Direito Processual Civil

quarta-feira, 1º de junho de 2011

Recurso Especial



Hoje vamos estudar um recurso novo, chamado recurso especial. Recurso importantíssimo, mas relativamente recente. Tem uma importância fundamental hoje nos processos. Claro que não é comum chegar lá, mas quem dá a última palavra em várias questões é o Superior Tribunal de Justiça. O REsp é um recurso para o STJ. Vamos prestar atenção. A parte de recurso especial é uma matéria que não é dada em todos os cursos de Direito. O profissional que gosta de advogar tem o REsp como diferencial.

O profissional de Brasília gosta de advogar. O STJ está aqui, bem como o STF. É do dia-a-dia nosso! Falar com alguém de fora de Brasília sobre o STJ pode inclusive causar surpresa. Mais antigamente, menos hoje em dia. O professor acha inaceitável o aluno se formar e não assistir a pelo menos uma sessão do STJ e do Supremo. Há alunos que pegam ônibus em outros estados para assistir sessões aqui. Lotam a sala e se impressionam! Aqui, os jovens futuros bacharéis dão tão pouco valor; passam de carro pelo setor de embaixadas, vão ali ao Pier 21, veem o prédio do STJ todos os dias, e passam reto. Mas outros escritórios de advocacia no Brasil precisam de contato com gente aqui de Brasília! Antigamente mais ainda porque a tecnologia não estava tão desenvolvida. Ter vista de processos e acórdãos era algo que até constituía um mercado. Houve quem dissesse que os advogados brasilienses torciam contra o desenvolvimento tecnológico no Poder Judiciário.

Vamos entender, portanto, de onde veio o recurso especial. Como falamos, é um recurso relativamente novo. Nosso Código de Processo Civil é de 73, então tem 38 anos. O REsp é de 1988, posterior ao CPC.

A estrutura do Poder Judiciário no passado, antes de 88, era assim: não existia o STJ; havia a justiça estadual de primeira instância e Tribunais de Justiça, ao lado da justiça federal de primeira instância, acima da qual havia somente um tribunal, chamado Tribunal Federal de Recursos, o extinto TFR. Não havia STJ nem Tribunais Regionais Federais, que hoje são em número de cinco.

O que acontecia? O STF tinha competência para julgar recursos discutindo matérias constitucionais e também para o julgamento de matérias infraconstitucionais, o que não faz mais hoje. Ou seja, o STF, antes de 88, tinha as atribuições que tem hoje junto com as do STJ de hoje. Pense em levar todos os processos do STJ para os 11 ministros do Supremo!

Surgiu a chamada crise no Supremo. O que foi isso? Simplesmente havia processos demais. Não havia condições de julgar todos os processos lá dentro. A competência era mais inflada, cheia, maior. A crise do Supremo fez com que se criasse um instituto chamado Arguição de Relevância. O Supremo passou a escolher o que julgar. Escolhia os casos relevantes. A parte tinha que sustentar, em seu recurso, que seu caso era relevante. O Supremo se reunia em sessão secreta e os ministros decidiam, sem fundamentar, o que era relevante e o que não era. Um absurdo. Toda a comunidade jurídica foi contra isso. Mas manteve por um bom tempo. Seria parecido com “não vamos mais julgar nada envolvendo responsabilidade civil, nem Direito de Família, pois não dá tempo.” Claro que não era esse o fundamento, mas era algo assim.

Aproveitaram a Constituição de 1988, que estava para se editada, e resolveram dar uma reformada na estrutura do Poder Judiciário. Ficou a ideia de um tribunal novo, extinguiram o TFR, criaram o STJ e os TRFs. Com a criação do STJ criaram também o recurso especial. O REsp é um desdobramento, uma versão do recurso extraordinário. Antes do STJ só havia recurso extraordinário para o Supremo, tratando de matéria constitucional e infraconstitucional. Da Constituição em diante o RE ficou somente para as matérias constitucionais. O recurso especial é uma espécie de um recurso extraordinário. Por isso, durante a aula aqui, vamos falar de súmulas do Supremo que tratam do recurso extraordinário mas que são aplicadas também ao recurso especial, pois são recursos da mesma natureza. Parte da competência do Supremo foi deslocada para o STJ. Por isso o Tribunal Superior não começou com zero processos; assim que foi criado vários processos foram remetidos ao recém-criado tribunal. Os TRFs passaram a ser a segunda instância da justiça federal.

