Direito Empresarial

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Propriedade industrial



Estamos quase chegando à avaliação! A matéria que cairá é até este tópico, que vai até a aula que vem. Veremos coisas além do conteúdo da primeira prova antes dela. A lista do conteúdo está na nota de rodapé da próxima aula.

Outro aspecto importante que diz respeito a esta matéria é que a disciplina é uma excelente fonte de renda para advogados. A lei tem 244 artigos, e os países brigam entre si por essa matéria, inclusive no Brasil. infelizmente é utopia achar que, em duas aulas, saibamos tudo sobre o Direito de propriedade industrial, mas é importantíssimo que saiamos daqui com uma noção do que é isso. Quando ouvirmos falar em propriedade industrial, saberemos do que se trata. Dá para entender em duas aulas os conceitos básicos do conteúdo. Para termos uma idéia do dinheiro que se envolve nessa história é só lembramos de J.J. Gomes Canotilho, constitucionalista de renome internacional. Direito Constitucional é Direito Público. Mas o que teria um constitucionalista a ver com o Direito de propriedade industrial? Simples, é que é um assunto que deixa pessoas poderosas sem sono, então lhe pagaram para elaborar um parecer para um dos maiores escritórios do Brasil, que acabou virando livrinho 1. Falava sobre a patente pipeline 2. Só para termos idéia da complexidade e da importância dessa matéria. O Brasil, há pouco tempo, teve que quebrar uma patente, que significa, tecnicamente, quebrar o direito de exclusividade em relação ao coquetel antiretroviral. Ou seja, sem pagar a devida remuneração, o chamado royalty, ao detentor da patente.

Qual o conteúdo desse Direito, em essência? Quando se fala em propriedade industrial, a primeira coisa é a tomar cuidado é que isso nada tem a ver com parque industrial, pelo menos não diretamente. Falamos aqui de Direito Imaterial. Não tem conteúdo físico. O conteúdo daqui são as patentes, que pode ser de invenções ou de modelos de utilidade.

As patentes são o primeiro conteúdo do Direito de Propriedade industrial.

O segundo conteúdo se chama registro de marca ou registro de desenho industrial. É o que veremos na aula de segunda-feira. Então, quando se fala “eu requeri uma patente”, significa que eu requeri um registro de uma marca ou de um desenho industrial.

Quem pede um registro de marca ou desenho industrial o faz para ter o direito de explorar aquela marca com exclusividade. Explorar, aqui, é obviamente no sentido econômico. Quem descobre alguma coisa tem o direito de explorá-la economicamente.

Outra coisa a se levar em consideração é que os Estados de hoje são Estados Democráticos de Direito. Existem, ao lado dos direitos individuais, os direitos sociais. A exploração, apesar de exclusiva, deve ser voltada para o interesse da sociedade. Significa que não se pode registrar uma patente e deixar de explorá-la. A conseqüência disso será a extinção da patente. Também acontecerá se o sujeito explorá-la desvirtuadamente ou deliberadamente produzir abaixo da demanda.

A lei que trata das patentes é a Lei de Propriedade Industrial (Lei 9279/96). Em seu art. 42, vemos:

CAPÍTULO V
DA PROTEÇÃO CONFERIDA PELA PATENTE

Seção I
Dos Direitos

        [...]

        Art. 42. A patente confere ao seu titular o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos:

        I - produto objeto de patente;

        II - processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado.

        § 1º Ao titular da patente é assegurado ainda o direito de impedir que terceiros contribuam para que outros pratiquem os atos referidos neste artigo.

        § 2º Ocorrerá violação de direito da patente de processo, a que se refere o inciso II, quando o possuidor ou proprietário não comprovar, mediante determinação judicial específica, que o seu produto foi obtido por processo de fabricação diverso daquele protegido pela patente.

A autorização e licença a terceiros é usada quando o titular não usa, e não exerce o direito que o sistema jurídico lhe assegurou. Ora, se é um direito imaterial, ele pode ser negociado, transacionado entre vivos ou então passado via herança.

Quem faz a proteção garantida pela lei? É uma autarquia federal chamada Instituto Nacional de Propriedade Industrial, o INPI, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

Repetindo: patente é ou de invenção ou de modelo de utilidade. E quais as condições para se obter uma patente? Eis os requisitos:

  1. Novidade – a invenção ou modelo de utilidade não pode estar compreendido no estado da técnica - deve ser desconhecido pela comunidade científica, técnica ou industrial - art. 11;
  2. Atividade inventiva - quando não seja uma decorrência óbvia do estado da técnica - deve despertar no espírito dos técnicos da área o sentido de um real progresso quanto à invenção e não decorrer de maneira comum e vulgar do estado da técnica, segundo parecer dos especialistas;
  3. Aplicação industrial – a invenção ou modelo de utilidade só poderão ser patenteados se forem industrializáveis. - art. 15;
  4. Não impedimento - a lei proíbe por razões técnicas ou morais determinadas invenções ou modelos de utilidade - art. 18.

Primeiro: novidade. Mas essa novidade não é aquela novidade de caráter pessoal. O sujeito pode achar que inventou algo extraordinário, e para ele pode ser até extraordinário mesmo. Só que, para os técnicos daquela área, aquilo é comum, e já pode ser feito e fabricado. A conseqüência é, neste caso, que o sujeito não obterá a patente. A novidade, portanto, não pode estar compreendida no estado da técnica. O invento deve ser desconhecido pela comunidade científica. Toda área científica tem pesquisadores, e ninguém tem dúvida de como pode ser fabricado um rádio. Então, se está no estado da técnica, conhecido pelos cientistas, então não se obtêm a patente.

Segundo, deve haver uma atividade inventiva. O que é isso? Quando não seja “uma decorrência óbvia do estado da técnica”. A legislação usa essa terminologia no art. 11. Estado da técnica é o conjunto de conhecimentos científicos para se fabricar determinado objeto. O estado da técnica é universal, independe de países. Existe uma convenção internacional chamada Convenção da União de Paris. Por essa convenção, se um inglês cria uma patente, ela valerá no Brasil, e vice-versa. Quem inventou o coquetel antiretroviral contra o HIV não foi um brasileiro, mas o Brasil estava obrigado a respeitar sua patente. A invenção deve despertar, nos técnicos da área, um sentimento de real progresso, ou seja, de efetiva novidade. Tem que ser algo desconhecido dos cientistas.

Mas não para aí: alguém poderia inventar um automóvel mirabolante, quem sabe, movido diretamente a energia nuclear. Mas não tem fonte de energia para ele, então ele não poderá ser patenteado. Significa que o terceiro requisito é que tenha aplicação industrial, e deve haver clientes para comprá-la, em outras palavras, deve ter aceitação no mercado.

Por último: não pode ter impedimento. Não pode contrariar a moral ou os bons costumes, ou ser algo de difícil controle, como algo que funcione com energia atômica.

A lei, como veremos, traz um artigo trazendo coisas que estão excluídas, como cálculos matemáticos, fórmulas de jogos, e qualquer coisa que seja produzida pela Natureza. Contudo, se o homem toma duas coisas formadas pela Natureza e produz alteração artificial, então o homem está inventando. Exemplo: alimentos transgênicos.

E os prazos de vigência? O indivíduo requer a patente ou o registro. No caso da patente, chama-se depósito, que é quando o pedido de registro é encaminhado ao INPI. Depois da análise o INPI fará a concessão do registro. O direito concedido não é eterno, ele tem um prazo para ser exercido. No caso da patente, são 20 anos que o titular terá para explorá-la, não podendo esse tempo ser inferior a 10 anos. Isso porque entre o depósito e a concessão há um processo longo. Se ele lança um produto inovador no mercado e imediatamente deposita o pedido de registro, levando o órgão 4 anos para analisá-lo e fazer a concessão, ele ainda terá, naturalmente, 16 anos para explorar a patente. Se, entretanto, o pedido levar 12 anos para ser apreciado, dos 20 anos de prazo máximo, teoricamente faltariam apenas 8 para serem explorados. Neste caso, a lei reserva ao titular o prazo mínimo de 10 anos, dando, neste caso, dois anos extras ao titular da patente que demorou a ser concedida.

No caso do modelo de utilidade, o raciocínio é análogo: o prazo máximo é de 15 anos, assegurando a lei o mínimo de 7 anos para a exploração.

Pois bem. Estamos repetindo muito esses dois termos: invenção e modelo de utilidade. Mas signficam? O que diz a doutrina? Ela chama o modelo de utilidade de pequena invenção. Como o nome diz, é um acréscimo feito a uma invenção. E os dois direitos subsistem, tanto o relativo à invenção original quanto ao acessório. Alguém inventa algo, e patenteia. Outro cidadão surge e acresce algo a mais, e poderá patentear somente aquele acréscimo. Exemplo: carro e o dispositivo para que o deficiente dirija. Os dois direitos permanecerão.

Art. 2º da Lei 9279/96:

        Art. 2º A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial, considerado o seu interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País, efetua-se mediante:

        I - concessão de patentes de invenção e de modelo de utilidade;

        II - concessão de registro de desenho industrial;

        III - concessão de registro de marca;

        IV - repressão às falsas indicações geográficas; e

        V - repressão à concorrência desleal.

Ficamos então com o que consideramos básico sobre a patente. Marca e desenho industrial veremos na próxima aula. O que falamos está no caput do artigo. Essa exploração exclusiva tem que ser voltada para o interesse social e o desenvolvimento tecnológico do país.

Art. 6º:

TÍTULO I
DAS PATENTES

CAPÍTULO I
DA TITULARIDADE

        Art. 6º Ao autor de invenção ou modelo de utilidade será assegurado o direito de obter a patente que lhe garanta a propriedade, nas condições estabelecidas nesta Lei.

        § 1º Salvo prova em contrário, presume-se o requerente legitimado a obter a patente.

        § 2º A patente poderá ser requerida em nome próprio, pelos herdeiros ou sucessores do autor, pelo cessionário ou por aquele a quem a lei ou o contrato de trabalho ou de prestação de serviços determinar que pertença a titularidade.

        § 3º Quando se tratar de invenção ou de modelo de utilidade realizado conjuntamente por duas ou mais pessoas, a patente poderá ser requerida por todas ou qualquer delas, mediante nomeação e qualificação das demais, para ressalva dos respectivos direitos.

        § 4º O inventor será nomeado e qualificado, podendo requerer a não divulgação de sua nomeação.

Art. 8º:

CAPÍTULO II
DA PATENTEABILIDADE

Seção I
DAS INVENÇÕES E DOS MODELOS DE UTILIDADE PATENTEÁVEIS

        Art. 8º É patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.

E aqui a lei define o que é modelo de utilidade no art. 9º:

        Art. 9º É patenteável como modelo de utilidade o objeto de uso prático, ou parte deste, suscetível de aplicação industrial, que apresente nova forma ou disposição, envolvendo ato inventivo, que resulte em melhoria funcional no seu uso ou em sua fabricação.

Se o sujeito criou uma forma de fabricar o que já é fabricável mas agiliza o processo de produção, isso é considerado um modelo de utilidade. O processo tem que ser impregnado de invenção, e tem que ser desconhecido do estado da técnica.

A leitura desses artigos é para sedimentar mais ainda o conteúdo do direito de propriedade industrial. Quem inventa, melhora algo que já existe, obtém a patente e com ela o direito de exploração econômica com exclusividade. Ou seja, alguém pode fazer, mas tem que pagar a retribuição, o royalty.

Art. 11:

        Art. 11. A invenção e o modelo de utilidade são considerados novos quando não compreendidos no estado da técnica.

        § 1º O estado da técnica é constituído por tudo aquilo tornado acessível ao público antes da data de depósito do pedido de patente, por descrição escrita ou oral, por uso ou qualquer outro meio, no Brasil ou no exterior, ressalvado o disposto nos arts. 12, 16 e 17.

        § 2º Para fins de aferição da novidade, o conteúdo completo de pedido depositado no Brasil, e ainda não publicado, será considerado estado da técnica a partir da data de depósito, ou da prioridade reivindicada, desde que venha a ser publicado, mesmo que subseqüentemente.

        § 3º O disposto no parágrafo anterior será aplicado ao pedido internacional de patente depositado segundo tratado ou convenção em vigor no Brasil, desde que haja processamento nacional.

A própria lei define o que é novidade. O que é conhecido está no estado da técnica. Mas depois ressalva-se que divulgações de última hora não atrapalharão a patente. Art. 12:

        Art. 12. Não será considerada como estado da técnica a divulgação de invenção ou modelo de utilidade, quando ocorrida durante os 12 (doze) meses que precederem a data de depósito ou a da prioridade do pedido de patente, se promovida:

        I - pelo inventor;

        II - pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI, através de publicação oficial do pedido de patente depositado sem o consentimento do inventor, baseado em informações deste obtidas ou em decorrência de atos por ele realizados; ou

        III - por terceiros, com base em informações obtidas direta ou indiretamente do inventor ou em decorrência de atos por este realizados.

        Parágrafo único. O INPI poderá exigir do inventor declaração relativa à divulgação, acompanhada ou não de provas, nas condições estabelecidas em regulamento.

Art. 13:

        Art. 13. A invenção é dotada de atividade inventiva sempre que, para um técnico no assunto, não decorra de maneira evidente ou óbvia do estado da técnica.

Todos os requisitos que colocamos têm definição legal. É difícil e tem muita abstração, mas podemos ter uma idéia.

Art. 14:

        Art. 14. O modelo de utilidade é dotado de ato inventivo sempre que, para um técnico no assunto, não decorra de maneira comum ou vulgar do estado da técnica.

É o que já vimos: a lei repete cansativamente a noção de estado da técnica. Quem faz algo já conhecido não obterá a patente.

Art. 15:

        Art. 15. A invenção e o modelo de utilidade são considerados suscetíveis de aplicação industrial quando possam ser utilizados ou produzidos em qualquer tipo de indústria.

Todos os requisitos que a lei exige são definidos em lei. Então não há muito que se discutir a não ser a dificuldade de alcançar a noção de estado da técnica. Basta que saibamos que é aquilo o os cientistas da área ainda não conhecem. Porque se é algo que um cientista estrangeiro já conhece, aquilo não será uma invenção.

Art. 18:

Seção III
Das Invenções e Dos Modelos de Utilidade Não Patenteáveis

        Art. 18. Não são patenteáveis:

        I - o que for contrário à moral, aos bons costumes e à segurança, à ordem e à saúde públicas;

        II - as substâncias, matérias, misturas, elementos ou produtos de qualquer espécie, bem como a modificação de suas propriedades físico-químicas e os respectivos processos de obtenção ou modificação, quando resultantes de transformação do núcleo atômico; e

        III - o todo ou parte dos seres vivos, exceto os microorganismos transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade - novidade, atividade inventiva e aplicação industrial - previstos no art. 8º e que não sejam mera descoberta.

        Parágrafo único. Para os fins desta Lei, microorganismos transgênicos são organismos, exceto o todo ou parte de plantas ou de animais, que expressem, mediante intervenção humana direta em sua composição genética, uma característica normalmente não alcançável pela espécie em condições naturais.

É o último item: o impedimento. O que é? É o que não poderá ser patenteado. Quanto ao outro impedimento, caberá à sociedade saber o que é algo contrário à moral e aos bons costumes.

Voltemos ao art. 10 também para termos mais uma idéia do que não pode ser patenteado:

        Art. 10. Não se considera invenção nem modelo de utilidade:

        I - descobertas, teorias científicas e métodos matemáticos;
        II - concepções puramente abstratas;
        III - esquemas, planos, princípios ou métodos comerciais, contábeis, financeiros, educativos, publicitários, de sorteio e de fiscalização;
        IV - as obras literárias, arquitetônicas, artísticas e científicas ou qualquer criação estética;
        V - programas de computador em si;
        VI - apresentação de informações;
        VII - regras de jogo;
        VIII - técnicas e métodos operatórios ou cirúrgicos, bem como métodos terapêuticos ou de diagnóstico, para aplicação no corpo humano ou animal; e
        IX - o todo ou parte de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados, inclusive o genoma ou germoplasma de qualquer ser vivo natural e os processos biológicos naturais.

Esse artigo não é taxativo, mas meramente exemplificativo.

Prazos: estão no art. 40:

Seção II
Da Vigência da Patente

        Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze) anos contados da data de depósito.

        Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior.

O que é básico aqui? É saber que o direito ao uso de uma patente é de 20 anos, ou no mínimo 10. Porque se fala em mínimo de 10? Porque o processo pode durar muito. Sem essa ressalva, o inventor poderia ficar desamparado.


Encerraremos na próxima aula. Veremos o registro e terminamos a matéria da avaliação.

  1. “A Questão da Constitucionalidade das Patentes Pipeline à Luz da Constituição Federal Brasileira de 1988”.
  2. Entrevista com Canotilho: http://www.revistapropriedade.com.br/conteudo.asp?qs_str_ID_AREA=3&qs_id_texto=758, acessível em 15/09/09 às 22:41.