Direito do Consumidor

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Responsabilidade civil nas relações de consumo, excludentes do nexo de causalidade, fato do produto e vício do produto


Continuando a aula passada: trabalhamos com conceitos básicos de responsabilidade civil. Trabalhamos com teoria da culpa, teoria do risco, explicamos a responsabilidade subjetiva, a objetiva, traçamos conceitos elementares. Paramos na exclusão do nexo de causalidade.

Para que haja responsabilidade civil precisamos dos elementos básicos: conduta, nexo de causalidade e dano. Quando trabalhamos com responsabilidade objetiva ou subjetiva, estamos trabalhando com a conduta, nexo de causalidade ou com o dano. As duas responsabilidades se distinguem pela presença ou não da culpa. Onde está a culpa? Na conduta. A culpa vincula-se à conduta. Temos conduta culposa e conduta não culposa.

Quando trabalhamos com responsabilidade objetiva, estamos trabalhando com uma conduta que não é culposa, mas, para que exista a responsabilidade civil objetiva, tem que haver o nexo de causalidade. Então, conduta pode ser culposa ou não culposa, o que é um dos elementos da responsabilidade civil. Outro elemento é o nexo de causalidade. Então, afirmar que a responsabilidade é objetiva ou subjetiva nada tem a ver com a afirmação de existência ou não de nexo de causalidade. Por quê? Por mais que se presuma que a responsabilidade seja objetiva, se não existir o nexo, não haverá responsabilidade civil.

Prestem atenção, portanto: se eu informo que uma responsabilidade se presume como objetiva, não quero dizer automaticamente que existe nexo de causalidade. Culpa ou inexistência de culpa se prende à conduta. A conduta não precisa ser culposa, mas, ainda assim, temos que analisar se existe o nexo. Portanto, se não houver nexo de causalidade, mesmo que se trate de um fato em que a responsabilidade civil seja presumidamente objetiva, não haverá responsabilidade civil se não houver nexo de causalidade. E aqui temos que trabalhar com as excludentes do nexo de causalidade.

O que exclui o nexo de causalidade?

A primeira excludente é a força maior. Outra é o caso fortuito. Outra é a culpa exclusiva da vítima, e o fato de terceiro é a quarta excludente. São basicamente essas quatro. Podemos fazer uma jornada reflexiva em alguns outros fatores que poderiam excluir o nexo, mas aqui está a base.
 

Força maior

O que é mesmo a força maior? Evento da natureza? Não necessariamente. Força maior tem a ver com a previsibilidade do evento? Não. Eventos da natureza podem ser previsíveis. Então, é melhor conceituar força maior como aquele fato que, embora previsível, é irresistível ou inevitável.

Suponhamos que o Sr. Cremildo tenha o seguinte negócio: depósito de automóveis. Cremildo, mediante uma remuneração, se responsabiliza por guardar automóveis dentro de um galpão, preservá-los, e, depois de determinado período, devolvê-los aos donos. Alguém viaja e deixa seu veículo com esse empreendedor. O negócio é guarda e conservação de carros. Isso em Brasília, cidade desértica, em pleno setembro como estamos.  

Chover, portanto, é fenômeno raro em setembro, e, mesmo que caia algumas gotas pelo final do mês, não se espera que caia um temporal. Mas o temporal vem, mesmo que seja coisa rara para a época, alaga o depósito e estraga todos os carros. O Sr. Cremildo tem responsabilidade? É previsível a chuva, mas os danos são inevitáveis, e o fato é irresistível. Trata-se de um caso de força maior. Está excluído, portanto, o nexo de causalidade. Nada se podia fazer; chuvas fortes são raras em setembro; mas, mesmo que a ideia de chover torrencialmente no mês não seja inconcebível, não havia como evitar o dano.

O mesmo vale para os furacões da Califórnia: pouquíssimo se pode fazer.
 