Pergunta importantíssima, que todos erram: o TFR funcionava ali onde hoje é o TRF no Setor de Autarquias, em Brasília. Quando o STJ foi criado, todos os funcionários do TFR viraram funcionários do STJ. A sede do TFR virou a sede do STJ. Os ministros do TFR viraram ministros do STJ. Os TRFs não. Essa transição acaba induzindo a erro porque, quem viveu isso acha que o STJ substituiu o TFR, mas isso na verdade não aconteceu. A competência jurisdicional do TFR foi substituída pelos TRFs. O STJ passou a ser a última palavra em matéria infraconstitucional, enquanto o Supremo continua como a última palavra em matéria constitucional. Pegou funcionários, mas não substituiu do ponto de vista jurisdicional.

Na época em que surgiram os TRFs e o STJ, foi uma alegria para os juízes do Brasil, porque houve várias promoções. Foi um momento em que vários magistrados novos, de início de carreira, ascenderam rapidamente.

Pois bem. Foi criado o STJ. Tem jurisdição em todo o território nacional.

Composição do STJ: 33 Ministros no mínimo. No STF eles são escolhidos pelo Presidente da República, enquanto no STJ temos “terços”. Um terço de desembargadores dos Tribunais de Justiça dos estados, o que significa que todos os desembargadores podem concorrer a uma vaga do STJ; Um terço dos desembargadores federais, dos TRFs, que é uma posição menos disputada, já que existem menos desembargadores federais; e um terço dividido em Ministério Público e Advogados. Essa é a composição do STJ. Faz-se uma lista tríplice e, desta, o Presidente da República escolhe um. Significa que não é possível para quem não é bacharel em Direito entrar para a composição do STJ; mas no STF tem! Claro, desde que tenha, de alguma forma, o notório saber jurídico.

O STJ ficou conhecido como "tribunal de advogados". No Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios há o quinto constitucional de advogados e Ministério Público. O sujeito que é advogado de carreira entrou no TJDFT para ser desembargador. Passou a ser magistrado, desembargador, e não mais advogado. Imagine que, um tempo depois disso, surge a vaga no STJ dentro do terço para desembargadores de TJ. Poderá concorrer esse mesmo sujeito? Poderá! Mas, na verdade, ele será advogado em sua essência. Daí ele concorre na vaga de desembargador no STJ, mas entrou no TJ com a vaga de advogado. Por isso o STJ passou a ser chamado de “tribunal de advogados”. Mesmo os oriundos da classe dos juízes, eram, na verdade, advogados. Os advogados ocupam, em tese, a vaga que seria de um juiz de carreira. Há um projeto para que esse advogado que entrou no TJ ou TRF como advogado e virou desembargador que concorra à vaga no STJ na classe de advogado, e não de desembargador, assim os advogados não ocuparão mais um máximo de 2/3 do STJ, mas sim somente seu 1/3.

Temos um mínimo de 33 ministros, o que significa que pode aumentar, em tese. Dificilmente acontecerá. É que no início imaginou-se que seriam instituídos mais ministros, então o próprio prédio do STJ foi construído grande na expectativa de que fosse abrigar mais. Mas isso não aconteceu, e hoje há gabinetes com seis banheiros e inúmeros assessores. Não há espaço para mais ninguém.

