Direito Processual do Trabalho

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Conciliação, contestação, revelia, reconvenção  e provas


Vamos falar hoje sobre a conciliação. Quando falamos em conciliação, precisamos nos lembrar do seguinte: só posso fazer um acordo sobre os pedidos feitos na reclamação. Exemplo: o trabalhador pediu adicional de periculosidade e horas extras. Não adianta fazer um acordo sobre danos morais e diferenças de FGTS. O acordo possui limites tanto objetivos quanto subjetivos.

Objetivo é limite quanto ao objeto, à causa de pedir, e subjetivo é o limite relativo às partes. O terceiro que está de olho em tudo é a Previdência Social. Isso porque há parcelas do objeto de acordo que têm natureza salarial. Se houver itens de natureza salarial, eles gerarão recolhimento para a Previdência. Ao contrário, se tenho a receber parcelas de natureza indenizatória, não há recolhimento previdenciário sobre elas. Não se precisa atender a todos os pedidos, mas qualquer pagamento deve ser imputado: cada item do acordo deve ser discriminado e especificado: se horas extras, se décimo terceiro salário, se salário in natura não pago, ou se, por exemplo, pagam-se férias não gozadas e não indenizadas, caso esse que constitui exemplo de verba de natureza indenizatória.

Há casos em que só é possível fazer acordo sobre parcelas de natureza indenizatória, então sinto muito para a Previdência. Pecúlios, compensações previstas em instrumento coletivo, reembolsos, vale refeição que por algum motivo não foi concedido quando deveria, diferenças no fundo de garantia, ou de algo que deixou de ser recolhido... Tudo isso é indenização. Horas extras constituem salário, bem como décimo terceiro (gratificação natalina) e reajuste à categoria, entre outros.

Vejam, então o § 3º do art. 832:

Art. 832 - Da decisão deverão constar o nome das partes, o resumo do pedido e da defesa, a apreciação das provas, os fundamentos da decisão e a respectiva conclusão.

[...]

§ 3o As decisões cognitivas ou homologatórias deverão sempre indicar a natureza jurídica das parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado, inclusive o limite de responsabilidade de cada parte pelo recolhimento da contribuição previdenciária, se for o caso.

Estamos falando em acordo. Na ata da conciliação o juiz manda reduzir a termo o que a parte disse: “pagarei R$ 10 mil”. O juiz perguntará como se chegou a esse valor. Nisso, tudo tem que ser discriminado. O que estamos dizendo é que o advogado deverá dizer a que título o seu cliente está pagando, e como se compôs aquele valor de R$ 10 mil. Se desse montante pedem-se R$ 7 mil de FGTS + férias não gozadas, desses 7 mil seu cliente não pagará nenhum centavo além para a Previdência Social. Agora, sobre os R$ 3 mil restantes, que se referem a horas extras, haverá mais um dinheiro a ser pago à Previdência, pois horas extras é verba de natureza eminentemente salarial. Os advogados dos reclamados tentam pagar o máximo possível em parcelas de indenizatórias para evitar as salariais. A Previdência poderá até recorrer caso se sinta lesada com um acordo que, convenientemente, deixou de contemplar verbas salariais devidas. Para ela a decisão não transita em julgado. O acordo para as partes é que transita.

Mas qual o sentido de a Previdência recorrer? O juiz não está lá para fiscalizar? Há juízes que não veem, não atentam para isso, enquanto outros só fingem que não veem. E outros alertam que, muito embora não intervenham nos termos do acordo, que remeterão os autos à Previdência para que eventualmente recorra da decisão.

§ 4º, ainda do art. 832:

§ 4o  A União será intimada das decisões homologatórias de acordos que contenham parcela indenizatória, na forma do art. 20 da Lei no 11.033, de 21 de dezembro de 2004, facultada a interposição de recurso relativo aos tributos que lhe forem devidos.

O INSS é avisado de todo acordo realizado. Os procuradores não conseguem cuidar de tudo, mas tomam conhecimento. 
 

Alcance da conciliação

O que quer dizer alcance? Se pegarmos uma ata de acordo trabalhista, veremos que os acordos podem ser de duas espécies: “o reclamante dá quitação pelo objeto da inicial.” O que quer dizer com isso? Que, pelo que ele reclamou, ele não poderá acionar o empregador novamente. Mas poderá ajuizar sobre algo que não tenha pedido nessa reclamação. Exemplo: o empregado pediu férias e décimo terceiro. O patrão compareceu e fez acordo sobre os pedidos. Outro dia o mesmo empregado surge querendo indenização por dano moral, porque em determinado dia ele foi admoestado vexatoriamente na frente dos colegas. Para saber se prosperará, seu advogado deverá olhar a ata lavrada no acordo passado, aquele em que pedia verba de férias e 13º. Qual foi o alcance, o objeto da inicial da reclamatória naquela ocasião? O que foi pedido não pode mais ser pedido. O que não foi deduzido poderá ser objeto de nova reclamação.

Temos outro tipo de acordo que fazemos raramente: quando o trabalhador está em mais de uma demanda ao mesmo tempo. Então pode-se pedir que o trabalhador faça acordo sobre itens que não foram contemplados na inicial da reclamatória. Quase sempre os advogados das empresas fazem com que seus clientes proponham da seguinte forma: “pago este valor pelo objeto da inicial e extinguimos o contrato de trabalho.” Significa que qualquer outra coisa que o empregado entenda ter direito e, eventualmente, venha a pedir, ele não poderá. Expliquem para seus clientes empresários esse pequeno detalhe. ¹

Como vimos, o acordo funciona como uma decisão transitada em julgado. Ou seja, não cabe mais recurso. Art. 831, parágrafo único da CLT:

Art. 831 - A decisão será proferida depois de rejeitada pelas partes a proposta de conciliação.

Parágrafo único. No caso de conciliação, o termo que for lavrado valerá como decisão irrecorrível, salvo para a Previdência Social quanto às contribuições que lhe forem devidas.

Como atacamos um acordo feito em juízo? Só por ação rescisória. Súmula 259 do TST:

Súmula 259 do TST – TERMO DE CONCILIAÇÃO. AÇÃO RESCISÓRIA

Só por ação rescisória é impugnável o termo de conciliação previsto no parágrafo único do art. 831 da CLT.

Rateio das custas processuais: na prática, quase sempre o juiz coloca-as sob responsabilidade do trabalhador, que é beneficiário da justiça gratuita, para então isentar as partes.
 

Revelia

Na forma do art. 319 do CPC, revelia é a não apresentação de defesa. A penalidade consequente da revelia é a mesma da parte que não comparece a uma audiência na Justiça do Trabalho: presunção de veracidade das alegações da parte contrária.

Art. 319.  Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.

Por que a ausência do reclamado à audiência trabalhista é revelia? Muito simples: porque a chance de oferecer defesa é exatamente na audiência inaugural. Se não comparecer, então não oferecerá defesa, portanto é revel.

Art. 844 da Consolidação:

Art. 844 - O não-comparecimento do reclamante à audiência importa o arquivamento da reclamação, e o não-comparecimento do reclamado importa revelia, além de confissão quanto à matéria de fato.

Parágrafo único - Ocorrendo, entretanto, motivo relevante, poderá o presidente suspender o julgamento, designando nova audiência.

Antes de tudo, não se esqueçam de ignorar a palavra “presidente” no parágrafo único acima. Presidente é do tempo das juntas de conciliação. Hoje leia “juiz do trabalho”. O que acontece se o reclamado comparece à primeira audiência, entrega a defesa e chega atrasado para a segunda audiência, de instrução? Ele será confesso sobre a matéria fática, porque foi intimado a depor e não depôs. A causa está prevista no CPC, no art. 277. Vimos ontem a Súmula 74 do TST. O art. 277 do CPC, que trata do rito sumário no Processo Comum, dispõe de forma parecida, em seu § 2º:

Art. 277. O juiz designará a audiência de conciliação a ser realizada no prazo de trinta dias, citando-se o réu com a antecedência mínima de dez dias e sob advertência prevista no § 2º deste artigo, determinando o comparecimento das partes. Sendo ré a Fazenda Pública, os prazos contar-se-ão em dobro.

§ 1º A conciliação será reduzida a termo e homologada por sentença, podendo o juiz ser auxiliado por conciliador.

§ 2º Deixando injustificadamente o réu de comparecer à audiência, reputar-se-ão verdadeiros os fatos alegados na petição inicial (art. 319), salvo se o contrário resultar da prova dos autos, proferindo o juiz, desde logo, a sentença.

Seja a ausência de defesa, ou a ausência à audiência em que tem que depor, o resultado prático é o mesmo. Não confundam: revel no Processo do Trabalho é aquele que deixa de apresentar a defesa, ou seja, não se manifesta na audiência inaugural. Deixar de comparecer à segunda audiência não é revelia, embora o resultado prático seja o mesmo.

Essa presunção de veracidade, seja num caso ou no outro, não é absoluta. O juiz avalia as provas mesmo assim. Se possível aliviar algo, então ele alivia para aquele que deixou de comparecer. Os documentos constantes dos autos servem de amparo ao magistrado. Eles podem sim relativizar um pouco os efeitos da presunção de veracidade.

No Processo do Trabalho, não se apresenta a defesa em cartório, como se faz no Processo Civil. Ao faltar à audiência, perde-se uma oportunidade processual. A ausência é muito pior no processo trabalhista por isso. O prazo é justamente a audiência designada o prazo.

Observação: cabe reconvenção no Processo do Trabalho. Há juízes que entendem que não cabe, entretanto, no rito sumaríssimo, por analogia com a Lei 9099/1995.
 

Formas de defesa

Antes de entrar na contestação propriamente dita, vamos ver as exceções no processo trabalhista. São duas as previsões na CLT: de incompetência e de suspeição. Na CLT só se fala de suspeição, mas aplicamos o Código de Processo Civil subsidiariamente. A CLT é muito mais branda. O juiz considerado suspeito para a CLT é somente o parente da parte. A CLT não prevê o parentesco do juiz com o advogado da parte. Então temos que usar o CPC.

As exceções estão disciplinadas nos arts. 799 a 802 da Consolidação.

Se falarmos de incompetência em razão das pessoas ou da matéria, vamos oferecê-la na própria contestação, nas preliminares. Incompetência em razão da matéria tem por fundamento o art. 114 da Constituição. Relação de consumo, relação de trabalho, direito de greve, etc.

Se a incompetência for em razão do local, só caberá a arguição da incompetência relativa, em peça apartada.

Aplicamos as hipóteses de suspeição e impedimento do CPC ao Processo do Trabalho.

Leiamos os artigos 799 a 802 da CLT:

Art. 799 - Nas causas da jurisdição da Justiça do Trabalho, somente podem ser opostas, com suspensão do feito, as exceções de suspeição ou incompetência.

§ 1º - As demais exceções serão alegadas como matéria de defesa.

§ 2º - Das decisões sobre exceções de suspeição e incompetência, salvo, quanto a estas, se terminativas do feito, não caberá recurso, podendo, no entanto, as partes alegá-las novamente no recurso que couber da decisão final.

O § 2º fala de decisões interlocutórias. Só se pode discutir se forem terminativas do feito.

Art. 800:

Art. 800 - Apresentada a exceção de incompetência, abrir-se-á vista dos autos ao exceto, por 24 (vinte e quatro) horas improrrogáveis, devendo a decisão ser proferida na primeira audiência ou sessão que se seguir.

Suspeição do juiz para a CLT está no art. 801:

Art. 801 - O juiz, presidente ou vogal, é obrigado a dar-se por suspeito, e pode ser recusado, por algum dos seguintes motivos, em relação à pessoa dos litigantes:

a) inimizade pessoal;

b) amizade íntima;

c) parentesco por consangüinidade ou afinidade até o terceiro grau civil;

d) interesse particular na causa.

Parágrafo único - Se o recusante houver praticado algum ato pelo qual haja consentido na pessoa do juiz, não mais poderá alegar exceção de suspeição, salvo sobrevindo novo motivo. A suspeição não será também admitida, se do processo constar que o recusante deixou de alegá-la anteriormente, quando já a conhecia, ou que, depois de conhecida, aceitou o juiz recusado ou, finalmente, se procurou de propósito o motivo de que ela se originou.

Não se esqueçam de que não existem mais vogais. Isso também era do tempo das juntas de conciliação e julgamento! E não deixe de observar, no caput do art. 801, que a Consolidação se refere à pessoa dos litigantes, e nada fala sobre advogados.

O parágrafo único trata, de maneira parecida, à hipótese do § 1º do art. 138 do CPC.

§ 1o  A parte interessada deverá argüir o impedimento ou a suspeição, em petição fundamentada e devidamente instruída, na primeira oportunidade em que lhe couber falar nos autos; o juiz mandará processar o incidente em separado e sem suspensão da causa, ouvindo o argüido no prazo de 5 (cinco) dias, facultando a prova quando necessária e julgando o pedido.

Continuemos com a CLT. Art. 802:

Art. 802 - Apresentada a exceção de suspeição, o juiz ou Tribunal designará audiência dentro de 48 (quarenta e oito) horas, para instrução e julgamento da exceção.

§ 1º - Nas Juntas de Conciliação e Julgamento e nos Tribunais Regionais, julgada procedente a exceção de suspeição, será logo convocado para a mesma audiência ou sessão, ou para a seguinte, o suplente do membro suspeito, o qual continuará a funcionar no feito até decisão final. Proceder-se-á da mesma maneira quando algum dos membros se declarar suspeito.

§ 2º - Se se tratar de suspeição de Juiz de Direito, será este substituído na forma da organização judiciária local.

Troque “Juntas de Conciliação e Julgamento” por “Varas do Trabalho”. Essas são decisões relativas à incompetência.

O que diz o parágrafo único do art. 305 do Código de Processo Civil? Que a exceção de incompetência pode ser apresentada no juízo que foi movido o processo, ou no local de residência do acionado:

Parágrafo único. Na exceção de incompetência (art. 112 desta Lei), a petição pode ser protocolizada no juízo de domicílio do réu, com requerimento de sua imediata remessa ao juízo que determinou a citação.

Isso não pode ser feito no Processo do Trabalho. Deve-se apresentar a exceção no local do trâmite.

Terminamos de falar de incompetência e suspeição. E os impedimentos do magistrado? No Código de Processo Civil, eles estão arts. 134 e 136:

Art. 134.  É defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário:

I - de que for parte;

II - em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como órgão do Ministério Público, ou prestou depoimento como testemunha;

III - que conheceu em primeiro grau de jurisdição, tendo-lhe proferido sentença ou decisão;

IV - quando nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou qualquer parente seu, consangüíneo ou afim, em linha reta; ou na linha colateral até o segundo grau;

V - quando cônjuge, parente, consanguíneo ou afim, de alguma das partes, em linha reta ou, na colateral, até o terceiro grau;

VI - quando for órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa.

Parágrafo único.  No caso do no IV, o impedimento só se verifica quando o advogado já estava exercendo o patrocínio da causa; é, porém, vedado ao advogado pleitear no processo, a fim de criar o impedimento do juiz.

Art. 136.  Quando dois ou mais juízes forem parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta e no segundo grau na linha colateral, o primeiro, que conhecer da causa no tribunal, impede que o outro participe do julgamento; caso em que o segundo se escusará, remetendo o processo ao seu substituto legal.

O art. 135, no meio desses dois, fala sobre a suspeição:

Art. 135.  Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do juiz, quando:

I - amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes;

II - alguma das partes for credora ou devedora do juiz, de seu cônjuge ou de parentes destes, em linha reta ou na colateral até o terceiro grau;

III - herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de alguma das partes;

IV - receber dádivas antes ou depois de iniciado o processo; aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, ou subministrar meios para atender às despesas do litígio;

V - interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes.

Parágrafo único.  Poderá ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo íntimo.

O juiz também pode se declarar suspeito por motivo de foro íntimo, tanto no Processo Comum quanto no Trabalhista.

Observações:

  1. O que é suspeição para a CLT é impedimento para o CPC. Compare o art. 801 daquela com o art. 134 deste.
  2. O Art. 136 do Código de Processo trata do impedimento entre juízes.
  3. Se o juiz “bater o pé” sobre a suspeição, quem julgará o incidente é o tribunal. Se julgado suspeito, o próprio juiz pagará as custas.

 

Contestação

Temos a seguinte estrutura: preliminares, prejudiciais e mérito. Preliminar é a tentativa de que o mérito não seja julgado. No Processo Civil, pode-se alegar a preliminar de ilegitimidade, nulidade de citação, litispendência, carência de ação e todas as que aprendemos no processo de conhecimento no Processo Comum; no Processo do Trabalho temos a inobservância do prazo de cinco dias para o oferecimento da defesa. Tenta-se, com a alegação das preliminares, impedir o julgamento da lide propriamente dita.

Temos uma segunda linha de raciocínio que é considerada pela lei como mérito: a extinção do feito pela prescrição, por exemplo. Isso é mérito. Art. 269 do CPC, inciso IV:

Art. 269. Haverá resolução de mérito:

[...]

IV - quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição;

[...]

Já as prejudiciais não visam a impedir o julgamento da lide mas, uma vez analisada uma prejudicial, isso influenciará, predeterminará o julgamento do mérito, o teor da decisão posterior, colocando uma premissa no raciocínio que o juiz terá que fazer para proferir a decisão seguinte. ²

O mérito é a impugnação de fato por fato, a criação de obstáculos a cada uma das pretensões descabidas do autor, não de maneira genérica, mas sim de maneira precisa, clara e objetiva, o mais possível.

E a eventualidade? Temos um prazo para fazer algo. O prazo desses remédios jurídicos no Processo do Trabalho é a audiência. O art. 300 do CPC diz:

Art. 300.  Compete ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito, com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir.

Toda a matéria de defesa, seja direta, indireta, a chance é essa. Não se pode esperar a segunda oportunidade para tirar um coelho da cartola. Não deixem de atacar o mérito, porque a preliminar pode não ser acolhida. Toda a matéria de defesa deve ser alegada na contestação.

Temos que impugnar especificamente as alegações que temos que derrubar, ou atrairá a presunção de veracidade. O professor já foi examinador da OAB, e via que candidatos engraçadinhos, ao invés de impugnar os fatos narrados na inicial do autor do problema hipotético apresentado, deixavam de tocar no assunto. O que não se impugna é verdadeiro. Não se pode deixar de discutir. Se não souber o que fazer, veja o art. 467 da CLT:

Art. 467. Em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de cinqüenta por cento.

Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e as suas autarquias e fundações públicas.

Parte incontroversa dessas verbas! Então aquilo que não for impugnado terá que ser pago na primeira audiência. Mande que seu cliente leve um dinheiro na primeira audiência, você estiver representando o empregador-empresário-reclamado. “Como assim, doutor?! Eu te contratei exatamente para não pagar, e você está me instruindo a levar dinheiro para pagar?” A resposta é sim. Dentre as possíveis alegações de um trabalhador reclamante, há coisas que são como batom na cueca mesmo. Não há como questionar. Então é bom ter no bolso a verba para a parte incontroversa do pedido, para não ter, depois, que pagar 1,5 vezes aquele valor. Para evitar a presunção de veracidade de tais alegações causadas pela abstenção de se discuti-las, portanto, você, como advogado do reclamado, deverá dizer que “não aconteceu daquela forma, e que responderá no momento processual oportuno.” Só então, na segunda oportunidade, em que o reclamado depõe é que vocês, cliente e advogado, “poderão esquecer”. Fazendo isso você cria a controvérsia.

Impugnação específica dos itens do pedido do autor/reclamante: caput do art. 302:

Art. 302.  Cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial. Presumem-se verdadeiros os fatos não impugnados, salvo:

[...]

Precisamente, e não genericamente.

Depois de oferecida a contestação, não se podem trazer novas alegações. Art. 303 do CPC traz as exceções a essa regra:

Art. 303.  Depois da contestação, só é lícito deduzir novas alegações quando:

I - relativas a direito superveniente;

II - competir ao juiz conhecer delas de ofício;

III - por expressa autorização legal, puderem ser formuladas em qualquer tempo e juízo.

 
No Processo do Trabalho caberia a hipótese do inciso I, que é muito difícil de acontecer. Não se pode criar outra tese no recurso.

Reconvenção

Não é prevista expressamente na CLT, então usamos o CPC subsidiariamente. Arts. 315 ao 318. Para que se valha da reconvenção, o reconvinte precisa que haja conexão entre as duas ações ou, pelo menos, a tese da reconvenção deverá estar relacionada ao fundamento da defesa. Exemplo: o trabalhador requer uma verba de qualquer tipo, tal como uma indenização pela demissão (art. 477 da Consolidação). O patrão reconvém dizendo que o empregado abandonou a empresa, gerando várias perdas, e quer reavê-las.

O juiz, então, abrirá prazo. O reclamado foi notificado, e apresenta a contestação e a reconvenção. Em seguida, o reclamante, em face da contestação do reclamado, se manifesta sobre a apresentação de documentos (réplica) e, em face da reconvenção do reclamado, apresenta sua própria contestação, e, em face desta, o reclamado apresentará sua réplica com a manifestação sobre os documentos apresentados na contestação do trabalhador.

Parece um quebra-cabeças, então vamos colocar as duas ações em paralelo:

  1. Trabalhador ajuíza reclamação trabalhista –> empregador contesta –> trabalhador manifesta-se em réplica sobre os documentos e alegações do reclamado.
  2. Empregador reconvém –> trabalhador contesta –> empregador manifesta-se sobre os documentos apresentados em réplica pelo trabalhador.
  3. Uma sentença julga a ação e a reconvenção.

Segundo a doutrina, para que possa haver a reconvenção, o juiz tem que ser competente e os ritos da reconvenção e da ação primeiramente movida têm que ser compatíveis.

A reconvenção é ação autônoma. Se houver desistência da ação principal a reconvenção continuará.

Art. 317.  A desistência da ação, ou a existência de qualquer causa que a extinga, não obsta ao prosseguimento da reconvenção.

A reconvenção é um contra-ataque da defesa, e a sentença deverá analisá-la juntamente com a ação inicial do trabalhador.

Art. 318.  Julgar-se-ão na mesma sentença a ação e a reconvenção.

 
Provas

Empregador ofereceu a defesa. Tentou acordo, não ocorreu. Ofereceu, portanto, a contestação. Agora temos instrução processual. Nela, faz-se a apresentação de provas, o convencimento do magistrado. O ônus da prova cumpre à parte que alega. É a única regra que dispõe sobre distribuição do ônus da prova: art. 818:

Art. 818 - A prova das alegações incumbe à parte que as fizer.

O art. 818 repete, com outras palavras, o teor do art. 333 do CPC.

Art. 333.  O ônus da prova incumbe:

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Parágrafo único.  É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:

I - recair sobre direito indisponível da parte;

II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.

Essa regra do art. 818 é a única prevista na CLT. Quase sempre o trabalhador terá que provar o que está alegando. E quase sempre ele que ajuizará contra o empregador. O empregado diz que não recebeu salários. O empregador contesta dizendo que recebeu sim. Então ele opõe fato impeditivo do direito do reclamante. Por isso não usamos a regra simples da CLT, mas sim o inciso II do art. 333 do CPC. O juiz, então, manda o reclamado apresentar os comprovantes. “Mas perdi os recibos!” – entristece-se o reclamado. A resposta do magistrado deverá ser: “então você pagou mal.” O mesmo para horas extras: o empregado alega que trabalhou além da jornada contratualmente estabelecida, então cabe ao patrão trazer os comprovantes de que pagou ou de que ele não trabalhou.

Equiparação salarial: presunção de veracidade das alegações do trabalhador, salvo justa causa. Equiparação salarial entra no inciso II do art. 333, e existe também o inciso VI da Súmula 6 do TST:

VIII - É do empregador o ônus da prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação salarial.

Aplica-se subsidiariamente ao Processo do Trabalho esse inciso II do art. 333 do Código de Processo Civil.
 

Princípios que regem a prova no Processo do Trabalho

Primeiro: princípio do contraditório e ampla defesa. O contraditório é previsto no inciso LV do art. 5º da Constituição, que é a possibilidade de manifestação recíproca sobre tudo.

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

Segundo princípio é o da necessidade da prova. Quando o art. 818 diz que o ônus da prova cabe à parte que as fizer, posso presumir que o que não é provado não existe. É o que diz o princípio da necessidade da prova. O juiz sabe, quase sempre na prática, que o que os litigantes fazem é errado. Às vezes ele lê a petição inicial e já sabe o que é verdade e o que é mentira, pela experiência ou pela reputação da empresa. Ainda que ele saiba que é verdade, sem provas não poderá condenar. Quase sempre sabe: os dois litigantes sabem, os dois estão mentindo, mas precisa da prova. Nada de provimento da reclamatória sem prova.

Princípio da unidade da prova: o exame da prova deve ser feito com base num todo, e não de forma pinçada. O professor teve uma experiência em que o juiz esqueceu absurdamente disso em Goiânia: aquele juiz ouviu as testemunhas do reclamante, que não tinham como saber o horário de trabalho dele daquela época porque só foram lá por três dias, e outros trabalhavam muito longe. Houve mais de um pedido, e os testemunhos foram apreciados positivamente para condenar num deles, mas não em outros. Isso não pode. O que esse princípio orienta é que, se em quatro ou cinco questões o depoimento da parte não foi suficiente para convencer, na sexta então não deverá convencer também. Se as alegações fazem certo sentido, não cabe escolher uma ou outra frase para desmerecer todo o depoimento.

Princípio da violação da prova ilícita: é a história do funcionário de banco que mandou e-mail pornográfico usando a conta institucional: o cerne da questão era se a prova fora obtida ilicitamente.

Princípio do livre convencimento ou persuasão racional: o juiz forma convicção livremente, sem pressão, mas tem que motivar sua decisão. Tem que fundamentar. É um princípio comum a todo o Direito. Está nos arts. 832, caput da CLT, e 131 do CPC.

Princípio da oralidade: no Processo do Trabalho é vigora que as provas são produzidas preferencialmente em audiência. Art. 845 da CLT:

Art. 845 - O reclamante e o reclamado comparecerão à audiência acompanhados das suas testemunhas, apresentando, nessa ocasião, as demais provas.

Para fazer em audiência terá que ser prova oral. Essa é a prioridade no Processo do Trabalho.

Princípio da imediação: comum a todo o Direito. Perguntas infelizmente não são feitas diretamente pelo advogado da parte às testemunhas, mas sim através do juiz, que é o diretor do processo, e ele colhe as provas. Bom é o juiz que apenas ouve a pergunta e manda que a testemunha responda, ou, no máximo, reformula levemente para ficar mais compreensível. Outros, entretanto, reformulam substancialmente, alterando o sentido pretendido pelo advogado, ou indeferem de plano.

Art. 765 da CLT:

Art. 765 - Os Juízos e Tribunais do Trabalho terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas.

O juiz tem, portanto, liberdade na direção do processo. Tudo ficará na mão do capa preta!

Por fim, o princípio da aquisição processual: é com base nisto que os juízes, de vez em quando, aceitam documentos fora dos prazos. Se recebidos, o juiz abre a oportunidade para a parte contrária manifeste-se imediatamente, ou, caso mais complexos, abrirá prazo. As provas não são da parte, mas do juízo.

Nulidades probatórias vamos falar na aula que vem.


  1. Logo depois deste parágrafo o professor fez uma observação sobre a ação de protesto, e disse que sua propositura não significa que o interessado demandou um devedor na Justiça do Trabalho, mas que o fará em breve. Ela indica que o credor apenas “zerou o cronômetro” para que não opere a prescrição.
  2. Expressão copiada ipsis litteris do esquema de aula do professor.