Direito Processual Civil

quarta-feira, 2 de março de 2011

Defeitos das decisões, juízo de admissibilidade, juízo de mérito e juízo de retratação



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  1. Defeitos das decisoes
  2. Juízo de admissibilidade / Juízo de mérito
  3. Juízo de retratação

Breve revisão da aula passada

Hoje vamos estudar defeitos das decisões, juízo de admissibilidade, juízo de mérito e juízo de retratação. Na aula passada estudamos o conceito de decisão, então vamos recapitular. O professor mando-nos a oitava edição do livro, mas na parte de teoria geral dos recursos nós podemos usar a sétima.

Vimos que o processo tem vários atos, mas somente os atos jurisdicionais importam para a temática dos recursos. E não todos; somente os pronunciamentos judiciais, e que causem prejuízo ou resolvam ponto controvertido. As decisões são, em regra, recorríveis. Esse é o princípio da recorribilidade.

Os atos que somente impulsionam o processo são despachos, que são irrecorríveis. Se fosse o caso de uma manifestação ter aparência de despacho mas causar prejuízo ou resolver questão, ela será uma decisão, e será recorrível.

Não adianta tentarmos listar quais são os “despachos aparentes” recorríveis. Dependerá do caso concreto. Não interessa, também, o nome dado pelo juiz ao seu próprio pronunciamento; temos que verificar o conteúdo para verificar se trata-se de um despacho ou decisão.

Quais os tipos de decisões judiciais? Sentença, decisão interlocutória, acórdão e decisão monocrática. Para diferenciar, na segunda instância, temos que saber quem proferiu. Acórdão tem relatório, votos, ementa e certidão de julgamento. A decisão monocrática é dada por somente um membro do Tribunal. Desembargador, Juiz de TRF ou Ministro do STF ou STJ. Em regra, as decisões proferidas por tribunais são colegiadas. Entretanto, como vimos, diante da quantidade de processos, especialmente por causa dos planos econômicos, temos muitas decisões monocráticas.
 

Defeitos das decisões

Vamos ver que, se alguém está recorrendo de uma decisão judicial proferida, esta parte alegará um defeito. Manifestará a discordância da decisão por algum defeito. E quais são esses defeitos? O que pode ser impugnado? O que pode ser alegado?

São basicamente dois defeitos que uma decisão pode ter. O que pode ser alegado ou impugnado em um recurso? São os chamados error in procedendo e os error in judicando. São essas as duas perspectivas. Um desses dois erros será atacado.

O que é error in procedendo? Qualquer ato processual tem que ser visto sob duas óticas: se o ato processual é válido. Como assim? Se preenche os requisitos formais. Para proferir uma decisão judicial, o juiz precisa ser competente. De nada adianta uma decisão maravilhosa e exaustiva sobre ação ordinária de cobrança proferida por um juiz do trabalho. A decisão, para ser válida, deverá ser proferida por juiz competente, ter fundamentação, julgar a pretensão na forma em que foi posta, entre outros. Deve preencher seus requisitos formais.

A decisão proferida por juiz impedido é nula, por melhor redigida que esteja. É um erro de forma, um error in procedendo. Vem antes do conteúdo; não interessa o que está dito. Não observou os requisitos formais. Outros exemplos: falta de fundamentação, julgamento extra petita, já que o juiz é obrigado a julgar nos limites do pedido, da pretensão. A decisão é nula, e tem um erro de forma, de estrutura, um error in procedendo. Enseja recurso.

O que isso acarreta? A cassação da decisão. E aqui começamos a ver coisas novas. O que se pede no recurso? “À vista do exposto, pugno pela anulação/cassação da decisão”. Se o recurso for acolhido, a decisão é eliminada. Pode causar a devolução da causa ao órgão julgador para reformulá-la, mas não é excluída do processo. Permanecerá nos autos. Cuidado, entretanto, com essa expressão “excluída do processo: ela fica nos autos, mas é tornada sem efeito.