Caso fortuito

E o caso fortuito, o que é? É o evento imprevisível, e, portanto, inevitável. Note bem a diferença. A previsibilidade é a diferença entre o caso fortuito e a força maior. A própria imprevisibilidade é o que torna inevitável.

Exemplo: você está andando com seu carro, com pneus novíssimos, “Mixelã ®, na velocidade da via, e há um prego, grandes como aqueles de trilho de trem. O pneu estoura, e você desvia com o carro até o quintal da Dona Clotilde, destruindo suas saprófitas. Trata-se de força maior? Não. É um caso fortuito. Não há sinais de que tal coisa vai acontecer.

Observações:

  1. Contrato de seguro leva a indenização contratual, responsabilidade contratual. As excludentes têm que estar expressas.
  2. O fortuito interno não exclui a responsabilidade do fornecedor.

O que é o caso fortuito interno? Na verdade, é uma criação doutrinária. Existem determinados eventos que são imprevisíveis dentro da cadeia de consumo, e imprevisíveis fora da cadeia de consumo, quando o produto ou serviço já chegou ao destinatário final. Dentro da cadeia: se por acaso o produto ainda não chegou às mãos do destinatário final consumidor, qualquer dano ou qualquer defeito neste produto dentro da cadeia de consumo não eximirá a responsabilidade do fornecedor. Significa que casos fortuitos ocorridos durante a concepção, fabricação, distribuição e comercialização não isentam o fornecedor de sua responsabilidade.

Exemplo: tenho um pneu “Pir-L ®”, empresa que possui uma série de máquinas para produzir esses pneus. Chove que é uma barbaridade, e essa chuva acaba afetando o maquinário da Pir-L, causando curto-circuito em alguns dos equipamentos. Mas a Pir-L ® não observa esse defeito, e o pneu fabricado a partir daquela máquina acaba sendo distribuído com defeito.

O que aconteceu para que a máquina apresentasse o defeito? Chuva. Força maior, inevitável. A máquina desregulou, e o pneu saiu deformado. O pneu chega às mãos do destinatário final. Momentos depois, ocorre um acidente de consumo por conta desse pneu.

Será que a Pir-L ® pode se eximir da responsabilidade por conta desse acidente que aconteceu? Mas foi uma chuva, a empresa não viu, não previu! Pode se eximir da responsabilidade? Não. Justamente porque se trata de um fortuito interno. Por mais que se trate de algo previsível mas inevitável, ou imprevisível e por isso inevitável, o defeito ocorreu dentro da cadeia de consumo, dentro do processo de fabricação, de distribuição, de criação do produto. Esses casos, que chamamos fortuitos internos, não excluem o nexo de causalidade.

Não excluem o nexo de causalidade. O que significa dizer que existem certos casos fortuitos e forças maiores que não excluem a responsabilidade do fornecedor.

Então, qual é o caso fortuito ou força maior que exclui a responsabilidade do fornecedor? O pneu chegou em perfeito estado, mas o prego de trilho de trem que falamos antes destruiu o pneu. Trata-se de um fortuito interno? Não. É um fortuito externo, que ocorreu efetivamente depois da produção. Depois de já encerrada a cadeia de consumo.

Note que isso não se equipara à responsabilidade objetiva. Esta diz respeito à existência ou inexistência de conduta culposa. Aqui, estamos trabalhando com nexo de causalidade. Não confunda! Estamos no segundo elemento da responsabilidade civil. Neste caso, não falamos de culpa, mas um fenômeno que supostamente excluiria a responsabilidade civil por ausência de nexo de causalidade. Um fenômeno imprevisível e inevitável ou previsível e forte ao ponto de não se poder evitar. Caso fortuito e força maior excluem o nexo de causalidade, todavia existe o fortuito interno, que provoca um defeito de fabricação, de concepção, de criação. Esse fortuito interno não exclui a responsabilidade civil do fornecedor.

Problemas com maquinário do fornecedor, determinada embalagem rasgou no momento em que estava sendo distribuído o produto, ou um determinado funcionário da empresa estava com a mão suja no momento da manipulação daquele alimento... use sua imaginação.
 

