Breve revisão da aula passada
Hoje
vamos estudar defeitos das
decisões, juízo de admissibilidade, juízo de mérito e juízo de
retratação. Na
aula passada estudamos o conceito de decisão, então vamos recapitular.
O
professor mando-nos a oitava edição do livro, mas na parte de teoria
geral dos
recursos nós podemos usar a sétima.
Vimos
que o processo tem vários
atos, mas somente os atos jurisdicionais importam para a temática dos
recursos.
E não todos; somente os pronunciamentos judiciais, e que causem
prejuízo ou
resolvam ponto controvertido. As decisões são, em regra, recorríveis.
Esse é o
princípio da recorribilidade.
Os
atos que somente impulsionam o
processo são despachos, que são irrecorríveis. Se fosse o caso de uma
manifestação ter aparência de despacho mas causar prejuízo ou resolver
questão,
ela será uma decisão, e será recorrível.
Não
adianta tentarmos listar
quais são os “despachos aparentes” recorríveis. Dependerá do caso
concreto. Não
interessa, também, o nome dado pelo juiz ao seu próprio pronunciamento;
temos
que verificar o conteúdo para verificar se trata-se de um despacho ou
decisão.
Quais
os tipos de decisões
judiciais? Sentença, decisão interlocutória, acórdão e decisão
monocrática.
Para diferenciar, na segunda instância, temos que saber quem proferiu.
Acórdão
tem relatório, votos, ementa e certidão de julgamento. A decisão
monocrática é
dada por somente um membro do Tribunal. Desembargador, Juiz de TRF ou
Ministro
do STF ou STJ. Em regra, as decisões proferidas por tribunais são
colegiadas.
Entretanto, como vimos, diante da quantidade de processos,
especialmente por
causa dos planos econômicos, temos muitas decisões monocráticas.
Defeitos das decisões
Vamos
ver que, se alguém está
recorrendo de uma decisão judicial proferida, esta parte alegará um
defeito.
Manifestará a discordância da decisão por algum defeito. E quais são
esses
defeitos? O que pode ser impugnado? O que pode ser alegado?
São
basicamente dois defeitos que
uma decisão pode ter. O que pode ser alegado ou impugnado em um
recurso? São os
chamados error in procedendo e os error in judicando. São essas as duas
perspectivas.
Um desses dois erros será atacado.
O
que é error in
procedendo?
Qualquer ato processual tem que ser visto sob duas óticas: se o ato
processual
é válido. Como assim? Se preenche
os
requisitos formais. Para proferir uma decisão judicial, o juiz precisa
ser
competente. De nada adianta uma decisão maravilhosa e exaustiva sobre
ação
ordinária de cobrança proferida por um juiz do trabalho. A decisão,
para ser
válida, deverá ser proferida por juiz competente, ter fundamentação,
julgar a
pretensão na forma em que foi posta, entre outros. Deve preencher seus
requisitos formais.
A
decisão proferida por juiz impedido
é nula, por melhor redigida que esteja. É um erro de forma, um error in procedendo. Vem antes do
conteúdo; não interessa o que está dito. Não observou os requisitos
formais.
Outros exemplos: falta de fundamentação, julgamento extra
petita, já que o juiz é obrigado a julgar nos limites do
pedido, da pretensão. A decisão é nula, e tem um erro de forma, de
estrutura,
um error in procedendo. Enseja
recurso.
O
que isso acarreta? A cassação da
decisão. E aqui começamos a
ver coisas novas. O que se pede no recurso? “À vista do exposto, pugno
pela
anulação/cassação da decisão”. Se o recurso for acolhido, a decisão é
eliminada. Pode causar a devolução da causa ao órgão julgador para
reformulá-la, mas não é excluída do processo. Permanecerá nos autos.
Cuidado,
entretanto, com essa expressão “excluída do processo: ela fica nos
autos, mas é
tornada sem
efeito.
Certo.
Digamos que foi proferida
uma decisão mas depois a parte interessada notou que o juízo era
incompetente.