Certo. Digamos que foi proferida uma decisão mas depois a parte interessada notou que o juízo era incompetente. Ela interpõe um recurso atacando essa decisão. Entretanto, a decisão está boa, bem fundamentada e articulada, é justa e não deixa de apreciar nenhum ponto do pedido. Pode-se convalidá-la? Não! De forma alguma, pois se trata de nulidade absoluta. O princípio que justifica isso é a segurança jurídica. As regras têm que ser observadas por todos, inclusive o juiz.

O error in procedendo é um erro que contamina a decisão, a forma. Note que falamos vários exemplos vinculados à própria decisão, como julgamento extra petita.

E se se tratar de erro no processo, como a não participação do Ministério Público quando ele deveria ter atuado? A parte recorre, não atacando a decisão no mérito, mas sim no processo, consequentemente a decisão? Também é um error in procedendo. Com efeito, cassa-se a decisão. Nulidade de citação é outro exemplo. Consequentemente o processo é anulado desde a citação.

O error in procedendo pode macular a decisão ou o processo. Vincula-se às regras processuais. Ao redigir um recurso, a primeira coisa a ser vista é se há um error in procedendo. Antes mesmo do conteúdo. Se há vício, ele deve ser alegado.
 

Error in judicando

O segundo defeito da decisão é o error in judicando, que diz respeito ao erro de julgamento, ao conteúdo da decisão. O que se ataca é o conteúdo da decisão, mesmo que todos os requisitos formais tenham sido observados. É um erro na análise do direito. É para o que atentamos depois de depois de verificados os requisitos formais: o conteúdo. A decisão está correta, decidindo nos termos da lei, da doutrina e da jurisprudência?

Se o recurso for acolhido ou provido, a decisão é reformada, e não cassada. Há uma substituição da decisão reformada por uma nova. Exemplo: redução do valor do dano moral.

E se não tiver defeito nenhum? O recurso será negado e a decisão será mantida. A decisão pode, depois de um recurso, ser cassada, reformada ou mantida. Tudo integralmente ou em parte. Essas são as consequências do julgamento de um recurso.

Mas aprendam a redigir corretamente o recurso! Na prática erramos tanto que acaba que a doutrina e a jurisprudência aceitam. Mas não vamos errar mais. O que devemos saber é o que pedir. Se falamos de error in procedendo, o que queremos é a anulação ou a cassação da decisão. Se não atacamos a estrutura, mas o conteúdo em si, pedimos a reforma. Pessoas trocam demais na prática esses termos. Acaba passando.
 

Princípio da eventualidade

Estudamos o princípio da eventualidade em contestação. Todas as matérias de defesa precisam ser suscitadas na mesma peça, no mesmo momento, ainda que aparentemente incompatíveis entre si. Vamos redigir um recurso. Concluímos que a decisão tem um vício de forma, mal fundamentada, ou o pronunciamento judicial é nulo por não ter fundamentação. Alegamos preliminarmente o error in procedendo. Mas e agora? Temos que alegar somente o error in procedendo? Não. Devemos alegar os dois defeitos no mesmo recurso, se houver, na mesma oportunidade. A questão de forma pode não ser acolhida. Então, “na eventualidade de ser superada a alegação do error in procedendo, a decisão também está errada do ponto de vista do conteúdo.” Não se pode guardar cartas na manga aqui, coisa que só devemos fazer se houver uma estratégia processual, que a parte assumirá o risco de usar.

E o error in judicando, a que está vinculado? Ao conteúdo da decisão. Discutimos direito material e direito processual. O juiz profere decisão dizendo: “eu sou competente”, numa exceção de incompetência. Não há defeito de forma. Aqui é que podemos nos confundir: como as exceções estão disciplinadas no Código de Processo Civil, pensamos que se trata de um defeito de forma, mas na verdade é de mérito. O que resta é apontar em caso de acharmos que Sua Excelência é incompetente é o error in judicando, o mérito, mesmo que o fundamento esteja na lei processual.
 

