Direito Processual Civil

terça-feira, 5 de abril de 2011

O recurso adesivo


Professora Renata Antony

 

Hoje vamos falar sobre o recurso adesivo. Professor Renato designou sua amiga Renata para estar conosco hoje e amanhã.

Art. 500. Cada parte interporá o recurso, independentemente, no prazo e observadas as exigências legais. Sendo, porém, vencidos autor e réu, ao recurso interposto por qualquer deles poderá aderir a outra parte. O recurso adesivo fica subordinado ao recurso principal e se rege pelas disposições seguintes:  [...]

O caput do art. 500 do CPC prevê a hipótese de, sendo vencidos autor e réu, a outra parte poderá aderir ao recurso da parte adversa. O primeiro ponto, aqui, é que a interposição do recurso adesivo pressupõe a sucumbência recíproca, e também que a outra parte tenha interposto recurso principal. Exemplo: Antuíno, autor, ajuíza ação de indenização pedindo R$ 10 mil por danos morais e materiais em face de Rouboaldo, réu. A sentença condena Rouboaldo ao pagamento de R$ 8 mil ao autor Antuíno. Este pode ficar satisfeito ou recorrer para buscar a parte que deixou de ganhar, no caso, os R$ 2 mil. Mas não; ele resolve não recorrer. No entanto, Rouboaldo se sente lesado pela sucumbência de R$ 8 mil e recorre. Antuíno, então, resolve aproveitar a oportunidade e pleitear os outros R$ 2 mil que poderia ter recebido. Como ele fará isso? É aqui que entra o conceito de o recurso adesivo. Serve para possibilitar ao jurisdicionado vencido a contra-atacar se a outra parte recorrer.

Um sucumbente só pode aderir se a outra parte houver interposto recurso principal.

Voltemos ao Código:

Art. 496. São cabíveis os seguintes recursos:

I - apelação;

II - agravo;

III - embargos infringentes;

IV - embargos de declaração;

V - recurso ordinário;

Vl - recurso especial;

Vll - recurso extraordinário;

VIII - embargos de divergência em recurso especial e em recurso extraordinário.

Este artigo apresenta o rol taxativo de todas as espécies recursais cabíveis. Logo notamos que o recurso adesivo não está aqui. O recurso adesivo, apesar de ter esse nome, é mesmo um recurso? Não! É uma forma procedimental secundária.

O juízo de admissibilidade do recurso adesivo está vinculado ao juízo de admissibilidade do recurso principal. Se este não for conhecido por qualquer motivo, o recurso adesivo nem será analisado.

E em relação ao mérito? Estão vinculados os méritos do recurso principal e do recurso adesivo? Não. O juízo de mérito de um não interfere no juízo de mérito de outro. Mas há uma exceção, entretanto. O autor Armandi Jorge ajuíza ação, digamos, de ressarcimento, e a sentença julga procedente a ação, condenando a ré R. Era Carolina a pagar honorários advocatícios no valor de 10% do valor da causa. A ré recorre. Nisso, o autor Armandi interpõe recurso adesivo, para obter honorários advocatícios no valor de 20%, não 10%. O juízo ad quem reforma inteiramente a sentença. O que acontece? Os ônus de sucumbência são invertidos e, neste caso, o juízo de mérito do recurso adesivo ficará prejudicado. Isso ocorre em função do efeito extensivo dos recursos. É o único caso em que o juízo de mérito de um interferirá no do outro.

O juízo de mérito do recurso adesivo só será feito se estiverem preenchidos os requisitos de admissibilidade de ambos os recursos. O recurso adesivo, entretanto, também precisa preencher os requisitos de admissibilidade do recurso ao qual está aderindo.

Vamos, agora, analisar os incisos do art. 500.

Art. 500. Cada parte interporá o recurso, independentemente, no prazo e observadas as exigências legais. Sendo, porém, vencidos autor e réu, ao recurso interposto por qualquer deles poderá aderir a outra parte. O recurso adesivo fica subordinado ao recurso principal e se rege pelas disposições seguintes:

I - será interposto perante a autoridade competente para admitir o recurso principal, no prazo de que a parte dispõe para responder;

II - será admissível na apelação, nos embargos infringentes, no recurso extraordinário e no recurso especial;

III - não será conhecido, se houver desistência do recurso principal, ou se for ele declarado inadmissível ou deserto.

Parágrafo único. Ao recurso adesivo se aplicam as mesmas regras do recurso independente, quanto às condições de admissibilidade, preparo e julgamento no tribunal superior.

Estávamos falando sobre o juízo de admissibilidade. Se o recurso principal for intempestivo, a outra parte poderá interpor recurso adesivo? E se for deserto por falta de preparo? Em todos esses casos o recurso adesivo não poderá ser usado, pois seria burla da lei, especificamente em relação ao inciso III do art. 500.

Em relação aos requisitos de admissibilidade extrínsecos, que, para os recursos em geral, são cabimento, legitimidade, forma e preparo, o recurso adesivo só pode aderir a quatro espécies recursais: apelação, embargos infringentes, recurso especial e recurso extraordinário. ¹

Quanto à tempestividade, também temos que dizer que o recurso adesivo também está sujeito às questões dos arts. 188 e 191:

Art. 188.  Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte  for a Fazenda Pública ou o Ministério Público.

Art. 191.  Quando os litisconsortes tiverem diferentes procuradores, ser-lhes-ão contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos.

O recurso adesivo também tem que ser apresentado em petição autônoma, mesmo que apresentado junto com as contrarrazões. Cada um deverá ter sua própria peça. O recurso adesivo tem que ser dirigido à mesma autoridade competente para julgar o recurso principal.

Quanto à legitimidade, o art. 500 deixa bem claro que só podem ajuizar recurso adesivo autor e réu. Ministério Público, como fiscal da lei, e terceiro prejudicado não podem interpô-lo porque não têm legitimidade. Mesmo que o Ministério Público e o terceiro prejudicado possam interpor recurso, eles não podem aderir.

Quanto ao preparo, o recurso principal também está sujeito ao pagamento de preparo se a lei o exigir para o recurso principal. Só haverá a exceção se houver expressa disposição legal nesse sentido, ou se o recorrente adesivo estiver isento por imposição legal. Exemplos: União, município, Distrito Federal e estados são pessoas jurídicas de direito público isentas de preparo. Sobre isso há um julgado do Ministro do STJ Aldir Passarinho, de 2007, transcrito logo mais. Um recurso adesivo foi declarado deserto. O recorrente principal era beneficiário da justiça gratuita, portanto desobrigado do preparo. O aderente, sustentando a tese de que o acessório segue sempre a sorte do principal, deixou de recolher o preparo, porque entendia-se também isento uma vez que as regras de admissibilidade do principal deveriam se estender ao acessório. Mas a regra não é essa. O recurso adesivo também é, por óbvio, um recurso, e somente está isento do preparo o beneficiário da justiça gratuita, independente dos requisitos subjetivos de admissibilidade do recurso principal.

REsp 912336: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL ADESIVO. RECURSO ESPECIAL PRINCIPAL AMPARADO PELA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. BENEFÍCIO QUE NÃO SE ESTENDE AO APELO ADESIVO. PRECEDENTE.

I. A assistência judiciária de que goza a parte que interpõe o recurso principal não se estende à parte contrária, que dela não frui, pelo que imprescindível o recolhimento do preparo do adesivo, sob pena de deserção. [...]

RECURSO ESPECIAL Nº 912.336 - SC (2006/0276403-1)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR: Cuida-se de recurso especial contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina TJSC, cuja ementa encontra-se lavrada nos seguintes termos (fl. e-STJ 429):

"AGRAVO DE DECISAO DE DESERÇAO - DESNECESSIDADE DE PREPARO NO RECURSO PRINCIPAL POR SER O APELANTE BENEFICIÁRIO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA - RECURSO ADESIVO - AUSÊNCIA DE PREPARO - DESERÇAO IMPOSTA - BENEFÍCIO INCOMUNICÁVEL - ÍNDOLE PESSOAL - COMPROVAÇAO DOS PRESSUPOSTOS DESCRITOS NA LEI N. 1.060/50 - RECURSO DESPROVIDO.

"As condições pessoais relativas ao preparo não aproveitam ao recorrente adesivo. Assim, se o recorrente principal está isento de preparo, por gozar de assistência judiciária, esta isenção não aproveita ao recorrente adesivo"(RT 751/333, JTA 129/310)."

Insurge-se a recorrente, Petróleo Brasileiro S/A PETROBRAS, alegando ofensa ao art. 500 do CPC.

Sustenta que, "como subordinado e dependente, segue sempre o recurso adesivo a sorte do recurso principal" e que "o recurso do beneficiário da gratuidade de justiça não está subordinado à análise extrínseca de admissibilidade do preparo, já que não se pode exigi-lo" (fl. e-STJ 441).

Aduz que se o recurso principal não se condiciona a este requisito (preparo), o seu acessório, pela dependência e subordinação, também não pode.
Invoca dissídio pretoriano e postula reforma do aresto hostilizado.
Contrarrazões não apresentadas (certidão à fl. e-STJ 460).
Houve juízo de admissibilidade positivo (fl. e-STJ 471).
É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 912.336 - SC (2006/0276403-1)

VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR (Relator): Não há como se dar guarida à pretensão reformatória.
Com efeito, insurge-se a ora recorrente, PETROBRAS, contra julgado que deixou de conhecer de seu recurso adesivo de apelação por declará-lo deserto, eis que não recolhido o respectivo preparo.
Sustenta a empresa que o recorrente principal goza do benefício da assistência judiciária gratuita e que, diante do que dispõe o art. 500 do CPC, no sentido de que o recurso adesivo segue a sorte do principal, tal benesse legal se estenderia à peça de insurgência adesiva.
Tal interpretação legal, no entanto, não é acompanhada por esta Corte, notadamente porque o parágrafo único do referido art. 500 do CPC, estabelece que se aplicam ao recurso adesivo as mesmas regras do recurso independente, entendido este como aquele que a parte interporia espontaneamente.
Neste sentido: (REsp 799010/SP).
Estando o acórdão recorrido em conformidade com posicionamento adotado por esta Corte Superior, inviável o apelo extremo.
Ante o exposto, não conheço do recurso especial.
É como voto.


Recurso adesivo em remessa necessária

Cabe recurso adesivo em remessa necessária? Como sabemos, a remessa necessária é a condição para que a sentença produza efeitos, e impede o trânsito em julgado até apreciação pelo juízo ad quem.

Entende-se que ali está em jogo o interesse maior, que é o patrimônio público. Então, cabe recurso adesivo no reexame necessário? Não cabe. Isso porque a remessa obrigatória não pode ser confundida com apelação; ela não é recurso. Há até divergência doutrinária em relação a isso, mas a corrente majoritária entende que não cabe por vários motivos. Primeiro porque, como não é recurso, o juiz não tem legitimidade para recorrer. Segundo porque ele também não pode ser tido como terceiro prejudicado em relação à sentença proferida por ele mesmo, e, por último, porque a remessa necessária não está sujeita à tempestividade, que é um dos requisitos de admissibilidade dos recursos. São esses os três motivos que a corrente majoritária entende que não cabe recurso adesivo na remessa necessária.

Outra questão interessante sobre o recurso principal: a desistência. A professora teve um caso em que recorreu de uma sentença. A outra parte aderiu ao recurso dela. Curiosa, tomou seu próprio recurso já interposto e analisou-o novamente, comparando com o adesivo da parte contrária. Fez pesquisa na jurisprudência, e chegou à preocupante conclusão de que o recurso da outra parte tinha mais chances de prosperar do que o dela. Se provido, lhe seria pior. Então resolveu desistir de seu recurso. O mínimo que conseguiria seria manter sua situação já consignada na sentença recorrida.
 

Recurso adesivo nos Juizados Especiais

Cabe recurso adesivo nos Juizados Especiais? No recurso inominado, por exemplo? Ainda não sabemos muito sobre os Juizados Especiais, mas já podemos adiantar antes de estudar a Lei nº 9099/95 que, proferida a sentença, o recurso cabível é o recurso inominado. É como se fosse uma apelação, mas com outro nome. O prazo dele é de 10 dias, e não de 15, como na apelação. Cabe recurso adesivo?

O inciso II do art. 500 admite a adesão àquelas quatro espécies recursais já ditas antes: embargos infringentes, recurso extraordinário, respe e apelação. E mais, as Leis dos Juizados Especiais, 9099 e 10259/01 não preveem a hipótese de interposição de recurso adesivo. A Lei nº 9099/95, ainda, sequer prevê a possibilidade de aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. Conclusão: não cabe recurso adesivo nos Juizados Especiais, e isso está inclusive sumulado. 2

E ainda que se prestigia a celeridade e os princípios dos Juizados Especiais. Portanto, não cabe recurso adesivo nos Juizados. 3
 

Resumindo: o recurso adesivo pressupõe:

Pergunta: sabemos que o Recurso Extraordinário e o REsp podem ser interpostos contra a mesma decisão, dependendo da matéria versada, se infraconstitucional ou constitucional. Se uma parte interpuser recurso adesivo ao REsp da outra parte e, ao mesmo tempo, interpuser RE por si própria? Não poderia, pois isso é uma hipótese de recurso adesivo cruzado. Expliquemos. Segundo ensina Bernardo Pimentel Souza, só se pode interpor recurso adesivo que seja da mesma espécie do recurso principal. Por exemplo, se o recurso principal é extraordinário, o adesivo também deve ser (recurso extraordinário); não há lugar para recurso especial adesivo de recurso principal extraordinário, porquanto os recursos extraordinário e especial têm requisitos de admissibilidade diferentes e são julgados por tribunais diversos. Daí a impossibilidade jurídica do denominado “recurso adesivo cruzado”, tendo em vista a incompatibilidade com o disposto no parágrafo único do artigo 500 do Código de Processo Civil. 4 

Isso é o recurso adesivo!

Amanhã: efeitos dos recursos.

 1 – Neste momento a professora falou algo sobre as regras das contrarrazões no recurso adesivo. Pesquisando, o que encontrei na doutrina cruzando “contrarrazões” e “recurso adesivo” foi que o prazo para a interposição do recurso adesivo é o prazo de que dispõe a parte para apresentar contrarrazões ao recurso principal (recurso independente que fora interposto pela outra parte), conforme o inciso I do art. 500 do CPC. A parte não precisa apresentar contrarrazões e recorrer; pode tomar ambas as atitudes, nenhuma ou apenas uma delas. Convém que a parte elabore peças distintas para cada uma dessas atitudes; mas, desde que se contenham todos os elementos indispensáveis à interposição do recurso, nada impede que se apresente única peça, com as contrarrazões e o recurso. Fonte: DIDIER JR., Fredie e CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo José. Curso de Direito Processual Civil, vol. 03, 3ª Edição, págs. 88 e 89.

2 – Não encontrei o dito enunciado nas Súmulas do STJ e do Supremo, mas, conforme a obra Introdução aos Recursos Cíveis e Ação Rescisória, de Bernardo Pimentel Souza, 8ª ed., Capítulo IX, Item 4, a assertiva de que não cabe recurso adesivo em sede de Juizado Especial é uma orientação jurisprudencial:

3 – Em sentido contrário, há este interessante artigo: http://jus.uol.com.br/revista/texto/4556/o-recurso-adesivo-nos-juizados-especiais

4 – Complementei os dizeres da professora a partir do “expliquemos” com o contido na obra Introdução aos Recursos Cíveis e à Ação Rescisória, de Bernardo Pimentel Souza, 8ª ed., Capítulo IX, Item 2. Discordando dessa posição, temos uma situação hipotética apresentada por Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha: “a parte fundamenta seu pedido em questão constitucional e questão federal. O tribunal acolhe o pedido, mas rejeita o fundamento constitucional ou federal). A parte vencida poderá interpor recurso especial (para discutir a questão federal, que foi acolhida). Nessa situação, a parte vencedora não tem interesse na interposição do recurso extraordinário para o STF (para discutir a questão constitucional, que foi rejeitada), na medida em que vitoriosa na questão principal, não pode recorrer para discutir simples fundamento. Sucede que há um problema para a parte vencedora: sem poder recorrer extraordinariamente, ela pode sofrer um grave prejuízo se o recurso especial da outra parte for provido: é que, em tal circunstância, não poderá rediscutir a questão constitucional, que ficara preclusa. Para evitar esse risco, a doutrina considera possível a interposição de recurso extraordinário/especial adesivo cruzado (porque é recurso extraordinário adesivo a recurso especial, ou vice-versa), sob condição de somente ser processado se o recurso independente for acolhido. [...]