Ela interpõe um recurso atacando essa decisão. Entretanto, a decisão
está boa,
bem fundamentada e articulada, é justa e não deixa de apreciar nenhum
ponto do
pedido. Pode-se convalidá-la? Não! De forma alguma, pois se trata de
nulidade
absoluta. O princípio que justifica isso é a segurança jurídica. As
regras têm
que ser observadas por todos, inclusive o juiz.
O
error in procedendo é um erro que
contamina a decisão, a forma.
Note que falamos vários exemplos vinculados à própria decisão, como
julgamento extra petita.
E
se se tratar de erro no
processo, como a não participação do Ministério Público quando ele
deveria ter
atuado? A parte recorre, não atacando a decisão no mérito, mas sim no
processo,
consequentemente a decisão? Também é um error
in procedendo. Com efeito, cassa-se a decisão. Nulidade de
citação é outro
exemplo. Consequentemente o processo é anulado desde a citação.
O
error in procedendo pode macular a
decisão ou o processo.
Vincula-se às regras processuais.
Ao
redigir um recurso, a primeira coisa a ser vista é se há um error in procedendo. Antes mesmo do
conteúdo. Se há vício, ele deve ser alegado.
Error in judicando
O
segundo defeito da decisão é o error in
judicando, que diz respeito ao
erro de julgamento, ao conteúdo da decisão. O que se ataca é o conteúdo
da
decisão, mesmo que todos os requisitos formais tenham sido observados.
É um
erro na análise do direito. É para o que atentamos depois de depois de
verificados os requisitos formais: o conteúdo. A decisão está correta,
decidindo nos termos da lei, da doutrina e da jurisprudência?
Se
o recurso for acolhido ou
provido, a decisão é reformada, e
não
cassada. Há uma substituição da decisão reformada por uma nova.
Exemplo:
redução do valor do dano moral.
E
se não tiver defeito nenhum? O
recurso será negado e a decisão será mantida. A decisão pode, depois de
um
recurso, ser cassada, reformada ou mantida. Tudo integralmente ou em
parte.
Essas são as consequências do julgamento de um recurso.
Mas
aprendam a redigir
corretamente o recurso! Na prática erramos tanto que acaba que a
doutrina e a
jurisprudência aceitam. Mas não vamos errar mais. O que devemos saber é
o que
pedir. Se falamos de error in procedendo,
o que queremos é a anulação ou a cassação da decisão. Se não atacamos a
estrutura, mas o conteúdo em si, pedimos a reforma.
Pessoas trocam demais na prática esses termos. Acaba passando.
Princípio da eventualidade
Estudamos
o princípio da
eventualidade em contestação. Todas as matérias de defesa precisam ser
suscitadas na mesma peça, no mesmo momento, ainda que aparentemente
incompatíveis entre si. Vamos redigir um recurso. Concluímos que a
decisão tem
um vício de forma, mal fundamentada, ou o pronunciamento judicial é
nulo por
não ter fundamentação. Alegamos preliminarmente o error
in procedendo. Mas e agora? Temos que alegar somente o error in procedendo? Não. Devemos alegar
os dois defeitos no mesmo recurso, se houver, na mesma oportunidade. A
questão
de forma pode não ser acolhida. Então, “na eventualidade de ser
superada a
alegação do error in procedendo, a
decisão também está errada do ponto de vista do conteúdo.” Não se pode
guardar
cartas na manga aqui, coisa que só devemos fazer se houver uma
estratégia
processual, que a parte assumirá o risco de usar.
E
o error in
judicando, a que está
vinculado? Ao conteúdo da decisão. Discutimos direito material e
direito
processual. O juiz profere decisão dizendo: “eu sou competente”, numa
exceção
de incompetência. Não há defeito de forma. Aqui é que podemos nos
confundir:
como as exceções estão disciplinadas no Código de Processo Civil,
pensamos que
se trata de um defeito de forma, mas na verdade é de mérito. O que
resta é
apontar em caso de acharmos que Sua Excelência é incompetente é o error in judicando, o mérito, mesmo que
o fundamento esteja na lei processual.