Juízo de admissibilidade e juízo de mérito

Vamos voltar à questão do ato processual. A palavra “juízo”, aqui é usada no sentido de valoração, de exame, de análise. Exame da admissibilidade, exame do mérito. Todo ato processual deve ser visto sob duas óticas: primeiramente a processual, depois a meritória. No recurso funciona do mesmo jeito. O ato de recorrer tem, primeiro, que ser admissível, ou seja, preencher os requisitos formais vinculados ao exercício desse ato. A lei diz quais os requisitos. Quais os requisitos que a parte tem que preencher para o recurso ser analisado?

O recurso tem primeiro que preencher os requisitos que a lei impõe para seu exercício. Preenchidos, examina-se o conteúdo do recurso. Um caso de fácil compreensão: a lei impõe prazos para o exercício de atos. Tenho 15 dias para apresentar um recurso. Apresentado no 16º, mesmo que esteja parecendo uma tese de doutorado, de nada adiantará. Os requisitos formais que a lei impõe para o exercício daquele ato não foram preenchidos. O juízo de admissibilidade é exatamente isso: a análise dos requisitos formais.

O juízo de admissibilidade é questão prejudicial para que se passe ao juízo de mérito. A partir da próxima aula vamos estudar quais são os requisitos impostos pela lei. Prazo é um deles. Isso é fundamental para os profissionais do Direito. Advogados não podem vacilar nas regras do jogo. Perder por causa de guia de preparo mal escrita ou estagiário que fura pneu é mais do que frustrante.

Há servidores que apenas procuram defeitos nos recursos para evitar o julgamento, infelizmente. E existe jurisprudência do mal também, criada para diminuir recursos politicamente, filtrando-os artificiosamente.

Mais um detalhe: sabemos quais são os requisitos formais. Perder prazo é inaceitável.

São juízos distintos a admissibilidade e o mérito. São momentos independentes.

Pergunta de prova: proferida decisão, a parte recorre, o tribunal lê o recurso, e vê que o juiz proferiu uma decisão completamente absurda. Usou argumentos chulos, lei inconstitucional, mas com um detalhe: o recurso é intempestivo. O relator, sentindo-se mal pelo trabalho feito na decisão proferida pelo juiz de primeira instância, resolve cassá-la por ser a questão de ordem pública, como haver uma nulidade absoluta. A resposta é: “sinto muito”. Não ultrapassada a admissibilidade, não há análise do mérito. Se quiser, a parte poderá ajuizar uma ação autônoma de impugnação, se for o caso.

Qual o objeto do juízo de admissibilidade? O que é valorado nele? Os requisitos de admissibilidade do recurso, que são condições impostas pela lei para a análise da pretensão recursal. Os requisitos gerais veremos a partir da próxima aula.

E a competência? Quem analisa os requisitos de admissibilidade? O juízo a quo, ou o ad quem? Significa, como já devemos saber, juízo de origem e juízo de destino. O juízo a quo é o juízo que proferiu a decisão. O juízo ad quem é o juízo que irá julgar o recurso. De onde vem e para onde vai o recurso, respectivamente. Nalguns casos, é o mesmo juízo. O próprio órgão que proferiu a decisão irá julgar o recurso. Normalmente são órgãos diferentes. Cuidado! Juízo a quo não necessariamente é juiz de primeiro grau. Até o STJ pode ser juízo a quo.

A competência para análise da admissibilidade é dos dois juízos. Duplo exame mesmo, de forma independente. Inclusive sobre a tempestividade! O juízo a quo é uma peneira. Ambos os juízos têm a obrigação de fazer o juízo de admissibilidade, por imposição legal.

Mas há recursos que só o juízo ad quem analisa a admissibilidade? Sim, há; mas estudaremos depois.

Quando da admissão do recurso, são proferidas, nos autos, expressões como “subam os autos.” “Remetam-se ao juízo ad quem.” O juízo a quo também pode negar a remessa dos autos. É uma decisão que trava o trânsito do recurso. “não remeto, pois o recurso é intempestivo”.

Dessa decisão há recurso? Sim! O objeto será destravar um recurso anterior que foi travado.
 

Terminologia

Qual a expressão usada pelo juízo a quo? “Admito o recurso”. Não preenchidos os requisitos, será “não admito o recurso”. Dizemos, então, que o recurso é admitido no juízo a quo. E do juízo ad quem? “Conheço do recurso”, ou “não conheço do recurso”. Portanto, o recurso é conhecido ou não pelo juízo ad quem. Recurso não conhecido não pode ser provido.
 

Juízo de mérito

E no juízo de mérito? O que se quer? Falamos da pretensão. Mérito = pretensão. Qual a pretensão recursal? O mérito do recurso. O que a parte pretende. O objeto do juízo de mérito é a análise da pretensão recursal. Irá analisar se as decisões têm defeito, se têm que ser mantidas, reformadas ou cassadas. O juízo ad quem irá analisar a pretensão da parte. O que ela quer? Cassar, reformar?

O juízo de mérito só é feito pelo juízo ad quem.

Neste momento, sem imaginar coisas fora desta aula, exceções ou caso concretos: o juiz profere uma sentença, a parte recorre. Ele deverá fazer a análise da admissibilidade desse recurso. Mas o juiz é curioso e lê a apelação por inteiro. Entende que errou no mérito, e admite para si mesmo, colocando a mão na própria cabeça pelo erro que cometera. Pode ele mudar a própria decisão que proferiu? Não! Porque cabe a ele fazer somente a admissibilidade do recurso. A admissibilidade não é mérito, e cabe ao juízo ad quem. Como regra, o juiz não poderá rever sua própria decisão.

Só depois veremos casos em que o juiz poderá alterar sua própria decisão. Juízo a quo analisa só admissibilidade, enquanto o ad quem analisa a admissibilidade e o mérito.

No juízo de mérito, o recurso é provido ou não provido. Será provido quando as razões recursais são acolhidas. A consequência é a cassação ou reforma da decisão recorrida. Se não for provido, a decisão é mantida.

Resumindo, então: proferida a decisão judicial, a parte pode sentir-se insatisfeita. A ideia que ela terá será interpor um recurso. No recurso ela atacará tanto possíveis erros de forma quanto de julgamento, alegando respectivamente o error in procedendo ou o error in judicando. Interposto o recurso, o próprio juízo a quo, quem proferiu a decisão, irá fazer o juízo de admissibilidade; em que decidirá pela admissão ou não do recurso. Se não admitido, a decisão é mantida. Se admitido, o juiz se manifesta pela "subida" do recurso ao juízo ad quem, que novamente analisará sua admissibilidade. Se entender inadmissível, o juízo ad quem não conhecerá do recurso; não usaremos o termo "admitido", mas "conhecido" no juízo ad quem. Se passar pelo filtro da admissibilidade, o juízo ad quem conhecerá do recurso, e passará ao juízo de mérito, que deverá terminar no provimento ou não provimento, a depender da valoração das razões recursais.

No juízo de admissibilidade, a admissão e o conhecimento precisam ser explícitos, ou podem ser implícitos? Se um recurso foi levado a julgamento do seu mérito, a “aprovação” pelo juízo de admissibilidade poderá ser implícita. Presume-se admitido o recurso no qual está-se analisando o mérito, por exemplo quando assistimos as sessões do Supremo na TV Justiça, salvo quando provocado o juízo. Quando o juízo de admissibilidade for negativo, a decisão que não acolhe deve ser explícita.

No mérito, claro, terá sempre que ser explícita a valoração.

Questão: contra a decisão do juízo a quo que admite o recurso da parte contrária, que não queria sua admissão, cabe recurso, ou não precisa? Para refletirmos.