Na última aula falamos de publicidade
enganosa e publicidade
abusiva, e trabalhamos com a inversão do ônus da prova justamente
quando se
trata de publicidade enganosa e publicidade abusiva. Inverte-se o ônus
e, quem
tem que provar que o anúncio não é enganoso nem abusivo é o fornecedor,
que faz
veicular a publicidade.
Vamos agora para práticas abusivas,
discriminadas no art. 39
no Código de Defesa do Consumidor.
São abusivas
as
práticas que atentem contra a dignidade da pessoa humana, a igualdade
de
origem, raça, cor e idade (art. 39, inciso IV do CDC), os direitos
humanos
(art. 3º, inciso II da CF), a intimidade, a vida privada a honra e a
imagem das
pessoas (art. 5º, inciso X da CF).
Primeira coisa: a prática abusiva latu sensu é carreada de imoralidade.
Quando trabalhamos com a
publicidade abusiva, nós vimos que não necessariamente ela será falsa.
Não necessariamente
induz o consumidor em erro. A publicidade abusiva, na verdade, é
discriminatória, trata o consumidor de forma aética, não ética. A
prática
abusiva segue essa mesma linha. É uma prática dotada de imoralidade, o
que
significa dizer que o fornecedor, quando trata abusivamente o
consumidor, o faz
de forma a discriminá-lo, a abusar de sua inocência, utilizando-se de
seu
poderio econômico para empurrar certos produtos e serviços ao
consumidor, ou seja,
a prática abusiva é imoral e aética.
O art. 39 do Código de Defesa do
Consumidor traz exemplos de
condutas tratadas como
abusivas. Por que estamos falando que o art. 39 traz “exemplos”? Porque
o art.
39 é exemplificativo e não exaustivo (ou taxativo). Então tudo aquilo
que for
visto como imoral ou aético pode ser considerado como prática abusiva,
não
necessariamente prevista dentro do CDC.
Vamos ler todos os incisos do art. 39
e entenderemos como
que pode se manifestar a abusividade do fornecedor. Já sabemos uma
maneira de o
fornecedor tratar abusivamente o consumidor. Uma é por meio da
publicidade. A
publicidade abusiva é uma prática abusiva. Então já podemos dizer que a
prática
abusiva é gênero, que tem diversas espécies. A prática abusiva em
sentido lato
é a conduta imoral e aética do fornecedor perante o consumidor.
E será que não existe prática abusiva
entre fornecedores? Ou
a prática abusiva só se dá entre fornecedor e consumidor? Dependerá de
sob qual
ângulo estamos analisando a questão, sob qual ponto de vista. Se
estivermos
olhando sob o ponto de vista do Código de Defesa do Consumidor, só
existe
prática abusiva feita pelo fornecedor contra o consumidor. Se
estivermos
olhando sob o ponto de vista da Lei 9279/96, a Lei de Propriedade
Industrial, a
prática abusiva pode sim ocorrer entre fornecedor e fornecedor, e
existe um
nome próprio para isso: concorrência
desleal.
Mais uma coisa com relação às
práticas abusivas: a classificação.
Classificação
das
práticas abusivas
Existem dois critérios para
classificarmos as práticas
abusivas. Um é quanto ao momento em que
se manifestam as práticas abusivas no processo econômico, e
outro critério
é o jurídico-contratual.
Pelo primeiro critério, quanto ao
momento em que se
manifestam no processo econômico, são duas as espécies de práticas
abusivas:
Muito bem.
Quando trabalhamos com uma prática
produtiva abusiva,
perguntamos: em que momento a prática está se manifestando? No momento
em que o
produto é fabricado, produzido. O produto é fabricado com desrespeito
às normas
técnicas impostas pelo Estado, com desrespeito aos padrões de produção
fixados.
Então, a prática produtiva abusiva se manifesta no momento em que o
produto é
gerado. O fornecedor está gerando um produto em desacordo com os
padrões de
construção e fabricação, em desrespeito àquilo que o Inmetro ou o
Conmetro
estabelecem, ou àquilo que a Anvisa estabelece. A prática abusiva
produtiva se
manifesta no momento da fabricação.
Note que esta classificação é
doutrinário-teórica. O produto
não foi posto no mercado ainda, então aparentemente não poderia ser
configurada
a prática abusiva. Mas só aferiremos depois que a prática abusiva se
deu no
momento da geração do produto. Também devemos nos perguntar: “o defeito
decore
da comercialização ou da fabricação do produto?” Decorre de publicidade
abusiva
ou enganosa, em que não se diz exatamente aquilo que o produto faz?
Será que o veneno
de rato não mata rato? Ou um remédio para gripe que, no momento em que
se é
vendido, o comerciante diz que aquele remédio é para curar frieira e
não gripe.
O problema não está na fabricação do remédio, mas na comercialização.
Se for o
caso, a prática abusiva é comercial e não produtiva.
E essa é a segunda hipótese de
prática comercial: em qual
outro momento se manifesta a prática abusiva? No momento em que se
comercializa, como adiantado no parágrafo anterior. O art. 39, inciso
VIII é o
único dispositivo que trata da prática produtiva abusiva:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou
serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro); |
Todos os outros incisos do art. 39
são práticas comerciais abusivas.
Mas o momento em que se manifesta no
processo mercadológico
é só um critério de classificação.
Outro critério de classificação é o
critério jurídico-contratual.
Existem três subespécies do critério
jurídico-contratual.
Primeira: práticas
abusivas contratuais. Não estamos mais falando do momento de
manifestação.
Quando trabalhamos com práticas abusivas contratuais, queremos dizer
que
existem práticas abusivas que ocorrem no interior de um contrato, no
momento em
que ele está se desenrolando, se aperfeiçoando. Não confundir “no
interior do
contrato” com “presente em alguma cláusula do instrumento”. Aqui
falamos no
momento em que as partes estão cumprindo suas obrigações. Nesse
momento, existe
um vício, uma prática abusiva.
A segunda subespécie de prática abusiva
jurídico-contratual é
aquela que se desenrola pós-contrato, ou seja, depois de já
estabelecido o
contrato. Vamos com calma.
Se estamos trabalhando com prática
abusiva
jurídico-contratual, estamos trabalhando com três subespécies. A
contratual é a
que se verifica no decorrer do contrato. Exemplo: plano de previdência
privada,
que o consumidor só vai terminar de pagar em 20, 30 anos. Durante todo
esse
período, o contrato ainda está se aperfeiçoando, porque você paga uma
contribuição, um prêmio para a seguradora, que só lhe pagará a
indenização daqui
a muitos anos. Se ocorrer algum tipo de desvio da seguradora, ou seja,
ela se
comprometera a pagar uma indenização X, mas no decorrer do tempo,
enquanto o
contrato ainda está em vigência, ela decide baixar para 60% de X, isso
é uma
prática abusiva. E no curso do contrato, daí prática abusiva
jurídico-contratual, porque está no interior, durante o contrato.
Terceira subespécie: práticas
abusivas jurídico-contratuais
pré-contratuais: Como, de que forma que podemos ver uma
prática abusiva
jurídico-contratual numa fase pré-contratual? Estamos vendo que prática
abusiva
jurídico-contratual se classifica em contratual, pré-contratual e
pós-contratual.
Exemplo de prática abusiva pré-contratual é aquela plaquinha com nota
de
isenção de responsabilidade do estacionamento por objetos deixados no
interior
do veículo. É cláusula em branco do sistema jurídico brasileiro.
Observação: promessa de compra e
venda é regulamentada pelo
Código Civil, e não pelo CDC, então cuidado.
E qual é outro grande exemplo de
prática abusiva
jurídico-contratual pré-contratual? A publicidade! Tanto a enganosa
quanto a
abusiva. A publicidade acontece antes de se realizar o contrato, e pode
sim
configurar uma prática abusiva. Ela virá a integrar o contrato, mas se
dá antes
de realizar o contrato. Como vimos, a publicidade é um convite para o
consumidor contratar. Diferença é que a proposta vincula o contrato no
Código
de Defesa do Consumidor.