Organização: o STJ é dividido em corte especial, sessões e turmas. Essa é a divisão do STJ. Corte especial é o órgão jurisdicional máximo. Sessões são três, e turmas são seis. Há o Plenário, mas não julga processos. Essa é a estrutura do STJ. ¹

O recurso especial é o recurso mais importante do STJ. É sua competência originária. Vamos ao que interessa agora.
 

Cabimento do recurso especial

Contra que decisões cabe recurso especial? Art. 105, inciso III da Constituição:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

[...]

III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

Causas decidias em última ou única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou Tribunais de Justiça dos estados. Vamos apontar especificamente de que tipos de decisão caberá recurso especial. Primeira decisão da qual cabe recurso especial é acórdão. Não cabe de decisão monocrática. Acórdão julgado em única ou última instância, o que significa que não há mais para onde recorrer dentro do órgão que prolatou a decisão. Ali dentro não cabe mais nada, salvo embargos de declaração, que é recurso que cabe contra qualquer decisão. Decisão monocrática não é uma decisão última, porque ainda cabe agravo regimental para submeter o exame da questão ao colegiado. Por isso não será conhecido REsp interposto contra decisão monocrática. Cabe recurso especial, portanto, contra acórdão.

Qualquer acórdão? Não. acórdãos de última e única instância. Última instância significa que a decisão veio de algum lugar e, nesse lugar, era o último recurso. Veio da primeira instância e parou na segunda. Falamos em única instância quando a competência do tribunal é originária. Começou na segunda instância, tramitou, julgou, nada mais cabe, e aqui começamos a pensar em REsp.

Vamos entender o recurso especial da seguinte forma: recurso ordinário e embargos infringentes são os únicos recursos de acórdãos que vimos até agora. A ideia da prova que vamos fazer é dar uma situação: “foi proferido um acórdão. Qual o recurso cabível?” alguns professores preferem lecionar primeiramente o recurso especial, o que o nosso professor entende não ser a melhor abordagem. Como o recurso ordinário é bem mais específico, pensamos primeiramente nele. Se não for o caso, pensamos em embargos infringentes. Daí o professor nos ensinou nessa ordem: recurso ordinário, embargos infringentes, recurso especial. Se não se tratar de habeas corpus, mandado de segurança, mandado de injunção ou habeas data julgado originariamente por tribunal, sendo denegatória a decisão, concluímos que não é caso de recurso ordinário, então passamos a pensar em embargos infringentes. Se não for caso de embargos infringentes, aí sim pensamos em recurso especial! Note que o art. 105, inciso III da Constituição não aponta que tipo de acórdão e que tipo de matéria. Simplesmente diz acórdão de última ou única instância de TJ e TRF. É mais geral o recurso especial. É importante por quê? No final das contas, do que adianta a sentença ser favorável a você, você ganhar a eventual apelação, e um único ministro do STJ reformar tudo aquilo que você já ganhou. Tudo é revertido. É possível, é real, concreto, acontece toda hora, e dá grande desespero. Por isso é bom pensar, no primeiro ajuizamento da ação, em quem irá julgar ao final de tudo. Não são todos os casos, mas temos que pensar no STJ, afinal na maioria das vezes estaremos lidando com lei federal. A maioria dos advogados só pensa em tribunal de segundo grau. Acha que termina ali, e se sentem seguros. Não é prudente se comportar assim. Pense numa derrota de virada! Então vamos ver os requisitos específicos para pensarmos na possibilidade concreta e real de haver interposição de REsp.

Continuemos com as regras de cabimento do recurso especial. Cabe espaço contra acórdão do TRT? Não. Contra acórdão do TRE? Não. Justiça militar? Não. Só cabe contra acórdãos de TJ e TRF! Os demais são os casos da justiça especializada.

E quanto aos Juizados Especiais? Podemos interpor recurso especial contra acórdão da turma recursal dos juizados? Não, pois não é tribunal. Porque só cabe contra acórdão do TJ e do TRF. Juizados Especiais não estão dentro da estrutura do TJ. Eles constituem, como estudamos, seu próprio microssistema. A sessão de julgamento da turma recursal por acaso fica fisicamente no TJDFT, mas não é parte daquele órgão. A turma recursal não é órgão integrante do Tribunal de Justiça. Há uma súmula sobre isso do STJ:

Súmula 203 do STJ: Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais.

