Vamos rapidamente ter uma visão de
ação rescisória. O estudo
profundo de ação rescisória não pode ser feito em uma hora. Poderemos
ver em Processo
nos Tribunais, uma disciplina optativa. Professor recomenda. Quem gosta
de advogar
e de recursos deve cursar! São ações de tribunais, e só tem aqui em
Brasília.
Olhe o diferencial!
Ação
rescisória
Em regra, o instrumento à mão do
indivíduo para impugnar uma
decisão judicial é o recurso. Dentro de um processo, a parte tem o
recurso para
impugná-la. O processo está tramitando, e a relação jurídica processual
é
prolongada quando da interposição de um recurso. Mas é possível
impugnar uma
decisão judicial por uma ação nova. São as ações autônomas de
impugnação. A
mais conhecida e mais comum é a ação rescisória. É uma ação autônoma de
impugnação, uma forma de impugnar uma ação judicial não dentro do
processo, não
com vistas a prolongar um que já existe, mas sim com nova ação, com
citação. Forma
um novo processo. Tem contestação como qualquer nova ação judicial.
É a ação rescisória a mais conhecida
das ações autônomas de
impugnação. Mandado de segurança, embargos de terceiro são outras.
Que decisão judicial a ação
rescisória busca combater? Uma
ação transitada em julgado. O
objetivo é desconstituir a coisa julgada. O conflito em tese foi
solucionado.
Transitou em julgado. Mas ainda é possível tentar desconstituir essa
decisão, e
isso foi feito pela ação rescisória. Pense em falar isso para um leigo,
ou para
seu cliente: “ajuizamos nossa ação de cobrança de R$ 70 mil, o juiz
proferiu
algumas decisões ao longo do processo, indeferiu a arguição de
falsidade dele
em relação ao seus documentos que você acostou ao processo, ele
agravou, o tribunal
manteve o indeferimento, o juiz proferiu sentença em seu favor,
reconhecendo
seu crédito, o réu embargou de declaração, a sentença foi aclarada, mas
se
manteve, então o réu apelou, a sentença foi mantida, então o devedor
recorreu
especial alegando dissídio jurisprudencial em relação ao TJ do
Mato
Grosso do Sul, o recurso especial foi conhecido, mas não provido, então
restou
ao sujeito embargar de divergência, fez o conflito e a prova da
divergência,
mas o órgão superior ainda entendeu que ele não tem razão. Em outras
palavras, cliente,
você venceu! Pode, portanto, proceder à execução, e finalmente ver a
cor do seu
dinheiro. Mas espere! Ainda resta a ele impugnar a decisão judicial por
meio de
uma “ação autônoma”.”
Seu cliente, indignado, deverá
responder: “como assim,
doutor?? Ele vai questionar a decisão depois de tudo discutido, depois
de todos
esses recursos?” A resposta é “sim, mesmo depois do trânsito em
julgado, ele pode
buscar um novo julgamento. Existe previsão legal disso. Chama-se ação rescisória a ação que ele irá
propor contra você.”
Mas claro, são casos gravíssimos. Não
em qualquer caso que
se pode discutir a coisa julgada. Casos de nulidades absurdas, que
contaminam
um processo. Mesmo com o devido processo legal, a decisão está
contaminada com
um vício gravíssimo. Para a sociedade, não é nada agradável e seguro
ter a
coisa julgada abalada. Afinal, deve-se ter a segurança jurídica. Mas há
decisões eivadas de tamanha injustiça tal que o mal-estar seria maior
do que a
própria insegurança. Então, para a sociedade, aquela decisão não deve
prevalecer mesmo com o devido processo legal. Tem vício que a contamina
a ponto
de poder-se desconstitui-la, de poder-se rediscuti-la. São casos
gravíssimos.
Vamos ver alguns já, já.
É cabível contra decisão de mérito,
seja sentença ou
acórdão. Ou seja, de uma decisão que extinguiu um processo sem
julgamento do
mérito não cabe ação rescisória, a princípio. Claro que a
jurisprudência cria
uma exceção ou outra, mas é esta a regra. Julgado o mérito é: julgada a
pretensão, solucionada a pretensão. Não cabe ação rescisória de decisão
judicial sem julgamento do mérito porque em tese você pode ajuizar
novamente.