Juízo de admissibilidade e juízo de mérito
Vamos
voltar à questão do ato
processual. A palavra “juízo”, aqui é usada no sentido de valoração, de
exame,
de análise. Exame da admissibilidade, exame do mérito. Todo ato
processual deve
ser visto sob duas óticas: primeiramente a processual, depois a
meritória. No
recurso funciona do mesmo jeito. O ato de recorrer tem, primeiro, que
ser admissível, ou seja, preencher
os
requisitos formais vinculados ao exercício desse ato. A lei diz quais
os
requisitos. Quais os requisitos que a parte tem que preencher para o
recurso
ser analisado?
O
recurso tem primeiro que
preencher os requisitos que a lei impõe para seu exercício.
Preenchidos,
examina-se o conteúdo do recurso. Um caso de fácil compreensão: a lei
impõe
prazos para o exercício de atos. Tenho 15 dias para apresentar um
recurso.
Apresentado no 16º, mesmo que esteja parecendo uma tese de doutorado,
de nada
adiantará. Os requisitos formais que a lei impõe para o exercício
daquele ato
não foram preenchidos. O juízo de admissibilidade é exatamente isso: a
análise
dos requisitos formais.
O
juízo de admissibilidade é
questão prejudicial para que se passe ao juízo de mérito. A partir da
próxima
aula vamos estudar quais são os requisitos impostos pela lei. Prazo é
um deles.
Isso é fundamental para os profissionais do Direito. Advogados não
podem
vacilar nas regras do jogo. Perder por causa de guia
de preparo mal escrita ou estagiário que fura pneu é mais do
que frustrante.
Há
servidores que apenas procuram
defeitos nos recursos para evitar o julgamento, infelizmente. E existe jurisprudência do
mal também, criada para diminuir recursos politicamente,
filtrando-os artificiosamente.
Mais
um detalhe: sabemos quais
são os requisitos formais. Perder prazo é inaceitável.
São
juízos distintos a
admissibilidade e o mérito. São momentos independentes.
Pergunta
de prova: proferida decisão, a parte recorre, o tribunal
lê o recurso, e
vê que o juiz proferiu uma decisão completamente absurda. Usou
argumentos
chulos, lei inconstitucional, mas com um detalhe: o recurso é
intempestivo. O
relator, sentindo-se mal pelo trabalho feito na decisão proferida pelo
juiz de
primeira instância, resolve cassá-la por ser a questão de ordem
pública, como haver
uma nulidade absoluta. A resposta é: “sinto muito”. Não
ultrapassada a admissibilidade, não há análise do mérito. Se
quiser, a parte poderá ajuizar uma ação autônoma de impugnação, se for
o caso.
Qual
o objeto do juízo de
admissibilidade? O que é valorado nele? Os requisitos de
admissibilidade do
recurso, que são condições impostas pela
lei para a análise da pretensão recursal. Os requisitos
gerais veremos a
partir da próxima aula.
E
a competência? Quem analisa os
requisitos de admissibilidade? O juízo a
quo, ou o ad quem?
Significa,
como já devemos saber, juízo de origem e juízo de destino. O juízo a quo é o juízo que proferiu a decisão.
O juízo ad quem é o juízo que irá
julgar o recurso. De onde vem e para onde vai o recurso,
respectivamente.
Nalguns casos, é o mesmo juízo. O próprio órgão que proferiu a decisão
irá
julgar o recurso. Normalmente são órgãos diferentes. Cuidado! Juízo a quo não necessariamente é juiz de
primeiro grau. Até o STJ pode ser juízo a
quo.
A
competência para análise da
admissibilidade é dos dois juízos. Duplo exame mesmo, de forma
independente.
Inclusive sobre a tempestividade! O juízo a
quo é uma peneira. Ambos os juízos têm a obrigação de fazer o
juízo de
admissibilidade, por imposição legal.
Mas
há recursos que só o juízo ad quem
analisa a admissibilidade? Sim,
há; mas estudaremos depois.
Quando
da admissão do recurso,
são proferidas, nos autos, expressões como “subam os autos.”
“Remetam-se ao
juízo ad quem.” O juízo a quo também pode negar a remessa dos
autos. É uma decisão que trava o trânsito do recurso. “não remeto, pois
o
recurso é intempestivo”.
Dessa
decisão há recurso? Sim! O
objeto será destravar um recurso anterior que foi travado.
Terminologia
Qual
a expressão usada pelo juízo
a quo? “Admito o recurso”. Não
preenchidos os requisitos, será “não admito o recurso”. Dizemos, então,
que o
recurso é admitido no juízo a quo. E do juízo ad
quem? “Conheço do recurso”, ou “não conheço do recurso”.
Portanto, o recurso é conhecido ou não pelo
juízo ad quem. Recurso não
conhecido
não pode ser provido.
Juízo de mérito
E
no juízo de mérito? O que se
quer? Falamos da pretensão. Mérito = pretensão. Qual a pretensão
recursal? O
mérito do recurso. O que a parte pretende. O objeto do juízo de mérito
é a
análise da pretensão recursal. Irá analisar se as decisões têm defeito,
se têm
que ser mantidas, reformadas ou cassadas. O juízo ad
quem irá analisar a pretensão da parte. O que ela quer?
Cassar,
reformar?
O
juízo de mérito só é feito pelo
juízo ad quem.
Neste
momento, sem imaginar
coisas fora desta aula, exceções ou caso concretos: o juiz profere uma
sentença, a parte recorre. Ele deverá fazer a análise da
admissibilidade desse
recurso. Mas o juiz é curioso e lê a apelação por inteiro. Entende que
errou no
mérito, e admite para si mesmo, colocando a mão na própria cabeça pelo
erro que
cometera. Pode ele mudar a própria decisão que proferiu? Não! Porque
cabe a ele
fazer somente a admissibilidade do
recurso. A admissibilidade não é mérito, e cabe ao juízo ad
quem. Como regra, o juiz não poderá rever sua própria decisão.
Só
depois veremos casos em que o
juiz poderá alterar sua própria decisão. Juízo a
quo analisa só admissibilidade, enquanto o ad
quem analisa a admissibilidade e o mérito.
No
juízo de mérito, o recurso é provido ou não provido. Será provido quando as
razões recursais são
acolhidas. A consequência é a cassação ou reforma da decisão recorrida.
Se não
for provido, a decisão é mantida.
Resumindo,
então: proferida a
decisão judicial, a parte pode sentir-se insatisfeita. A ideia que ela
terá
será interpor um recurso. No recurso ela atacará tanto possíveis erros
de forma
quanto de julgamento, alegando respectivamente o error
in procedendo ou o error
in judicando. Interposto o recurso, o próprio juízo a quo,
quem proferiu a
decisão, irá fazer o juízo de admissibilidade; em que decidirá pela
admissão ou
não do recurso. Se não admitido, a decisão é mantida. Se admitido, o
juiz se
manifesta pela "subida" do recurso ao juízo ad quem, que novamente
analisará sua admissibilidade. Se entender inadmissível, o juízo ad
quem não
conhecerá do recurso; não usaremos o termo "admitido", mas
"conhecido" no juízo ad quem. Se passar pelo filtro da
admissibilidade, o juízo ad quem conhecerá do recurso, e passará ao
juízo de
mérito, que deverá terminar no provimento ou não provimento, a depender
da
valoração das razões recursais.
No
juízo de admissibilidade, a
admissão e o conhecimento precisam ser explícitos, ou podem ser
implícitos? Se
um recurso foi levado a julgamento do seu mérito, a “aprovação” pelo
juízo de
admissibilidade poderá ser implícita. Presume-se admitido o recurso no
qual
está-se analisando o mérito, por exemplo quando assistimos as sessões
do
Supremo na TV Justiça, salvo quando
provocado o juízo. Quando o juízo de admissibilidade for
negativo, a
decisão que não acolhe deve ser explícita.
No
mérito, claro, terá sempre que
ser explícita a valoração.
Questão:
contra a decisão do
juízo a quo que admite o recurso da
parte contrária, que não queria sua admissão, cabe recurso, ou não
precisa?
Para refletirmos.