Já se cobrou muito isso em prova. Turma recursal não é órgão integrante do tribunal. Não se esqueçam!

Esse é o cabimento. Vamos facilitar: quando podemos interpor REsp? Tem que ser acórdão do TJ ou TRF, e não ser possível outro recurso. No pedaço que não tiver jeito, REsp. Não esqueçam da regra dos embargos infringentes que vimos na aula passada. Se proferido um acórdão, que reforma apelação interposta contra sentença de mérito, sendo que esse acórdão contém uma parte unânime e outra não unânime, caberão embargos infringentes da parte não unânime do dispositivo, sobrestando o prazo para interposição de REsp em relação à parte unânime. Proferido o novo acórdão julgando os embargos infringentes, aí sim caberá REsp único contra as duas decisões: o acórdão julgando os embargos e a parte unânime do acórdão que julgara a sentença. Essa é a particularidade que temos que lembrar. Se cabíveis embargos infringentes, agravo regimental ou o que for, não caberá REsp.

No Supremo, para recurso extraordinário, a regra é diferente. Contra acórdão de turma recursal caberá recurso extraordinário, enquanto que não cabe recurso especial. Vamos ver recurso extraordinário na próxima aula.
 

Alíneas do recurso especial

São as alíneas do inciso III do art. 105 da Constituição. Vejamos:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal;

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

Vamos especificar o cabimento, portanto. Não precisaria nem ver as alíneas “b” e “c”, porque a “a” integra tudo. Alínea a:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

Contrariar lei federal ou negar vigência a ela. Vejam para que serve o recurso especial. O STJ é o guardião da legislação federal infraconstitucional. O guardião da Constituição é o Supremo, enquanto o STJ é o guardião da legislação infraconstitucional federal. Temos, portanto, que indicar que essa decisão da qual recorremos violou lei federal. “Contrariar” e “negar vigência” são termos diferentes? Do ponto de vista literal há diferença sim. Contrariar é falar sobre o dispositivo e dar interpretação diferente. Negar vigência é ignorá-lo. Mas do ponto de vista geral, prático e jurídico não há diferença. Em sua petição de REsp basta sustentar que a decisão recorrida descumpriu, ofendeu um ou vários dispositivos da lei federal. A ideia é: “olhe, STJ! O TJDFT violou um artigo do Código de Defesa do Consumidor.” Ataca o acórdão dizendo que ofendeu a lei federal.

É difícil redigir um REsp; na apelação podemos falar o que quisermos. Da mihi factum, dabo tibi jus... portanto em REsp deve-se treinar muito, e aprender com quem sabe. O professor mesmo passou a colecionar petições de REsp que feitas por advogados experientes e que conseguiram provimento. É difícil porque pensa-se em REsp quando já se está com a corda no pescoço. Insiste o professor: “pensem: qual o dispositivo legal que pode ser interpretado de forma diferente e que poderá ensejar eventual REsp?

E o que é lei federal? Como enquadrá-las? Que legislações enquadramos no conceito de lei federal? Todas! Lei ordinária, decreto-lei, medida provisória, lei complementar, lei delegada... todas as leis federais que não estejam na Constituição. Podemos apontar a violação no recurso especial. é amplo o conceito de lei federal para efeito de recurso especial.

E lei local? Posso apontar um dispositivo de uma lei distrital? Não mesmo:

Súmula 280 do STF: Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário.

Não se esqueçam que essa é uma súmula do Supremo e que trata de recurso extraordinário. Mas não tem problema, de acordo com o que falamos no início. Há súmulas que tratam, na verdade, dos recursos especial e extraordinário, por serem da mesma natureza. “Recurso especial é um recurso extraordinário”.

