Direito Civil

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Efeitos das invalidades negociais, prescrição e decadência


Esta nota, pela sua grande extensão, ficou pendente de revisão. Cuidado.

“Lobo em pele de cordeiro.” Já ouviram essa expressão, né? Cuidado com a segunda prova. Ninguém pode tirar MI, ou estará reprovado. Há pessoas que não estão vindo às aulas. Mesmo quem tirou SS antes, tirando MI agora, estará reprovado. O professor não é bonzinho, ele é justo com quem merece. Justiça aristotélica: consiste em tratar conforme o mérito. É porque só temos mais uma aula, e depois uma revisão na quinta-feira e, em seguida, a prova. Dependendo de como for a aceitação com relação a esta matéria, o professor sugerirá uma aula ao sábado. Não comprometerá a aula de revisão. “Cuidado” – é tudo que ele diz.

Observação muito importante: Quem não traz o código não conseguirá fazer a prova inteira.


Dito isso, vimos na aula passada os últimos vícios negociais. A questão da lesão é eminentemente patrimonial, e difere da coação porque não envolve ameaça ou chantagem; difere do estado de perigo porque não envolve o risco de vida, nem a necessidade de salvar-se. Questão de prova: teoria da imprevisão vs. lesão. Vimos também os vícios sociais, que são a fraude contra credores e a simulação.

Diferença entre coação e estado de perigo: neste, o agente que se beneficia só tem a má-fé e conhecimento da complicada situação da outra parte, mas não provoca aquele estado, enquanto na coação ele age, é ativo.

Os vícios sociais: interessam à sociedade, como a fraude contra credores. Essa prática tem que ser reprimida pelo Direito, ou se buscaria o pagamento de dívidas sempre por via da força. Tem a ver com a dívida de devedor insolvente. Neste caso, haverá a possibilidade de se acionar o patrimônio do devedor insolvente para a quitação de obrigações. Questão de prova: fraude contra credores. Características: estado de solvência, negócios gratuitos e onerosos, inclusive os de garantias de dívidas.

Ação pauliana: ação revocatória, com intuito de anular o negócio fraudulento. Efeito: anular um contrato e fazer com que o bem transacionado retorne à propriedade do devedor insolvente. Feito isso, o credor tentará expropriar o bem que se tentou alienar. O prazo, como veremos hoje, é de 4 anos. Efeitos da fraude contra credores: anulação do negócio fraudulento; se houver um proveito, ele retornará em favor dos credores.

Imaginemos um negócio de compra e venda de uma propriedade rural celebrado entre Jofre e Onofre, os fazendeiros do dia 19/03. Jofre tem alguns credores já perdendo a paciência com ele, o que já faz com que ele seja considerado insolvente. Essa compra e venda é objeto de uma ação pauliana e, daqui a um ano, existe uma decisão que anula essa compra e venda, em que Jofre passou a Onofre a propriedade da fazenda. Mas, a essa altura, Onofre já está plantando nela, e tem frutos por colher em breve. E como fica Onofre nessa história? E os proveitos? Todos vão para os credores, ainda que sejam de valor maior do que a dívida que Jofre tinha. Para não ficar desamparado, Ulisses será indenizado, na melhor das hipóteses.

Simulação: vício social, que está no art. 167 do Código Civil. Gera a nulidade. É o único vício negocial que gerará a nulidade. Isso não quer dizer que não existam outros efeitos que gerarão nulidade, mas em termos de vício negocial sim.

A simulação admite uma modalidade absoluta, quando o negócio não é o que aparenta ser, ou relativa, quando o negócio até é feito e desejado, mas os efeitos não são sentidos. Como eu transferir o carro para alguém, mas eu continuar usando-o. Essa seria uma simulação absoluta. Ou vender bens do casal para a amante, mas sem receber o dinheiro, o que na verdade tem efeito de doação. Isso é simulação relativa. Existe efetivamente o negócio, mas não com os efeitos desejados, já que no contrato de compra e venda se espera o dinheiro em troca. Na verdade, foi doação. Atenção: a simulação absoluta gera nulidade, enquanto a relativa não gerará nulidade se não gerar prejuízo.