Veja o art. 39, inciso XII do CDC:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou
serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério. |
Ele deixa de estipular um prazo para
cumprir sua obrigação.
Vamos tentar dar um exemplo, e não é um contrato diferido. Nós dois
contratamos
que irei lhe prestar um serviço de mecânica. Consertarei o motor do seu
carro.
No momento da contratação, você deixa seu carro em meu estabelecimento
e eu
digo: “fique tranquilo(a) porque vou consertar.” Você vai embora para
casa e
pensa. “Mas pera! Preciso do carro para amanhã!” Não é um contrato de
longa
duração, mas existe um vício, um defeito no contrato porque o
fornecedor deixou de estipular um prazo.
Só ocorre
no interior do contrato.
Outro exemplo: art. 51 do Código.
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as
cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços
que: I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; [...] |
Ou seja, aquelas cláusulas que
exonerem o fornecedor de
responsabilidade por vícios e por fatos do produto são nulas de pleno
direito.
E nada têm a ver com contrato de prestação diferida. O art. 51 elenca
uma série
de práticas abusivas jurídico-contratuais que se classificam como
contratuais.
Por via de regra, as práticas
abusivas contratuais são
comerciais. Se se trata de defeito de fabricação, a prática abusiva e
pré-contratual.
E, finalmente, uma prática
abusiva pós-contratual: negar peças de reposição. Os
fornecedores devem
disponibilizar no mercado, por um prazo, na forma da lei, peças de
reposição. Mas,
como a tal disposição legal não existe, usa-se o prazo jurisprudencial
de um
ano. Se por acaso você contratou, comprou o produto, quebrou, você quer
a peça,
o fornecedor não disponibiliza, trata-se de uma prática abusiva
pós-contratual.
Outro exemplo é negar ao consumidor o direito ao recall.
O que é isso mesmo? Acontece muito com veículos. O carro
sai com algum defeito de fábrica e o consumidor já fechou o contrato, o
contrato já se aperfeiçoou, o consumidor já está andando com o veículo
viciado e
o fornecedor se nega a fazer o recall,
mesmo diante de pedidos das entidades governamentais, se sujeitando,
inclusive,
a tomar uma multa pesada dos PROCONs, do DPDC, etc. Mas se o veículo
saiu com
defeito de fábrica, isso não seria uma prática abusiva pré-contratual?
Também!
Uma não exclui a outra. Fornecer produto com defeito de fabricação ou
em
desacordo com normas técnicas estabelecidas é prática abusiva
pré-contratual.
Negar o reparo é prática abusiva pós-contratual.
Vamos, então, definitivamente, ao
art. 39 do Código de
Defesa do Consumidor.
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou
serviços, dentre outras práticas abusivas: I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos; II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes; III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço; IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços; V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; VI - executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes; VII - repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos; VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro); IX - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério; IX - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais; X - (Vetado). X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços. XI – (Dispositivo incluído pela MPV nº 1.890-67, de 22.10.1999, transformado em inciso XIII, quando da conversão na Lei nº 9.870, de 23.11.1999) XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério. XIII - aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido. Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento. |
Venda casada
A venda casada consiste no seguinte:
o consumidor tem
interesse
em comprar um determinado produto, que tem características próprias,
que
sozinho é suficiente para satisfazer suas necessidades. Ou seja, o
consumidor
quer comprar um shampoo. Ótimo. Basta aquele shampoo e o consumidor já
estará
satisfeito. Mas o fornecedor não vende o shampoo se o consumidor não
comprar o
condicionador. Isso é venda casada. Por quê? Se o shampoo é vendido
isoladamente, condicionar a venda do shampoo à venda do condicionador constitui venda casada.
E se no estabelecimento só tem aquela
embalagem que contém um shampoo e um condicionador? Tenham calma.
Quantas salsichas vêm num pacotinho?
12? E quantos pães de
cachorro-quente num pacote? Nove. Há um problema sério na mente dos
fornecedores?
Eles não têm condições de imaginar a diferença entre 12 e 9? Vender 12
salsichas ao invés de 9 é venda casada? Sabemos que não.
Mais um exemplo bem vívido: uma
pessoa só tem um braço; é
maneta. Vai comprar luvas porque pretende viajar para o Canadá. Tenta
comprar
uma única luva, mas o comerciante só vende o par. Indignado, o
deficiente
responde: “Deixe de ser imbecil! Sou maneta! Quero só uma!” O que vocês
acham
disso?
A grande chave é: qual é o produto?
No caso do shampoo e
condicionador, trata-se de um produto
coletivo. E no caso de um shampoo vendido isoladamente, o
produto é individual. Quem irá
dizer? O fornecedor
que disponibiliza o produto na fabricação. O que significa que se o
fabricante
do produto o fabricou como um kit,
então o produto é coletivo. Trata-se de um produto coletivo, é mais de
uma
unidade. Só a embalagem propriamente dita que irá mostrar que aquele
produto é
coletivo. É o fornecedor fabricante que determina a extensão do produto.
Estamos falando do fornecedor que
disponibiliza o produto no
mercado. Shampoo, por exemplo. Dentro de uma única embalagem, com a
base, a
publicidade, o shampoo e o condicionador. É um produto coletivo. A
fabricante
também disponibiliza só o shampoo e só o condicionador. Sem problema.
Agora imagine que o dono da farmácia
pegue um saco plástico
e junte o shampoo e o condicionador. É venda casada? É. Isso porque o
comerciante está transformando o produto individual em coletivo. E só o fabricante pode fazer isso.
Lâminas de barbear: em geral o
fornecedor disponibiliza
caixas com duas ou quatro. O consumidor não pode exigir que se venda
somente
uma, pela metade do valor do par. O fornecedor poderá dizer: “se
quiser,
procure outro fornecedor que disponibilize somente uma.”
Outra questão que pode ser suscitada
em relação à venda
casada é a compra de ingressos para os jogos da Copa de 2010 que se
realizarem
no Rio. Você, que tem parentes na cidade, já tem onde ficar. Então você
pede à
agência de turismo que lhe venda um pacote somente com o ingresso e com
a
passagem. Mas a agência só comercializa pacotes com o ingresso + a
passagem + a
hospedagem. Isso não é venda casada, pois é a própria agência que
coloca o
serviço de agenciamento no mercado. Ela determina o pacote dela.
Mais um: você vai assistir no fim de
semana na sala “XD” ao
filme "Os Três Mosqueteiros." Você chega lá no cinema e, claro, não
quer deixar de comer uma boa pipoca para acompanhar o filme. Mas você
não quer
comprar a pipoca de R$ 400,00. Então você compra em outro lugar, e a
Coca você
leva de casa mesmo, naquele copo plástico que você ganhou de brinde na
Copa de
94. Chega ao cinema e, quando você vai entrar com seu próprio copo e a
pipoca debaixo
do braço, o recepcionista o barra. “Você não pode entrar no cinema com
esse
copo de 1994!” O que você acha? É venda casada? E aqui sim, a resposta
certa é “depende”.
Já vimos isso antes. Se o fornecedor vende pipoca dentro do cinema e
nega sua
entrada porque você está de pipoca do concorrente, o que acontece neste
caso é
venda casada, porque ele condiciona você a assistir o filme comendo a
pipoca dele. Mas não são coisas
diferentes, pipoca
e filme? Serviço e produto? Significa que, se só se pode comprar aquela
pipoca,
que é a dele, então temos venda casada, e o fornecedor está
condicionando. O fornecedor
poderá impedir quando ele não fornecer o produto, então te impede por
outros
motivos, tais como questões de segurança ou higiene. Neste caso é
justificável,
e a proibição seria de entrar com “alimentos” ou com “bebidas”.
Observação: relação entre
concorrentes não importa ao
consumidor. Se está sendo servida cerveja dentro de uma festa pública,
mas a fabricante
de cerveja que patrocina o evento exigiu exclusividade, para que só a
marca
daquela fabricante seja vendida lá dentro, você poderá entrar com sua
cerveja
da concorrente. Claro que, na prática, você terá que dobrar o
segurança. A não
ser que a proibição da festa seja quanto a “entrar com garrafas de
vidro”: você
caminha em direção ao portão de entrada carregando uma garrafa long
neck
enquanto a organização só permitiu que se vendesse cerveja em lata. Aí
sim, não
haverá venda casada, pois o fundamento da proibição pode ser a
prevenção do uso
de cacos de vidro como arma.
Vamos adiante. Isso tudo foi só a
primeira proibição. Na venda
casada, O produto é vendido só se estiver atrelado a outro. Prática
abusiva.
Segundo tipo de proibição, ainda no
inciso I, é a condição quantitativa.
Vejam: o consumidor tem o direito de
comprar mais de um
produto igual ao outro. Mas o fornecedor não tem o direito de forçar a
venda de
produtos iguais juntos se eles puderem ser consumidos isoladamente ou
se também
forem oferecidos isoladamente. Exemplo: óleo de cozinha. Não falamos
mais de
shampoo e condicionador, nem de cinema e pipoca, que são, no primeiro
caso,
produtos diferentes e, no segundo, mescla de produto com serviço. Aqui,
o que o
fornecedor não pode fazer é condicionar a venda de um produto, que é
igual a
outro, à aquisição em determinadas quantidades. Se o óleo de soja é
vendido
isoladamente, o comerciante não pode juntar os dois e vender no mínimo duas embalagens de
cada vez. Isso é venda irregular em conjunto, o que significa dizer
que, se o
consumidor quiser comprar dois óleos, ele pode, mas o comerciante não
poderá
juntar dois. É um tipo de venda casada que chamamos de condicionante
quantitativa.
Existe outra coisa chamada limite de estoque. Agora temos uma
proibição para o consumidor. A priori,
ele pode comprar quantos produtos iguais ele quiser. Mas o fornecedor
pode se
negar a vender uma quantidade exagerada de produtos, ou, até mesmo, se
negar a
vender mais de um produto para um mesmo consumidor. Por quê? Existe uma
justificativa plausível. Limite de estoque. Já viram aquelas
publicidades: “venda
limitada a um CPF”? A justificativa é que o fornecedor tem um estoque
limitado.
E, tendo uma quantidade limitada de exemplares para vender, ele
preferirá
vender para cem diferentes pessoas do que cem unidades para um único
consumidor. Será melhor para o negócio. Ele terá que provar que tem o
estoque
limitado, se demandado numa ação em que se questiona o porquê de não
vender “regularmente”.
Não precisa ser veiculada anteriormente a condição de venda.
Vamos ao inciso II:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou
serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes; |
Recusa ao atendimento à demanda do
consumidor. Exemplo: Ticiana
foi para o Garota Carioca com as amigas comemorar aquele aniversário e
toma
todas, se acaba. Sai de lá troncha, torta. Ela decide que não tem
condições de
dirigir. Mas ela mora ali na 302 Norte! Poderia só atravessar a pista,
mesmo
que não esteja vendo a pista. Chama um taxi, mas o taxista diz: “minha
senhora,
eu mesmo estou vendo seu prédio daqui. É aqui do lado! De jeito nenhum
farei
uma viagem só para te levar até ali!” Ela responde: você não tá
entendendo! E
aí, o taxista pode negar? Porque Ticiana, saindo do Garota, estará
certamente
com um CDC na bolsa, e lê para o taxista o inciso II do art. 39. “Tem
que
levar, meu amigo!” Mesmo que só 500 metros de viagem. “Você não pode
recusar a
demanda do consumidor se você tem o produto ou serviço à disposição!”
Obviamente, claro, limitado ao estoque. Mas aqui falamos de serviços.