Entendam: em relação ao recurso especial, o Brasil não dá certo por quê? Quem regulamenta nosso dia-a-dia em quase 100% dos casos é o Congresso Nacional. As Assembleias Estaduais têm competência legislativa muito pequena, restrita. É um sistema copiado dos Estados Unidos, dividido em estados, mas esqueceram de conferir poderes às Assembleias Estaduais. Daí nos EUA haver pena de morte em um estado, e em outro não. Existe essa diferença de legislação entre os estados. Lá, lei federal é menos. Aqui, lei federal é mais. Para Direito de trânsito, comercial, de família, do consumidor, criminal, processual e muitos outros temos legislação federal. Significa que tudo vai ao STJ! A maior parte está escrita em legislações federais. A maioria das questões seria de lei local se fossem dados maiores poderes aos Legislativos estaduais. As cortes estaduais nos Estados Unidos, portanto, são de fundamental importância, e têm força mesmo. Aqui têm bem menos, haja vista a insegurança de ver seu processo indo ao STJ e reformado lá, muitas vezes por um único ministro.

Claro que, no caso do Brasil, ter a via do dia-a-dia regulada pelas Assembleias Estaduais seria um caos. Lembrem-se, para começar, de nossa maravilhosa Câmara Distrital.

Observação: normas infralegais não são consideradas lei federal para o recurso especial! Portarias e instruções normativas, por exemplo.

Daí concluímos que o recurso especial é o instrumento mais importante para a defesa da lei federal.

Alínea b:

b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal;

Aqui estamos em uma esfera bem mais específica. No final das contas, apontamos violação também à lei federal. É mais específica, entretanto, que foi um ato de governo incompatível com a lei federal. Demonstramos: “O TJ prestigiou um ato de governo em detrimento da lei federal.” Costuma acontecer em convênios e questões relacionadas a ICMS.

Alínea c:

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

Divergência jurisprudencial. O STJ, além de ser o guardião da lei federal, é também um tribunal uniformizador. Deve ser o tribunal de precedente, mas infelizmente ainda existem divergências até dentro dele mesmo. O que a parte faz, então? Alega que há divergência de jurisprudência. Há um conflito entre decisões dos tribunais do país. Recorro de um acórdão do TJDFT, que aplicou, em determinado caso, prescrição de 20 anos contra mim. Quero recorrer. Faço uma pesquisa na jurisprudência do Brasil e encontro um acórdão do TJRJ julgando o mesmo caso, a mesma situação, e decidiu que a prescrição era de cinco anos. Então, em meu REsp, alegarei a divergência. Apontarei os dois. E fundamentarei: “quem está certo, em meu ponto de vista, é o Rio!”. Aponto divergência na jurisprudência, e demonstro que tribunais do país estão julgando diferentemente em relação à lei federal.

Hoje é fácil. Mas imagine no passado, em que não havia Internet. Como pegar um acórdão em outro tribunal que decidiu de maneira diferente do seu? Todos os tribunais editavam revistas de jurisprudência, com acórdãos selecionados. Você, assinante, gastava boas horas do seu dia para lê-las, marcava algo que fosse interessante e guardava a revista, e, na memória, guardava vagamente a ideia do que havia sido deduzido em juízo. Quando viesse um caso que julgava de uma forma, você se lembrava. Estagiário tinha até mais valor naquele tempo! Hoje usamos a pesquisa em banco de dados com “força bruta”, digitando todas as possíveis combinações de termos que possam constar da ementa, e, quando algo for encontrado, usamos o maravilhoso Ctrl+F. Hoje basta imprimir o acórdão em que apontamos a divergência.