Pergunta interessante: para ajuizar
ação rescisória
precisamos esgotar todos os recursos no processo em que foi proferida a
decisão? Não precisa esgotar as vias.
São processos independentes. A parte pode não ter querido recorrer
naquela
ocasião. E, ao ajuizar a ação rescisória, está pagando por isso, porque
se
operou a coisa julgada, a preclusão máxima. Não são totalmente
independentes as
ações porque a decisão proferida num processo está sendo atacada em
outro, mas são
independentes do ponto de vista do ajuizamento da ação.
Cabimento
Ação rescisória está prevista no art.
485 do Código de
Processo Civil.
Art. 485. A sentença de mérito, transitada em
julgado, pode ser rescindida quando: I - se verificar que foi dada por prevaricação, concussão ou corrupção do juiz; II - proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente; III - resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei; IV - ofender a coisa julgada; V - violar literal disposição de lei; VI - se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na própria ação rescisória; VII - depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável; VIII - houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença; IX - fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa; § 1o Há erro, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido. § 2o É indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato. |
Conluio, fraude, nulidade absoluta,
como falta da
intervenção do Ministério Público, incompetência absoluta, como nos
casos em
que um juiz do trabalho ter proferido sentença em juízo comum,
impedimento do
juiz, e, claro, violação literal de dispositivo legal. Esta é a
hipótese mais
aberta. Decisão expressamente contrária ao dispositivo legal. No
recurso
especial alegamos violação à lei, então alguns dizem que a ação
rescisória é um
“recurso especial indireto”. Essa violação a dispositivo de lei tem que
ser
literal, absurda. Se havia na época somente uma interpretação
controvertida no
âmbito dos tribunais a respeito daquele dispositivo, em que o STJ julga
determinado
caso, e um ano depois muda a jurisprudência, posso ajuizar ação
rescisória?
Não. Súmula 343 do STF:
Súmula 343 do STF: Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais. |
Violação da
Constituição: quando uma decisão viola a Constituição, ou
seja, uma questão
foi decidida de uma forma, e, posteriormente, o Supremo declara
inconstitucional o dispositivo no qual se baseou a decisão de mérito
que se pretende
rescindir. Cabe ação rescisória? Aí sim! É a chamada coisa
julgada inconstitucional. Neste caso não se aplica a Súmula
343 do Supremo. Fala-se de inconstitucionalidade, e não de dispositivo
de lei.
Veja também o art. 741, parágrafo
único do CPC:
Art. 741. Na execução contra a Fazenda Pública, os
embargos só poderão versar sobre: I – falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia; II - inexigibilidade do título; III - ilegitimidade das partes; IV - cumulação indevida de execuções; V – excesso de execução; VI – qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença; VII - incompetência do juízo da execução, bem como suspeição ou impedimento do juiz. Parágrafo único. Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal. |
Relativização
da
coisa julgada: foi um movimento. A coisa julgada, em 1973,
quando o Código
de Processo Civil foi editado, era considerada um dogma. Ninguém mexia
na coisa
julgada. Quem ganhou deve ter o direito de ter a coisa. Ninguém poderia
mexer
nisso. Ganhar uma ação rescisória era coisa rara. Mas alguns apontaram
que
havia coisas julgadas que não mereciam prevalecer. Declaração de
paternidade,
por exemplo. Em 1973 ainda não havia exame de DNA, que pode determinar,
com
suficiente certeza, que alguém é ou não pai. Havia gente declarada pai
por
depoimento de testemunha!
Outros cabimentos são: decisão
teratológica, que é a decisão
absurda; manifesta injustiça, paternidade, indenizações absurdas, etc.
Hoje busca-se mais a verdade real no
Processo Civil, muito
embora a verdade formal seja suficiente.