Existe simulação quando: § 1º do art. 167.

        Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.

        § 1o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

        I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;

        II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

        III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

        § 2o Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.

Exemplo: um corretor vende um apartamento por R$ 100.000,00, na data de hoje. Poucas horas depois, um outro interessado se apresenta querendo o mesmo apartamento, e pergunta: “poxa, cheguei atrasado, por quanto você vendeu?”. O corretor responde: “R$ 100 mil, cara...” então, o sujeito diz “que pena, eu também queria, e eu estava disposto a pagar 140.” Vendo que deixaria de ganhar comissão sobre essa diferença de 40 mil Reais, o corretor diz: “segura aí! Vou dar um jeito. Tome aqui o contrato de compra e venda, assine aí que eu coloco a data de anteontem. É como se o negócio celebrado com você fosse anterior.” E, em seguida, liga para o sujeito que pagara 100 mil e diz: “amigo, houve um grave engano, vi aqui nos registros que o apartamento que eu te vendi na verdade já havia sido vendido por outro corretor aqui, há dois dias! Me desculpe. Vamos desfazer.”

Se ficar provada a manobra, o negócio é absolutamente nulo, porque houve simulação. 

Então, vamos encerrar as invalidades.

São conseqüências dos defeitos negociais. Estão nos artigos art. 166 a art. 171, gerando situações de nulidade e anulabilidade. Os dois primeiros dizem respeito a circunstâncias gravíssimas, em que os negócios não poderão ser convalidados. Dispõem sobre a estrutura (art. 104) e a simulação. Ainda assim não se esqueçam: quando falamos em vícios negociais, há os de consentimento, e há os que afetam a estrutura do negócio. Nulo, como estamos cansados de saber, significa invalidade absoluta. As características são vício insanável, o interesse social, a possibilidade de o juiz agir de ofício, não sujeição à ação do tempo e efeito judicial ex-tunc. A partir de agora, vamos ler e comentar alguns artigos sobre as invalidades negociais.

Art. 166:

CAPÍTULO V

Da Invalidade do Negócio Jurídico

        Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

        I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;

        II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

        III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;

        IV - não revestir a forma prescrita em lei;

        V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;

        VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;

        VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

Na sequência, leia novamente o art. 167.

Art. 168:

        Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

        Parágrafo único. As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes.

Qualquer interessado ou o Ministério Público. Pode o juiz agir de ofício. Suprimento, aqui, significa conserto, convalidação, ratificação, confirmação. O juiz não pode fazer isso. Se é nulo, é nulo e não tem discussão. 

Art. 169:

        Art. 169. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.

Nulo hoje, nulo sempre. 

Art. 170:

        Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.

Transmutação do negócio: este negócio é nulo, mas pode-se salvar, dele, outro que as partes queiram. Exemplo: faço uma compra e venda de bem imóvel, que requer escritura pública. Mas como compra e venda não vale por causa da solenidade, podemos transformar esse contrato em um negócio de arrendamento. Então, o negócio é nulo para a compra e venda, mas não se, da essência, pudermos aproveitar e transformar em outro tipo de contrato.

Art. 171:

        Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:

        I - por incapacidade relativa do agente;

        II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.

Anulável significa "invalidade relativa." Quais são mesmo as características? Vício sanável, juiz não pode agir de ofício, mas só quando provocado, sujeição à ação do tempo, não-possibilidade de convalidação e efeito judicial ex-nunc.

II - todos são conhecidos nossos. O único não presente é a simulação.

Art. 172:

        Art. 172. O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro.

Art. 173:

        Art. 173. O ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo.

Vamos seguindo:

Art. 174:

        Art. 174. É escusada a confirmação expressa, quando o negócio já foi cumprido em parte pelo devedor, ciente do vício que o inquinava.

Inquinar significa “macular”. Ou seja, se a pessoa fecha um negócio que está sujeito a uma declaração de anulabilidade, se a parte devedora declara abrir mão de se buscar essa anulabilidade, depois de detectado o vício, a manifestação expressa não será mais necessária. Desde, é claro, que haja a vontade expressa de mantê-lo.

Art. 175:

        Art. 175. A confirmação expressa, ou a execução voluntária de negócio anulável, nos termos dos arts. 172 a 174, importa a extinção de todas as ações, ou exceções, de que contra ele dispusesse o devedor.

Significa que a confirmação do ato automaticamente anula todos os atos que buscam declarar a anulabilidade do negócio.

Art. 176:

        Art. 176. Quando a anulabilidade do ato resultar da falta de autorização de terceiro, será validado se este a der posteriormente.

Imagine um ato praticado hoje que exige uma autorização de alguém. A falta dela pode gerar a anulabilidade do ato. Se a prática do ato já se deu, mesmo que a autorização falte, o negócio se transforma em bom e saudável se dada a autorização  posteriormente. Mais uma vez o princípio da conservação dos negócios jurídicos agindo. Exemplo: venda de bens de casal, feita apenas por um dos cônjuges, sem a autorização do outro.

Art. 177:

        Art. 177. A anulabilidade não tem efeito antes de julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os interessados a podem alegar, e aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo o caso de solidariedade ou indivisibilidade.

Mostra o efeito ex-nunc. 

Art. 178:

        Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado:

        I - no caso de coação, do dia em que ela cessar;

        II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico;

        III - no de atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.

Traz o prazo decadencial para se pedir a anulação do negócio. Decadencial. Isso será de suma importância. Prazo decadencial e prazo prescricional é o que veremos a seguir.

O artigo é auto-explicativo, mas atentem: no caso da coação, o prazo começará no dia em que ela cessar, não do momento em que o contrato é assinado. A data da celebração do contrato será a referência para os outros vícios. Inciso III: a incapacidade aqui pode ser atingida por emancipação ou atingimento da maioridade. Quando ocorrer, inicia-se a contagem do prazo.
 

Prescrição e decadência

Esta matéria é de ultra-importante, e nem o professor aprendeu em tempo, enquanto na faculdade. A riqueza de detalhes é grande aqui.

Lembra quando falamos em fato jurídico, que é o elemento nuclear de toda relação jurídica? Depois disso, fizemos um quadro falamos de três espécies de fatos jurídicos: fato jurídico strictu sensu, ato-fato jurídico e ato jurídico.

Quando falamos dos fatos jurídicos propriamente ditos, aprendemos que eles são circunstâncias relevantes para o Direito mas que não envolviam a participação do homem. Óbito natural: acontecimento que gera um impacto em nosso mundo jurídico. Com isso, surge uma relação jurídica, como a abertura da sucessão. Nesse momento, vimos que um ótimo exemplo de circunstâncias tidas como fatos jurídicos propriamente ditos eram a prescrição e decadência. Isso porque tanto um quanto o outro trabalham com a ação do tempo. Ou seja, com a contagem dos dias, das horas, tudo isso com uma proposta bem definida: proporcionar segurança jurídica. Então, vamos introduzir assim: vamos aprender ainda que, em termos processuais, existem prazos que precisamos obedecer. Imaginemos que saiu uma sentença hoje, que temos todo o interesse do mundo, que ou ganhamos, ou perdemos. O Código Civil diz que o prazo para recurso é de 15 dias. Para que serve esse prazo? Para que se aja, que se tome uma atitude, mas para que? Recorrer. Somente se quisermos? Sim, porque não somos obrigados. Pode ser que não queiramos gastar mais dinheiro com o advogado. O fato é que temos um prazo. Esses prazos, no Direito, representam formas de marcos temporais. Para que? Para que, se quisermos agir, ajamos em determinado momento. Passado esse momento, a mensagem é: “toque sua vida! E deixe os outros.”

Então vamos lá: a sentença saiu hoje. O interessado interpõe recurso 14º dia. Ele honrou com seu compromisso? Sim, ele sabia do prazo e o respeitou. É bem diferente do sujeito que age no 16º dia. O juiz pode pensar: “você tem 15 dias para recorrer, mas você entrou no 16º, logo, você agiu desinteressadamente”. O que acontecerá? Grosseiramente falando, porém para bem do entendimento, o destino é o lixo. Quem errou? O sujeito que demorou para recorrer, pois o juiz agiu com justiça. Então, seja prescrição ou decadência, ambos trabalham com a ação do tempo de maneira a fazer com que possamos tocar nossa vida. Se não houvesse prescrição ou decadência, olhem o que aconteceria: uma casa foi vendida em 1920, e hoje o herdeiro do vendedor acordou com a vontade de tentar anular o negócio. Ele poderia? Poderia. Seria um caos total. Será que esse cidadão poderia ter alguma chance, a não ser que houvesse uma coação enormemente prolongada? Não. Então, o Direito trabalha com marcos. Esses marcos serão de nosso conhecimento. E, por favor, não pensem que não estão entendendo antes de ler até o final. Prossigamos, então!

Uma coisa é o Direito agir sobre a pretensão de agir. Ou seja, agir sobre aquela possibilidade de correr atrás. A outra coisa é termos o Direito agindo sobre o próprio direito envolvido.¹ Pensão alimentícia: algo que todos têm medo. Uma pessoa que, em novembro de 2006, deveria ter começado a ganhar R$ 500,00 por mês. Pergunta-se: ela tinha essa pretensão em novembro de 2006; não recebeu o pagamento pois o alimentante simplesmente não pagou. Em vez de agir, a pessoa passou todo o tempo remoendo essa amargura. Em 2042, ela acorda com aquela insatisfação. Isso faria sentido, diante de nossa lógica e razoabilidade? Claro que não. Então, prestação alimentícia tem um prazo para dela se correr atrás. De quanto é? Dois anos.

Vejam como funciona a prescrição. Vamos começar então com o exemplo da pensão alimentícia com prestação de novembro de 2006, numa história em que me separei da minha esposa pouco antes, e tínhamos um filho. Agora imagine aquela garrafinha d’água que estava sobre a mesa do professor durante a aula, que ele usou como “coringa”, e permitam-se um pouco de abstração. A garrafinha é a prestação, ou seja, podem dar à garrafinha o nome de “pensão alimentícia”. Então, eu digo à interessada, à minha ex: “você tem 2 anos para pedir em juízo a garrafinha.” A garrafinha é dela; ela têm dois anos para correr atrás. Mas não corre. Pergunta-se: a garrafinha deixa de ser da minha ex-esposa? Não, porque o direito à garrafinha é dela sim. Foi o direito de correr atrás dela que desapareceu no tempo. Então, ela ajuíza uma ação de alimentos em janeiro de 2009, portanto, mais de dois anos após o início da pretensão. Qual é o resultado? Acabou o prazo. O Direito dirá à minha ex: a garrafinha é da sua, mas você não pode mais pedi-la.

Então, com a decadência, perdemos o direito à garrafinha.

Agora vejamos outro exemplo: passei num recurso para juiz, com 5 vagas, em quarto lugar. Quem está incumbido de me chamar é meu desafeto. Ele chama o primeiro, o segundo, o terceiro, me pula e chama o quinto. Isso enseja um mandado de segurança. O prazo decadencial para aviar-se um mandado de segurança é de 120 dias contados do ferimento do direito liquido e certo. Passei no concurso, me mudei de Brasília, e não acompanhei a divulgação dos resultados. Com essa arbitraria “artimanha” do meu inimigo, houve ferimento do meu direito liquido e certo. Por negligência, não acompanhei e descobri que desse ferimento, dessa supressão que houve do meu nome, passaram-se 124 dias. Pergunto: tenho o direito de usar o mandado de segurança? Não. Aquela garrafinha, agora chamada de “mandado de segurança”, faz o quê? Some, desaparece mesmo. É diferente da primeira situação, em que o direito estava ali, era de minha ex-mulher, continua sendo dela, mas não pode ser pedido. Aqui, o tanto o direito de ir atrás quanto o próprio direito (o mandado de segurança) não existem mais. Isso é complicado mesmo. Se, no caso da garrafinha chamada prestação alimentícia, de valor igual a 500 reais, cujo pedido fora ajuizado depois de novembro de 2008 que é indeferido pelo juiz, eu me apresento voluntariamente e pago à minha ex, eu precisava pagar? Esse direito é dela, mesmo depois do prazo que ela tinha para pleitear judicialmente? Sim! Então, se eu pago, não posso mais voltar atrás!