Outros tribunais: podemos apontar como divergente o próprio órgão prolator da decisão? Outro órgão interno, como turma e câmaras? Não podemos! As decisões têm que ser de tribunais distintos. E como fica quando a divergência é do mesmo tribunal? Não podemos fazer nada. Temos que fazer um incidente de uniformização, o que não é vinculado, então sinto muito mesmo. É questão de azar e sorte em relação ao desembargador de um tribunal que irá apreciar o caso. Podemos, entretanto, apontar diferença entre TJ e TRF, desde que julguem de forma diferente uma mesma questão, afinal, são tribunais distintos. “STJ, diga o Direito e uniformize!”
 

Prazo do recurso especial

Quinze dias. E tem recurso adesivo, não se esqueçam. Sempre vejam o art. 500, inciso II do CPC para saber se cabe recurso adesivo para cada espécie recursal. Não se esqueçam, entretanto, da hipótese de cabimento de embargos infringentes contra parte do acórdão, como já falamos algumas vezes. Se o acórdão tem um pedaço do qual cabem embargos infringentes e um do qual não cabem, quem apresenta embargos infringentes provoca o sobrestamento do prazo. Só inicia o prazo ou depois do julgamento dos embargos infringentes ou depois do trânsito em julgado. Aí é através de recurso especial contra a parte que não cabiam embargos infringentes que será possível o prolongamento da discussão. Art. 498 do Código de Processo.
 

Preparo

O recurso especial tem preparo. Até há pouco não se pagavam custas no STJ. E aqui tenha certeza do preparo! Os assessores olharão erros na guia de qualquer forma. Não se esqueçam da filtragem maliciosa. Não aceitam pagamento pela Internet, nem com número da autenticação. Por isso a guia de preparo é fundamental. O professor mesmo paga sempre presencialmente no banco.
 

Regularidade formal

Recurso especial tem ser interposto via petição, e não oral. Direcionada a quem? Quem faz o primeiro juízo de admissibilidade? O presidente ou vice do tribunal de origem. “Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente do Tribunal Regional Federal da __ Região.” Ou “Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios”. TJ ou TRF. Ele fará o primeiro juízo de admissibilidade.

Fundamentação: vinculada, claro. O recurso especial é mais difícil do que a apelação. É vinculada porque a lei, no caso, a Constituição, aponta o que deve ser discutido. Se interpomos recurso especial pela alínea a, devemos apontar a violação ao dispositivo de lei federal. Cite o dispositivo constitucional usado como fundamento do recurso especial, ou seja, o art. 105, inciso III, alínea a, b ou c. É um recurso de fundamentação vinculada. É difícil apontar essa violação, esse confronto. Podemos interpor recurso especial pelas alíneas a, b e c ao mesmo tempo? Podemos, claro. Logo, aqui convém ser detalhista na estética. Aponte desde já o fundamento legal, motivo pelo qual o recurso especial está sendo interposto, ou seja, indicando a respectiva alínea do inciso III do art. 105 da Constituição logo na folha de rosto do recurso. E, dentro, indique com clareza e transcreva o dispositivo de lei federal violado ou ao qual a vigência fora negada.

Por último, cuidado sempre com a procuração.

Súmula 115 do STJ: na instância especial, é inexistente o recurso interposto por advogado sem procuração nos autos.

Já vimos isso antes! Recurso para tribunal superior precisa de procuração ou o recurso é inexistente. No passado era ainda mais formal. Se não se apontasse a alínea na folha de rosto, o recurso não seria conhecido. Mesmo que muito bem fundamentado. Não podemos perder por isso, e desde então flexibiliza-se mais pois seria uma armadilha processual. É um erro escusável. Mas o que é melhor fazer? Colocar, claro! Há requisitos muito subjetivos dos assessores. Eles é quem farão o juízo de admissibilidade, na verdade. Num gabinete com sete assessores, seu recurso poderá cair nas mãos de qualquer um deles, inclusive um que esteja de mau-humor no dia.

Continuamos depois a falar sobre o recurso especial.


1 – Interessante, neste momento, lermos sobre cada órgão interno do Superior Tribunal de Justiça. Em seu site (http://www.stj.jus.br) vemos:

É assim a estrutura hierárquica dos órgãos julgadores do STJ: