Direito Processual Civil

terça-feira, 29 de março de 2011

Conclusão da tempestividade e remessa necessária

 

 

Hoje vamos terminar a tempestividade e começar a remessa necessária, matéria nova. Amanhã não terá aula. Semana que vem haverá aula normal, mas não com o professor.Semana que vem terminamos a matéria da primeira prova, provavelmente. Hoje o professor deve mandar para nós as provas dos semestres anteriores.

Vamos rever. A tempestividade é um requisito de admissibilidade que manda que, se o recurso for apresentado fora do lapso temporal, ele não será conhecido. O ato processual tem que ser praticado nesse interregno. Não praticado, opera-se a preclusão. Os prazos são variáveis, mesmo com as tendências para unificar. A maioria dos prazos, entretanto, é de 15 dias.

Vimos as regras de prazo: excluir o dia do início, incluir do fim, o primeiro dia da contagem tem que ser útil, o último também, e se a intimação for realizada em dia não útil, considera-se feita no dia útil seguinte, começando o prazo a contar no dia subsequente a este.

Vimos também que o prazo do terceiro prejudicado é igual ao das partes. Passamos também pela casuística das férias dos tribunais superiores, de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho. Expediente normal dia primeiro desses dois meses, não se esqueçam!

Há uma curiosidade: no novo Código de Processo Civil, o prazo será o seguinte: quando o dia não útil estiver no meio do prazo, ele não será contado. A ideia do novo Código será que se pulem os dias não úteis. Isso já foi uma lei, aprovada na época de FHC, mas o presidente vetou. O trâmite processual demoraria. Imagine o prazo em dobro para aqueles entes, especialmente na Semana Santa!

Faltou ver, na aula anterior, a diferença entre prazo de publicação e prazo de intimação.
 

Processo eletrônico

O que nos interessa para a questão do prazo?O Diário da Justiça, jornal tradicional que publica os nomes das partes intimadas, é hoje eletrônico. Isso foi maravilhoso, pois agora é muito mais fácil para ler, bastando pressionar CTRL+F (localizar) e digitar o nome da parte. Conseguimos identificar os processos muito mais facilmente. Estagiário não precisa mais ser contratado para ficar lendo. O que isso mudou em relação à contagem do prazo? Há reflexos no Diário Eletrônico e no protocolo.

Em relação ao diário eletrônico, no passado, intimadas as partes pelo diário da justiça em papel, excluía-se o dia do começo do prazo para a contagem. No diário eletrônico atual ganhamos um dia. A Lei 11419/06, a Lei do Processo Eletrônico, diz que o dia em que as partes forem intimadas será tido por dia da divulgação. Divulgada a decisão hoje, consideram-se intimadas as partes no dia útil seguinte, e o prazo começa a correr no dia útil seguinte ao que foi realizada essa intimação. Exemplifiquemos: a decisão é prolatada hoje, terça-feira, 29 de março, mas ainda não sabemos. Amanhã (30) a parte abre o Diário Eletrônico e vê a decisão recém-adicionada. Este dia, 30 de março, é considerado a data da divulgação. Ela será considerada intimada no dia útil seguinte, quinta-feira, 31 de março. A contagem do prazo, portanto, iniciar-se-á na sexta-feira, 1º de abril.

Ganhamos um dia, em tese. Há a data da divulgação, da intimação e da contagem do prazo.

A parte, portanto, recebe a intimação eletrônica. Cuidado com a confusão, pois essa é a divulgação! A intimação é o no dia útil seguinte, e começa a contar o prazo no dia útil seguinte. Tudo dias úteis! Viveremossó eletronicamente daqui para frente.

A OAB tem um sistema gratuito que envia aos advogados todos os processos eletrônicos interessantes para cada profissional. Informa o dia da divulgação, da intimação e do início da contagem do prazo. Pode cair em prova!

Intimadas as partes no dia 28 de junho, quarta-feira, nos autos do processo que tramita num Tribunal Superior, no Diário Eletrônico. 2 de julho começam as férias forenses. 28 de junho é a divulgação, intimação é dia 29, na quinta, começando a contar o prazo no dia 30 de junho, que cai numa sexta-feira, primeiro dia do prazo. Primeiro de julho é sábado, mas conta, pois está no meio do prazo! Então é contado. Só não pode ser data de início ou de término.