Culpa exclusiva da vítima

Não há muita dúvida aqui. Culpa exclusiva da vítima ocorre quando o próprio consumidor, e aqui estamos trabalhando com relação de consumo, se coloca em posição perigosa, e se sujeita ao risco.

Observação importantíssima: existe uma coisa chamada culpa concorrente. Dentro de responsabilidade civil pura, a culpa concorrente serve para atenuar o valor a ser pago a título de indenização. Exemplo: um operador de máquinas que trabalha dentro de um navio cargueiro, que possui alguns porões a vácuo, com produtos perecíveis. Deixando de observar o procedimento padrão, o operador entrou na câmara sem o companheiro, que deveria olhar a porta. A porta então fechou atrás dele, e então ele morreu sufocado dentro do porão.

Olhe que interessante: os amigos viram que ele tinha entrado, e correram para puxar a porta. O sujeito já estava desmaiado. Quando foram procurar para essa ocasião extraordinária, descobriram que não havia balão de oxigênio disponível no navio.

Pergunta: a vítima tem culpa? Tem. A companhia dona do navio também tem responsabilidade? Tem, porque deveria ter disponibilizado um balão de oxigênio. Trata-se de culpa concorrente. Ainda não estamos falando de relação de consumo, mas sim responsabilidade civil pura. Neste caso, a indenização a ser paga à família do falecido pela companhia que administra os navios será diminuída por conta da culpa concorrente.

Já no caso do Direito do Consumidor, só haverá diminuição no valor da indenização se a conduta da vítima for preponderante para a ocorrência do evento. Só assim haverá diminuição do valor da indenização. Ou seja, um determinado produto apresenta um risco, um determinado defeito, mas que não é um defeito absurdo; um defeito de informação, por exemplo. Falta determinada informação, como “não deixe o liquidificador ao alcance das crianças”. Defeito simples, mas ausência de informação também é defeito. O consumidor deixou a criança brincar com o liquidificador, e alguém sai sangrando. Neste caso, a conduta do consumidor foi preponderante para a ocorrência do evento danoso. Existe o defeito, mas era mínimo, que naturalmente não causaria aquele evento danoso.

Então, dentro da responsabilidade civil pura, podemos fazer uma análise mais abrangente. São culpas que se igualam. A responsabilidade do sujeito que entrou no porão foi tão grande que diminuiu o valor da indenização paga pela empresa. Nas relações de consumo, para que haja minoração do valor da indenização, deve haver primeiramente o defeito do produto, que por si só não deve ser suficiente para causar um dano tão grave, e, aí, a conduta do consumidor deverá ser preponderante para a ocorrência e gravidade do evento.

Caso concreto: ônibus de determinada empresa deixou uma pessoa de idade na esquina de uma avenida. Isso ocorreu na cidade de Saint Sebastian. Passou a avenida principal, e havia a via alternativa, que se une à principal. Não deveriam entrar ônibus por essa via. Acontece que existia um bloqueio que acabou forçando o ônibus a entrar nela. Deixou então o passageiro na esquina da avenida principal, para então entrar na alternativa. 150 metros depois, o que é considerado longe, havia um ponto de ônibus. O motorista abriu a porta, alguns desceram, e, por último, um senhor de idade desceu pela saída da frente. O motorista olhava para a esquerda, enquanto que a porta fica à direita. Lentamente o senhor desceu, a porta se fechou, então ele olhou para o lado e foi. Mas o ônibus é grande, e não consegue fazer a curva simplesmente como os carros. O ônibus imprensou as duas pernas do senhor contra o meio-fio, e seguiu viagem.