Atenção para o inciso IV: a nova
sentença “ofendeu a coisa
julgada”. Ou seja, a decisão judicial rescindenda atropelou a coisa
julgada
formada em um processo anterior, portanto cabe ação rescisória para
desconstituir a coisa julgada de uma decisão que ofendeu a coisa
julgada
anteriormente formada. Afasta-se a segunda decisão para prevalecer a
primeira. Inexistência
da coisa julgada é um pressuposto processual negativo.
Não
cabimento de ação
rescisória
Descabe ação rescisória em ação
cautelar, nos Juizados
Especiais, e para reexame de provas. É um novo julgamento da causa, mas
não
para reexaminar prova. “Juiz novo! O juiz antigo analisou errado!” <–
Não
se pode pedir isso. A interpretação de prova deve ser feita dentro
daquele
processo. Não pode ser feita novamente. Só em erro de fato e documento
novo,
mas não em relação ao exame daquela prova.
Também não cabe em caso de citação
nula. O processo tramitou,
teve decisão de mérito, mas a citação é nula. Não é caso de ação
rescisória,
porque considera-se que não houve decisão! Sem citação, não se forma
relação
jurídica processual, portanto não há processo, e não há decisão fora do
processo. Ajuíza-se, ao invés disso, ação
declaratória de inexistência. Busca-se declarar que aquele
processo nem
existe. Aplica-se a fungibilidade para quem erra, mas tecnicamente não
é o caso
de ação rescisória.
Prazo
Decadencial
de dois
anos. A ação rescisória é ação constitutiva, portanto o prazo
é
decadencial, então não suspende nem interrompe. Contados de quando? Do
trânsito
em julgado da última decisão proferida naquele processo. Proferida a
sentença,
apelo, a apelação é intempestiva, eu agravo, recorro especial, recorro
extraordinário, e nisso tudo estou discutindo tudo a tempestividade da
apelação.
O mérito foi analisado na sentença, e as decisões posteriores falam de
requisitos de admissibilidade da apelação. Mas a decisão de mérito
ainda não
transitou! Quando transitar, ajuízo a ação rescisória contra a
sentença. Mesmo
que proferida 10 anos atrás, se tiver um agravinho lá no Supremo, na
corda
bamba, quando transitada em julgado aí sim conta-se o prazo para a
proposição
da ação rescisória.
A parte pode, se quiser, desistir do
recurso para acelerar o
trânsito em julgado. Denomina-se coisa julgada decisão contra a qual
não cabe
nenhum recurso ordinário ou extraordinário. Não há mais nada pendendo
no
processo.
Competência
Quem julga ação rescisória? Tribunais
somente. Não existe
ação rescisória em primeiro grau. É competência originária de tribunal.
Como
definir a competência? Vamos relembrar: se estou buscando a rescisão de
uma
sentença, ajuízo a ação rescisória no tribunal de segundo grau
respectivo: TJ
ou TRF. E se for uma causa estrangeira? No STJ, embora o professor
nunca tenha
visto acontecer. É o entendimento sincero do professor.
Sentença é julgada, portanto, por
tribunal de segundo grau
respectivo.
E contra acórdão? No próprio tribunal que proferiu o acórdão que pretendo rescindir. Se quero rescindir o acórdão do STJ, será no STJ que proporei minha ação rescisória. Se foi o STF o tribunal que proferiu o acórdão, é no STF que ajuízo a ação rescisória. E assim sucessivamente: o tribunal que proferiu a decisão de mérito, claro.
Legitimidade
Está no art. 487:
Art. 487. Tem legitimidade para propor a ação: I - quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular; II - o terceiro juridicamente interessado; III - o Ministério Público: a) se não foi ouvido no processo, em que lhe era obrigatória a intervenção; b) quando a sentença é o efeito de colusão das partes, a fim de fraudar a lei. |
Dano moral com a sogra: morre o genro
num acidente de
trânsito e a sogra pleiteou danos morais contra o causador do acidente
em razão
do falecimento do genro. O STJ manteve a condenação do responsável. Em
geral condena-se
ao pagamento de indenização por dano moral para os pais do falecido.