No caso da decadência, o Direito age contra o direito, então, o direito some! Logo, se for pago, então, pode-se voltar atrás! 

Vamos, então, à prescrição.

Art. 189:

TÍTULO IV
Da Prescrição e da Decadência
CAPÍTULO I.
Da Prescrição

Seção I
Disposições Gerais

        Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Pretensão. Lembrem-se dessa palavra. O artigo sintetiza a questão da pensão alimentícia: quando me separei de minha esposa, deixando um filho morando com ela, surgiu para, imediatamente, o direito de receber o pagamento dos alimentos. Então, dizemos que nasceu para ela, titular do direito, a pretensão de pedir a pensão.

Art. 191:

        Art. 191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.

Primeira característica da prescrição: ela admite renúncia. Na decadência, não haverá renúncia. Segunda característica: a prescrição não admite alteração de prazo. É o que diz o art. 192:

        Art. 192. Os prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo das partes.

Qualquer que seja o prazo prescricional, ele não poderá ser mudado. Na decadência isso será possível.

Art. 193: pode ser alegada em qualquer instância.

        Art. 193. A prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita.

Art. 195:

        Art. 195. Os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem causa à prescrição, ou não a alegarem oportunamente.

Por último, a prescrição começada contra um continuará contra seu sucessor:

        Art. 196. A prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o seu sucessor.

Então, vamos, agora, ficar indignados. A usucapião: ela é a única espécie de prescrição aquisitiva de direitos. Isso quer dizer que todas as demais formas de prescrição serão extintivas de direito. O que é usucapião? A possibilidade de ganhar a propriedade de um imóvel, ou de um móvel, em razão da ação do tempo em que se fica na posse daquilo. Ou seja, temos uma fazenda, que está abandonada, não se cuida, e alguém entra lá, não vê reação, e começam a tomar conta daquilo. Se os posseiros ficam determinado número de anos, podemos perder a propriedade para eles? Sim. O que o Direito pensa? “A coisa é sua, mas não se está nem aí para ela!” É um raciocínio parecido com aquele em que não se recorre nos 15 dias de prazo. “Camarão que dorme a onda leva.” Ou então, com Aristóteles: “o Direito não socorre a quem dorme.”

Claro que a ação de usucapião deve ser declarada judicialmente. O prazo é de 5 anos para bens imóveis e 3 para móveis.
 

Características da prescrição

A primeira é que ela admite não contar o tempo, admite ser suspensa, e admite ser interrompida (o que são coisas diferentes). Ao contrário da decadência, em que nada pode parar a contagem do prazo. Sobre a essência, a prescrição fulmina apenas uma pretensão, enquanto a decadência fulmina o próprio direito.

As diferenças entre suspensão e interrupção de prazo é que a suspensão podem ocorrer múltiplas vezes, enquanto a interrupção somente uma. A suspensão apenas congela o prazo, retomando este quando terminada; a interrupção faz reiniciar a contagem do prazo. 

Quando interrompemos, e quando suspendemos? Veremos já, já. Mas antes de mais nada, mais uma questão de prova: no direito trabalhista, temos prazo para ajuizar ações. Imagine uma situação em que o sujeito trabalha numa empresa desde 1990. Ele gosta do lugar, é bem tratado, tem bom salário, faz questão de desfilar com o uniforme, etc. Em 2006, as coisas mudam: um chefe chato começa a persegui-lo. Esse assédio culmina na demissão do empregado fiel, que contava com 16 anos de casa. Ele fica grande dúvida: “coloco ou não coloco a empresa na justiça? Ela me deve coisas, mas também fez tanto por mim!” Se consultar um advogado, desde que este não esteja apenas interessado nos honorários, ou seja, um advogado minimamente consciente, ele dirá: “rapaz, tome logo a decisão, porque você terá um prazo para ajuizar essa ação.” Se ele não tivesse consultado um advogado e só tivesse ajuizado a ação trabalhista em 2009, portanto mais de dois anos depois de sua demissão, ele terá desrespeitado o prazo. O que ele perde? Tudo, pois perdeu o direito de correr atrás do pagamento, por exemplo, das horas extras a que tem direito: R$ 300.000,00. Qual a esperança dele? Que a empresa seja legal e pague. Se o fizer, num outro mundo, ela pode voltar atrás? Não. Por quê? Porque o direito é do trabalhador; o que ele perdeu foi o direito de correr trás (a pretensão) de receber.

Mas este caso é trabalhista. No Direito Trabalhista, há a norma de que só se pode retroagir até 5 anos em pagamento. Então, se ele ajuíza ação em novembro de 2006, logo no início da contagem do prazo de dois anos da data em que foi demitido, ele terá direito de reivindicar o que? Os pagamentos referentes a novembro de 2001 em diante. Mas e se ele demora e só ajuíza a ação trabalhista no final do prazo, em outubro de 2008? Significa que ele perdeu dois anos, e, como a regra é que só se pode retroagir até o limite de 5 anos, qual será a data resultante? Outubro de 2003. Note que, neste caso, ele só conseguirá, na melhor das hipóteses, abarcar 3 anos dentro do período em que trabalhou. É algo para um advogado da empresa prestar muita atenção, também. Quanto ao trabalhador, camarão que dorme...

Nesse exemplo, sendo prazo de prescrição, ele admitiria prazo de suspensão. O que diz o art. 197?

Seção II
Das Causas que Impedem ou Suspendem a Prescrição

        Art. 197. Não corre a prescrição:

        I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;

        II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;

        III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.

A prescrição pode não estar sendo suspensa, ou ainda por acionar. Entre cônjuges, enquanto casados, não correrá o prazo prescricional. Não precisa haver a separação judicial para que se inicie a contagem; basta a separação de fato.

Art. 198:

        Art. 198. Também não corre a prescrição:

        I - contra os incapazes de que trata o art. 3o ;

        II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;

        III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.

Atenção: absolutamente incapazes. Então, rememore o art. 3º. Missão de paz, como a do Haiti em 2004 é considerado tempo de guerra.

Art. 199:

        Art. 199. Não corre igualmente a prescrição:

        I - pendendo condição suspensiva;

        II - não estando vencido o prazo;

        III - pendendo ação de evicção.

Condição suspensiva: como é conteúdo que já estudamos, ela pode ser cobrada. Termo (prazo) também.

Evicção: uma espécie de garantia em que se responsabiliza por aquele que negocia com alguém. Não sendo uma relação de consumo, que já traria garantia, a ação de evicção se dá quando se vende algo que é particular. Digamos que Curley vende para Moe um automóvel. A propriedade foi transferida. Depois de ficar sabendo dessa transação, Larry, o verdadeiro dono daquele automóvel, intervém judicialmente, alegando ser sua a propriedade daquele bem, vindo a receber, por isso, sentença em seu favor. Essa é uma ação de evicção. Neste caso, Moe terá que transferir a posse para Larry; aquele é o evicto, este é o evictor. Curley, o alienante, ficará com as conseqüências.

Art. 201:

        Art. 201. Suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só aproveitam os outros se a obrigação for indivisível.

Cada credor tem que correr trás do que é seu. A prescrição é individual. Questão de prova.

Art. 202: não é mais causa de suspensão, mas sim situação de interrupção, aquela em que o tempo é reiniciado. Somente poderá ocorrer a interrupção uma única vez.

Seção III
Das Causas que Interrompem a Prescrição

        Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:

        I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;

        II - por protesto, nas condições do inciso antecedente;

        III - por protesto cambial;

        IV - pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores;

        V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

        VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.

        Parágrafo único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper.

Para suspensão, não existe número máximo ou mínimo. Haverá uma questão de prova envolvendo interrupção.