Outro tópico em relação ao processo eletrônico é quanto ao protocolo. Pode-se protocolar 24 horas por dia! É permitido o envio até meia noite, e será considerado dentro do prazo.É a melhor hora para trabalhar. Desde, é claro, que o tribunal esteja adaptado à lei. A tendência é digitalizar tudo. Há até a intimação no momento em que a decisão é lida, ao clicar-se no link, o que nalguns casos faz enviar uma mensagem ao órgão de que a parte tomou conhecimento. Aqui em Brasília temos todos os recursos. Imagine, entretanto, um advogado do interior se adaptar ao processo eletrônico. Há pessoas que infelizmente ainda não têm acesso à Internet.
 

Suspensão, interrupção e sobrestamento do prazo

Já estudamos a suspensão e a interrupção do prazo, mas não o sobrestamento. Suspensão e interrupção do prazo são causas que ocorrem durante o processo que influenciam a contagem do prazo. São as causassuspensivas e as causas interruptivas. Na suspensão, para-se o prazo mas os dias que já passaram são considerados. Começa, para, e volta a contar o que faltar. Um exemplo de suspensão do prazo é o advento das férias forenses. É causa suspensiva da contagem do prazo.

Interrupção do prazo: começa a contar o prazoquando surge uma causa interruptiva, e, superada esta causa, o prazo volta a contar por inteiro. Reinicia o cronometro. Renova a contagem do prazo a partir do zero. A suspensão aproveita o que já passou, enquanto a interrupção não. morte da parte é um exemplo de causa interruptiva do prazo. Podesim interromper mais de uma vez!

E o sobrestamento? É uma expressão nova no Código de Processo Civil. Há um caso em que o prazo fica sobrestado, o que significa que ele nem começa a contar. Veremos isso quando tratarmos de Recurso Extraordinário e Recurso Especial. O início é postergado, jogado para frente.

Vamos ao último tópico da matéria de tempestividade.

Há um caso em que havia quatro réus, duas pessoas jurídicas e duas pessoas físicas.O professor representava uma das pessoas jurídicas, e agravou em relação somente a ela. Coincidentemente, uma das duas pessoas físicas era representante da pessoa jurídica para que o professor advogava. A pessoa física foi citada. Quando feito, o juiz entendeu que a pessoa jurídica já se presumia ciente da ação, já que havia, óbvio, íntima relação entre o representante e a pessoa jurídica em si. A contagem do prazo para a pessoa jurídica contou-se da citação da pessoa física, o que o professor entende que foi um erro do juízo. São dois mandados diferentes, e os réus tinham personalidades jurídicas diferentes! Na verdade, nesse caso foi enviado oficial de justiça em busca tanto da pessoa física quanto da pessoa jurídica, mas esta última não teve seu representante encontrado quando o oficial foi à sede. Dirigiu-se, depois, à residência da pessoa física e lá a encontrou. Mas esta tinha inclusive advogado diferente.

As pessoas são, de fato, a mesma: o representante da pessoa jurídica e a pessoa física. Entretanto não são juridicamente as mesmas pessoas.

Professor entende que a interpretação de prazo deve ser sempre benéfica. Não é razoável interpretar restritivamente. Essa, portanto, é um exemplo de jurisprudência ‘do mal’.
 

Publicação e intimação

Usamos a expressão “a decisão foi publicada”. Estamos acostumados com a ideia de que isso é a data em que as partes foram intimadas. Mas, na verdade, o que se quer dizer é que as partes foram intimadas via publicação. Isso porque existe um outro ato processual, chamado publicação, que é diferente da intimação via publicação. Publica-se a intimação, tornando a decisão pública, e as partes são intimadas. Mas ocorre primeiro a publicação, e depois a intimação via publicação.

Os juízes escrevem ao final de seus pronunciamentosas letras “PRI”. Significam“publique-se, registre-se e intime-se”. A letra P, que é o ato de tornar público o pronunciamento, é diferente da intimação! No momento em que o juiz subscreve a decisão e a entrega ao serventuário, para que faça a juntada aos autos, nesse momento a decisão torna-se pública, e já existe no mundo jurídico. É aqui que ocorre a publicação, a existência da decisão. Depois, as partes serão intimadas. Mas a decisão já existe. Exemplo: o juiz manda soltar um cidadão. Precisam-se intimar as partes para que ele seja solto, ou pode-se soltar imediatamente? Pode soltar imediatamente.