O que a empresa de ônibus alegou? Culpa exclusiva da vítima. Queria, portanto, eximir-se de responsabilidade pelo dano por culpa exclusiva da vítima, que não teria observado corretamente como descer. Num segundo momento da audiência, na tréplica, a empresa defendeu outra tese: a culpa concorrente, para diminuir a indenização. Não é bom sinal quando se muda de tese defensiva em plena audiência. Como sabemos, na contestação, o réu deverá, pelo princípio da eventualidade, sustentar todas as possíveis teses, mesmo que contraditórias. Mas não em plena audiência, pois importa confissão da parte relativa à qual se fez a “concessão”.

Vejamos. É relação de consumo? É. Então, para que haja diminuição do valor da indenização é necessário que a conduta da vítima seja preponderante para a ocorrência do evento danoso. Neste caso foi? Não mesmo. Primeiro porque não era uma parada de ônibus. Foi, inclusive, contra a legalidade. Para o Código de Trânsito Brasileiro, a infração é gravíssima. Segundo que a conduta em si não foi preponderante. Bastava o motorista esperar um pouco mais, e não haveria evento danoso. Nem culpa concorrente é. Dentro do Direito do Consumidor, a conduta deveria ser preponderante! O velhinho deveria ter pulado na frente do ônibus para ser culpa concorrente, pois aí sim sua conduta seria preponderante para o evento prejudicial. E culpa exclusiva da vítima, então? Neste caso, não há culpa exclusiva da vítima de forma alguma.

Foi estabelecida uma pensão em favor da família do idoso, mas a empresa não quer pagar, pois acha absurda a obrigação de dá-la três salários mínimos. Em primeira instância o juiz determinou a pensão nesse valor; a empresa recorreu ao Tribunal de Justiça, que confirmou a decisão. Então interpôs recurso especial ao STJ, que não foi admitido (ou não foi conhecido, já no STJ). Agravo de instrumento para destrancá-lo. A Corte Superior não deu provimento ao recurso especial. A decisão do juiz de primeira instância foi confirmada três vezes pelas instâncias acima.
 

Fato de terceiro

O que é mesmo o fato de terceiro? Se lembramos da aula passada, o fato de terceiro mostra-se assim: aparentemente existe uma conduta, um nexo de causalidade e um dano que formariam responsabilidade civil. Mas tudo é aparente, porque o fato de terceiro se apresenta no curso do processo, da investigação dos fatos. Temos, portanto, uma multiplicidade de condições. O ciclista é esmagado pelo ônibus, o que faz parecer que a culpa é da empresa de transportes. Depois é que se nota que, quando o ônibus passou por cima dele, foi porque ele caíra num buraco meio segundo antes, buraco que ali foi deixado pela empresa que fazia a manutenção do pavimento. Parecia ser conduta não diligente do motorista de transporte. Supunha-se que o motorista dirigia-se de forma imprudente.

É assim que se apresenta o fato. Existe uma aparência.

Portanto, com a descoberta do buraco, que é o fato de terceiro, durante a investigação dos fatos, ou mesmo no curso da instrução processual, exclui-se o nexo de causalidade por fato de terceiro. Quem são os sujeitos desta relação jurídica? Primariamente, empresa de ônibus e ciclista. Autor este, réu aquela. Mas vem à tona o terceiro, que efetivamente causou o dano. Daí exclui-se o nexo de causalidade da conduta do responsável aparente por fato de terceiro.

Se o lesado insistir, isso poderá levar à extinção do processo com julgamento do mérito. Forma coisa julgada entre essas partes, mas pode-se acionar a outra. Nada de denunciação à lide porque não existe intervenção de terceiros em relação de consumo. Vamos ver mais para frente.

Fato de terceiro é excludente de responsabilidade. Mas existe essa mesma expressão dentro da responsabilidade civil que, na verdade, faz com que surja uma responsabilidade. Veja que interessante: o pai é responsável pelos atos do filho. Trata-se também de responsabilidade objetiva. O empregador é responsável pelos atos do empregado. Por isso, podemos dizer que o empregador é responsável por fato de terceiro. E, agora, essa expressão “fato de terceiro” ganhou outra conotação. Portanto, cuidado! A expressão fato de terceiro possui duas conotações. Uma como excludente de nexo de causalidade, e outra como justificativa da responsabilidade civil objetiva: o empregador responsável pelos atos do empregado significa responsabilidade objetiva.

