
Art. 162, § 1º: Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei. |
Vejam
que foi excluída a
expressão “extinção do processo”, substituindo por “situações dos
artigos 267 e
269”.
Art. 267: Extingue-se o processo, sem resolução de
mérito: [...] Art. 269: “Haverá resolução de mérito: [...] |
Complicou.
O que é sentença
agora? Sentença põe ou não fim ao processo? Logo depois que surgiu esse
conceito, o professor ajuizou ação de execução de alimentos. A
magistrada notou
que parte da dívida em cobrança estava prescrita. Pelo conceito antigo,
que
dizia que sentença é o ato pelo qual o juiz põe fim ao processo, esse
ato seria
uma decisão interlocutória, pois continuaria do mesmo ponto.
Então
veio o conceito novo,
prescrevendo que sentença é o ato pelo qual o juiz aplica uma das
questões dos
arts. 267 e 269. No caso da execução de alimentos, foi o caso do art.
269, pois
se tratava de prescrição. O recurso cabível era apelação, e todo o
caderno
processual era remetido ao Tribunal. E a parte deferida da execução
alimentícia? Houve um problema.
É
aqui que entra a doutrina:
“sentença é a o ato pelo qual o juiz põe fim ao processo ou
a uma de suas fases.” A conclusão que chegamos é de que o conceito de sentença tem que ser visto
pelo conteúdo e pela sentença. Não somente pelo conteúdo do
ato.
O
juiz recebe uma petição inicial
e exclui três dos cinco réus do processo, extinguindo o processo em
relação a
eles. Não é uma extinção completa, então é uma decisão interlocutória!
Não
existe a possibilidade de dizer: “para os três, temos sentença, para os
réus
restantes temos decisão interlocutória.” Não é assim. O ato é visto de
uma
forma só para todos os consortes. O pronunciamento judicial é visto na
perspectiva do processo e não das partes individualmente consideradas.
Vejamos
exemplos de
pronunciamentos decisórios:
O
art. 162, § 1º não deve ser
interpretado literalmente, mas sistematicamente. Importa o conteúdo e a
consequência.
Essa
é a diferença entre sentença
e decisão interlocutória. Basta identificar o ato para identificar o
recurso,
no futuro. Se não souber, você poderá até errar o prazo.
Decisões nos tribunais
E
nos tribunais? Como identificar
os tipos de decisões judiciais? É mais simples aqui. Temos vários
julgadores
divididos em colegiados. O que são colegiados? Grupos de julgadores. No
primeiro grau, quem decide o processo é um juiz, uma única pessoa. Nos
tribunais, é
um colegiado, várias pessoas. Adotamos como regra a colegialidade.
Decisões
monocráticas serão exceção.
O
nome da decisão proferida por
esse colegiado é acórdão. Do que é
composto? Relatório, votos, ementa e a certidão de julgamento.
No
relatório, o magistrado lê o
processo e elabora uma síntese do que está em discussão. Resumo da
controvérsia. Elabora, depois, sua decisão. Esse é o voto.
O relator lê o relatório para os colegas, que começarão a
visualizar o que está acontecendo. Em seguida, os demais se pronunciam.
A
ementa, por sua vez, é um resumo
de tudo o que foi decidido. É isso o que será publicado no jornal da
justiça.
Não há como publicar tudo.
Por
fim, a certidão de
julgamento, com um registro da ata do julgamento, quem esteve presente,
como
ficou a votação, data, entre outros.
Isso
tudo compõe o acórdão, que é
a decisão proferida por um colegiado.
Decisão monocrática: como dito, nosso
sistema adota a regra da
colegialidade. Significa que, nos tribunais, em regra quem decide é uma
pluralidade de julgadores. Entretanto, são muitas causas repetidas que
tramitam,
inclusive com jurisprudência consolidada. No passado, os regimentos
internos
começaram a permitir que os julgadores que compõem os tribunais
passassem a
decidir alguns casos sozinhos. Ele não precisava levar ao colegiado,
mas
poderia decidir em nome dele.
Antigamente
gerava muita
controvérsia o instituto da decisão monocrática, mas hoje virou lei, e
temos
muitas decisões desse tipo. No STJ e no STF as decisões monocráticas
são maioria. A
parte
perde algumas garantias, como não saber a data precisa do julgamento e
não
poder fazer sustentação oral.
Observação:
se houver erro no
relatório, cabe embargo de declaração. Não é erro na decisão em si, mas
de
coerência.
Terminamos
as decisões proferidas
nos tribunais.
Certeza
que cairá na prova uma situação para identificar que tipo
de ato é.
Essa
conceituação de sentença,
decisão monocrática, acórdão aplica-se a todos os processos e
procedimentos.
Ação de reintegração de posse, ação de cobrança, execução, cautelar,
não
interessa. Nem o tipo de processo nem de processo. O ato pelo qual o
juiz põe
fim ao processo será sempre sentença.
Amanhã:
defeitos das decisões.