Antigamente era difícil, pois não havia Internet. Hoje vemos “sentença proferida” quando consultamos os andamentos processuais. Pode-se ter acesso à decisão mesmo antes de ser intimado. Ela pode ser totalmente lida mas a parte ainda não foi oficialmente intimada. Dependendo do cartório, eles não deixam sequer tirar cópia. A publicação normalmente antecede a intimação, mas são atos processuais diferentes.

Às vezes sabemos o teor de uma decisão e só somos intimados três meses depois. Em tese ganhamos 90 dias. O prazo sequer começou. Isso acontece, porque a decisão já existe, já foi tornada pública. É um carimbo, na verdade. Serventuário se manifesta: “Certifico e dou fé que a decisão foi publicada em cartório.”

A decisão já gera efeitos imediatos, especialmente se houver urgência.

Caso real: juiz sentenciou julgando improcedente um pedido. O estagiário do escritório interessado na causa foi ao cartório e tirou cópia, mas sem que a parte tenha sido intimada. Levou para o escritório cópia da decisão que julgava improcedente o pedido, que agora não importa se formulado pelo escritório que o empregava ou pela parte contrária. O juiz, depois, refletiu, e pediu ao serventuário para rever o processo. Isso tudo antes da intimação. O magistrado notou que havia praticado um error in judicandoe trocou a sentença julgando procedente o pedido. E agora, qual das duas decisões vale? A resposta está no Código.

Art. 463. Publicada a sentença, o juiz só poderá alterá-la:

I - para lhe corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais, ou lhe retificar erros de cálculo;

II - por meio de embargos de declaração.

O trecho "publicada a sentença" diz respeito a que ato? À publicação em cartório! Vale, portanto, a primeira sentença. Se o estagiário não tivesse sido designado para ir buscar a cópia da decisão, ninguém ficaria sabendo. O que vale então é a primeira, pois são atos processuais diferentes: existência (da decisão no mundo jurídico) e intimação. Um é a publicação e outra é a intimação que se dá via publicação. São atos processuais diferentes, no entanto.

Depois de tudo isso, onde queremos chegar é: vamos dizer que a decisão foi publicada em determinado momento. Passou um tempo razoável e as partes só então foram intimadas. O prazo começa a correr da intimação. Se a parte protocolar o recurso depois do termo final, o recurso não será tempestivo, claro. A pergunta é: e se a parte interpuser o recurso antes da intimação, mas depois da publicação? Em tese, o prazo sequer começou. Antigamente consideravam o recurso intempestivo, pois interposto antes! até chegou-se a cunhar um termo para esse recurso: antempestivo. A jurisprudência mudou e, hoje em dia, considera-se tempestivo, e a parte é tida por intimada naquele momento. Quando a intimação finalmente chegar, basta apresentar petição simples com a ratificação do recurso anterior.

Que dia então é o dia da publicação? O da intimação é fácil. Mas o da publicação não se tem exatamente. Dependerá de cada processo. Em primeiro grau, é o dia que o juiz entrega ao serventuário, que faz a juntada. E nos tribunais, qual é o dia da publicação? No dia em que ocorre o julgamento, e divulga-se o resultado na pauta da seção.
 

Remessa necessária

Já estudamos que, para a parte buscar o reexame de uma decisão, ela precisa recorrer. Ela precisa provocar o reexame. No entanto, existem casos em que ocorrerá o reexame da decisão mesmo não havendo recurso.

Casos em que não há recurso algum e mesmo assim a decisão é reexaminada, por imposição legal, para outro órgão julgador. Para adiantar, já podemos colocar que o reexame necessário existe em prol do poder público.

É também chamada de “remessa oficial”, “reexame obrigatório” ou “recurso de ofício”. Este último nome é equivocado, pois não existe recurso obrigatório, já que recurso é um ato voluntário; a parte recorre se quiser.O nome é usado porque parece um recurso, fazendo com que a decisão seja reexaminada de ofício.

Conceito de remessa necessária: condição de eficácia da decisão, condição necessária à formação da coisa julgada. É válida a decisão, mas não produz efeitos ainda, sem transitar em julgado. Precisa de confirmação por um órgão superior.

Súmula 423 do STF: não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso "exofficio", que se considera interposto "ex lege".

Significa que a decisão só transita em julgado depois de confirmada pelo tribunal.

É condição de eficácia. Mesmo que ninguém recorra. Não se fala em juízo de admissibilidade aqui. O juiz simplesmente escreve: “decisão sujeita ao duplo grau.”

Esse instituto, extremamente criticado, tendo sidocogitada várias vezes sua extinção, tinha no passado razão de ser, pois as Procuradorias não estavam bem organizadas. Hoje elas estão mais aparelhadas, e subsiste a ideia de proteger o Erário, o patrimônio público. Parece injusto. O particular tem que recorrer em caso de sucumbência; o poder público, representado por procuradores bem gabaritados, não precisa recorrer. Já se decidiu que isso não fere a isonomia, pois o poder público tem muito mais processos para lidar. A ideia é evitar condenações exageradas.

Só não existe remessa necessária entre particulares.
 

Casos em que se fará a remessa necessária

Somente em sentença. Lembrem-se dos quatro tipos de decisões judiciais: sentenças, decisões interlocutórias, acórdãos e decisões monocráticas. Que sentença? Qualquer uma, ou somente algumas?

Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).

§ 1o Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.

§ 2o Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.

§ 3o Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente.

 A lei é geral: “sentenças contra o poder público”. Não explicita que tipos de processos. Basta que seja contra o poder público. não é somente sentença condenatória. Sentença mandamental que ordena a nomeação de alguém também deve ser remetida. Basta ser desfavorável.
 

Restrições quanto ao cabimento da remessa necessária

Primeira delas é o valor. Sentenças cujo valor seja possível de aferir em até 60 salários mínimos não estão sujeitas à remessa necessária. Proferida uma sentença contra o poder público condenando-o a pagar 59 salários mínimos, não haverá remessa. É o § 2º do artigo transcrito acima.

Outra restrição é a fundamentação. Se a sentença estiver baseada em súmula dos tribunais superiores ou do STF, ainda que condene o poder público ao pagamento de R$ 300 milhões, não haverá remessa necessária. A ideia foi prestigiar as decisões dos tribunais superiores. É o § 3º do art. 475.

§ 3o Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente.

Pergunta: pode prejudicar o poder público a remessa necessária? Negativo. É como se fosse uma aplicação analógica do princípio da proibição da reformatio in pejus. Também há um enunciado sobre isso.

Sem prejuízo de outras sanções, o usuário do sistema será considerado litigante de má-fé se não houver perfeita concordância entre o original remetido pelo fac-símile e o original entregue em juízo.Súmula 45 do STJ: no reexame necessário, é defeso, ao tribunal, agravar a condenação imposta à Fazenda Pública.

A remessa necessária não tem contrarrazões justamente porque não há razões, afinal, não há recurso.

Vamos terminar. Proferida uma decisão em que é caso de remessa necessária, e o juiz não encaminha o processo. Pode-se executar a sentença? Não, pois a sentença ainda não é eficaz. É imprescindível a confirmação do tribunal. Questão de prova. Nem que passem vários anos, pois falta exequibilidade. A parte pode pressionar indo ao tribunal pedindo que o presidente do tribunal o avoque. § 1º do art. 475.

§ 1o Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
 

Julgamento da remessa necessária

A remessa é julgada como se fosse uma apelação. A remessa é tratada como se fosse uma apelação em tudo aquilo que foi contrário ao poder público. Há relator, sessão de julgamento, faz-se relatório, e tudo mais. Tem que ter fundamentação. Mas na remessa necessária não é recurso! Não tem razões, tempestividade, preparo; é um instituto paralelo, mas é feita às vias da apelação.

Observação: não cabe recurso adesivo. A União pode recorrer mesmo que haja a remessa. Pode haver recurso do particular, da União e a própria remessa. Os três serão julgados ao mesmo tempo. O reexame e o recurso da União têm o mesmo objeto, então o julgamento de um torna prejudicado o julgamento do outro.

Contra a decisão que julga a remessa cabe outro recurso? Para refletir.