Significa que pode haver responsabilidade civil objetiva por fato de terceiro, mas por outra conotação de fato de terceiro. Empregado, filhos, tutor, curador, entre outros.

Logo, se estivermos diante de uma excludente do nexo de causalidade, não haverá responsabilidade civil nem objetiva. Tendo essas bases da responsabilidade civil em mãos, podemos começar a falar da...
 

Responsabilidade civil nas relações de consumo

Arts. 12 a 14 do Código de Defesa do Consumidor.

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - sua apresentação;

II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi colocado em circulação.

§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.

§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Art. 13:

Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:

I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;

II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;

III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis.

Parágrafo único. Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causação do evento danoso.

Estamos diante de fato do produto.

O art. 14 trabalha com fato do serviço. 

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - o modo de seu fornecimento;

II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi fornecido.

§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Para que haja fato do produto, ou melhor, para que haja acidente de consumo, é necessário que o produto ou o serviço sejam defeituosos. Se inexistir defeito, não há responsabilidade civil.

Como funciona isso? O defeito se transforma em condição para a responsabilidade objetiva. É condição. E já vimos que, se o fornecedor provar que não existe defeito no produto, então não há responsabilidade civil. Isso exatamente nos termos do Código de Defesa do Consumidor.

O defeito pode se apresentar de três formas. Pode ser:

  1. De concepção;
  2. De produção; ou
  3. De distribuição.

Este último também chamado de defeito de comercialização.

Defeito de concepção é defeito da engenharia básica, do desenvolvimento, da criação do produto. Na fórmula de remédios, por exemplo. Ao concebê-lo, o fabricante não elabora da forma que deveria.

Na produção, o defeito é aquele do maquinário, como o equipamento responsável por produzir o pneu. Ao invés de sair com a calibragem X, ele sai com a calibragem Y. A concepção foi perfeita, mas na produção temos o defeito que gera o fortuito interno. E o defeito na distribuição, por sua vez, é a ausência de informação adequada. O produto é bonito, foi fabricado devidamente, mas apresenta riscos, é perigoso, e precisa exibir as informações sobre os riscos. O fornecedor esquece-se de colocar a informação necessária para se evitar o dano dos riscos. Falta de conservação do produto, por exemplo.

Temos responsabilidade civil na medida em que o produto apresenta um defeito.
 

Fato do produto e vício do produto

Preste atenção: existe uma coisa chamada fato do produto e outra coisa chamada vício do produto. São coisas diferentes! Todavia, tanto no fato do produto como no vício do produto, este apresenta um defeito. Sem defeito, não há fato nem vício do produto. Então qual a diferença? No fato do produto, o defeito causa um dano mais grave, de grandes proporções. Quando mencionamos fato do produto, automaticamente estamos mencionando acidente de consumo. É um evento grave, que causa grandes prejuízos ao consumidor. Via de regra, prejuízos físicos, ou materialmente relevantes, psicologicamente graves.

E no vício do produto? Há um defeito, mas esse defeito não é extrínseco ao produto, não se manifesta extrinsecamente. Simplesmente funciona mal ou não funciona. Se temos um fato, um evento extrínseco, temos um acidente de consumo, que é grave, daí fato do produto. Se houver mau funcionamento ou simples não funcionamento, teremos vício do produto.

Exemplo de fato do produto: a navalha que corta cinco dedos do passageiro do carro que procura o cinto de segurança. Exemplo de vício do produto: cinto de segurança que não encaixa, ou saiu mais curto do que deveria. Também o banco do carro, que deveria ir para frente ou para trás, mas que não se move de jeito nenhum. Você não consegue mover o banco. Trata-se de quê? Vício, porque o defeito é intrínseco ao produto.