Mas havia uma
peculiaridade no caso em que o genro morava com a sogra. Ainda cabem
embargos
de divergência, mas será difícil mudar: para serem admitidos os
embargos de
divergência, o sujeito deverá encontrar um caso similar para fazer a
divergência: genro que morava com a sogra E foi morto num acidente.
Isso é o “dano moral por ricochete”,
dano moral reflexo:
alcançam-se os parentes posteriores caso não existam os primeiros.
Execução do
julgado
A decisão é executável. A ação
rescisória evita a execução
da decisão que se pretenda rescindir? Não. Ajuizada a ação rescisória,
a
execução não é impedida. Mas é possível ser concedido efeito suspensivo
na ação
rescisória, desde que se demonstre a relevância do direito e o periculum in mora. É possível a
concessão judicial na própria ação. É a doutrina moderna: para saber se
o
pedido de concessão judicial do efeito suspensivo deve se dar no
próprio bojo
da ação rescisória ou em ação cautelar autônoma, deve-se saber se o
pedido tem natureza
de antecipação de tutela ou de pedido cautelar. Pede-se a antecipação
dos
efeitos da futura sentença? Ou liminar para garantir o futuro direito?
Parece ter
natureza de cautelar, então ter-se-ia que ajuizar uma nova ação para
conferir
efeito suspensivo à ação rescisória. Mas a doutrina moderna permite no
bojo da
ação para que não sejam necessárias duas ações, e permite a
fungibilidade aqui.
Requisitos
da petição
inicial
Uma ação rescisória ajuizada é como
qualquer outra, e segue
os requisitos do art. 282 do Código de Processo. É uma ação nova, então
tem que
seguir os requisitos da petição inicial. Não é recurso!
Art. 488. A petição inicial será elaborada
com observância dos requisitos essenciais do art. 282, devendo o autor: I - cumular ao pedido de rescisão, se for o caso, o de novo julgamento da causa; II - depositar a importância de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, a título de multa, caso a ação seja, por unanimidade de votos, declarada inadmissível, ou improcedente. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no nº II à União, ao Estado, ao Município e ao Ministério Público. |
Art. 282. A petição inicial indicará: I - o juiz ou tribunal, a que é dirigida; II - os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu; III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV - o pedido, com as suas especificações; V - o valor da causa; VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; VII - o requerimento para a citação do réu. |
Além dos requisitos da petição
inicial, o autor é obrigado a
fazer um depósito para garantir a ação rescisória: 5% do valor da
causa.
E qual o valor da causa na ação
rescisória? Segue o padrão
normal: o proveito econômico. Pode bater com o valor da ação anterior,
mas a condenação
pode ter sido menor do que o valor da ação original.
E, claro, outro requisito da petição
inicial é comprovar o
trânsito em julgado da decisão atacada. Deve-se juntar a certidão. Até
para
verificar a contagem do prazo.
Julgamento
da ação
rescisória
Tem três fases o julgamento da ação
rescisória.
E se houver novo vício? Quando você
aponta um tipo de vício
na ação rescisória, esta é a causa de pedir. Por exemplo: o juiz foi
corrupto.
O tribunal decide que não está provada a corrupção. Mas o tribunal
entende que,
entretanto, o Ministério Público deveria ter participado e não
participou. Pode
anular a decisão passada por este outro motivo? Não. O
juízo da ação rescisória está vinculado à causa de pedir.
Observação: pode-se ajuizar ação
rescisória de ação
rescisória. No mesmo tribunal, claro.
Recursos
contra ação
rescisória
Cabe recurso algum da decisão que
julga ação rescisória?
Cabe! Regra da recorribilidade. O primeiro recurso que cabe são, claro,
os
embargos de declaração. Mas também cabem embargos infringentes,
lembram-se? Cabem
de acórdão não unânime que reforma, em grau de apelação, sentença de
mérito, ou
de acórdão não unânime que julga
procedente ação rescisória. Não cabe, por outro lado,
apelação, pois não há
sentença na ação rescisória. Não cabe agravo do art. 522 também, pois
decisões
interlocutórias são, tecnicamente falando, pronunciamentos judiciais
feitos por
juiz de primeiro grau sobre questões incidentes. ¹