Reconhecimento de direito pelo devedor: ninguém normalmente liga para essa parte final. Ou seja, quem está devendo confessa, de alguma maneira, que deve. Isso faz com que haja uma interrupção da prescrição. Caso banal: o sujeito contrai uma dívida de cerca de 200 mil Reais e demora para pagar. O credor, em vez de ajuizar uma ação de cobrança, prefere a “diplomacia”, e liga, reiteradas vezes, para o devedor, oferecendo uma negociação para pagar. O devedor, por sua vez, até tem a intenção de pagar, mas está sem condições. Quando passam-se alguns meses, ele manda um e-mail ao credor dizendo: “por favor, vamos renegociar, dê-me mais tempo para pagar.” Note que, ao mandar esse e-mail pedindo “piedade”, o que acontece? Confissão! Significa que se reconheceu que realmente há uma dívida. O efeito é exatamente a interrupção de prazo. Então, o devedor, que dali a alguns dias poderia comemorar o fim da pretensão do devedor de cobrar aquela quantia, fez com que se iniciasse novamente todo o prazo de dois anos. Agora sim, o credor, que já deve estar impaciente, deverá ajuizar a ação. Normalmente, quem age é quem tem medo da prescrição.

Parágrafo único. Quando recomeça a contagem.

Art. 203:

        Art. 203. A prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado.

Simples.

Art. 204:

        Art. 204. A interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos outros; semelhantemente, a interrupção operada contra o co-devedor, ou seu herdeiro, não prejudica aos demais coobrigados.

        § 1o A interrupção por um dos credores solidários aproveita aos outros; assim como a interrupção efetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus herdeiros.

        § 2o A interrupção operada contra um dos herdeiros do devedor solidário não prejudica os outros herdeiros ou devedores, senão quando se trate de obrigações e direitos indivisíveis.

        § 3o A interrupção produzida contra o principal devedor prejudica o fiador.

Este artigo trás a característica da pessoalidade da prescrição. Prescrição é pessoal, daí cada credor, como visto antes, deverá correr atrás do que lhe é de direito individualmente.

Art. 205:

Seção IV
Dos Prazos da Prescrição

        Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.

Atentem para os mais importantes. Se nada for falado, o maior prazo de prescrição é de 10 anos no Direito Brasileiro. O Código de 1916 dispunha que, em regra, era de 20 anos. 10 anos, portanto, é regra geral, a ser aplicada subsidiariamente quando o dispositivo em questão silenciar-se a respeito de prazo.

Art. 206:

        Art. 206. Prescreve:

        § 1o Em um ano:

        [...]

        II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo:

        a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;

        b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;

        [...]

        § 2o Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem.

        § 3o Em três anos:

        I - a pretensão relativa a aluguéis de prédios urbanos ou rústicos;

        [...]

        V - a pretensão de reparação civil;

        [...]

        § 5o Em cinco anos:

        [...]

        II - a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou mandato;

        [...]

Este artigo trás várias regras específicas de prescrição. Vamos apontar os casos mais usuais:

§ 1º, inciso II é uma prescrição mais famosas, pois envolve seguradoras;

§ 2º: prescrição de dois anos para pensão alimentícia;

§ 3º, inciso I: também famoso. Rústico = rural. Prazo para cobrar aluguel: 3 anos. Como o contrato de aluguel é um dos mais comuns em nossa sociedade, muitos fogem depois de passado esse tempo.

Inciso V: reparação do dano civil.

§ 5º, inciso II: importante para nós, advogados!
 

Decadência

O que se diz com relação à decadência? Artigos. 207 a 211.

CAPÍTULO II.
Da Decadência

        Art. 207. Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição.

        Art. 208. Aplica-se à decadência o disposto nos arts. 195 e 198, inciso I.

        Art. 209. É nula a renúncia à decadência fixada em lei.

        Art. 210. Deve o juiz, de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida por lei.

Características principais: prazo admite reconvenção, porém não pode haver suspensão nem interrupção em nenhuma hipótese. Também não se admite renúncia na decadência, nem antes nem depois de consumada.

Art. 211:

        Art. 211. Se a decadência for convencional, a parte a quem aproveita pode alegá-la em qualquer grau de jurisdição, mas o juiz não pode suprir a alegação.

Só uma questão que pega: prazo para anular negócio jurídico é prescricional ou decadencial? Decadencial, portanto não admite interrupção nem suspensão. Não pode ser renunciado e admite alteração pois sua fonte pode ser, além de legal, convencional.

Observação: os artigos 212 e seguintes tratam das provas dos negócios jurídicos, que já estudamos.


  1. Note os empregos da palavra “Direito” e “direito”, o primeiro na forma objetiva, e o segundo na subjetiva.
Questões de prova mencionadas hoje: